Depois de sair da minha cabine eu acabei esbarrando com a última pessoa que eu queria ver naquele momento. A própria Isami. Ela me olhou por algum tempo e depois virou-se para uma parede. Nós dois fomos levados por Angelina até um carro e do carro até a estação. Eu permanecia no mais puro silêncio e a garota também. A única que falava era Angelina, que tentava de alguma forma nos animar.

_ Era só o que me faltava! Ter pego dois tributos tão fracos e deprimentes como vocês! –respondeu ela.

Deu para perceber que suas frases não estavam ajudando em nada, mas mesmo assim eu continuei calado até finalmente conseguir ver o nosso trem pela janela do carro. No caminho dele haviam inúmeras câmeras e pessoas barulhentas da Capital.

_Bem, é melhor irmos logo. Quando mais cedo acabar, melhor. –disse Angelina abrindo a porta do carro e saindo sorridente para os repórteres.

Me virei para Isami e percebi que ela começara a agir de um jeito estranho. Parecia nervosa, ou melhor, apavorada. Suas mãos tremiam e seu rosto tinha ficado pálido.

_Você está bem, menina? –perguntei curioso.

Ela me olhou e vi seus olhos azuis claros me observarem cheios de surpresa e vergonha. Talvez ela fosse tímida. Talvez ela estivesse com medo de ir para o trem enquanto era observada por Panem inteira. O pedido de Marcel novamente me passa pela cabeça.

Então a proteja até onde conseguir chegar. Por favor, Seth. É o único pedido que eu já te fiz.

Protegê-la? Mas como? Ai, já vi que esse pedido me vai trazer um monte de problemas! O único jeito de fazer os repórteres não quererem filmá-la seria... De repente, suspirei. Um dia eu ainda vou me arrepender dessa ideia, mas no momento não vejo outra alternativa para conseguir distrair essas pessoas temporariamente até Isami chegar no trem. Marcel, você realmente está me devendo uma.

Tirei minha camisa e joguei para o lado. Isami me olhou parecendo prestes a desmaiar de vergonha, mas eu consegui segurá-la antes disso.

_Quando eles começarem a me filmar você corre direto para o trem, entendido? –foi tudo o que disse.

Ela pareceu surpresa por um momento, mas balançou a cabeça logo depois concordando com o plano. Sai do carro sorrindo e acenando para as câmeras. Como eu previ. Ninguém conseguia parar de olhar para mim. Me aproximei de algumas câmeras e fingi estar gostando de participar desse Jogos. Mandei beijos para algumas moças e fiz algumas brincadeiras com o pessoal e com os Pacificadores. Senti um braço me puxar para trás. Angelina, agora um pouco corada, começou a me dar uma bronca longa e cumprida que eu nem prestei atenção. Percebi um vulto se aproximando do trem. As câmeras cansadas de me filmar levando o discurso de Angelina começaram a perceber Isami e estavam prestes a filmá-la, quando eu, não sei por que, gritei de repente para todos ouvirem:

_O que é, Angelina? Você quer que eu tire a calça também?!

Todos voltaram a me olhar e Angelina fica tão vermelha quanto um pimentão. Corro para o trem onde Isami tinha acabado de entrar. Quando todos nós já estávamos no trem, tive que ouvir novamente um novo e longo discurso de Angelina e quando finalmente consegui sair de fininho, pude ver Isami me olhar com o rosto um pouco rosado.

_Hum... Obrigada. –disse ela rapidamente e depois fugiu para a sua cabine.

Não entendi direito o que aconteceu, mas não dei muita importância para aquilo. Entrei na minha cabine e tirei um longo cochilo.

Quando acordei novamente, era hora do jantar. Tomei um banho frio de chuveiro por duas razões. Primeira: Para me despertar do sono. Segunda: Eu não tinha a mínima ideia de que botões usar para mudar de temperatura a água.

Quando sai de lá, encontrei uma muda de roupa limpa e a vesti. Dirigi-me para a sala de jantar onde um banquete me esperava. Admito que nunca vi tanta comida colorida que eu pudesse comer na minha vida. Está certo que eu vivia no Distrito 11 e lá havia vários pomares, mas em nenhum deles eram autorizado comer seus frutos. Angelina já estava lá com Isami que devorava seu prato desesperadamente. Sentei perto dela e enchi o meu prato de comida. Peguei tudo que conhecia e tinha ouvido falar. Comi saboreando cada comida até não sobrar nada no meu prato. Eu já estava quase acabando com a minha coxa de peru quando olhei para Angelina que me observava com nojo.

_Vocês podiam, pelo menos, mastigar de boca fechada, não acham? –falou ela tampando a boca parecendo enjoada.

_Não. –disse sorrindo malvadamente para ela.

Essa era a minha vingança por ela ter me dado aqueles sermões irritantes. Mastiguei ainda mais abertamente. Angelina não aguentou e saiu da sala correndo para um lugar que desconfio ser o banheiro.

_Ela não vai voltar aqui tão cedo. –disse satisfeito.

_Não – concordou Isami sorrindo para mim.

Era a primeira vez que eu a tinha visto sorrir naquele dia. Era realmente um sorriso bonito. Eu, desde hoje de manhã, nunca havia visto uma cara tão feliz e delicada vindo dela como nesse exato momento, mas também não era pra pouco. Tudo o que tinha passado hoje devia ter sido muito assustador para uma menina como ela, principalmente porque Isami ainda é quase uma criança. Agora que paro para pensar, fico me perguntando por que ela está aqui. Uma menina tão jovem e pequena como ela poderia ser odiada tanto assim pelo nosso Distrito a ponto de ser votada para participar dos Jogos? Não podia ser isso. Ela não aparentava se perigosa. Muito pelo contrário. Parecia mais como se fosse um gatinho perdido no meio de uma selva perigosa.

_Você já conheceu a Jasmen? –perguntou Isami me acordando dos meus pensamentos.

_Quem é essa? –perguntei.

_A nossa mentora. Pensei que ela tinha se apresentado para você essa tarde. –falou ela parecendo confusa.

_Não, eu acabei dormindo o resto do dia na minha cabine. –expliquei para Isami. -Como ela é?

_Ela é... –disse Isami parecendo tentar achar uma palavra certa. -...diferente.

Diferente? O que isso queria dizer? Antes que eu pudesse perguntar ouço a porta se abrir com força e uma mulher entrar.

_E ai, idiotas? Tem comida ou os bebezões paparam tudo? –falou ela parecendo irritada.

Quem era ela? Uma Pacificadora? Não. Ele parecia confiante e confortável demais para ser uma. Olhei para Isami que tentava forçar um sorriso para mim.

_Seth, eu te apresento a nossa mentora, Jasmen.