O Reino de Lotaria escrita por Anderson Ricardo Paublo


Capítulo 14
Capitulo 12 - Entre sombras e Cicatrizes




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No silêncio ensurdecedor que se seguiu à batalha, a prisão do anjo, agora um santuário de dor e reflexão, abrigava os heróis exaustos de Lotaria. Os ecos da luta ainda vibravam nas paredes de pedra, testemunhas silenciosas do conflito que havia se desenrolado. No centro deste cenário, Anderson, cujo poder descontrolado havia sido tanto a salvação quanto a ruína, encontrava-se afundado em um mar de culpa.

Nimariel, com feridas visíveis e outras invisíveis, tentava reunir forças, a gravidade de sua condição evidenciada pelos movimentos cuidadosos e pela respiração contida. Lolis, a fada outrora parte de Anderson, agora uma entidade separada, e a princesa, cuja determinação não conhecia limites, uniam-se em esforço para tecer magias de cura. Suas energias, embora diminuídas pela batalha, fluíam como riachos de esperança, buscando aliviar o sofrimento de seus companheiros.

Anderson, observando a cena, sentia o peso de suas ações comprimir seu peito. A culpa que carregava por ferir aqueles que estavam ao seu lado na luta contra as trevas era uma sombra que agora obscurecia sua visão de futuro. Em um momento de vulnerabilidade, ele se aproximou de Lolis, sua voz baixa, quase um sussurro, carregada de uma hesitação que raramente mostrava. "Lolis, há... há alguma forma de nos fundirmos novamente? Para que... isso nunca mais aconteça?" A pergunta pendia no ar, carregando consigo o desejo de Anderson de retomar o controle, de evitar que o caos que havia desencadeado pudesse se repetir.

A fada, cujos olhos refletiam o turbilhão de emoções que a pergunta havia despertado, baixou o olhar. "Anderson," ela começou, sua voz tingida de tristeza, "nossa união foi única, uma conjunção de circunstâncias que talvez não possamos replicar. Eu... não conheço uma forma." Sua admissão era um golpe, não apenas para Anderson, mas para todos que ouviam. A possibilidade de não encontrar um caminho de volta, de não poder reparar o que foi quebrado, pairava sobre eles como uma névoa densa.

A princesa, sempre a esperança personificada, interrompeu seus pensamentos. "Mas isso não significa que devemos desistir," ela disse, sua voz firme apesar do cansaço evidente. "Lotaria é vasta, e seus mistérios são inúmeros. Deve haver uma forma, um conhecimento antigo ou um poder esquecido que possa nos ajudar."

Após a tumultuada batalha e a derrota de Miguel, o silêncio pesado da prisão era interrompido apenas pelos sons fracos da recuperação e das conversas preocupadas sobre o futuro. Foi então que Vlad, recuperando-se suficientemente para ficar de pé, começou a entoar um cântico em uma língua antiga e esquecida. Sua magia, embora fraca pela batalha, era potente e precisa. Com gestos firmes e palavras de poder, ele teceu um portal através do qual todos puderam passar, libertando-se da sombria prisão do anjo.

Lá fora, a luz do dia ou o crepúsculo não os esperava, mas sim a aura opressiva das Ilhas das Sombras, um lembrete de que ainda estavam longe de qualquer semblante de segurança. Anderson, segurando o recipiente contendo a aura de Miguel, aproximou-se de Vlad. "Minha parte está feita, faça a sua," disse ele, entregando o recipiente ao mago.

Vlad, com um sorriso que misturava satisfação com um toque de astúcia, aceitou o recipiente. "Calma, garoto. Antes, vou dar a você alguns prêmios. Você merece," respondeu ele, liderando o grupo em direção ao seu castelo. O caminho até lá era marcado por uma paisagem que carregava as cicatrizes de inúmeras batalhas, um prelúdio ao que viria a ser uma jornada repleta de perigos e descobertas.

Ao chegarem ao castelo, um imponente bastião erguido contra o caos das Ilhas, Vlad os conduziu até um vasto arsenal. Lá, estavam expostas as raríssimas espadas utilizadas por anjos, demônios, e deuses durante a Guerra Divina. "Aqui estão as espadas usadas na guerra divina. Pegue o que quiser, sei que vai precisar, principalmente para lutar contra os Leviatãs na saída dessas ilhas malditas," Vlad explicou, gesto amplo abarcando o arsenal diante deles.

Anderson, seus olhos varrendo o arsenal, fixou-se em duas espadas em particular. Uma, com a lâmina de um vermelho profundo e a empunhadura esculpida na forma de um anjo; a outra, com a lâmina azulada, cuja empunhadura continha o desenho de um escudo. Ao apontar para elas, Vlad não perdeu tempo em apresentá-las. Pegando ambas nas mãos, ele detalhou: "Excelente escolha. A de lâmina vermelha, chamada Matadora de Demônios, possui encantos capazes de expurgar qualquer criatura das trevas e pertenceu ao Anjo Gabriel. Já a de lâmina azulada foi a espada usada por um cavaleiro rúnico chamado Delita. Esta espada, indestrutível, possui uma runa de proteção gravada em seu núcleo."

Anderson, ao tomar as espadas em mãos, sentiu um poder que transcendia a mera forja de metal. Eram mais do que armas; eram símbolos de eras passadas, de conflitos que moldaram o mundo. 

 

Vlad, guiando o grupo através dos corredores sombrios e sinuosos do castelo, levou-os a uma passagem secreta que desembocava em um porto oculto. Este era um lugar que poucos em Lotaria conheciam, escondido das vistas curiosas e das forças malevolentes que rondavam as Ilhas das Sombras. Lá, amarrado ao cais, repousava um grande barco, cuja madeira escura e resistente desafiava o tempo e a corrosão do sal.

"Este barco chegou aqui há centenas de anos, sem nenhum arranhão. É de grande qualidade, mas sua tripulação não sobreviveu à ilha," Vlad revelou, seu tom carregando um misto de respeito e melancolia pela memória dos que haviam perecido. "Grandes guerreiros se aventuraram por aqui, mas a maioria não retornou."

O barco, apesar de sua aparência impecável, carregava a aura das muitas almas que haviam tentado conquistar as Ilhas das Sombras e falhado. Seu casco robusto e velas intactas falavam de uma construção superior, destinada a enfrentar as mais tempestuosas águas e os mais ferozes adversários. Era mais do que apenas uma embarcação; era um testemunho da ousadia e do espírito inquebrantável daqueles que desafiaram o perigo em busca de glória ou redenção.

Vlad, percebendo o interesse e talvez a apreensão em seus olhares, continuou. "Mas este barco possui algo que nenhum outro tem. Foi construído com magia e ciência, uma combinação rara que lhe confere não apenas durabilidade, mas também velocidade e agilidade incomparáveis. Com ele, atravessar o Mar das Sombras e enfrentar os Leviatãs não é apenas uma possibilidade; é uma certeza."

Ele fez um gesto, convidando-os a inspecionar mais de perto a embarcação. "Não se enganem pelo passado sombrio deste lugar. Este barco é a chave para a fuga de voces, a chance de deixar estas ilhas malditas para trás."

Anderson, ao se aproximar do barco, sentiu uma conexão instantânea. Talvez fosse a promessa de liberdade que ele representava ou talvez algo mais, um sussurro do destino que o ligava àquela embarcação ancestral. As espadas escolhidas, agora em suas mãos, pareciam vibrar em resposta à proximidade do barco, como se reconhecessem o papel que desempenhariam na jornada vindoura.

Diante do grande barco que prometia liberdade e novos horizontes, Anderson virou-se para Vlad, uma questão queimando em seus olhos. "Você e Aatrox virão conosco?" A esperança na voz de Anderson era palpável, uma esperança de não deixar para trás aqueles que haviam se tornado parte de sua luta, parte de sua história em Lotaria.

Vlad, com um olhar que misturava resignação e determinação, sacudiu a cabeça. "Elfos negros e demônios estão amaldiçoados. Por isso, não podemos acompanhá-los," explicou ele, a sinceridade em seu tom deixando claro que a decisão não era por falta de desejo, mas por impossibilidade. "Mas esteja certo de que, muito em breve, essa maldição cairá, graças a mim." Sua confiança não deixava espaço para dúvidas, mas a promessa carregava consigo a amarga realidade de uma despedida iminente.

Anderson, procurando confirmação, olhou para Nimariel, cuja presença havia sido um farol de força e conhecimento durante suas provações. Ela confirmou as palavras de Vlad com um aceno leve, mas firme. "Não posso acompanhá-lo," disse ela, sua voz tão resoluta quanto sua decisão. "Mas um dia, nos reencontraremos." A promessa não era uma simples despedida; era um voto, uma certeza de que os laços forjados na adversidade perdurariam além das barreiras da maldição e da distância.

O grupo, agora ciente da separação que se avizinhava, enfrentava não apenas a perda física dos companheiros que ficariam para trás, mas também o desafio emocional de seguir em frente sem eles. A revelação de que Vlad e Nimariel, figuras tão centrais na resistência contra as forças que assolavam Lotaria, não poderiam se juntar a eles na jornada final, impunha um peso adicional sobre os ombros de Anderson e dos demais.

A despedida que se desenhava entre eles era marcada não por palavras de adeus, mas por promessas de reencontro. A determinação de Vlad em quebrar a maldição e a confiança de Nimariel no futuro serviam como um farol de esperança, iluminando o caminho a seguir. Anderson, embora entristecido pela separação, reconhecia a importância de cada passo que davam em direção à liberdade, não apenas para si, mas para todos aqueles que permaneceriam lutando nas sombras.

Com o grande barco à espera e a promessa de liberdade além das Ilhas das Sombras, Anderson e seus companheiros preparavam-se para zarpar. A despeito das despedidas e das promessas, sabiam que a luta contra a escuridão não terminava com a fuga da ilha, mas se expandia para além dela, carregando consigo a esperança de um dia, finalmente, reunir todos aqueles que haviam se tornado uma família forjada na batalha.

Naquela tarde, o pátio do castelo era banhado por uma luz suave, onde Anderson se dedicava ao aprimoramento de suas habilidades mágicas. A tranquilidade do treinamento foi interrompida pela chegada de Aerilyn, cujos passos leves mal perturbavam a serenidade do ambiente. Sua presença, sempre marcada pela aura majestosa de Glatera, trazia consigo uma curiosidade palpável.

"Anderson," Aerilyn começou, sua voz clara cortando o silêncio, "o que você fez na batalha... foi incrível. Nunca vi nada parecido."

Anderson, virando-se para enfrentá-la, deixou escapar um sorriso modesto. "A magia," ele explicou, "se baseia em quatro pilares elementais: Água, Fogo, Terra e Ar. A maioria dos magos domina um ou dois desses elementos. Com a combinação certa, é possível criar novas formas, como o gelo para os Glaciais."

Enquanto falava, Anderson demonstrava, conjurando água da atmosfera, misturando-a com ar para formar gelo diante dos olhos atônitos de Aerilyn. Em seguida, ele manipulou a terra e a água, transformando-as em barro, antes de envolvê-las em chamas, solidificando a mistura em rocha. Cada demonstração era uma aula viva dos fundamentos da magia, exibida com a facilidade de quem entendia profundamente os mistérios que governavam tais poderes.

Aerilyn, impressionada, lutava para manter sua compostura real. "Mas se grandes magos dominam dois ou três elementos, como você consegue manipular todos os quatro?"

"Sinceramente, não sei," admitiu Anderson, soltando uma risada suave. Ele então pausou, seu tom tornando-se mais sério ao retirar a camisa, revelando as cicatrizes que marcavam seu corpo. "Meu pai me treinou bastante. Era... bem exigente." As marcas em sua pele não eram apenas cicatrizes físicas, mas símbolos de uma jornada árdua, de lições aprendidas na forja do sofrimento e da perseverança.

Houve um momento de silêncio, onde a brisa gentil parecia carregar consigo o peso das palavras não ditas. Anderson, olhando diretamente nos olhos de Aerilyn, quebrou o silêncio com um pedido vulnerável. "Posso te pedir uma coisa?"

Aerilyn, um pouco surpresa pela intimidade do momento, acenou afirmativamente.

"Você pode me fazer sentir algo novamente?" A pergunta era carregada de uma complexidade emocional que Aerilyn sentiu até o âmago.

Compreendendo a profundidade do pedido, Aerilyn avançou, colocando delicadamente suas mãos sobre o peito de Anderson. Ao canalizar sua magia glacial, um frio que deveria ser incômodo trouxe uma sensação de alívio. Anderson inalou profundamente, sua respiração acelerando não apenas pela magia, mas pelo toque de Aerilyn, uma conexão inesperada que transcendeu o poder arcano.

A magia de Aerilyn não era só um meio para despertar os sentidos adormecidos de Anderson; era um gesto de empatia, um sinal de que, apesar de suas origens e destinos divergentes, havia um terreno comum onde podiam se encontrar.

"Isso... isso é incrível," Anderson conseguiu dizer, as palavras mal saindo entre respirações ofegantes.

Aerilyn, um sorriso suave adornando seus lábios, respondeu: "A magia é apenas uma parte do que nos faz sentir, Anderson. Às vezes, tudo que precisamos é do toque certo, no momento certo."

Enquanto Aerilyn observava as cicatrizes de Anderson, uma pergunta brotou de sua curiosidade e preocupação evidentes. "Seu pai que te fez isso?" A inocência misturada com a perplexidade em sua voz refletia o choque ao considerar tal possibilidade.

Anderson, captando a seriedade por trás da pergunta, apressou-se em corrigir qualquer mal-entendido, sacudindo a cabeça energicamente. "Não, claro que não," ele assegurou, seu tom veemente. "Meu pai era um homem bom. Aliás, ele nem era meu pai de verdade. Sou adotivo. Mas ele me criou para ser forte." A explicação servia tanto para esclarecer a origem de suas cicatrizes quanto para homenagear a memória de um homem que havia sido sua verdadeira família.

Sua expressão tornou-se mais sombria ao tocar no ponto de virada de sua vida. "Infelizmente, no dia em que ele morreu, eu vim parar aqui. Fui torturado, e comido vivo por demônios. Graças a Lolis, eu sobrevivi." O resgate por Lolis, mencionado com um tom de gratidão profunda, destacava a importância da fada em sua sobrevivência contra as probabilidades mais sombrias.

"E depois de me libertar, Nimariel me ajudou a me curar, a me nutrir." Anderson concluiu, lançando um olhar em direção a Nimariel, que confirmou silenciosamente sua história com um aceno de cabeça. Sua jornada, marcada pela violência e pela cura, era um testemunho da força encontrada na bondade de estranhos que se tornaram sua nova família.

Aerilyn, absorvendo cada palavra, refletiu sobre a resiliência e a coragem que Anderson demonstrara. "Sua força é notável, Anderson. E a bondade de Lolis e Nimariel... é um lembrete de que, mesmo nas trevas mais profundas, a luz pode ser encontrada." Sua admiração por ele, já grande, crescia ainda mais com a revelação de sua história.

Este diálogo, marcado pela sinceridade e pela vulnerabilidade compartilhada, fortaleceu o vínculo entre Anderson e Aerilyn. Eles percebiam que, apesar das diferenças em suas origens e experiências, compartilhavam um entendimento mútuo e uma resiliência que os unia. Naquele momento, Aerilyn viu em Anderson não apenas um guerreiro poderoso, mas um ser humano incrivelmente forte e resiliente, reafirmando seu compromisso de apoiá-lo em qualquer desafio que Lotaria ainda reservasse para eles.

 

 

 




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