O Caminho das Estações escrita por Sallen


Capítulo 45
∾ O maldito vício de continuar procurando afeição nos lugares errados.


Notas iniciais do capítulo

Olá, meus amores, como estão? Estamos aqui para uma semana e mais um capítulo rumo a reta final. Agora vamos ver alguns destinos caminhando para suas conclusões enquanto nossos protagonistas parecem continuar seguindo caminhos, hm, um tanto tortuosos.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/793402/chapter/45

A chuva não se importa com os planos para o feriado de ninguém. 

Um breve clarão percorreu pelo céu noturno com o trovão rugindo através das nuvens escuras logo em seguida. Ao longe, conseguia ver a chuva se aproximando, feroz e impiedosa. Alguns poucos pingos grossos despencavam, o suficiente para começar a afugentar as pessoas para dentro de suas casas ou qualquer abrigo provisório.  

Juno apertou as saias do longo vestido herdado da tia e correu ao atravessar a rua. Não se lembrava de uma primavera tão chuvosa, nem em sua antiga cidade que estava sempre debaixo de água, mas não reclamava. As árvores já exibiam um brilho verde estonteante, as flores abriam suas pétalas coloridas e havia um resíduo de pólen no ar que quase incomodava o nariz. Ela mal podia esperar pelo verão que a aguardava. Só de pensar nos longos dias ensolarados que pediam sorvetes e águas de coco e em noites quentes em que todos ficavam fora até mais tarde, conseguia sentir a nostalgia das férias de verão de quando era apenas uma garota com as emoções à flor da pele. 

Porém, enquanto o verão não chegava, Juno precisava fugir da chuva que se aproximava. Ao seu lado, uma outra moça acelerava os passos. Trazia uma bolsa sobre os cabelos loiros, já antecipando os pingos que se tornavam cada vez mais insistentes. Elas se entreolharam, correndo lado a lado de uma calçada a outra. Então, riram. O fato de não se conhecerem tornava a cena mais divertida. Ela corria desajeitada em uma calça jeans apertada, usando a bolsa como guarda-chuva enquanto Juno tinha os cabelos a dançar em volta do rosto avermelhado como as saias do vestido a serpentear entre suas pernas. Por um instante, sentiu-se como uma menina novamente até que os caminhos se opuseram. A moça seguiu para a esquerda e ela para a direita. Mesmo depois de se afastarem, Juno manteve o sorriso nos lábios. 

Sob o arco de marquises, Juno conseguiu desacelerar o ritmo para recuperar o fôlego. Um vento forte assobiava pelas vielas bem iluminadas, anunciando a chuva que trazia em seu encalço. Dali, já conseguia ver a porta do bar exibindo um brilho fluorescente. Era para lá que se adiantava, penteando os cabelos com as pontas dos dedos e ajeitando as saias rodadas de seu vestido. Era antigo, nem por isso ultrapassado, um presente que Octavia recebeu da própria Abigail que já não cabia mais e Juno ficou feliz em herdar. Bastou um olhar para se tornar seu favorito com seu caimento longo, saias esvoaçantes no tecido claro e as alças finas e delicadas. 

O bar era um lugar apertado, com o chão de taco e paredes escuras. O balcão parecia uma meia lua, servido por três rapazes novos. A música alta abafava o rugido dos trovões e as luzes vibrantes faziam as vezes dos relâmpagos. E estava cheio. Várias pessoas se amontoavam em volta de mesas redondas que preenchiam o salão. No lugar de uma pista de dança, havia apenas mesas de sinuca. Juno soltou um suspiro animado relembrando seus tempos de faculdade perdidos em uma mesa de sinuca qualquer em um bar com procedência duvidosa. Ali perto encontrou seus amigos. 

Hester estava sentada em um banco alto, concentrada ao conversar com Helena, que se escorava no balcão tomando uma cerveja que dividiam entre si. Theo terminava de pedir mais uma bebida, antes de se aproximar de Louise, que parecia mais agitada do que a batida repetitiva da música. Conforme se aproximava, percebeu a falta de Sarah e Alice, mas foi a presença de Nirav que mais fez falta. Estava olhando de um lado para o outro quando foi resgatada por Louise. 

— Oh, aí está você! — Louise suspirou de alívio, envolvendo seu corpo em um abraço aconchegante. — Pensei que não viesse. 

— E morrer de curiosidade? — Juno abanou as mãos, fazendo a amiga dar um sorriso. 

O convite viera de última hora. Estava assistindo a um documentário qualquer sobre guerra com a tia, quando a mensagem pipocou em seu celular. Por um instante, até se sentiu preocupada diante da urgência de Louise, até que se referiu a sair para comemorar. A curiosidade a fez saltar do sofá e procurar uma roupa decente para envergar. 

Enquanto batia os punhos contra os de Theo para cumprimentá-lo, uma presença sorrateira a surpreendeu por trás. 

— Alice disse que não pode vir. — Nirav anunciou, pondo a mão em seu ombro esquerdo e surgindo do seu lado direito. Juno sobressaltou-se com o susto. 

— Misericórdia, Nirav! — ela arquejou, soltando um ruído insatisfeito. — Desde quando me assustar virou hobbie para você? 

Ele sorriu, divertindo-se com sua expressão. E não retirou a mão de seu ombro. Estava tão bonito, usando uma camisa listrada em preto e branco sobre uma calça jeans marrom. 

— Pediu desculpas, disse que sente muito por não vir. 

— Ah, era só o que me faltava! — Louise esbravejou. — Primeiro Sarah, agora Alice. 

Juno franziu o cenho, passando o olhar de Louise para os rapazes ao seu redor. 

— Está tudo bem com ela? O que houve? 

— Ninguém sabe. — Theo respondeu, levando um copo com líquido colorido aos lábios. — Só espero valer a pena, eu estava muito ocupado descansando. 

Um par de braços envolveu seus ombros, fazendo seu coração sobressaltar mais uma vez. Quando sentiu o beijo de Helena em seu rosto, virou-se para abraçá-la de volta. 

— Você está quente, está com febre? — ela perguntou, colocando a mão debilmente em sua testa, como uma mãe. 

— Eu precisei correr para fugir da chuva. 

Helena sorriu, soltando Juno para que pudesse cumprimentar Hester. 

— Vocês têm alguma ideia do que esteja acontecendo? — decidiu perguntar às irmãs, porém, a resposta foi a mesma. Ninguém sabia. 

Por fim, Louise desistiu de esperar por aqueles que não chegariam. Aos poucos, conforme se juntavam em uma das mesas, sua expressão tornava-se mais branda, abrindo espaço até para um sorriso. Juno sentou-se ao lado de Helena, próxima a Theo e Hester. Nirav permaneceu do lado oposto junto com Louise. Não demorou até que um garçom se aproximasse para atendê-los. 

— Só uma rodada por enquanto. — Louise pediu com gentileza. 

Nirav acenou para o rapaz. 

— Para mim, só água. — disse, lidando com o olhar desconfiado dos amigos. — Eu estou dirigindo. 

Observando-o do outro lado da mesa, arqueou as sobrancelhas ao direcioná-lo um sorriso. Ele sequer pareceu notar que Juno não foi capaz de desviar a atenção dele. 

Admirou como seu rosto se tornava apaziguado, com o olhar perdido ao longo do bar, alheio a qualquer outra coisa. Com os cotovelos apoiados na mesa, seus dedos brincavam entre si, fazendo Juno se perguntar se estavam apenas seguindo o ritmo da música ou controlando o anseio de fumar. Ele comprimiu os lábios por um instante, fazendo a barba se destacar em seu rosto. Um pequeno cacho deslizou por sua testa e ali permaneceu até que ele passasse os dedos para alinhar a mecha novamente. Apenas o detalhe de ver os dedos dele percorrendo pelos cabelos a fez prender a respiração. 

— Por que Sarah não veio? — perguntou para Helena, tentando ignorar o homem à sua frente. 

— Está estudando para os exames. — ela respondeu. — Está terminando de cursar ciências sociais. 

— Ah, eu não sabia que ela ainda estava fazendo faculdade. 

— Ela ficou indecisa por um bom tempo, não fez nada além de cursos, depois começou com história, desistiu e foi para linguística, que também não deu certo. Agora, finalmente parece que se encontrou. 

— Uau, como ela conseguiu tudo isso? 

— É o que eu chamo de ter tempo e ter dinheiro. — Theo se intrometeu, fazendo as duas rirem. 

Sua risada pareceu chamar atenção de Nirav. Ela pigarreou, limpando a garganta repentinamente seca. A rodada de cerveja estava demorando demais para chegar. 

— Acho que eu gostaria de fazer outra faculdade. — refletiu, imaginando qual curso escolheria. — Se tivesse tempo e dinheiro. 

— Ah, não! Eu poderia ter todo tempo e dinheiro e a última coisa que eu faria era gastar mais quatro ou cinco anos estudando. — Theo bufou, gesticulando uma recusa com as mãos. 

— Bem, nesse caso só te falta o dinheiro, porque tempo de sobra você tem, meu cunhado. — Helena provocou, arrancando uma gargalhada incrédula de Juno. 

— Nós estamos todos bem por aqui? — Nirav perguntou, observando os dois. 

— É só o jeito dela de dizer que me ama. — Theo piscou para Helena, que revirou os olhos. 

— Teria se casado com ele, se eu não tivesse chegado primeiro ao mundo. 

— Você pode ter nascido primeiro, mas eu nasci com o melhor gosto para homens. — retrucou com a acidez ardendo em cada palavra. Logo que Hester respondeu com um dedo do meio, as gargalhadas ecoaram em uníssono ao redor da mesa. 

— Ah, finalmente! — Theo apontou para o garçom trazendo o pedido. — Agora vão poder dar uma utilidade decente para as bocas de vocês. Além de só falar merda. 

Em meio às gargalhadas, eles ergueram os copos cheios, celebrando em um brinde balbuciado, ao qual ninguém sequer entendeu uma palavra do que foi dito. As risadas só se tornaram mais fortes e Juno quase se engasgou com o primeiro gole da bebida. Helena a socorreu, rindo de sua crise de tosse. 

— Eu chamei vocês aqui porque queria fazer um anúncio. — Lou começou dizendo, após apoiar seu copo sobre a mesa. — Por isso queria que estivessem todos presentes. 

— Vai se casar também? — Hester se sobressaltou, batendo a palma da mão na mesa, fazendo os copos tremerem. 

— Não! — ela respondeu fazendo uma careta, então considerou a questão. — Bem, quem sabe quando... 

Helena soltou uma exclamação exasperada. 

— Minha nossa, você está grávida! 

— O quê?! — Louise engasgou com a própria saliva, incrédula. — Eu não sou tão maluca assim. Se vocês deixassem eu terminar de falar, quem sabe... 

— Ora, vamos, desembucha! — Theo instigou, impaciente. 

Com o seu momento arruinado, Louise deu-se por vencida. Soltou um suspiro e, balançando os ombros e as mãos, anunciou: 

— Eu consegui um intercâmbio para estudar gastronomia. É como um mochilão por vários países para... — sua voz começou a desaparecer conforme a comoção de seus amigos e apenas o som de sua risada ecoou junto da música quando foi abraçada por Helena. 

O rosto de Louise tornou-se tão vermelho quanto seus cabelos. Suas bochechas rechonchudas pareceram brilhar de tão coradas. E ela cobriu o largo sorriso quando Helena beijou seu rosto. Nirav envolveu os braços em volta de seus ombros enquanto Juno tomava suas mãos com um afago. Hester estava deslumbrada com as mãos sobre a boca ao balbuciar qualquer coisa. Já Theo não perdeu tempo com as perguntas, debruçando-se sobre a mesa. 

— E quando você vai? 

— Acredito que ainda vá demorar mais um pouco. Não vou deixar de avisar. — ela respondeu, recuperando o fôlego ao tomar um gole da cerveja. — Vocês iriam me cumprimentar assim caso eu estivesse grávida? Só para saber. 

— Claro que não! — Helena abanou a mão com desdém. — Para que serve uma criança comparado a você aprender centenas de dezenas outros pratos deliciosos? 

— Oh, disse a professora do maternal. — Juno retrucou, desarmando a amiga com risadas. — Por quanto tempo vai ficar fora? 

— Oito meses. 

— Eu vou morrer de saudades! — Hester suspirou, exibindo um sorriso entristecido, não desprovido de satisfação. — Mas, nossa, estou tão feliz por você. 

— Todos nós vamos sentir sua falta. — Nirav murmurou a ela. — Principalmente da sua comida. 

Com um ruído enojado, Lou acertou-lhe um tapa repreensor, causando risadas. 

— É só pra isso que sirvo? 

— Precisa nos prometer que vai deixar a gente provar todos os pratos que aprender! — Hester apontou o indicador a ela, levando o copo aos lábios. — Caso contrário, não tenho certeza se vou deixar você ir embora.  

— Isso é um pouco demais! — ela protestou. — A comida já vai ficar ainda melhor quando eu voltar. Deveriam estar gratos. 

— E isso é possível? Por favor, deixa eu te levar de uma vez então! — Helena brincou, roubando um riso desajeitado da amiga. 

Juno interviu. 

— Eu concordo com Hester. — encarou a amiga com seriedade, cerrando os olhos em uma falsa ameaça.

Lou bufou, erguendo o olhar para cima, tentando fugir da pressão que a roda de amigos colocava em seus ombros. Entretanto, no fim, acabou por ceder ao bater em suas próprias coxas. 

— Está bem! Está bem, seus aproveitadores! 

Outra rodada foi pedida e mais uma outra logo em seguida. Logo já exibiam os risos fáceis, as caretas exageradas, as vozes alteradas. Do lado de fora, a chuva fazia sua entrada. Imponente e violenta, lavando a rua com a torrente de pingos grossos e constantes, fazendo o céu brilhar e estremecer com raios e trovões. Lá dentro, não pareciam se preocupar com a previsão do tempo. Com uma rodada de bebida atrás da outra, logo estavam por todo o lugar. Cinco pessoas ocuparam um bar inteiro cheio de outras dezenas de pessoas que começavam a se embriagar noite adentro. Apenas Nirav estava sóbrio, bebericando de quando em quando em sua água. E foi ele a chamá-la para jogar sinuca. 

No início, sentiu-se hesitante, embora estivesse ansiosa para jogar. Não tinha certeza de se lembrar como jogava, considerando os anos que se passaram desde sua última partida. Apesar de perder as primeiras rodadas, aos poucos, começou a ganhar confiança. Empatou as próximas e, logo, virou o jogo. Melhor, dominou a mesa. Para a infelicidade de Nirav, Juno encaçapava uma bola atrás da outra, soltando um grito de exaltação a cada pontuação que chamava atenção de outras pessoas. Não demorou até que Nirav tivesse uma plateia para testemunhar sua derrota. 

Ao seu lado, Helena estava de braços cruzados, conversando em tom alto para sobrepor a música. Theo, por outro lado, tentava ajudar Nirav a descobrir a jogada perfeita e só o fazia se atrapalhar mais. 

— Então, como foi apresentar Sarah aos seus pais? — Juno perguntou, pairando os olhos sobre as bolas dispostas na mesa sem se preocupar. O taco permanecia escorado em seu corpo, repousando sem pressa. 

— Foi melhor do que podia imaginar. Não sabe o quanto eu estava nervosa, morrendo de medo da reação deles. — ela respondeu após tomar mais um gole de cerveja de uma pequena garrafa escura. — Me senti como uma adolescente de novo. 

— Ah, é tão bom saber que eles reagiram bem com a Sarah. — a conversa de Juno foi interrompida por três batidas do taco de Nirav na mesa. 

Ele conseguiu acertar uma bola, marcando alguns pontos. A primeira de tantas outras perdidas, mesmo assim a confiança voltava a brilhar em seus olhos. Aceitando o desafio, ela se dispôs em direção à mesa. Ainda havia algumas bolas embaralhadas e a cobiçada bola preta continuava distante. Com um assobio, Juno fingiu ponderar uma jogada e, quando a arriscou, errou. 

— Errou de propósito! — Nirav se queixou, ficando irritado com as gargalhadas de Theo ao seu lado. 

Juno sorriu, provocando-o com uma piscadela. 

— Estou facilitando para você. 

— Vai se arrepender por isso. — ele garantiu, se preparando. Quando se curvou sobre a mesa, virou-se para Helena. — Como foi para ela? Sarah, quero dizer. 

— Ninguém te chamou na conversa. — Juno brincou, só para vê-lo rir. 

— Bem, ela sabia da possibilidade de dar errado, mas eu estava decidida em dizer a verdade. — Helena prosseguiu, passando a garrafa para Juno molhar a garganta com um pouco de cerveja. — Estava cansada de viver nas sombras, não dava mais para amar alguém no escuro. — ela respirou fundo, um doce sorriso brilhou em seus lábios ao falar da namorada. — Ela ficou orgulhosa da minha atitude e em nenhum momento quis cobrar nada de mim. Entendia que podia ser um risco a falta de aceitação, porque ela mesmo passou por isso, sabe? Disse que respeitaria meu tempo. 

— Isso foi lindo da parte dela! 

— E como! Conheci outras garotas, outras vezes, que desistiram de ficar comigo enquanto eu ainda estivesse... vocês sabem, no armário. 

Juno esboçou uma careta insatisfeita, mas era a sua vez novamente. Dessa vez, não iria errar. Curvou o corpo sobre a mesa, apoiando o taco por baixo de seu tronco ao analisar a melhor tacada. Theo apontou para uma bola no canto, concentrado demais para interagir no assunto, e Juno descartou a possibilidade. 

— Não tinham o direito de te cobrarem algo do tipo. — Nirav prosseguiu a conversa, pontuando o que Juno pensou em responder. Apesar disso, ela conseguia sentir os olhos estreitos dele pairando sobre si, tentando prever seus movimentos. — Não sabiam como sua família iria reagir. 

— E eu tive tanto medo disso que comecei a jogar algumas piadas e falar coisas do tipo, só para descobrir se precisaria mentir falando que Sarah era só uma amiga. 

— Isso! — Theo exclamou, interrompendo Helena e batendo palmas. 

Juno acertou uma encaçapada. Sua vantagem começou a aumentar. Ao seu redor, os demais desconhecidos também vibraram. Nirav bufou, insatisfeito. Agora, Juno se preparava para a próxima jogada enquanto falava com Helena: 

— E como Sarah iria lidar com o fato de ser só sua amiga? — perguntou com certo tom malicioso, fazendo-a rir. 

— Ah, ela estava bem satisfeita, na verdade. — Helena sorriu, abrindo espaço para Juno rodear a mesa. — Afinal, a linha que divide um amigo e um amante é bem tênue. Alguém me disse isso uma vez, não me lembro quem. 

Como um instinto, Juno ergueu o olhar da mesa para Nirav. E ele a olhava de volta. Por um breve momento, os olhares pareciam concordar entre si, mesmo sem nada dizer. Uma linha bem tênue. 

Voltando a atenção para o jogo, procurou se concentrar. Ignorando o homem do outro lado da mesa, arrastou seus olhos para cada bola disposta na mesa. Não seria uma jogada fácil, algumas bolas estavam encurraladas ou próximas demais para criarem impacto. Se conseguisse acertar, só então poderia arriscar a bola preta de número oito encurralada com a sete. Exceto se fosse para o tudo ou nada. 

Mordendo os lábios, Juno encurvou o corpo sobre a mesa outra vez. Esticou o taco alinhado ao seu tronco, mantendo-o firme entre as mãos. Diante de seus olhos, apenas as duas bolas. Respirou fundo e atacou. Ambas as bolas rodopiaram pela mesa verde. Rodopiaram, rodopiaram e... 

— Você só pode estar de sacanagem comigo! 

Theo gritou em exultação junto com as pessoas ao redor. Ele veio em sua direção, batendo em seus ombros com empolgação. Mesmo Helena assoprou um longo assobio para comemorar. Juno havia encaçapado as duas bolas juntas em uma só tacada. 

— Onde diabos aprendeu a jogar dessa forma? — Nirav perguntou, incrédulo, passando o olhar da mesa para ela. 

Juno sorriu para ele, abrindo os braços e encolhendo os ombros. 

— Na faculdade, meu amor. Onde mais? 

— Pelo visto, não fez outra coisa. — resmungou, abandonando o taco sobre a mesa.  

Juno soprou-lhe um beijo à distância só para irritá-lo, embora o sorriso dele sugerisse outra coisa. 

— Ah, pare de arranjar desculpas para sua derrota. — Helena provocou, fazendo um bico para provocá-lo. 

— E que derrota! — Theo suspirou cheio de entusiasmo. — Ela te deu uma surra! 

— É, talvez eu goste de apanhar de mulher bonita. 

Juno engasgou-se com a própria respiração. De repente, era como se o mundo tivesse desaparecido. Sua visão escureceu por completo. Por um momento, pensou estar tendo algum colapso, até perceber se tratar apenas da luz. A energia desarmou. E eles foram engolidos pela escuridão. 

Houve um longo silêncio de expectativa. Sem a música, tudo o que ressoava era a chuva rugindo violenta e furiosamente do lado de fora. Um relâmpago brilhou, clareando todo o salão por breves segundos. Em seguida, o trovão rugiu como um animal selvagem. E assim perceberam que era hora de ir embora. 

Apesar de todos acenderem as lanternas dos celulares, tudo o que conseguiram era imitar uma horda de vagalumes e encontrar os colegas se revelou uma tarefa complicada. Um burburinho começou a percorrer pelo salão com as pessoas perguntando sobre outras. Com os ânimos alterados pelo álcool, a ideia de se misturar no meio da multidão pareceu péssima. Juno não deu um passo, sem ousar se mexer, apenas levou a mão para trás para tentar alcançar Helena e acabou encontrando o relógio de pulso de Nirav. Ele segurou sua mão de volta. 

Virando-se para trás, encontrou-o junto de Louise. Tinha a lanterna do celular acesa refletindo em seu rosto. Embora a visão começasse a se acostumar com a escuridão, sempre que um relâmpago piscava, os olhos tornavam-se cegos outra vez. 

— Você quer ir? — ele disse, soltando de sua mão. — Vou levar Lou, posso te levar também. Theo disse que conseguiu um táxi. 

— Não é melhor esperar a chuva aliviar? — Juno perguntou, sentindo o corpo dele próximo. 

— Não acredito que vai aliviar tão cedo. — logo que terminou de responder, mais um clarão surgiu seguido de um rugido violento. Juno assentiu. 

Ele amparou suas costas com o braço ao lhe conduzir em direção a porta. Outras pessoas tiveram a mesma ideia, de forma que a entrada estava repleta de cabeças que espreitavam a rua, esperando a oportunidade certa para enfrentar a torrente. Assim como os outros, os três se mantiveram ali, parados, apenas observando. Juno sentiu o braço de Nirav contra o seu e lutou contra a vontade de segurar sua mão. Não estava com medo, muito pelo contrário. Ali, encostada contra ele, a tempestade não parecia tão assustadora. Era quase encantadora. 

A cidade estava engolida pela escuridão, exceto pelas lanternas dos faróis que iluminavam estrada afora, dando um vislumbre dos constantes pingos grossos da tempestade. Apesar do ruído grosseiro dos inúmeros trovões, o mundo inteiro parecia estar mergulhado em um silêncio profundo. Toda vez que alguém erguia a voz, um eco eterno parecia ressoar pelas vielas até se perder no tilintar das gotas de chuva contra o chão. 

Seu olhar teimoso procurou pelo homem ao seu lado. Com o celular em mãos, parecia digitar qualquer coisa. Juno questionou se estaria mandando alguma mensagem para Alice, perguntando se estava tudo bem e avisando que estava preso. Não conseguiu evitar sentir inveja dela. 

— Como diria minha mãe, Florencia é só uma roça grande. — Nirav disse, de repente, retornando a usar o celular como lanterna. Juno se divertiu, abrindo um sorriso que passaria despercebido. 

Enfim, ele as levou em direção ao carro depois de localizá-lo. Mesmo com os passos apressados, a chuva os apanhou com força. Assim que alcançaram o carro, Juno tinha o vestido aderido ao corpo, a maquiagem de Louise desmanchava em suas bochechas e os cabelos de Nirav escorriam por sua testa. Assim que encontraram o refúgio dentro do automóvel, a tempestade tornou-se apenas um ruído externo, tamborilando sobre a lataria. 

Havia se sentado na frente, no banco de passageiro ao lado de Nirav, e Lou nos bancos traseiros. Precisou de muita concentração para não deixar transparecer o nervosismo de quando tentou puxar o cinto de segurança e ficou lutando contra a trava. Nirav fingiu não perceber, mesmo que em seus lábios um sorriso zombeteiro brilhasse satisfeito. Ele passou as mãos sobre os cabelos úmidos, retirando-os do rosto, antes de dar partida. 

— Ah, uma pena que tenha chovido tanto. — Louise lamentou, apoiando-se para frente, entre os dois bancos frontais. — Pelo menos Alice está sã, salva e seca. 

— Por que ela não veio? — Juno questionou, enrolando os cabelos para trás. 

Nirav manobrou, escapando com habilidade da vaga apertada que havia encontrado. 

— Foi se encontrar com a família, geralmente fazem isso nos feriados. — explicou, mantendo concentração no retrovisor externo. — É quase como uma tradição de família, eu é que acabei me esquecendo. Fui pego de surpresa, na verdade. — ele pareceu ressentido em admitir. 

— E como estão as coisas no paraíso? — Lou perguntou, debruçada sobre o banco de Juno. — Quase achei que estivessem brigados. 

Ele trocou a marcha ao mesmo tempo que encolheu os ombros. 

— Estamos bem. — seus dedos pousaram sobre o volante, batucando sem ritmo. Seus olhos estavam presos na estrada. — Apresentei ela ao meu pai. 

— Oh, está brincando? E como foi? — Louise parecia animada. 

— Por incrível que pareça, foi ótimo. Pela primeira vez, meu pai se mostrou uma pessoa boa de se lidar. — ele suspirou, se divertindo com o que dizia. — Gostou bastante dela. E ela também pareceu gostar dele. Nunca imaginei apresentar namorada nenhuma a ele e lá estava ele, fazendo ela rir. 

Juno sorriu, sem tirar os olhos dele. 

— Então, já estão fazendo planos para o futuro? — ela continuou. Juno estudou seu rosto, curiosa com a reação, mas ele parecia apenas focado em conseguir uma brecha no trânsito. 

— Bem, toda essa história do casamento de Theo e Hester realmente a inspiraram. — ele deu um riso nasal, girando o volante em direção a estrada e esperando passagem. — Eu é que, bem, não sei. Ainda não me sinto preparado. 

— Por que não? — Juno deu por si perguntando. 

Nirav a olhou como se a resposta estivesse estampada em seu rosto. E nada disse. Apenas a olhou, dentro de seus olhos, para seu nariz e depois a sua boca. Só encolheu os ombros. 

Louise resfolegou insatisfeita. 

— Vocês, homens, são todos iguais, não são? Nunca sabem o porquê de não querer, só sabem que não querem. —  seu comentário fez Juno rir. Ele acelerou ao conseguir uma abertura para sair. O trânsito se mostrou mais movimentado com todo mundo querendo fugir da chuva. — Se até seu pai gostou dela, isso certamente deve ser um sinal. Não acha? 

Juno tentou imaginar Nirav se casando. Estaria de braços dados com outra mulher, jurando votos solenes, prometendo amá-la até a morte. Uma sensação estranha agitou seu estômago. Não conseguia saber como se sentiria, embora a felicidade dele fosse sua prioridade. Sempre que tentava imaginá-lo ao lado de Alice entrando em uma igreja, era o Theo e Hester que enxergava. 

— Oh, está perguntando para mim? — Juno se sobressaltou, dando um riso sem graça. Passou o olhar de Nirav para Louise, sem saber o que responder. — Eu não acho que seja uma boa ideia pedir conselhos para mim, considerando as minhas experiências. 

Para a sua sorte, eles riram de seu comentário. E ela pode engolir o nervosismo que remexia em seu estômago. 

— Falando nisso — Juno limpou a garganta. — Como está sendo com seu pai? 

— Está sendo mais fácil do que imaginava. — Nirav respondeu, mantendo apenas uma mão no volante ao dirigir. — Meio que me acostumei com a presença dele, mas sempre que penso no assunto, não tenho certeza se quero perdoar qualquer coisa. Parte de mim nunca vai se esquecer do que ele fez. 

Juno o observou, ponderando sua resposta. Parecia calmo, apesar da chuva pesada do lado de fora obstruindo a visão da estrada. 

— Não tem nada de errado nisso. E ninguém pode dizer que não tentou. — confortou-o. 

— Bem, queria fazer isso pela minha mãe, mas... 

— Ela vai entender. Eu sei que vai. 

Louise deu um riso nasal, puxando a atenção dos dois. Juno olhou para trás, confusa. 

— É bom ver vocês dois assim. — ela comentou com um sorriso. — É como se as coisas estivessem voltando ao normal. Como devem ser. 

Por um instante, eles se entreolharam. 

Atravessaram uma cidade imersa na escuridão e afogada sob uma cortina de água que despencava do céu sem intenção de parar. Até cruzaram com outros carros seguindo seus próprios caminhos, entretanto a cidade parecia deserta. Em pouco tempo, a casa de Louise já surgia na esquina seguinte. Enquanto ele estacionava para que ela pudesse sair, Juno observou a casa através do vidro molhado. Era sempre um sentimento controverso voltar àquela casa. Tantas coisas aconteceram ali. Quando se separaram, estavam ali. Quando se reencontraram, estavam ali. E, agora, continuavam ali. 

Louise despediu-se, recebendo as felicitações pelo intercâmbio. Nirav não deu partida até ver que ela havia entrado em segurança. Juno apreciou a preocupação. 

Enfim, estavam sozinhos. O carro guardava os dois em uma tênue luz alaranjada da luz interna. O silêncio os consumiu quando ficaram a sós, tão intenso que Juno receou que Nirav pudesse escutar o ritmo acelerado de seu coração. No entanto, o único barulho existente era o contínuo cair da chuva e as palhetas dianteiras enxugando o para-brisa. 

— Se vai bancar a tímida ao menos coloque uma música para disfarçar o silêncio. — ele a provocou, vendo segurar um riso desajeitado enquanto ligava o rádio do carro. 

Nirav ajustou a marcha para dar ré. Com a mão esquerda no volante, passou a direita em volta do banco de Juno para olhar a traseira. Havia algo de fascinante no jeito que ele fazia que a deixava hipnotizada. O modo como sua mão esquerda deslizava pelo volante, ressaltando os músculos de seu braço. O pescoço exposto ao virar a cabeça para trás. E o rosto tão perto do seu, com a expressão séria e concentrada. Gostava de como ele comprimia os lábios e piscava lentamente. 

Quase esqueceu-se de colocar a música quando sentiu a mão dele roçar em seu ombro, sem querer querendo. Seu dedo acertou o primeiro botão, reproduzindo uma música pausada pela metade. Ela fez uma careta de desgosto escutando a música com suas letras obscenas e explícitas. Ele adiantou-se para trocá-la, mas outra pior apareceu. 

— Alice gosta quando estamos... — tentou se explicar, vendo que ela estava rindo desconfortável. 

— Oh, não, por favor! — Juno abanou as mãos contra o rosto. — Me poupe dos detalhes sórdidos. 

— Ah, até parece. — ele a cutucou com o cotovelo, provocando. — É bom, principalmente no carro, tudo fica mais... 

— Não ouse dizer o que penso que vai dizer! — ela apontou o indicador para ele, que deu uma risada contagiosa. 

— Lembra daquele casal que estava se pegando no carro? 

Juno gargalhou com a repentina lembrança, levando as mãos até o rosto para cobri-lo. Nirav a acompanhou, rindo mais de sua própria risada do que das lembranças em si. 

— Ah, eu nunca poderia me esquecer. — ela respirou fundo, recuperando o fôlego. — Bons tempos. 

Sentiu o olhar dele sobre si, sem coragem de encará-lo de volta. Escutando a música, apesar dos pesares, ela manteve o rosto focado na estrada, observando a torrente lavando as ruas. Aos poucos, perdendo-se nas lembranças que ele havia revivido. A única forma de conseguir suportar estar tão próximo a ele, sem poder tocar em seus cabelos, afagar sua barba e beijar seus lábios. 

A ideia a fez fechar os olhos, numa vã tentativa de apagá-la de sua mente. Entretanto, dentro do calor do carro, com o braço dele roçando no seu toda vez que trocava a marcha, parecia quase impossível não pensar em algo do tipo. E não adianta culpar a música com letras obscenas, a culpa era sua que ainda o desejava. E o desejava tanto que era difícil respirar. 

De repente, desligou o rádio. O silêncio esvaziou sua cabeça. Ainda assim, sua imaginação imprudente trouxe memórias de quando fazer-se de impulsiva era tudo o que sabia ser. 

— Está tudo bem? — ele perguntou, franzindo o cenho. 

A viagem não durou quase nada. Logo sua casa apareceu à frente, intocada dentro da escuridão. Imaginava se sua tia devia estar preocupada, esperando seu retorno. Deveria ter se despedido e ido embora quando ele estacionou. Porém, decidiu ficar um pouco mais. Só mais um pouco. 

Com o carro desligado, Nirav a encarava cheio de expectativa. As mãos repousavam casualmente sobre as coxas, com os dedos desenhando no jeans marrom. O que ele estava esperando? Perguntou a si mesma. Então, deu a única resposta que tinha na cabeça. 

— Lembra da manhã em que apareci na sua porta? — indagou, recordando seus impulsos tão primitivos. Os mesmos que a fizeram divagar sobre desejos tão impróprios. 

— Como posso me esquecer? 

Juno suspirou, ajeitando-se no banco ao soltar o cinto de segurança. 

— Eu agi feito uma idiota, não foi? — sentiu uma súbita raiva. — Toda vez que lembro da minha birra e das cobranças, eu me sinto tão estúpida. 

— Já tem tanto tempo. Por que isso agora? 

— Porque havia um motivo por trás daquela estupidez. Um motivo que eu demorei a perceber. 

Ele arqueou as sobrancelhas, encarando-a com serenidade, quase como se já soubesse a resposta. 

— E qual foi? 

— Eu estava procurando por uma desculpa para dar um fim na bagunça que criei. E seria mais fácil de me convencer se conseguisse estragar tudo. Caso contrário, eu não conseguiria dizer o que precisava, eu não teria coragem de terminar o que começamos... Então, agi da maneira mais idiota que pude para me convencer de que precisava acabar. 

Mas? 

— Assim que te vi, percebi o quanto queria você e quão irritada estava por ser tão covarde. Todas as asneiras que falei, toda a birra que fiz, toda baboseira que cobrei de você, na verdade, viraram apenas uma desculpa para falar com você de novo. Mesmo que fosse para brigar, porque era tudo o que me restava. 

Nirav sorriu. Simplesmente sorriu. 

— Eu sei. Sempre soube. Por isso beijei você. 

Ele a conhecia bem demais. Para sua sorte ou para sua desgraça. 

— Desculpe. — pediu, então. — Desculpe, mais uma vez. Desculpe por ter agido como uma louca. Não tinha o direito de cobrar nada de você. E fazer esse tipo de cobrança era como ser o Nicholas. Possessivo, perigoso e abusivo. Sempre que lembro do que fiz, eu me sinto como ele. 

— Não se compare a ele, porque não foi assim. — seu tom de voz parecia ressentido com a suposição. — Foi desnecessário, infantil e bobo, sim, mas não foi desse jeito. 

— Mesmo assim, se puder, me desculpe. 

— Só se admitir que estava com ciúmes da Lou. — ele disse, pegando-a de surpresa. Quando viu o divertimento em seu rosto, deu um riso de alívio. 

— Tudo bem... eu estava com ciúmes da Lou. — disse, revirando os olhos. — Satisfeito? 

Eles riram, divertindo-se. Estava tão gostoso que, por um momento, Juno gostaria de continuar ali o resto da noite, apenas conversando com ele. E ele pareceu sentir o mesmo. 

— A verdade é que eu beijei a Lou para tentar me vingar de você. — confessou subitamente. — Eu também estava com raiva, não aguentava ver você com o Nicholas e não sabia mais o que fazer. Então, acabei usando uma pessoa inocente. No fim, nenhum de nós saiu ileso e todos nós cometemos nossos pecados. 

— Mas eu não fui capaz de perdoar os pecados dele. — disse antes de perceber o que estava dizendo. 

— Nicholas? 

Juno assentiu, tomando um tempo antes de responder. Olhando para fora, percebeu uma trégua na chuvarada. 

— Quando vi ele da última vez, tinha quebrado todas as restrições para me ver. Queria pedir perdão. 

— E não você não conseguiu. — Nirav a olhava com atenção, quase sem piscar. Quando ela assentiu, ele prosseguiu. — Ele ainda esperava que você pudesse ser capaz de perdoar depois de tudo? 

— E eu não consegui perdoar porque sempre que olhava para ele, eu sentia raiva. Eu já não tinha mais medo, só raiva. — ela respirou fundo, sentindo o gosto amargo do sentimento em sua boca uma vez mais. — Eu só queria machucar ele como ele me machucou. Então, quando ele me pediu por perdão, eu só disse tudo o que poderia para conseguir machucar. Falei sobre você, sobre nós dois. E acho que eu consegui, porque ele se enfureceu tanto. E ele não podia sair por baixo, ou então, não seria ele. Por isso, pela última vez, ele tentou me atingir. 

— Como se não fosse o suficiente... — grunhiu, irritado. 

— Disse que o que o confortava era saber que eu estava sozinha. — repetir aquelas palavras em voz alta era como segurar uma lâmina afiada, entretanto, por mais que cortasse, agora já conseguia suportar a dor. — Disse que eu iria morrer sozinha, porque sou incompetente o suficiente para merecer o amor de alguém. 

O olhar dele retornou de encontro ao seu, deslizando por todo o seu ser até alcançar sua alma. E perder-se em seu olhar era a melhor sensação que podia confortá-la num momento como aquele. 

— Eu estou aqui com você. E você sempre vai ter a mim. 

Juno permitiu-se sorrir, embora os olhos ardessem com as lágrimas. 

— E eu fico feliz que esteja aqui comigo. — um longo suspiro escapou de seus lábios. Conforme o silêncio foi crescendo e a distância entre eles tornava-se insuportável, Juno ajeitou os cabelos e arrumou sua postura. — Bem, acho melhor eu ir. Obrigada pela a carona. 

Sem mais delongas, obrigou-se a sair do carro. Não ofereceu muitas despedidas, pois sabia que usaria qualquer desculpa para ficar com ele. Apesar de sua urgência, ele segurou seu braço. 

— Escuta — chamou, observando seu rosto. — Vai estar ocupada amanhã? 

— Não — deveria ter que sim, sabia que deveria. — Quer fazer algo? — como se não fosse o bastante, ela insistia. 

— Se quiser. — ele balançou os ombros com um sorriso despretensioso. — Como antigamente. 

— Como antigamente. — ela repetiu debilmente. 

Quando ele a deixou na porta de casa, apenas uma fina e fria neblina cobria o bairro em um véu cinzento. Ele esperou até que entrasse em casa para buzinar e ir embora. O silêncio da casa indicava que sua tia já estava adormecida. Então, sozinha no meio da sala escura, Juno fechou os olhos e escondeu os rostos. O que diabos estava fazendo? E por que não conseguia evitar que fizesse? 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Olha, devo admitir que provavelmente não é assim que se joga sinuca ~oficialmente~ hahaha. É só um jeito que eu aprendi a jogar por aqui na minha roça, então decidi trazer pra história. Não sei se tem outros modos de jogo ou qualquer coisa, mas se alguém joga sinuca, vou adorar trocar uma ideia, já que não dá para ir jogar por conta da pandemia D:



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "O Caminho das Estações" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.