O Caminho das Estações escrita por Sallen


Capítulo 32
∾ Não sei o que mais dói, superar ou insistir em você.


Notas iniciais do capítulo

Olá, olá! Como vamos? Preparados para o fim do inverno? Preparem-se por vem aí!

Esse capítulo foi um desafio por motivos de: meu óculos está perneta. Era qualquer movimento e ele escorregava da minha cara. Passei mais tempo ajeitando o óculos do que escrevendo.



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“Espero sermos capazes de superarmos os fantasmas do nosso passado", dissera, por fim, seu pai.  

Encarando a tela do celular apagada, entre suas longas mãos, Nirav ainda não sabia como se sentia. Não entendia porque era esperado dele a atitude enquanto seu pai era quem havia cometido os erros. E não sabia do que resultaria o provável, eventual encontro, mas já não havia mais volta.  

A frase dita por ele continuava a flutuar em sua mente, entretanto. Superar os fantasmas do passado. E não era tudo sobre isso?  

Não importava o quanto tentasse ignorar. Não fazia diferença tentar se esconder. Fugir de si mesmo. Não conseguiria despistar tais fantasmas. Uma hora ou outra, sempre voltariam a assombrá-lo. Ou era capaz de superá-los ou estaria perdido com eles.  

E apesar de estar disposto a tentar, ainda havia aquele fantasma que parecia impossível. Continuava a vagar, sem rumo, aparecendo e desaparecendo, sempre fugindo. Às vezes, na maior parte delas, tinha o rosto de Juno. Porém, em outras, já não conseguia reconhecer sua face.  

Era como fumaça. Sempre parecia mais perto do que estava, mais palpável do que era. E toda vez que tentava alcançá-la, dissolvia-se no ar, como se nunca tivesse existido antes. E não deixava sequer um rastro a seguir. Apenas desaparecia, mesmo estando ao seu redor.  

Ele suspirou, fechando os olhos. Enfim, abandonou o celular sobre o sofá. Procurou, por um instante, descansar a cabeça ao pensar em nada. Seu corpo reclamava pela costumeira preguiça do fim de tarde.  

O som da televisão ligada puxou sua atenção, obrigando-o a abrir os olhos, curioso. Um filme antigo continuava a preencher a tela opaca, desgastada pelo tempo. Seu filme favorito, sobre as gangues de Nova Iorque.  

O homem no centro balançava um cutelo, vestindo roupas de couro, enrolado em uma bandeira americana. Uma figura tanto pitoresca quanto tosca, como deveria ser. E, talvez por ser assim, era tão icônico.  

Como o garoto que era antes quando se encantou pelo filme, deixou os olhos se perderem na ação. Ainda não conseguia dizer o que tanto o prendia naquele específico filme. Já havia perdido as contas de quantas vezes já havia o assistido, todavia, era incapaz de se cansar. Talvez, as costumeiras lutas e violência não justificadas. Quem sabe, os conflitos e os diálogos. Ou apenas por ser capaz de perder a atenção, vendo um homem rodar um cutelo em um figurino excêntrico, sem se preocupar em pensar em mais nada.  

Entretanto, agora, nem mais seu filme favorito era capaz de sustentar a sua atenção. Irritou-se, de repente, com o fato de já saber o que iria acontecer. Já sabia todos os diálogos, todas as reviravoltas. Já sabia como terminava. E era irritante, pois, no fundo, não tinha esse controle sobre nada.  

O som do riscar de um isqueiro sendo acesso ecoou, então. Uma outra vez, tornava a recorrer ao cigarro. Um trago longo, queimando uma boa parte da beirada do cigarro pousado entre seus lábios. Ele respirou fundo, sentindo o fumo queimar sua garganta. Só depois expirou, soprando para longe a fumaça branca.  

Longe do sofá, obrigando o corpo resistir a preguiça, ele caminhou pela casa, em direção a janela. A televisão permaneceu ligada, com o volume baixo. Apesar de se afastar, continuava a escutar as frases de efeito do bendito personagem. Ou talvez fosse seu cérebro tão acostumado a elas, que as reproduzia automaticamente.  

Como de costume, estava sem camisa. O corpo magro, embora definido, arrepiava-se com o toque frio do vento ao lado de fora, que entrava pela janela. A calça de moletom, antiga e surrada, parecia o suficiente para mantê-lo aquecido. Estava uma bagunça, com os cabelos desgrenhados e a barba por fazer. Era uma bagunça.  

Quando debruçou o corpo no peitoril, continuava a fumar o cigarro. A fumaça escapava de seus lábios, avançando para longe da janela, se perdendo na brisa tardia. Nirav olhou para o céu, tragando-o outra vez. O sol se despedia, afundando-se atrás das colinas ao longe, seu brilho fraco resistindo até o último segundo. Uma cor alaranjada tomava conta da amplidão antes azul. Já não era mais o céu de inverno. Entretanto, uma chuva pesada cercava a cidade. Os extremos eram escuros, por todos os lados onde se olhava, uma espessa nuvem de chuva se aproximava.  

Com o olhar cansado, ele piscou algumas vezes, retornando atenção às ruas, que começavam a esvaziar. Pouco a pouco, conforme a hora escura se aproximava, menos pessoas caminhavam de um lado para o outro. Agora, a maior parte eram carros apressados, ansiando para chegar em casa. Ainda assim, entre as calçadas de um beco próximo, crianças brincavam com uma bola, alheias a qualquer outra coisa.  

Apagando o cigarro, o suspiro retornava aos seus lábios. Olhando ao redor, acompanhando desde as crianças ao tráfego constante, não conseguia se encontrar. Estava perdido mesmo estando parado num só lugar. Pois, quando olhava de um lado para o outro, não tentava encontrar a si próprio. Tentava encontrar Juno. E ela não estava ali. Não estava em canto nenhum, mesmo estando em todo lugar.  

De repente, sentiu-se preso nos anos anteriores. Nos sete anos em que os separaram. Os sete anos em que tentou encontrar uma resposta que nunca encontrou. A resposta para a pergunta que tinha uma face e continuava a repercutir no fundo de sua mente, como um resquício que o tempo não apagava. Deveria significar algo não ser capaz de esquecer.  

Agora, tudo estava igual, por mais diferente que pudesse estar. Continuava a procurar por uma resposta. Insistia em lembrar da mesma face. E que, assim como outrora, continuava desaparecida, como se nunca tivesse existido.  

Como antes, Juno havia desaparecido sem dizer sequer adeus. Em um instante, estava a centímetros de seu toque. No outro, estava a metros inalcançáveis dele. E sequer havia deixado um rastro. Nem uma razão qualquer para procurá-la. Tudo o que tinha era a sensação da pele dela se arrepiando com o seu toque.  

Em todos esses anos, nunca a teve tão perto. Era como revisitar as memórias desgastadas, que a tanto recorreu. E ela ainda respondia tão bem ao seu toque. Por um segundo, quase teve a certeza de que ela queria permanecer. Quando ela segurou seus dedos, entendeu a razão de continuar a procurá-la. Então, a verdade continuou implícita no silêncio que pairava entre eles. Nunca a teve tão perto e tão longe ao mesmo tempo.  

Os dias passaram. Um atrás do outro, atravessando a semana. E ele permaneceu preso naquele instante. Conseguia ver a nuca dela, exposta ao seu toque, com o rastro de arrepio acompanhando seu dedo. No fim, tudo o que mantinha dela, era o breve toque de seus dedos, entrelaçados como uma vez antes estiveram.  

E, apesar de saber onde encontrá-la, parecia difícil procurá-la. E mais uma vez, o seu único resquício era a sua memória. Afinal, nem Helena sabia responder o que havia acontecido. Era, talvez, a sua última esperança de entender e quando não houve resposta, já não sabia mais o que fazer.  

Parte sua estava cansada demais para continuar insistindo. E já estava mais do que exausto dos vícios de seus pensamentos. Abandonando a vista da rua pela janela, ele retornou para o interior da casa. No meio da sala, a bendita televisão continuava a reproduzir o seu filme favorito. E agora, de alguma forma, também o lembrava dela.  

Quando bateram à porta, sentiu-se pego no flagra por ter expectativas. Era tolice, sabia, acreditar que pudesse ser quem esperava. E quando reencontrou o rosto de Alice, encarou a parte feia de si. A culpa o engoliu, deixando-o incapaz até de cumprimentá-la.  

Sua namorada, bem à sua frente, com o belo sorriso estampado em seu rosto solene. Os longos cabelos presos em uma trança, caindo por seus ombros. Estava tão bonita, usando uma roupa casual, blusa branca e jeans azul, com sandálias abertas. Em suas mãos, algumas sacolas com comida. Conseguia notar a ansiedade de passarem a noite juntos. E estava feliz por tê-la ali, para não estar sozinho consigo mesmo. Só não sabia se seria a companhia certa para ela. Afinal, se fosse sincero...  

—  Eu trouxe comida! — ela ergueu as sacolas em sua direção. — Podemos encher a barriga ou podemos ficar aqui na porta. Você quem decide!  

Nirav deu um riso nasal, abaixando a cabeça. Por fim, deu passagem para que entrasse. A sua empolgação era como uma punhalada no peito. Queria retribuir, queria tanto, mas estava dormente.  

Enquanto ela colocava as sacolas sobre a bancada da cozinha, ele tentava esconder a própria bagunça. Principalmente, os vestígios do cigarro. E nem nisso conseguiu ter sucesso.  

— Não precisa esconder, eu vi você pela janela, mocinho. — ela piscou em sua direção, reprimindo-o com o olhar.  

— Não estou tentando esconder, só tirando de perto. Sei que você não gosta.  

Então, ela voltou-se para a televisão, analisando com um gesto o filme. Um riso fugiu de seus lábios sorridentes.  

— De novo o mesmo filme? — brincou, meneando a cabeça. — Não se cansa?  

Nirav deu de ombros, fazendo-a rir.  

A comida os esperava em cima da bancada e o cheiro que emanava era torturante. Já fazia um tempo desde que comeram massas juntos. Na verdade, Nirav sempre optava por levá-la em algum encontro, fazer alguma surpresa fora do cotidiano exaustivo e repetitivo. E sempre valia a pena. Só de vê-la sorrir a noite toda, qualquer noite valia a pena.  

Gostaria de levá-la em outro encontro. Tirá-la da mesmice daquele relacionamento. Queria vê-la vestida com uma roupa diferente, que comprou só para encontrá-lo. E gostaria de ver o sorriso estampado, marcando suas bochechas, por toda a noite.  

Agora, ela estava sentada ao seu lado, conversando sobre o seu dia. O filme na televisão encaminhava-se ao ato final, porém jazia agora esquecido. Mesmo não pedindo, tinha toda a atenção dele. Falava sobre seus pais, os problemas do seu apartamento, suas amigas, até sobre seu cachorro. Ele quase não respondia, mas não deixava de escutar.  

Em determinado momento, ela sujou o canto da boca com o refrigerante, sem perceber. Quando a provocou, limpando seu rosto com o polegar, sentiu-se satisfeito com a reação. O sorriso sem jeito, as bochechas avermelhadas. Era como antes, quando se conheceram, como se não houvesse nada entre eles. E, apesar disso, sentia como se estivesse mentindo para ela.  

No fundo, sentia que só havia feito as pazes para evitar o pior. Nada havia mudado, no entanto, continuava como antes. Ela só não desconfiava mais. Talvez, apenas ignorasse, já cansada de tentar.  

Encarava ali, naquele momento, a sua própria parte feia. A divisão de seus sentimentos e a culpa por tê-los dividido. Quando olhava para Alice, tinha certeza que a amava. E, contudo, quando pensava em Juno...  

Até que ponto era saudável estar dividido entre duas pessoas? Até que ponto era justo?  

Então, como uma resposta, o rosto de Juno permaneceu estampado em sua mente. E ao encarar naquela face os seus próprios conflitos morais, não deixou de se pôr em seu lugar. Pela primeira vez, talvez, começasse a entender uma parte da mulher que era provável ainda amar.   

Teria sido assim que se sentiu, tão dividida a ponto de se fragmentar? A culpa que o consumia agora era a mesma que a confrontou, sete anos atrás? Se era ela tão condenável assim, então ele também deveria ser?  

Diante disso, seu mundo tornou-se mudo, cego e distante. A ideia de que não eram tão diferentes um do outro soava quase como um recomeço. Estava ali, talvez, a abertura que precisava. A chance que queria. A resposta que procurava. E, então, o que deveria fazer com aquilo?  

— Querido?  

A voz de Alice o trouxe à realidade com força. Fugindo de seus pensamentos, notou o rosto que o encarava, piscando em sua direção. Os grandes olhos de Alice o acompanhavam, tentando entender o seu distanciamento.  

— Desculpe, eu me perdi no que você falava...  

— O que está pensando? — ela recostou o corpo no sofá, levando a mão até seu rosto, tocando-o com a ponta dos dedos. — Está tão distraído...  

Ele sorriu, fechando os olhos com o carinho. Alice entrelaçou os dedos em sua barba, causando arrepios por seu corpo. Quando reabriu os olhos, encontrou seu rosto bem próximo.  

— Sabe no que estou pensando? — ela continuou, dessa vez, abrindo um sorriso malicioso.  

Ela se afastou, por um instante, para se aproximar de novo. Sentou-se sobre suas coxas, acomodando-se em seu colo. Nirav a observou, pondo as mãos em seu quadril, sem nada a dizer.  

Aos poucos, ela ergueu a própria blusa, revelando seu tronco nu a ele. O sutiã de renda preta era um belo contraste contra sua pele pálida. Através dele, conseguia ver seus seios. Era uma visão tentadora, mas não foi capaz de se sentir tentado.  

Quando ela beijou seus lábios, ainda foi capaz de retribuir. Sentia as mãos dela em volta de seu pescoço, alcançando sua nuca. Conseguia sentir o desejo no toque com sua pele. E era incapaz de retribuir. Com remorso, desviou o rosto, desfazendo o beijo com um estalo.  

Alice sorriu, sem entender. Em uma outra tentativa, beijou sua bochecha. Nirav fugiu de novo, balançando a cabeça.   

— Vamos... — ela murmurou, passando os lábios perto de sua orelha.  

Ele a segurou, com cuidado, impedindo seu avanço. Sentiu-a se contorcer um pouco, fugindo da sua repreensão.  

— Não.  

Por um instante, ela pareceu acatar sua vontade. Quis pedir desculpas ao encarar sua expressão frustrada. Então, de novo, ela tentou beijá-lo nos lábios. Não podia culpá-la por tentar investir, mesmo assim, irritou-se por não ter sua vontade respeitada.  

Com as mãos em sua cintura, ele a empurrou de volta para o sofá, deixando-a incrédula com a sua reação.  

— Eu não quero. — repetiu com seriedade, se afastando dela ao se levantar.  

Ainda deixada sobre o sofá, Alice o encarava descrente. Sem a blusa para cobrir-lhe o peito, com a boca entreaberta, uma ruga de irritação entre as sobrancelhas e os braços abertos, ela parecia como uma boneca rejeitada.  

— Por quê? — foi tudo o que saiu de sua boca.  

— Por que o quê? — Nirav deu um riso nasal, sem graça. — Por que eu não quero transar?  

A ruga de irritação aumentou, tomando seu rosto.   

— Por que continua tão distante?  

Se acovardando, ele desviou o rosto, evitando o olhar que o perseguia com inquisição. Naquele olhar estava estampada a falsa garantia do pedido de desculpas, a mentira que se escondia sob as pazes improvisadas.  

— Nós já conversamos sobre isso...  

— E você continua sem sequer me olhar direito! Continua se afastando, se esquivando, se isolando...  

Nirav passou as mãos sobre os cabelos, depois esfregou o próprio rosto.  

— Não comece de novo. — pediu em vão.  

— De novo? — ela ergueu o tom de voz, exibindo o tom afetado. — Você continua me evitando, me excluindo. E não quer que eu comece de novo?  

— Só porque eu não quis fazer sexo com você?  

Ela se ergueu do sofá, vindo em sua direção de forma brusca. Sua trança estava bagunçada, fazendo as mechas caírem sobre seu rosto enfurecido.  

— Não, Nirav! Não é por você não querer fazer sexo comigo! — sarcástica, ela trovejou. — Pare de fingir que não tem nada acontecendo! Você sabe bem o que está acontecendo e todo mundo sabe o motivo. Eu sei o motivo!  

— Sabe? — devolveu com tom idêntico, sem fugir da briga. Agora, já não havia mais volta. — Então por que não fala? Se sabe, por que fica me cobrando?   

— Não se faça de sonso! — ela o alertou, apontando-lhe um dedo.  

— Vamos, fale! — ele sustentou a postura, cruzando os braços. Manteve o olhar indiferente sobre ela, arqueando as sobrancelhas. — Quem sabe assim eu consiga descobrir o motivo.  

Então, arrependeu-se. Ao vê-la sussurrar um xingamento, com o olhar cansado, arrependeu-se. Assim que ela se reaproximou do sofá para recolher sua blusa, ele tentou alcançá-la, em uma vã tentativa de impedi-la de partir. No entanto, era tarde demais. E ela estava enfurecida.  

Alice o afastou, empurrando-o com os braços para se livrar de seu toque.  

— Eu cansei! — esbravejou, impedindo que ele a encostasse. — Eu cansei, Nirav. De verdade, cansei!  

Ele a encarou, surpreso com sua voz esganiçada. Seu semblante partia seu coração. Era nítido o seu cansaço. O desgaste do relacionamento a estava consumindo junto. Ela havia tentado, em seus olhos marejados conseguia ver o quanto ela havia tentado. Ele, no entanto, não havia feito o mesmo.  

— Eu tentei ser compreensiva, tentei ajudar você, mas... Nossa, eu não aguento mais! — apesar da vontade de chorar, ela sustentava a fala alta, agitada e agressiva, de um jeito que nunca tinha visto antes. — Eu não reconheço mais você! Desde que essa mulher voltou, você não é mais o mesmo...  

Ele acenou com a cabeça, tentando remediar o dano causado.  

— Não tem nada a ver com...  

— Não tem? — bramiu, cortando-o abruptamente. — Olhe na minha cara e diga que não tem a ver com ela!  

Nirav não respondeu. Não tinha coragem. E ela já esperava, pois já sabia que seu silêncio era a resposta que procurava.  

Uma outra vez, ela tornou a se aproximar, dessa vez, obrigando-o a olhá-la.  

— Eu pensei que se deixasse meu orgulho de lado, se ignorasse meus ciúmes, eu conseguiria entender você. Eu queria poder ajudar você, mas você não me ajuda. Você não está nem aí para mim! Você não se importa em como me sinto! Sabe, eu também tenho meus sentimentos, infelizmente eu sinto ciúmes.  

— Alice...  

— Você me excluiu da sua vida por causa de outra mulher, Nirav. Acha que é fácil ver você todo desconcertado por causa dela?  

Em seu rosto, sentiu o calor das lágrimas manchando sua bochecha. Não adiantou morder os lábios, fechar os olhos, desviar o rosto. Suas lágrimas estavam ali, entregando sua culpa, sua fraqueza e a sua covardia.  

— Eu sinto muito...  

Alice não o deixou terminar. Mesmo com o rosto marcado do pranto, a voz rouca dos gritos, as mãos trêmulas do nervoso, ela manteve sua postura enfurecida. A raiva dentro de si era palpável.  

— Ela abandonou você! — sua voz ecoou por toda a casa, gerando um eco dolorido. — Pode se iludir o quanto quiser, mas ela usou você. Pode repetir a mentira que era o sentimento de vocês quantas vezes desejar. Pode se convencer de que ela gostava de você, mas, no fim, ela sequer escolheu você. Não se troca o certo pelo duvidoso, você deveria saber disso. Era o amante dela, só isso!  

— Alice, por favor... — suplicou, pois não tinha forças o suficiente para escutar tais atrocidades.  

— Ela nunca tentou procurar por você, em todos esses anos, ela nunca quis saber de você. E agora, você realmente acha que ela voltou por sua causa? — Alice estalou os lábios com indignação, o desprezo escorria por sua língua. — Quer dizer, pode ser que ela esteja entediada, sozinha, desamparada... Quem melhor do que o amante dela para consolá-la?  

Nirav sentia em sua pele a incisão de suas palavras, como uma faca cortando de uma extensão a outra. E como doía. Ele piscou os olhos, deixando as lágrimas escorrerem por seu rosto, sequer ousou limpá-las.  

Por fim, Alice vestiu a blusa. Limpando o rosto, ela se afastou em direção a porta. Porém, antes de sair, hesitou. Uma última vez, olhou para a visão deplorável do próprio namorado.  

— Eu amo você, mas eu não vou ficar entre você e qualquer sentimento que ainda acha ter por essa mulher.  

Com a batida agressiva da porta, a casa sucumbiu ao silêncio. A televisão exibia uma tela azul, trêmula e vazia. A comida estava largada de lado. De Alice não restava mais nada. E de Juno menos ainda.  

Ele estava sozinho. E sozinho, engoliu a seco a verdade nua e crua.  


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Notas finais do capítulo

Que coisa, não?

"A mulher que era provável ainda amar" contra "qualquer sentimento que ainda acha ter por essa mulher"

Acho que todos nós temos esse filme em específico que continuamos a ver de novo, de novo e de novo.



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