POV’s Anne

_Atchim! –Espirei novamente.

Eu estava enrolada numa manta vermelha que o rapaz tinha me dado quando me trouxera para onde ele morava. Sua casa era menor que a dos meus irmãos e ficava encostada em uma igreja velha que parecia meio abandonada, mas mesmo sendo assim, era um lugar confortável e quente. O rapaz estava na cozinha preparando algo enquanto eu tentava me aquecer. A chuva ainda caia e eu ficava me perguntando se Liam estava preocupado comigo. Eu tenho que voltar e me desculpar com ele por ter saído daquele jeito. Assim que essa chuva parar é melhor eu ir embora.

A porta da sala em que eu estava é aberta e o rapaz entra carregando uma bandeja que tinha um cheiro bom. Assim que ele pôs ao meu lado, me surpreendi. Aquilo eram tacos?! Eu nunca comi tacos em toda minha vida. No orfanato só serviam no máximo macarrão com lingüiça. Peguei um e dei uma mordidinha. Ai Meu Deus! Isso é muito bom! É meio apimentadinho, mas tudo bem. O rapaz ao ver minha expressão sorriu para mim e perguntou:

_Está bom?

_Uma delicia. Acho que me apaixonei. Finalmente alguma coisa além de macarrão e pizza.

_Você não gosta de pizza? –disse ele parecendo surpreso e meio deprimido.

Não. A questão não era essa. Era que Liam tinha me feito pizza esses três dias e eu já estava até com uns quilinhos a mais de só comer isso. Mas aquele rapaz não sabia dessa história.

_Não, não é isso. É que faz três dias que eu só como pizza. É bom variar às vezes.

_Eu não me importaria de comer pizza todo dia. Quer que eu faça uma? –sorriu ele.

_O que?! Mas você acabou de preparar uma bandeja de tacos. –disse alto sem querer.

_Mas são poucos. Depois eu preparo duas pizzas pra nós.

_Duas?! Por que duas?! –me assustei.

_Uma pra você e uma pra mim. –respondeu ele falando o que parecia o óbvio.

_Você não prefere dividir uma pizza comigo? –pensei melhor já que não sei se conseguiria comer uma pizza inteira depois desses tacos.

_Não. –disse ele sorrindo inocentemente.

Me surpreendi. Nunca vi alguém gostar tanto de comer. Ainda mais um rapaz magrinho desse jeito que ele é.

_Bem, por que não nos apresentamos? Como você se chama, dona vampira?

_Dona sua avó. Meu nome é Anne Melaine. –disse um pouco irritada com a palavra “dona” já que me soou como se eu fosse alguma velha.

_Prazer, Niall James. –disse ele animado ignorando minha irritação.

Ele sorriu para mim. Seu sorriso era tão lindo e inocente que me fez esquecer meu orgulho por uns minutos e uma vontade de abraçá-lo surgiu no lugar. E quando Niall começou a comer os tacos me veio a imagem de um filhotinho balançando a caudinha de felicidade. Era tão fofo.

Não sei como, mas consegui parar de olhá-lo e ver sua casa. Era meio empoeirada e seus móveis eram um pouco velhos. Sem falar que além dele eu não vira mais nenhum humano por perto. Ele morava ali sozinho?

_Niall, cadê seus pais? –perguntei curiosa.

De repente o rapaz para de comer e me olha tristemente.

_Provavelmente na Irlanda. Eles devem pensar que eu estou morto ou algo assim. –disse ele.

Me espantei com aquela frase. O que tinha acontecido para seus pais pensarem isso? Niall olhou para mim e parece que adivinhou meus pensamentos.

_Sabe... quando eu era pequeno eu estudava em uma escola só para garotos chamada Coláiste Mhuire. Um dia nós somos fazer uma viajem para Londres e eu acabei me perdendo do grupo. Desesperado, eu comecei a chorar e chamei a atenção de uma moça que me consolou. Ela me levou para seu carro e começamos a procurar os meus colegas... ou foi isso que pensei. A moça na verdade era uma vampira e me seqüestrou até esta floresta. Eu quase morri. Foi realmente assustador, mas ai o Padre João me viu e me salvou daquela mulher. Desde então eu moro com ele aqui. –contou ele parecendo querer chorar.

_Mas por que você não voltou para onde seus pais estavam?

_É uma boa pergunta. –falou Niall sem graça. –Acho que eu não senti coragem de vê-los. Nem sei se eles estão na minha antiga casa ainda. Sem falar que quase não tenho dinheiro para voltar para a Irlanda.

Depois dessa última frase um silêncio se formou e eu não sabia como quebrá-lo. Ele ficou olhando os tacos por alguns minutos e depois começou a comê-los meio deprimido. Droga, a carinha dele era tão fofa mesmo triste e dava uma vontade de abraçá-lo. Eu tentava me conter para não fazer isso, até porque não estávamos num clima muito bom depois dessa história.

De repente ouvi o barulho da porta da sala se abrindo o que me fez voltar para a realidade e o mesmo aconteceu com Niall que assustou-se. Ele, num pulo, me leva para dentro de um armário e fecha as portas.

_Fique quietinha ai até eu disser que pode sair. –disse ele num sussurro.

O que estava acontecendo ali?! O que Niall estava pensando me prendendo dentro de um armário? Minha vontade era de abrir as portas e gritar com ele, mas essa idéia logo some quando eu ouço passos mais pesados se aproximarem.

_Niall? Você está ai? –ouvi uma voz grossa e rouca chamá-lo.

_Estou aqui, Padre João. –ouvi Niall responder calmamente.

A porta abre se abre totalmente e depois de alguns segundos ouço um suspiro vindo do tal Padre João.

_Niall, não me diga que você está comendo de novo? Você já comeu duas panquecas hoje de manhã.

_Ah, Padre, foi hoje de manhã. Eu estou em fase de crescimento.

_Sempre a mesma história não é? Venha aqui. Tenho uma coisa para te mostrar.

_O que é? –Niall fala com uma voz animada.

_Cinzas de um vampiro! –disse o homem com uma voz orgulhosa. –Eu acabei esbarrando com um e esse foi o resultado dele ter tentado me morder. Vampiros são seres do diabo, Niall. Por isso devem ser destruídos. Um dia você também terá uma coleção de cinzas com você.

Meus olhos se arregalaram e meu corpo estremeceu com aquela frase. O que aconteceria comigo se aquele Padre descobrisse que eu estava ali?

_Falando em morder, eu tenho uma coisa para te mostrar Padre.

Disse Niall se aproximando do armário. Não me diga que... Niall armou para mim?! Ele ia me revelar para ver o Padre acabar comigo?! Por que eu tinha sido tão cega? Niall poderia ter um rostinho bonito, mas não significava que ele era uma boa pessoa. Eu tinha sido tão burra. E agora aqui estou eu prestes a virar cinzas. Eu fechei os meus olhos esperando o momento em que a porta se abriria e a luz fraca iluminasse meu corpo deixando o tal Padre me ver e atacar. Eu estava me preparando, preparando, preparando, mas... a porta não se abriu. Pude ouvir Niall ao lado do armário abrir uma caixa e pegar algo dentro dela. Depois ele se afastou de mim e se aproximou da porta onde o homem poderia estar.

_Está tendo um desconto nesse supermercado hoje, falta vinte minutos para acabar.

_Por que está me dando isso? –perguntou o homem curioso.

_Bem, vamos dizer que eu “supostamente” esgotei todos os ingredientes da geladeira quando fiz tacos.

_O que?! Ora seu...

_Quebra esse galho, padre. Em nome de Deus, vai.

O Padre bufou, mas ouvi a porta se fechar com força. Depois de alguns minutos, Niall abre a porta do armário parecendo aliviado.

_Essa foi por pouco. –riu ele.

_É melhor eu ir. –disse saindo do armário um pouco assustada e um pouco aliviada naquele momento.

_Hã? –disse ele surpreso. _Você já vai? Mas ainda está chovendo e...

_Tem algumas pessoas me esperando na minha casa. Eu tenho que ir, Niall.

_Você vai voltar? –perguntou ele parecendo triste.

_Eu não sei. Acho que não. Meus irmãos não deixariam.

De repente ele me abraça o que me surpreende e eu sinto minhas bochechas esquentarem.

_Se você não voltar então eu não vou nem te deixar ir. Você é a primeira amiga que eu fiz desde muito tempo. Não posso te deixar ir assim. Fica aqui, Anne. Sei que posso te fazer feliz nesta casa. –disse ele com voz de choro.

_Niall, eu...

Antes que eu pudesse continuar a frase, sinto alguém me puxar para trás e cobrir meus olhos.

_Ela não é um bichinho de estimação que você pode cuidar, menino. –ouvi a voz de Harry soar friamente.

Harry? Por que ele estava aqui? Ele estava me procurando? De repente sinto meu rosto inteiro esquentar.

_Q-Quem é você? –pergunta Niall surpreso. –Mais um vampiro?

_Sou irmão desse bebê. E vou levá-la de volta para casa. –ele envolveu minha cintura e me levantou para o ar.

Meu corpo começa a esquentar e minhas bochechas queimam mais ainda. Por que eu estava assim? Meu coração também acelera e começa a bater rapidamente. O que estava acontecendo comigo? Harry começa a andar até a porta, mas Niall entra na sua frente impedindo sua passagem.

_Saia. –disse Harry.

_Não. –respondeu Niall também sério.

Harry trincou os dentes e começou a me segurar com mais força.

_Estou perdendo a paciência, moleque. Você não vai querer me ver bravo, vai?

_Eu já vi a morte de perto uma vez, não tenho medo de ver novamente.

Respondeu Niall. Senti Harry se aborrecer. Se eu não fizesse alguma coisa vai saber o que aconteceria com Niall. Eu tentei sair das costas de Harry, mas não consegui, apenas adiei as coisas, pois Harry tentava me segurar.

_O que você pensa que está fazendo? Fique quieta. –gritou ele surpreso e irritado por eu estar me debatendo em seus braços.

_Não. Você não pode machucar o Niall. Ele é meu amigo, Harry.

_Como você é tonta! Não está vendo que ele é um caçador de vampiros, menina burra! –gritou Harry.

Eu paro de me mexer com o final daquela frase. Niall, o garoto gentil e fofo que eu conheci era um...

_Isso é uma mentira, não é Niall? –perguntei esperando ele sorrir para mim e dizer que era.

Mas isso não aconteceu. Ele não respondeu. Estava olhando para o chão deprimido.

_Niall... por favor... por favor... me diga que isso é uma mentira.

Eu chamei por ele em meio de um soluço e outro, mas ele continuava na mesma posição. Agora tudo se explicava, aquele papo estranho com o padre, o fato de Niall descobrir logo de cara que eu era uma vampira. Ele devia estar aprendendo a ser... a ser...Por que isso tinha que estar acontecendo? Meu mais novo amigo era um caçador da minha espécie!