As ruas de Konoha nunca pareceram tão cheias e alegres aos olhos de Sasuke. Há 3 anos, tudo era tão parecido e tão diferente... mas ele estava se sentindo tão estranho ali. Três anos eram quase uma eternidade para ele. Aquelas ruas haviam mudado tanto...


Ele também havia mudado muito. Há três anos, quando andasse por aquelas ruas, tudo o que veria era os ombros dos homens mais velhos, e mal alcançaria o pescoço das mulheres. Há três anos, ele estaria andando por aquelas ruas junto com seus alegres colegas de time, e não sozinho, com as mãos enterradas nos bolsos vazios, os olhares estranhos lhe mirando se soslaio, rostos reprovativos irritando-lhe. Os ombros dos homens agora estavam nos mesmos níveis dos seus. Os pescoços das mulheres agora estavam abaixo do seu próprio. Não haviam colegas de time, embora eles ainda estivessem por ali. Embora eles houvessem esperado por Sasuke durante três anos.


Sob o sol intenso de meio-dia, o Uchiha pôde reconhecer a cabeleira rosa de Sakura. Ela também tinha mudado, e ele custava a admitir que tinha gostado das mudanças que ela sofrera. Seu corpo adquirira ares de mulher, curvas suaves e graciosas, que serviam apenas para emoldurar a beleza que já lhe era tão bem servida. Os cabelos haviam crescido e agora atingiam os cotovelos, e o vento brincava com eles.


Não fora só o corpo dela que mudara. Sakura passara a ser mais recatada e branda, e sua habilidade de kunoichi atingira um alto patamar. Ele se divertia com isso. Queria algum dia poder lutar com ela e ver se ela tinha alguma chance contra ele.


Havia apenas um pequeno detalhe que lhe incomodava em relação a ela e a ele também. Itachi. Poderia ter outro nome? A razão dos seus ódios e desoncofortos poderia ser outra, se não o irmão mais velho? Sempre ele. Sempre. E agora ele interferira na única coisa que Sasuke acreditava, no seu porto seguro. Na sua Sakura. Sasuke não entendia isso. Sabia que eles tinham algum tipo de relação, misteriosa e entrelaçada com algum acontecimento que lhe era seu desconhecido. Ele não podia ter interferido nisso. Do que lhe adiantara fazer as pazes com o irmão dias antes? Arrependeu-se. Por sua culpa, o que era seu, apenas seu, ia ser roubado. Itachi roubaria Sakura, assim como roubara a família Uchiha há anos e chegara ao ponto da crueldade de deixar Sasuke vivo.


-Sasuke-kun! - a voz doce e meiga dela penetrou-lhe até o fundo da alma. Sakura. Sempre desprezada, sempre apaixonada. Será? Ela ainda o amava?


-Ah... Sakura. - Sasuke ficou um pouco atordoado ao ter seus devaneios interrompidos de forma tão abrupta.


-Estava procurando por você. Kakashi está nos chamando para uma missão.


-Não envolve ajudar as velhinhas a carregar as compras como aquela de ontem, né? - receou o Uchiha, fazendo a Haruno rir.


-Não, não. Estamos recebendo missões mais leves porque você voltou, mas os capangas de Orochimaru continuam atrás de você. Não devemos nos expôr muito. Além do que, estamos passando por épocas bem pacíficas.


-Você fez isso por mim? - quis saber Sasuke, aproximando-se dela.


-Do que está falando? - redargüiu Sakura, rindo. - Foi Kakashi-sensei que nos orientou assim. Ele disse que era para o seu bem.


"Eu sei", respondeu Sasuke mentalmente. "Antigamente você diria que tinha sido uma idéia sua, numa tentativa de me conquistar. Hoje acho que isso nem lhe importa mais. Eu queria que importasse."


Quando deu por si, Sakura já estava vários passos a sua frente. Ele seguiu-a, um tanto confuso com seus próprios pensamentos e desejos. Depois lembrou-se da ajuda que Hinata lhe prometera. Um sorriso curvou seus lábios. Confiava no potencial da Hyuuga.


"Você é minha", pensou Sasuke, enquanto Sakura caminhava à sua frente.


Enquanto caminhava, ele mal notava os orbes pérolas que lhe miravam cheios de preocupação à curta distância.






-Sakura.


A voz de Sasuke soou tão distante para a Haruno que chegou a ecoar nos seus ouvidos. Depois da missão, Naruto havia ido treinar com Kakashi e Yamato, deixando Sasuke e Sakura a sós na beira de um pequeno riacho em vias da Floresta da Morte. Sakura segurava o copo de refresco doce e gelado que Naruto havia lhe comprado com as duas mãos, e seus pensamentos se estonteavam por Itachi.


-Sakura - repetiu o Uchiha, um pouco mais alto, tentando voltá-la para a realidade.


-Hum? - os devaneios dela foram interrompidos abruptamente, e ela não conseguiu pensar em nada coerente para responder ao chamado.


-Eu quero lhe perguntar uma coisa. Acho que você pode me responder.


A Haruno permaneceu em silêncio, e seus lábios se fecharam sobre o canudinho, enquanto Sasuke amaldiçoava a sorte daquele canudo. Não tinha certeza se ela estava realmente escutando-o, mas resolveu tentar mesmo assim.


-Você sabe onde o Itachi está morando?


Apesar da alienação da moça, o efeito foi instantâneo. Sakura tossiu repetidamente, como se um projétil tivesse atravessado sua garganta. Sasuke estreitou as pálpebras, desconfiado. A Haruno se recompôs rapidamente, e enfiou o canudo na boca de novo para disfarçar o descuido.


-Pensei que você soubesse - resmungou ela, o canudinho preso entre os dentes e os dedos apertando o plástico gelado e úmido do copo.


-Não tive ocasião de descobrir - respondeu o outro, ainda mirando-a com desconfiança.


-Por que você quer saber? - indagou Sakura, um pouco nervosa. - Vocês não vão brigar, vão?


-Tem medo que eu me machuque? - falou Sasuke, rindo. Ela não respondeu. "Claro que não", acrescentou o Uchiha mentalmente, "você tem medo que ele se machuque."


Os dois permaneceram em silêncio por mais alguns instantes. Sasuke voltou a insistir.


-Eu não vou brigar com ele. Você esqueceu? Eu descobri toda a verdade, o Madara me contou. Não há motivos para lutarmos. - "Não até certo ponto", pensou ele.


-E o que lhe faz acreditar que eu sei onde ele mora? - perguntou Sakura. Sasuke deu um sorriso amarelo. Quando ela queria, conseguia realmente ser esperta. Não mais que ele.


-Ah - disse ele, em tom de doce admiração - eu sei melhor que ninguém o quanto a Hokage confia em você. Ela conta para você coisas que nem mesmo à Shizune ela fala. E além do mais, porque eu confio em você. Não imagina o quanto.


Sakura corou. Sasuke riu internamente da ingenuidade dela. Era boba, e mesmo assim ele a queria.


-Você vai ter que me prometer que não vai arranjar briga - objetou a Haruno, lançando ao colega um olhar de mãe severa. - Não que eu me incomode... é que... vai arranjar problemas para mim. Além de Tsunade, eu sou a única que sabe, entende.


-Pode deixar comigo - respondeu Sasuke, sem abandonar o tom de voz delicado. - Só quero conversar. Pedir desculpas por tudo o que tem acontecido. Você sabe, eu sempre julguei mal Itachi.


Sakura sorriu. A possibilidade de Sasuke, seu antigo amor e melhor amigo, fazer as pazes com Itachi, o homem que lhe ensinara verdadeiramente o que era amar alguém, era quase perfeita. Sasuke admirava-se de tamanha ingenuidade.


-Vou escrever para você - disse Sakura, apanhando um papel amarrotado no bolso, enquanto Sasuke lhe estendia uma caneta já pronta. Suas mãos se esbarraram, e ela invariavelmente corou, de culpa e vergonha ao mesmo tempo. Ele limitou-se a dar-lhe um tênue sorriso.






O bairro Uchiha ficava numa parte especialmente arejada de Konoha. Parecia que era justamente ali que o vento cismava de fazer a curva e bagunçar tudo, incluindo os cabelos negros de um Uchiha de rosto marcado por finos traços de expressão, os olhos rubros mirando o nada. Itachi deleitava-se em tardes amenas como aquela. E, ali, sentado naquele pequeno alpendre da casa em que convivera com e matara sua família, era especialmente agradável.


Mas ele estava tenso. E haveria outro motivo? Sasuke. Sakura. Por alguma razão, sentia que algo errado havia acontecido, e podia piorar. Algumas pessoas poderiam achá-lo um ciumento extremoso, mas ele tinha suas razões. Não por Sakura; ela era tímida e gentil, e sempre nutrira uma paixão desmedida por Sasuke, mas Itachi queria acreditar que era algo do passado. Sasuke, porém, era obstinado e persistente; ele sempre achava que as coisas eram realmente legais quando elas eram dos outros. E, se não se enganava, Sasuke acharia que Sakura era simplesmente perfeita... porque ela era de Itachi.


Duas presenças estranhas avivaram os instintos do Uchiha. Um chakra era seu conhecido; o outro, ele não fazia idéia a quem pertencia.


Decidido a observar sem ser observado, Itachi subiu num velho carvalho habilmente, enfiando-se pela copa repolhuda com facilidade. Não eram comuns visitantes no abandonado bairro Uchiha, e isso o deixou um tanto desconfiado; sabia exatamente de quem era o primeiro chakra, mas queria ver com seus próprios olhos. E conseguiu.


-Pare de me amolar! - gritou Sasuke, andando a passos largos e duros enquanto alguém que Itachi não conseguia ver andava nervosamente atrás dele. - É verdade que eu pedi a sua ajuda, mas não pedi para encher meu saco a cada passo que fosse dar!


-Mas... mas... - a voz tímida e feminina era estranha a Itachi; contudo, quando ela dirigiu-se para o lado dele, o Uchiha mais velho pôde distingui-la; os cabelos negros e azulados desciam até a cintura e envolviam-a delicadamente. Seus olhos eram estranhamente esbranquiçados, e Itachi supôs que ela fosse uma Hyuuga.


-Pare de me seguir, está bem? - disse Sasuke agressivamente. - Se você quer atrapalhar, procure outro para isso. Meu assunto é sério. Eu não sou idiota feito você, que fica correndo atrás do Naruto esperando que algum dia ele repare que você REALMENTE existe. Eu amo a Sakura e quero que ela seja minha.


Itachi sentiu uma incontrolável vontade de espancar o irmão mais novo até que ele virasse uma panqueca ou algo parecido; mas sua vontade de escutar toda a conversa foi maior. Hinata deu um solucinho ao lado do Uchiha, magoada com as palavras dele.


-Mas o senhor vai acabar se machucando - disse ela, nervosa. - Por favor! Vamos voltar e pensar em outra coisa. Tenho certeza que se você conversar com a Sak...


-Pare de ladainhas - resmungou Sasuke, olhando irritado para a Hyuuga. Ela encolheu-se, e ele pareceu sentir-se um pouco culpado, embora não demonstrasse. - E não me chame de senhor, não sou seu pai. Isso dá nos nervos.


-Dá nos nervos? - repetiu Itachi, em voz alta. - Deixe eu te mostrar o que dá nos nervos.


E saltou. Sasuke estava preparado. Na mesma hora, ele direcionou um chute forte para Itachi. Hinata gritou, assustada, e recuou. Itachi bloqueou o chute com sua maestria natural, e olhou para Hinata.


-Melhor sair daqui - aconselhou, com a voz calma. - Não vou parar de bater no meu querido irmão até que todos os dentes da boca dele se reduzam a farinha.


-Digo o mesmo - resmungou Sasuke entredentes, um sorriso maldoso espalhando-se em sua face.


Apesar de tudo, Hinata não foi embora. Ela recuou, e continuou acuada, embaixo da árvore que Itachi se encontrava há pouco, observando horrorizada enquanto os Uchiha lutavam.


Itachi levava a melhor em larga escala. Não bastaram 2 minutos para que Sasuke desabasse no chão com um baque seco, os olhos inchados e o rosto pálido como de um cadáver.


Hinata soltou um grito horrorizado e correu para perto de Sasuke, verificar sua pulsação. Itachi pousou no chão com suavidade e prostrou-se ao lado dela, fazendo o mesmo.


-Droga - disse ele baixinho - se eu tiver matado esse desgraçado... Sakura não vai me per...


Os olhos vermelhos dele se arregalaram quando a cesta escorregou das mãos de Sakura e caiu no chão com um baque surdo. Seus orbes verdes miravam aterrorizados a cena de Sasuke, visivelmente morto no chão, Hinata tentando desesperadamente salvá-lo... e Itachi se assemelhando assustadoramente com um assassino.


O Uchiha mais velho abriu a boca, provavelmente tentando dizer alguma coisa. Mas quem disse foi Sakura. O grito dela foi arrancado de sua garganta, rouco e desesperado, ao ver o colega de time aparentemente morto e seu grande amor com todas as suspeitas apontando para ele.


-S... Sa... suke... k... - ela empalideceu e desmaiou.