Utopia escrita por dastysama


Capítulo 6
Capítulo 6 - Uma taça de sangue




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Bill estava novamente no seu quarto, arrumando todos os seus casacos no guarda-roupa. Era quase duas horas da tarde e ele decidira que arrumar o seu quarto seria o melhor a fazer, não queria nada bagunçado, nem nada que o impedisse de escrever mais tarde. Estava até pensando em comprar algumas cortinas para colocar no dossel da cama, mesmo que não fosse sua casa, seria ótimo poder chamar aquele lugar de lar.

Ele havia aberto a janela para deixar o sol adentrar o local e acabar com aquele cheiro de mofo. Apesar do frio, os raios de Sol davam a impressão que o dia estava quente e bonito o suficiente para se sentar lá fora e ficar lendo algum livro. Era o que ele gostaria de fazer, mas invés de livro, seria um caderno e um lápis. Quem sabe ele não fizesse isso mais tarde?

Quando terminou de arrumar o guarda-roupa e olhou para a pilha de sapatos que havia dentro da sua mala, achou que isso podia ficar para mais tarde, afinal iria perder o dia inteiro arrumando tudo. Pegou um caderno no meio da sua bagunça na mala e uma caneta, desceu as escadas onde se podia ouvir Tom treinando algumas melodias em um piano que havia em um dos quarto. Georg tocava o baixo preguiçosamente, sentado no sofá, enquanto Gustav batia em sua bateria ferozmente.

Ele não parou para falar com eles, apenas continuou o seu percurso até o lado de fora, procurando um bom lugar para se sentar, onde não estivesse tão frio. Decidiu optar em ficar perto de um pinheiro que não era tão grande quanto os outros, por isso deixava os raios de Sol atravessarem seus galhos e aquecer o local que ficava suas raízes. Bill se sentou lá, com o caderno sobre suas pernas e o lápis pronto para escrever em sua mão.

Olhou para todos os lados, era incrível a visão que tinha. Havia colinas e mais colinas verdejantes brilhando junto com seus pinheiros altivos e sombrios. A casa, então, parecia surgir do nada, como se brotasse da terra e o levasse para longe. A sensação era incrível, parecia que nada no mundo poderia superar aquilo, era como se um arrepio transpassasse por sua pele e corresse nas suas veias.

Um vento passou por ele, fazendo as folhas do caderno se virarem abruptamente. Ele segurou o caderno com mais força e deitou a cabeça no tronco caloso da árvore. Tudo parecia tão em paz, não havia ninguém correndo atrás dele, na verdade não havia ninguém. E isso era ótimo, nunca pensou que sentir-se sozinho trouxesse um alívio tão grande. Então ele fechou os olhos por um segundo e deixou seus ouvidos atentos aos barulhos que se ouvia, deixou-se ser guiado pela música.

 

– Você me parece tão cansado – disse um cara com cabelos castanhos aloirados compridos, preso em um rabo de cavalo, vestido elegantemente. Via-se malícia no olhar dele, como se pudesse brincar com qualquer um facilmente – Sinceramente, William, você está ficando pior do que eu imaginava.

– Cale-se, Thomas – disse William em sua ampla sala de estar, indo direto a uma mesinha e pegando uma garrafa de uísque, encheu um pequeno copo com ela e tomou um gole rapidamente. A sensação corrosiva do álcool em sua garganta o acalmou, era como se a corda em seu pescoço afrouxasse um pouco para depois voltar a enforcá-lo – Já não vês que estou terrível sem suas palavras insignificantes.

– Obrigado pelos elogios, fico lisonjeado – disse ele rindo abertamente, como se o outro tivesse acabado de contar uma piada – Não falo isso por que quero acabar com sua paciência. Falo como seu melhor amigo, você está acabado. Faça hoje algo por si mesmo, não fique fazendo tudo de má vontade só por que tem que fazer.

– As pessoas esperam mais de mim, não posso simplesmente ignorar. Meu pai quer que eu assuma os negócios da família, não vou decepcioná-lo, ele vai ver que sou tão bom quanto ele. Vou acabar com as dívidas que temos, tenho que me esforçar mesmo que seja cansativo.

– Não estou dizendo para você abandonar tudo, estou falando para se divertir, é o que você precisa. Nem todo o uísque do mundo vai fazê-lo feliz, precisa de muito mais – disse ele lançando um sorriso maroto.

– Sobre o que você está falando? – disse William levantando a sobrancelha, desconfiado – Que tipo de diversão?

– Você sabe do que estou falando, o que é melhor que bebida? Mulheres. Além disso, abriu aquele Cabaré novo e o dono é meu amigo, ele vai escolher as melhores mulheres para nós, você vai ver.

– Sinto-me enojado ao vê-lo falar isso – disse William fazendo uma expressão de desgosto e pensando seriamente em tomar outro copo de uísque – Não vou manter relação nenhuma com mulheres daquele local. São usadas, não quero me deitar em uma cama onde todos os dias milhares de homens deitam e usam as mesmas mulheres. É asqueroso.

– Você vai morrer se for para lá? Se não quiser nenhuma mulher, pode simplesmente beber já que é o que mais gostas de fazer. Só estou te convidando, por que não quero ir sozinho, além de que você é meu fiel companheiro. E vai que gostas de alguém de lá?

– Gostar? – disse ele rindo sinicamente – Como se eu fosse casar com alguma mulher daquele local. Não sou tão repugnante a esse ponto, não quero dar nenhuma oportunidade a essas mulheres de tentar encostar o dedo em minha herança. Elas que lutem pelos seus sonhos de outra maneira mais honrada.

– Não me importa o que são, o que eram ou o que vão ser. Só estou interessado no que elas têm a me oferecer – disse ele dando de ombros e se levantando do divã que estava sentado – Vamos lá de uma vez, o local é novo, desconhecido, misterioso. Se não gostar, é só não voltar nunca mais. Se não ir, vai ficar com essa curiosidade na sua cabeça.

– Não estou com curiosidade nenhuma – disse ele rispidamente – Vou-me sentir totalmente sujo sem entrar naquele local. Só péssimas pessoas frequentam, e você deveria também não ir para não ficar mal falado. Você tem um nome a honrar, Thomas.

– Infelizmente, tenho a má notícia de que sou uma péssima pessoa, por isso vou lá neste momento. E hoje, William, você será uma má pessoa, amanhã é outro dia, outra história. Pode voltar a ser decente e honrado como sempre, mas hoje não.

Thomas piscou para o amigo e pegou firmemente em seu braço o puxando para longe daquela casa. Não queria que o amigo continuasse a ser tão frio e severo como era, ele precisava de alguma diversão, algo para deixá-lo mais relaxado. Logo quando estavam saindo de casa, se depararam com o Senhor Baumgärtner chegando em casa.

– Aonde vão garotos? – perguntou ele com uma voz rouca e altiva, ele tinha o mesmo olhar que William, como se fosse capaz de matar alguém com aqueles olhos acastanhados.

– Boa noite, Senhor Baumgärtner, vamos apenas nos divertir – disse Thomas com uma lábia, como se pudesse enganar a todos com seu jeito cínico – A noite é uma criança e trabalhamos tanto que um descanso não é algo errado, é?

– Desde que não exagerem e não percam a compostura – disse ele lançando um olhar fuzilante para William, fazendo este sentir o impacto das palavras dele. Automaticamente o que o pai queria foi gravado em sua mente como uma tatuagem que o impedisse de fazer qualquer coisa errada – Só quero que se comportem.

– Sim, Senhor – disse Thomas fazendo uma reverência exagerada e puxando William para dentro de uma carruagem – Seu pai é cômico, se não fosse tão sério, poderia até trabalhar em um circo.

– Cômico você vai ver quando ele arrancar o meu couro e o seu junto. Se fizermos qualquer coisa de errada, eu juro que te mato antes que ele me mate – disse William se apoiando na janela, de mau humor.

– Você vai me agradecer, William – disse Thomas rindo – Ninguém vai morrer essa noite, vamos ao paraíso para depois retornarmos ao inferno.

William apenas o ignorou, não adiantava retrucar com um Gietzen, eles eram conhecidos por serem cabeça dura, era só conversar com a família de Thomas que já comprovaria esse fato. Apenas afundou no estofado da carruagem desejando poder sair dali e voltar para sua própria cama onde poderia dormir sossegado, sem nenhuma mulher daquele Cabaré asqueroso.

A carruagem desceu várias ladeiras até chegar ao tal tão falado lugar, onde se via uma casa enorme, com aspecto velho com vários cartazes pintados a mão nas paredes, mostrando mulheres bonitas e sedutoras em seus espartilhos apertados. Dava para ouvir música vindo de lá e muitas risadas, sem contar o barulho de copos e do piano que se tocava ao longe.

– Mas que lugar mais lindo, não é mesmo? – disse Thomas rindo enquanto descia da carruagem – A princesa não vai precisar de ajuda para descer, vai? Vamos logo, William, se não vamos perder o principal da festa. Precisamos escolher as mulheres mais bonitas antes que outro idiota escolha.

– Não acredito que estou aqui – disse ele descendo realmente aborrecido – Vou ficar apenas alguns minutos, se eu não gostar, vou embora você querendo ou não.

– Tenho certeza que você não vai embora.

Respirando fundo, ele seguiu o amigo e parou na frente da casa. Vários homens já estavam ali parados, e olharam fixamente em William. Um Baumgärtner. Era só morar lá que podia se reconhecer um em qualquer lugar, a supremacia máxima da cidade, filho do homem mais rico da região carregava poder e morte nos olhos. Alguns alegavam que eles vinham mais dos demônios do que de anjos, apesar de terem todos uma beleza indiscutível.

– O que um cavalheiro como o Senhor está fazendo aqui? – disse um cara bêbado rindo – Procurando uma dama? Aqui não vai encontrar.

– Se eu fosse você, nem dirigiria a palavra a mim. Mas como está bêbado, eu o perdoo. Quero ver falar dessa forma comigo com tanta coragem sem ter um pingo de álcool no sangue. Quando seu sangue rolar pelo chão, quero eu mesmo analisar a quantidade de coragem que corre em suas veias – disse William com sua voz cortante.

O homem engoliu seco e sentiu o chão sumir, enquanto aquele rapaz apenas lançava aquele olhar venenoso e intrépido. Todos sabiam que se ele tivesse uma arma na mão, o homem já estaria decapitado no chão. São assim as coisas com a realeza, morte justifica honra e sangue é sua principal bebida. Todos malditos.


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