Utopia escrita por dastysama


Capítulo 19
Capítulo 19 - Almas Atormentadas




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Bill sentiu os nós dos seus dedos cederem, assim que tocou a xícara. A rica porcelana escorregou de sua mão e caiu no chão, se espatifando em mil pedaços brancos. Ele apenas ficou olhando para os cacos, sem saber o que fazer. Na verdade ele nem sabia mais onde estava.

– Desculpa... eu... não... – Bill tentou falar algo ao ver a expressão pasmada de Biene, também olhando para os cacos – É uma relíquia, não é?

– Não – ela se apressou a dizer – Na verdade nem tem muito significado, era da minha avó, mas ela já morreu há muito tempo, nem a conheci. Não tem importância, acredite.

– Me desculpe, eu sou um idiota, não queria ter quebrado – mas antes que ele pudesse falar mais, Biene já estava coletando os cacos com cuidado – Seu sobrenome é Grünewald, não é?

– Sim, é da família do meu pai, ou seja, é usado pelo meu avô também. Vem de uma família antiga, não sei muito sobre ela, por que ela não era rica e não tinha tanta importância como os Gietzen. Uma pena, afinal adoraria descobrir mais sobre meus antepassados.

– Ah, entendo – Bill disse tentando organizar as ideias. Então isso explicava por que tanto Eleazar quanto Biene gostavam de adivinhações, estava no sangue deles há séculos, passando de pai para filho, ou de avô para neta. Talvez não fosse tão enganoso quanto parecia, talvez fosse realmente verdade.

– Mas por que você anda tão interessado? – Biene disse se levantando e indo até a cozinha. Ela voltou com um pano para limpar a borra de chá que havia sujado todo o assoalho – Quero dizer, você não parece o tipo de pessoa que gosta de história? Até pode admirar, mas ultimamente você anda se interessando tanto quanto eu e nem estou te forçando a gostar.

– Eu sei, é que essa cidade faz você gostar disso – Bill disse tentando se explicar, mas parecia não encontrar palavras – Talvez eu possa aprender um pouco mais também. Não é tão ruim descobrir sobre antepassados.

– E você sabe algo sobre os seus? – ela perguntou, o olhando fixamente, como se o desafiasse a falar. Biene sabia que havia algo atrás disso, ele estava começando a achar que ela era vidente mesmo. Talvez ela conseguisse lê-lo, apenas de olhá-lo, como se ele fosse uma borra de chá mais do que evidente.

– Não muito, eu comecei a gostar quando vim para cá – ele disse com a boca seca – Quando conheci você e me mostrou que havia mais do que eu imaginava. Às vezes nos esquecemos que outras pessoas fizeram as mesmas coisas que nós em algum passado longínquo. Pode parecer inútil, mas estou começando a pensar que não é.

– Bill, tome cuidado – ela disse segurando suas mãos nervosamente, dava até para ver seus tendões ficando brancos e seus olhos perderam um pouco do foco de repente – Sabe, apesar de não acreditar muito nos meus poderes de ler borras de chá, tenho medo de que seja um aviso.

– Não deve ser nada demais, Biene – Bill disse colocando suas mãos dentro dos bolsos de seu jeans. Ele abaixou seu olhar, como se não quisesse encarar os olhos azuis e límpidos dela. Talvez ele não quisesse prometer, ultimamente tudo andava tão confuso, que ele não sabia mais o que esperar – Eu já vou indo, não quero tomar o seu tempo. Só quero pedir que procure algo sobre os Baumgärtner para mim.

– Eu vou tentar, prometo – ela disse fazendo Bill ficar um pouco constrangido. Ela tinha coragem de prometer – Sei que existem muitas poucas informações, mas vou tentar ao máximo encontrar algo.

– Obrigado – ele disse sorrindo – Obrigado por se importar.

– Não é só por você – ela disse corando e ficando mais nervosa ainda – É por mim também.

 

– Que demora! Você foi fabricar as coisas? – Tom disse quando viu Bill chegar com as sacolas – Por onde você esteve?

– Decidi dar uma olhada na cidade, não tinha nada melhor para fazer mesmo. Além de que eu não estava encontrando inspiração para escrever, precisava passar um pouco o tempo.

– Agora posso ir ao banheiro – Gustav disse rasgando o plástico do papel higiênico, pegando um e correndo.

– Ele ficou apertado o tempo todo, esperando você chegar – Georg disse rindo enquanto pegava uma latinha de coca-cola e abria – Quase fomos atrás de você, pensando que tinha acontecido algo.

– Estou bem, não morri, estou sã e salvo. Vou descansar um pouco se não se importam e espero que não acabem com o que eu comprei logo – Bill disse lançando um olhar reprovador para eles enquanto caía fora da cozinha.

A verdade era que ele teve uma ideia. Ele havia percebido que suas visões e sonhos eram despertados quando encostava ou via algo significativo, além de que bastava dormir para que os sonhos o dominassem. Ele queria realmente saber o que estava acontecendo, mas não sabia que direção seguir e para descobrir, precisava mais daquelas visões.

Bill foi para o seu quarto, preparado para fazer da maneira mais comum, dormindo. Deitou-se em sua cama e fechou os olhos, pensando o máximo possível no que queria. Ele queria respostas, queria verdades, algo que mostrasse por que ele andava tendo aqueles sonhos. Mas quanto mais tentava dormir, menos conseguia.

Talvez não fosse fácil assim, ele não entendia muito bem como acontecia, mas pelo visto teria que ter uma hora certa para que as visões ocorressem. Decepcionado esse levantou e foi até o banheiro, queria tomar banho antes que escurecesse e ficasse muito frio. Além de que depois de uma ducha, seu corpo iria ficar mais relaxado e quem sabe conseguisse dormir.

Debaixo do chuveiro quente, ele sentiu toda a preocupação se esvair. Sua cabeça parecia tão lotada de pensamentos e preocupações e agora sentia que elas estavam indo junto com a água para o ralo. Por um momento passou por sua cabeça que ele podia voltar para sua casa em Hamburgo e se esquecer de tudo, mas parecia uma ideia tão ruim. Ele só estava vendo o seu lado, afinal os outros pareciam estar se divertindo e precisavam daquele tempo só para eles.

E quem sabe, não era tão ruim assim descobrir o que suas visões tinham a dizer. Ele já começara a aceitar a ideia que podia ter algo a ver com espíritos atormentados, mesmo achando isso meio estúpido. Por que não havia outra explicação para o que estava acontecendo, a não ser que ele partisse para uma explicação científica. Mas mesmo assim, talvez não achasse as respostas corretas.

Depois de quase meia hora debaixo do chuveiro, Bill saiu muito mais calmo, se secou e colocou a toalha em volta do seu corpo enquanto dava uma olhada no espelho totalmente cheio de vapor por causa do chuveiro quente. Ele passou seu braço pela superfície gélida do espelho para limpá-lo, então em vez de ver o seu rosto, viu o de William Baumgärtner.

– Seu idiota! – a imagem no espelho disse, olhando desdenhosamente para Bill, com aqueles olhos escuros – Você não pode deixá-la morrer! Não a perca de vista!

Então antes que pensasse, Bill deu um soco no espelho para acabar com aquela visão, para tentar tirá-lo de sua cabeça. Mais cacos jorraram da moldura, igual à rica porcelana de Biene, só que dessa vez eram milhões de pedacinhos refletindo o banheiro, Bill e o sangue vermelho que jorrava de sua mão.

Havia um corte profundo nas costas de sua mão, próximo aos dedos, onde um sangue quente e vermelho escuro escorria pelo seu braço. As gotas empapuçavam o chão com sua coloração forte, manchando todo o piso e formando uma linha ondulada e comprida. Bill olhou para o chão, achando estranha a forma que seu sangue formava, mas nada parecia coerente, principalmente agora que sua cabeça latejava e que o corte ardia.

Correu o mais rápido para o seu quarto, para achar a caixa de primeiros socorros que mantinha junto com suas coisas desde que passaram mal em uma viagem de longas horas. Ali havia um pouco de gaze e álcool, talvez fosse o suficiente para estancar o corte, não queria preocupar os outros nem queria ir para um hospital. Não podia chamar atenção.

Mas enquanto tentava limpar o corte, suas mãos tremiam demais. O que William dissera, estava ecoando na sua cabeça. “Você não pode deixá-la morrer! Não a perca de vista!”. O que isso significava? Ele não fazia ideia de quem se tratava, nem quem ele deveria evitar que morresse. Agora ele estava mais confuso do que antes e sabia que Biene estava certa. O perigo estava próximo.


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