Caminho das Centelhas escrita por Sir Rail Zeppelin


Capítulo 33
Sobre Torneio e o Passado parte 3 - Ixchel




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 “Adoramos a perfeição, porque não a podemos ter; repugná-la-íamos se a tivéssemos. O perfeito é o desumano porque o humano é imperfeito.” 

 

“Você deve ser perfeito!” 
 
“Não envergonhe o nome da sua família. Faça melhor do que o seu melhor.” 
 
“Perder não é uma opção, não para nós da família Kamanu.” 

“Ixchel, você não tem tempo para brincar, despeça dessas crianças e vamos, você precisa treinar” 
 
“Ixchel, se não for aceito da academia Yata, não precisa nem voltar do teste para casa, vá para uma sarjeta qualquer e fique lá!” 
 

Não houve se quer um momento da minha vida, do qual eu não fui pressionado pelos meus pais, parentes próximos e distantes e até amigos. Nascer numa família de renome como a Kamanu, não é uma grande benção como todos imaginam... na verdade, é o pior pesadelo para qualquer pessoa que só quer ser normal. 

Eu realmente achei que após ser aprovado na academia, às coisas mudariam. Pelo contrário, a sombra das expectativas da família Kamanu parecia se estender ainda mais sobre mim. Na academia, eu era constantemente lembrado da grandeza de minha família e das responsabilidades que recaíam sobre meus ombros. Os professores esperavam mais de mim, meus “colegas” me viam como um competidor implacável, e as noites eram preenchidas com estudos e treinamento rigoroso. A pressão era esmagadora, foi nesse momento que comecei a me questionar se algum dia conseguiria escapar das garras da minha família. 

Durante reuniões que minha família fazia. Reuniões essas que envolviam fornecimento de magos do nosso clã que ajudariam em conflitos e coisas do tipo, tudo por dinheiro, normalmente havia uma família que se dava muito bem com a minha. Os Mazenta, mesmo sendo de outro reino, eles sempre se deram bem com a minha. Às vezes, contratos de exércitos particulares eram fechados em conjunto com os Mazenta e os Kamanus. Numa dessas reuniões, eu a conheci. Luise Mazenta, uma jovem encantadora com olhos que brilhavam de vivacidade, cruzou meu caminho. Luise e eu nos encontraram várias vezes nas reuniões familiares, e logo percebi que ela era diferente. 

Apesar de sermos de famílias de vertentes totalmente diferentes, sendo a minha de magos e a de Luise de cavaleiros. Luise, estava sujeita às mesmas pressões em relação à perfeição. Ela vinha de uma família que se destacava na formação de cavaleiros, uma das mais temidas cavaleiras da nossa época Melissa Mazenta. E embora tivesse suas próprias expectativas a cumprir, seu sorriso caloroso e personalidade acolhedora eram um alívio. 
  À medida que os encontros se tornavam mais frequentes, Luise se tornou alguém em quem eu podia confiar. Compartilhávamos nossas histórias de famílias exigentes e expectativas esmagadoras. Luise entendia o fardo que eu carregava, e sua presença proporcionava-me um escape momentâneo das pressões que enfrentava na Academia Yata e em casa. 

Enquanto a amizade entre mim e Luise crescia, os sentimentos também começavam a se transformar. Eu via em Luise não apenas uma amiga, mas alguém que entendia minhas lutas e o me fazia sentir humano, não apenas um produto da família Kamanu. 

“O tempo de brincar, acabou”, foi o que ouvi de meu pai quando às academias anunciaram os anos letivos. Luise retornou para Aúdases, para a academia Thunderbird, enquanto eu fui para Yata. Eu prometi que daria meu melhor por ela, por mais que a relação abusiva com meus pais continuasse me tratando como uma mercadoria, um investimento que deveria ser moldado para atender às expectativas da família. Não havia amor ou carinho, apenas a constante pressão para ser melhor, para alcançar a perfeição. Eu não ligava, era pela Luise que eu faria aquilo. 

No dia do combate livre de Thunderbird, eu estava lá, eu fui torcer por Luise, tudo bem que ela não ganhou, mas ver ela lutando por ela e não pela família, me deu novas esperanças. Retornei sem nem ao menos dizer oi para ela, afinal eu não conseguiria a encarar daquele jeito, ela lutando por si enquanto eu estava tentando agradar algum amontoado de pessoas. Eu retornei e treinei, treinei e treinei. Ganhei ótimas posições no combate livre de Yata. E quando fui até Thunderbird para dizer isso a Luise, ela não estava, disseram que ela estava doente ou coisa do tipo, mas os boatos é de que ela estava em missão pela guilda em Zetsuen. Tudo bem, eu esperei seu retorno, voltei a Yata que estava se preparando para o Torneio Fronteira. Como um dos melhores, eu fui um dos 13 selecionados. Quando soube de seu retorno, imediatamente peguei um trem até Thunderbird, para a encontrar, era noite. Eu a vi no para peito de um Zeppelin com outro garoto, acho que foi aí que tudo mudou. Ela seguiu em frente, ela achou uma pessoa que era confiante? Diferente de mim que não tenho um pingo de confiança! 

Não pode ser assim, tem que mudar. Eu decido quando vou fazer algo, e quando não vou. A partir de agora, eu é quem vou mandar na minha vida. Como mago invocador fiz vários contratos bons, com criaturas ótimas que meu clã forneceu, mas me abdiquei de todas elas, só para poder fazer contrato com ele. Tameemon!  

Naquele dia, durante um exercício de sobrevivência na Academia Yata, que me levou a uma caverna desconhecida, encontrei a estátua de Tameemon. Nesse mesmo dia, ouvi uma voz, a voz de Tameemon ecoar na minha mente. "Você estaria disposto a largar tudo para começar de novo?" A resposta era clara. Eu ansiava por uma nova chance, uma oportunidade de me libertar das expectativas da minha família e encontrar meu próprio caminho. Abdicando de todas as minhas invocações e poderes anteriores, aceitei o desafio de Tameemon e fiz um contrato com ele.  

Eu prometi para mim mesmo que mostraria a Luise que eu também não havia desistido. Mesmo que Luise não estivesse participando do torneio, eu queria que ela visse a mudança. Com Tameemon como aliado, não tem pra ninguém. Então, por mim, por ela, por essa promessa. Eu não vou perder aqui... 

 

—NÃO VOU PERDER AQUI NEM A PAU! 
—NÃO VOU PERDER AQUI NEM A PAU! 

 

Ambos dizem ao mesmo tempo, Kurosaki enquanto avança em direção a Ixchel e Ixchel enquanto faz sinais de mãos. Os restos de Tameemon no chão começam a se fundir a Ixchel, formando uma espécie de armadura de pedra com agora seis braços, enquanto os braços de Ixchel ficam imoveis tentando canalizar algo, os braços de Tameemon são os que agem na luta. Esse não era o campo de Ixchel, seu forte não era luta corpo a corpo, mas ele não podia parar, não poderia desistir, não agora. Kurosaki já estava em seu limite, mesmo em ESTADO DE FLOW, há limites para o corpo humana aguentar. 

Uma saraivada de socos vem da parte de Kurosaki, fazendo pouco a pouco a armadura de Ixchel ceder, apesar da pouca proficiência dele em combate, Ixchel consegue acertar alguns golpes em Kurosaki, nada muito sério... mas por algum motivo, isso começa a mudar, Ixchel começa a ter uma habilidade fora do comum com combate corpo a corpo, acertando golpes cada vez mais precisos, soco atrás de soco, chute encima de chute, para cada golpe de Kurosaki, uma defesa perfeita, para cada ataque de Ixchel um hematoma diferente surgia em Kurosaki. 

Kurosaki começa a se perguntar, como é possível alguém aprender a lutar assim do nada? A verdade é que às muralhas, nunca caíram, elas ainda estão drenando Kurosaki. E drenaram dele a maestria de combate e passaram para Ixchel! 

—Eu disse que eu não perderia, eu não posso perder, minha promessa... meu caminho. Eu vou ganhar, essa é a segunda parte da habilidade do Tameemon. A segunda parte da habilidade "Palmas da Criação" de Tameemon acrescenta um elemento que vai acabar com você. Em momento algum eu precisava deixar minhas mãos desprotegidas, poderia ter as colocado dentro da armadura de pedra criada a partir do corpo de Tameemon, mas decidi que às usaria para ativar a segunda etapa. Minhas mãos se tornam imãs ao contrário, elas repelem umas às outras, mas com esforço eu posso aproximá-las. À medida que as mãos se aproximam uma da outra, o tempo é crucial. Demora cerca de 20 minutos para que essas duas mãos se encontrem completamente, mas cada vez que o fazem, um poder é desencadeado. Quando as duas mãos de Tameemon se encontram, ele concede a mim a capacidade de desativar temporariamente um dos sentidos do meu oponente. Nesse caso, resolvi agir com às minhas mãos, mas seria uma quebra das regras dos poderes né? Então porque não me tornar Tameemon? Foi por isso que ele se tornou minha armadura, assim, eu posso usar minhas próprias mãos.  

Esse é o tempo que Kurosaki tinha antes de começar a perder todos os seus sentidos um a um. Não era mais tempo de estratégias, planos nem nada. Ou ele ganha no soco agora, ou ele lutou até aqui pra nada! 

Kurosaki começou a notar que sua visão estava ficando turva. Um véu escuro começou a se espalhar sobre seu campo de visão, obscurecendo o mundo ao seu redor. Ele piscou repetidamente, tentando afastar o efeito, mas a escuridão persistia, insinuando-se em sua percepção. 

—Parece que já começou a perder os sentidos – diz Ixchel com às mãos juntas – Me diz, como é ficar cego? Não importa, não vai ser apenas isso que você vai perder hoje. 

Ixchel volta a separar às mãos e tentar juntá-las novamente, mais 20 minutos seriam necessários para que ele consiga remover outro sentido de Kurosaki.  

Para ixchel, a armadura de pedra fortalecida com os restos de Tameemon aumentou sua ferocidade, cada golpe desferido com uma precisão mortal. Kurosaki, lutando para se adaptar à perda repentina de sua visão, confiou em seus instintos e memória muscular para revidar, mas a ofensiva implacável de Ixchel o forçou a ficar na defensiva.  

Após a perda de sua visão, Kurosaki se viu mergulhado em uma escuridão total. No entanto, ele não se deixou abalar, pois sua mente estava em um estado de fluxo que transcendia as limitações físicas. Seus ouvidos aguçados captavam cada movimento e respiração de Ixchel, transformando o som em um mapa sensorial do campo de batalha. Esse era o máximo do seu ESTADO DE FLOW! 

Cada passo de Ixchel, cada movimento de seus braços de pedra, cada respiração ofegante se tornou uma pista para Kurosaki. Ele não precisava mais enxergar; sua audição aguçada tornou-se uma arma. Com uma destreza extraordinária, ele antecipava os ataques de Ixchel e respondia com precisão, transformando a luta em uma dança mortal no escuro. Kurosaki estava agora lutando quase de igual para igual, apesar de suas deficiências. Ixchel, por sua vez, começou a sentir a pressão da situação, uma vez que Kurosaki se adaptava rapidamente à sua nova condição e tornava a batalha mais equilibrada. A escuridão não era mais uma desvantagem para Kurosaki, mas sim uma aliada que o fortalecia.  

—Porque você simplesmente não desiste, é irritante demais! 
—Não posso desistir, tenho que dar meu melhor mesmo estando na pior... outra frase que meu pai sempre me disse; Isshoukenmei ( 一生懸命 - Fazer o seu melhor durante toda sua vida) 

 

Novamente, a luta começava a pender em vantagem para Kurosaki, Ixchel se perguntava, como alguém que nem poderes tinha, estava ganhando? Com a força dos punhos, a armadura começou a se rachar mais e mais, o resultado já está muito próximo de sair! Enquanto Kurosaki continuava pressionando, um sorriso frio se formou nos lábios de Ixchel ao perceber que o efeito da "Palmas da Criação" de Tameemon havia ativado novamente, suas mãos novamente se juntaram! 

Já estava complicado tendo que lutar sem sua visão, Kurosaki se adaptou como pode, lutando utilizando sua audição, mas quando novamente ele ouve às palmas de Ixchel, ele já sabe qual vai ser o sentido que perderá.  

—Acho que você não vai mais escutar agora seu maldito. Vira a porra de um surdo e me dá logo a vitória 

Todos os barulhos, mesmo naquele lugar, davam para ouvir do outro lado da cidade pessoas gritando, empolgados com várias lutas diferentes que estavam ocorrendo. Todos esses sons... sumiram! Agora Kurosaki, já não enxergava e nem mesmo ouvia. O que dava para fazer? 

—E agora? Vai fazer o que? Me fala? Ah, foi mal, esqueci que agora você não escuta mais! 

Sentindo a vantagem, Ixchel concentrou seu poder, seus punhos se tornando um borrão enquanto se moviam com uma velocidade que desafiava a percepção. Kurosaki, lutando para se adaptar à perda de visão e audição. Não tinha mais escapatória, agora era só aceitar a derrota! Incapaz de acompanhar os movimentos de Ixchel, só restava a ele resistir aos impactos. Os impactos dos ataques de Ixchel ecoaram por todo o lugar, cada golpe enfraquecendo ainda mais Kurosaki. O desespero começou a se enraizar em sua mente enquanto ele lutava para manter o equilíbrio, os sentidos restantes se tornando turvos sob a pressão esmagadora de Ixchel. Uma sensação de opressão cresceu dentro de Kurosaki. 

Kurosaki estava agora completamente mergulhado na escuridão e no silêncio, sua visão e audição roubadas por Ixchel através do poder de Tameemon. O que antes era uma luta acirrada transformou-se em um desafio desolador. Ele estava privado de seus sentidos, um estado de total privação que poderia ter deixado qualquer um em desespero.  

—Agora, é tudo ou nada – diz Kurosaki, mesmo sem poder ouvir uma resposta, é como se falasse para sim mesmo 

Kurosaki, cegado e privado de sua audição, recorreu a um novo estilo de luta. Ele estendeu sua língua de forma constante e rápida, como se buscasse capturar informações sobre seu ambiente e seu adversário. Cada movimento preciso da língua o ajudava a rastrear a presença e os movimentos de Ixchel. O tato, o último sentido que ele podia contar, era através dele que iria vencer, captando partículas no ar, seja de poeira, pedaços de rochas, sentindo o gosto através do ar e sabendo onde está. No tudo ou nada, Kurosaki vai lutar assim como uma serpente! 


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