Stella escrita por Vic


Capítulo 30
Amuleto da sorte


Notas iniciais do capítulo

Bom dia! Sim, eu sei que passei mais um sábado sem postar capítulo novo, mas a criatividade tem dessas coisas... nem sempre vem quando a gente quer.
Espero que vocês gostem desse capítulo, ele vai deixar o coração de vocês muuito quentinho.
Boa leitura!


CAPÍTULO REVISADO



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— Sim, eu deixei a Stella na clínica ontem à noite, mas sem ela aqui eu estou meio perdido. – Confessou com a voz rouca de sono enquanto pegava algumas fraldas e levava até a bolsa que estava em cima da mesinha. A noite não tinha sido das mais fáceis, um dos dentinhos de Lily estava nascendo e ela passou quase a noite inteira chorando. E para piorar ainda mais a sua situação, ele teria que levar ela ao supermercado com ele, porque era o dia de folga de Kate e Judy só chegaria depois do almoço. – Eu preciso da manhã para ficar com a Lily, então peça ao Danny para assumir os meus casos mais urgentes e deixa que eu me viro com o resto.

— Mas você não tem uma babá? – Lindsay perguntou, deixando todo o seu mau humor transparecer em sua voz.

— É claro que tenho, mas hoje é o dia de folga dela e a Judy só chega depois do almoço. – Enfiou uma boa quantidade de fraldas no fundo da bolsa. – E eu ainda tenho que explicar umas coisinhas para ela. – Ouviu o suspiro dela e começou a mordiscar os lábios. – Será que você pode me fazer esse favor, por favor?

Ele virou a cabeça ao ouvir batidas à porta.

— Tudo bem. – Outro suspiro escapou dos seus lábios. – Então pode deixar comigo.

— Muito obrigado. – Agradeceu, encerrando a ligação e colocando o telefone em cima da mesinha.

— Vamos ver quem é? – O bebê bocejou, deixando a sua cabecinha descansar no ombro do pai enquanto ele caminhava em direção à porta. – Quem será?

— O homem que vai resolver todos os seus problemas chegou! – Sage anunciou com muito entusiasmo, arqueando a sobrancelha ao vislumbrar toda aquela bagunça que estava espalhada pela sala. – E na hora certa, pelo visto.

— Eu posso saber o que você está fazendo aqui? – Umedeceu os lábios e coçou a cabeça enquanto tentava entender o que estava acontecendo. O outro homem não respondeu nada, apenas pegou a mala do chão e entrou na casa. – E por que trouxe essa mala?

— Eu estou aqui para te ajudar, e sem ofensas, mas parece que você está precisando muito. – Explicou, fazendo uma careta, como se a pergunta tivesse realmente o ofendido, e colocou a mala em cima do sofá. – Eu vou me mudar para cá e ficar com vocês até a sua mulher voltar para casa. – Tirou a mochila das costas e colocou ao lado da mala. – Vamos ser só nós dois, amigo. – O sorriso em seu rosto aumentou enquanto ele tirava a menina dos braços dele e a erguia no ar. – Dois homens e um bebê. – Arrumou a criança nos seus braços. – Oi, garotinha.

O homem não podia negar que tinha ficado muito surpreso com a novidade, mas também não podia negar que achava aquilo uma péssima ideia. Lily tinha sofrido tanto naqueles últimos meses, não precisava de mais alguém perdido tentando cuidar dela.

— Eu não quero que você interprete isso do jeito errado... estou realmente muito comovido com esse seu gesto, mas... – Esfregou a barriguinha do bebê pela última vez, certificando-se de que ela havia realmente pegado no sono, e então se levantou para encarar o amigo. – Mas ainda acho que se mudar para cá... é meio... estranho. – Encarou o chão quando o outro fez uma careta para ele. – Eu sei me virar muito bem e também tenho muita ajuda.

O outro passou o olho na sala e abriu os braços.

— É mesmo? – Umedeceu os lábios. – E onde é que está esse povo todo?

— Muito engraçado. – Revirou os olhos com uma expressão de tédio estampada em seu rosto cansado. – A Kate está de folga hoje, mas a Judy chegará aqui depois do almoço, e eu sinceramente acho que consigo me virar até lá... está tudo sob controle.

— Uhum. – Soltou uma risada. – Mas não é bem isso que está parecendo... parece mais que passou um furacão por aqui e... – Levou o indicador até a mancha na camiseta dele e em seguida o colocou na boca. – A papinha de maçã vai te dar um ar muito profissional quando você for falar com os parentes de alguma vítima.

Ele não disse nada, simplesmente passou pelo amigo, indo pegar alguns lenços umedecidos na bolsa para tentar limpar aquela mancha.

— Você tem algum plano?

— Mas você tem?

— Então... – Hesitou ao encarar o outro enquanto ainda tentava limpar aquela maldita mancha. – Você mesmo me disse que não tem muita experiência com bebês...

— Mas você também não tinha... – Rebateu, abaixando a cabeça. – Antes da Lily...

— Mas é justamente essa a questão. – Começou a esfregar a mancha com um pouco mais de força em um lugar onde ela parecia estar mais seca. – Eu sou muito mais experiente que você e mesmo assim ainda me sinto meio perdido. Eu nem tinha notado como sou ruim nisso, até que acordei essa manhã e percebi que a mãe dela não estava mais aqui. O ponto é que a minha filha não precisa de mais um amador tentando cuidar dela.

— Mas dois amadores são iguais a uma pessoa quase competente.

Um grito irrompeu direto de dentro do cercadinho e o pai instintivamente virou naquela mesma direção no exato momento em que a sua filha ergueu os bracinhos e as perninhas, aparentemente acordada.

— Ah! – Um suspiro de frustração escapou dos seus lábios enquanto ele deixava o lenço sujo em cima da mesa e corria na direção da criança que já havia começado a resmungar, então se agachou ao seu lado, voltando a esfregar a sua barriguinha. – Agora isso está começando a ficar realmente complicado.

— Viu? – Abriu um sorriso convencido. – É exatamente por isso que você vai precisar muito da minha ajuda. Eu sei que essa coisinha tem você, mas eu também posso ajudar a cuidar dela... e eu também sei que não tenho muita experiência no assunto, mas estou disposto a aprender, e quem sabe assim ela não sinta tanto a falta da mãe.

Will virou o pescoço na direção dele.

— Então você quer mesmo fazer isso?

— Eu sei que não chego nem aos pés da Stella, mas acho que ela também ficaria muito feliz em saber que estou tentando ajudar a filha dela.

— Hum... – Um sorrisinho surgiu no seu rosto e ele olhou para a menina novamente, flagrando o exato momento em que ela colocou o pé na boca e resmungou algo parecido com “pa”.

— Eu quero muito poder ajudar em alguma coisa...

— Olha... – Levantou e olhou no fundo dos olhos do amigo enquanto a criança no cercadinho continuava tentando formar uma palavra. – Eu ainda acho que você vai acabar se arrependendo disso, mas se está mesmo falando sério... então saiba que essa é uma ótima oferta e eu aceito.

A impressão que ele tinha era de que dava para ouvir o choro da filha a quilômetros, ela estava quase sem fôlego quando o seu pai abriu a porta, jogou as compras no sofá e correu para tirá-la do cercadinho.

— Oi, querida. – Lily estava mordendo um pedaço de cenoura com casca e tudo, e isso só podia significar que aquele seu choro era de fome. – Tudo bem? Vem aqui. – O seu choro cessou assim que o seu pai a pegou no colo. – O papai está aqui.

— Como você fez isso?

— Mágica. – A ironia continuou pairando no seu tom de voz. – Mas por que a deixou chorando desse jeito? – Tentou não ser muito rude, mas odiava ver a filha chorando daquele jeito. – Será que você pode esquentar uma mamadeira de leite para ela? – A criança continuava tentando arrancar um pedaço da cenoura com os seus quatro dentinhos. – Ela está com fome.

— Eu estava mesmo tentando encontrar alguma coisa para ela comer... – Coçou a nuca ao perceber que aquele pedaço de cenoura era duro demais para os dentinhos de uma garotinha de oito meses. – Mas não tinha quase nada nessa casa, eu sinto muito.

— Tudo bem, vá esquentar o leite dela. O leite está em uma das sacolas. – O outro procurou o leite dentro das sacolas e saiu correndo para a cozinha assim que encontrou. – Esquente um pouco, mas não muito quente. – Beijou a testa da filha, que olhou para seu rosto com alegria. – Você gosta de cenoura, meu amor? – Alguém bateu à porta e eles foram abrir. – Ok, vamos ver quem é?

Jas chegou a abrir a boca para dizer "oi", mas Sage a interrompeu erguendo as mãos para o céu e soltando um longo suspiro de alívio.

— Oh! Muito obrigado por ter enviado esse anjo.

A mulher segurou o riso e fechou a boca.

— Anjo, é? – Arqueou a sobrancelha e soltou uma risadinha. – Estou lisonjeada. É o horário da minha pausinha, então resolvi dar uma passadinha aqui e ver como vocês estão.

— Você precisa ajudar a Lily. – Uma expressão de angústia surgiu no rosto dele. – Eu não sei como a coitadinha vai sobreviver até a mãe dela voltar.

Will cutucou a amiga com o cotovelo.

— Ele é muito amador.

Enquanto ele terminava de preparar a mamadeira da menina, os outros dois começaram a arrumar a bagunça da sala e também terminaram de arrumar a bolsa para que Lily e Sage saíssem para passear um pouco.

— Prontinho. – Jas enfiou a última fralda dentro da bolsa e entregou nas mãos dele. – Agora você está pronto para dar uma voltinha com ela.

— Mas você tem certeza que está tudo aqui? – Encarou a mulher com um semblante de desespero. – Cobertor, comida, fraldas extras...?

— Mas você não vai passar doze anos fora, cara. – Ele repreendeu o amigo usando um tom de riso enquanto terminava de arrumar a filha dentro do carrinho. – É só uma voltinha no quarteirão e pronto, são no máximo uns doze minutos.

— Mas e se acontecer alguma coisa nesses doze minutos? – O desespero na sua voz provocou uma risada na mulher. – E se... eu sofrer um mal súbito ou alguma coisa do tipo?

— Não vai acontecer nada disso.

— Mas não se preocupe. – Jas completou, rindo da expressão que ele estava fazendo. – Se acontecer alguma coisa com você, buscaremos o seu corpo.

— É, pode ficar tranquilo. – Will também entrou na brincadeira. – Eu acho que você vai até gostar de se atrasar um pouquinho.

— E o que isso quer dizer?

— Todo mundo sabe que bebês chamam muito mais a atenção das garotas do que os cachorros. – Explicou enquanto a mulher ria. – Mas nem inventa de dizer que ela é sua filha.

— Eu sou um cara negro, irmão. – Respirou fundo. – Bebês chamam mais a atenção das garotas do que os cachorros. – Repetiu aquilo como um mantra enquanto o pai da menina abria a porta. – Vamos nessa, querida. – Empurrou o carrinho em direção a saída. – Vamos arrasar.

A mulher deu uma boa gargalhada quando ele fechou a porta.

— Você não tem noção do que acabou de fazer com essas pobres coitadas. – Colocou as mãos na cintura, observando a expressão do amigo mudar. – Você está bem?

Ele negou com a cabeça.

— Não muito.

Jas mordiscou o lábio inferior e entrelaçou os dedos uns nos outros.

— Saudades da Stella?

— É... estou. – Sentou ao lado dela. – Foi só uma noite, mas parece que a ausência dela já preenche a casa inteira... e eu sinto que tudo isso é culpa minha...

— Culpa sua?

— Eu devia ter ajudado ela, Jas. Eu sempre achei que podia ajudar todo mundo... mas não consegui fazer nada para ajudar a minha mulher...

— Não, para com isso. – Respirou fundo, colocando uma mecha do cabelo atrás da orelha. – Eu não vou deixar que faça isso consigo mesmo. Eu estava aqui e vi o quanto você se esforçou para fazer com que ela se sentisse bem. Você tentou fazer ela tomar os remédios, e só organizou uma intervenção quando as coisas começaram a ficar realmente muito complicadas. Todo mundo sabia que essa era a sua última opção.

Ele assentiu e abriu um sorriso, mesmo que não acreditasse muito naquelas palavras, sabia que a amiga estava dizendo aquilo do fundo do seu coração. Eles ficaram conversando por algum tempo, mas o celular dela acabou tocando e a arrastando de volta para o trabalho.

O homem andava de um lado para o outro no meio da sala, ainda havia algumas coisas espalhadas pelo cômodo, mas nada que ele não pudesse resolver em alguns minutos. Foi enquanto terminava de tirar o pó das coisas, que ele se deparou com o porta-retrato com a sua foto de casamento caído ao lado do abajur. Suas mãos tremeram quando ele o segurou e o encarou por uma fração de segundos antes que o seu amigo e a sua filha entrassem pela porta, tirando-o dos seus devaneios.

— Oh, cara! – A animação no seu tom de voz era evidente enquanto ele empurrava o carrinho para dentro de casa e trazia a menina em seus braços. – Você tinha toda a razão, andamos um quarteirão e as gatas começaram a aparecer! Um montão assim!

— Vai com calma, cara. – Os dois riram e ele diminuiu a distância que havia entre eles. – Esse é apenas mais um dos muitos benefícios de ficar com a Lily, não é, princesinha?

— Eu amei cada segundo, querida. – Segurou a sua mãozinha direita e a beijou. – Mas já estão precisando de mim no trabalho. – Concluiu, dando um beijo na testa da menina e a passando para os braços do pai. – Eu tenho que me arrumar correndo.

— Oi, meu amorzinho.

— Você é o melhor bebê do mundo. – Usou a mesma voz que Lindsay fazia quando falava com ela, e puxou os seus bracinhos para cima. – Eu te amo, sabia? Eu queria muito poder passar mais tempo com você, mas infelizmente o dever me chama. – Uma falsa expressão de tristeza surgiu no seu rosto. – Você é o meu amuletinho da sorte, sabia? E eu acho que vou até conseguir a minha vida social de volta. Tchau, eu te vejo mais tarde. – Beijou a testa da menina mais uma vez e saiu.

— Olha só. – Murmurou e sorriu para ela. – Bom trabalho, querida. Eu acho que você conseguiu mesmo ajudar o titio, não foi? – Olhou para o teto, imitando o gesto da filha. – Mas você não liga para nada disso, você só quer a mamãe de volta... e eu também.

Judy chegou pontualmente às 13h da tarde e ele saiu em disparada, estava muito atrasado e a cada minuto chegavam mais casos. O primeiro rosto que viu ao chegar foi o de Dante, ele esperava na sua sala e pela expressão no seu rosto o assunto era mesmo muito sério.

— Oi, cara. – Cumprimentou o amigo com um tapinha nas costas. – O que foi que aconteceu dessa vez?

— Eu preciso da sua ajuda. – Umedeceu os lábios. – Eu acho que temos um serial killer solto na cidade.

A pele do homem se arrepiou no mesmo instante.

— Mas do que se trata?

— Lembra daquele tiroteio na Maryel?

O homem colocou a mão na testa e forçou um pouco a memória, se não estava enganado, aquilo havia acontecido há quase dois meses.

— Lembro.

— Esse mesmo cara matou outras crianças em outros estados e até mesmo em outros países. – Engoliu em seco, a decepção também havia o atingido. – E precisamos dar um jeito de parar esse cara antes que o pânico tome conta da cidade. Os pais não vão querer mais levar as crianças para a escola enquanto esse cara estiver solto.

Ele deu um soco na mesa.

— Vamos pegar esse cara!

Um mês se passou sem que eles encontrassem pistas que os levassem até o atirador, e aquilo era extremamente frustrante. A cidade inteira aguardava um desfecho para aquela situação e nenhum deles era capaz de dar. Os seus outros casos também não estavam indo nada bem, o deixando cada vez mais frustrado, mas pelo menos um de seus casos estava perto de ser solucionado, conseguiria fazer justiça ao menos por uma de suas vítimas.

Outra coisa que estava tirando o seu sono era a ausência de sua esposa, mesmo conversando com ela pelo telefone quase todos os dias, ainda não era a mesma coisa que tê-la em casa. Lily estava crescendo muito rápido, era uma garotinha muito esperta e muito bonita. Acabou falando a sua primeira palavra enquanto ela e o pai assistiam uma corrida de carro.

— Car-ro! – Ela disse, esticando seu dedinho para apontar para a tela. E logo em seguida começou a bater palmas, orgulhosa do esforço que havia feito para dizer aquilo.

O seu pai também ficou muito orgulhoso, ela era a garotinha do papai e aquela era a prova definitiva disso, mas ele também ficou muito triste ao constatar que Stella não estava presente para ver isso, esperava que isso pudesse ser compensado quando a menina a chamasse de mãe pela primeira vez.

— Está chateado? – Sage perguntou ao parar ao lado dele com um copo de café nas mãos.

Ele tirou os olhos da tela do computador por um instante e olhou para ele.

— Sim, um pouco.

— É... foi exatamente isso que eu pensei. – Riu. – Aconteceu alguma coisa com aquela coisinha linda?

— Não. – Deixou o computador de lado e virou para olhar para ele. – A Lily está ótima. Eu queria te pedir um favor.

— Oh! Espera um minutinho, agora você me pegou de surpresa. – Acabou de beber o café e se alongou. – Está me pedindo ajuda? É isso mesmo que eu ouvi?

— Mas isso não tem nada a ver com o fato de você ter se mudado para me ajudar com a Lily.

— Mas você não ama ter ajuda em tempo integral?

— É claro que amo, e a Lily também ama o titio. – Sorriu. – Mas eu queria mesmo era saber se os resultados da necropsia daquela garotinha já chegaram.

Sage jogou o copo no lixo perto dali.

— Então é isso que está te deixando chateado?

— É... meio que estão me cobrando alguma resposta. – Encolheu os ombros, não aguentava mais tantas cobranças. – É por isso que eu queria que você fizesse umas ligações e tentasse conseguir algumas respostas...

— Mas eu não posso fazer isso, eu não sou o supervisor. – Negou com a cabeça. – Só você pode fazer isso. Não me põe nessa, por favor.

O homem assentiu meio a contragosto e admitiu a derrota.

— Eu dei uma olhadinha nos relatórios e acho que já tenho a sua resposta. – Sage apontou para a pasta que vinha trazendo nas mãos. – Isso aqui é horripilante, mas acho que você vai querer ouvir.

— Então diga.

— Há uma grande chance de que eu esteja certo. – Abriu a pasta. – E pelo que os vizinhos disseram, quando aquela garotinha nasceu a avó mandou a mãe entregá-la para a adoção porque não queria uma criança na casa, mas a mãe se negou a fazer isso e eu acho que foi justamente isso que acabou criando um clima ruim entre elas. E se a avó tiver colocado o bebê no forno para se livrar dela?

O outro homem fez uma careta e colocou as mãos na cintura.

— Olha... não temos certeza de nada disso, e esse é um palpite muito arriscado.

— Eu acho que devíamos trazer a avó até aqui para um interrogatório.

— Cara, não podemos simplesmente arrancar uma mulher da casa dela e perguntar se por acaso ela não cozinhou a neta dela viva. – Aumentou o seu tom de voz. – Precisamos de provas concretas.

— Eu não queria dizer isso, mas acho que você está com raiva e com saudades da sua mulher... – O outro passou por ele, não estava com a menor vontade de falar sobre aquilo. – Eu sei que se sente culpado, mas não deveria... não é culpa sua ela ter depressão pós-parto. – Ele finalmente virou para encarar o amigo. – Mas não estrague a melhor chance que temos de prender uma assassina. Eu sei que você não quer estragar as coisas... nem com a sua filha, nem com a sua esposa e muito menos com a sua carreira.

Mais algumas semanas se passaram e a ausência da mulher preenchia ainda mais a casa, era quase insuportável ficar lá sem ela, mas mesmo assim ele ainda tentava segurar as pontas da melhor forma possível. Ainda não tinha conseguido prender o serial killer, e temia nunca conseguir fazer isso. Sage estava certo a respeito de seu palpite sobre a avó da garotinha, ela havia mesmo cozinhado a neta no forno para se livrar de seu choro e de sua presença. A mulher foi julgada e condenada ao corredor da morte devido a brutalidade de seu crime, aquela sentença foi um alívio enorme para o supervisor, era como se tivessem acabado de tirar um peso enorme das suas costas.

Stella também sentia que um peso enorme havia sido retirado de suas costas. A internação tinha mesmo feito um bem enorme para ela. Ela estava tomando os seus remédios nas horas certas e a terapia em grupo tinha mudado sua forma de encarar aquela doença, era quase como se estivesse enxergando o mundo de uma perspectiva completamente nova.

— Oi, doutor. – Uma das mulheres cumprimentou o psiquiatra com um sorriso e todas sentaram-se em seus respectivos lugares.

— Oi. – Cumprimentou todas de uma vez e também se sentou. – Alguém quer compartilhar alguma coisa conosco hoje?

Elas olharam uma para a outra, mas não se manifestaram.

— Certo... – Stella começou. – Acho que vou começar. – As outras riram ao ouvir a risada dela. – Eu tenho ligado para a minha casa quase todos os dias para pedir para o meu marido ou para a minha babá colocarem o telefone no ouvido da minha filha para que eu possa dizer para ela que a amo. – Abriu um sorriso ao pensar nisso. – Eu não sei se ela me entende... eu acho que ela não me entende, e não é só porque ela é um bebê, mas também é porque eu nunca mostrei a ela que realmente a amo. – Abaixou a cabeça, olhando para os próprios pés. – E eu não sei o que fazer para compensar isso.

— Eu sei exatamente o que você está sentindo. – A mulher que estava ao lado direito dela disse. – Você devia amar aquela coisinha linda que está bem na sua frente... devia ser um momento mágico. Você passa tanto tempo olhando para aquelas fotos de mães super felizes com seus bebês nas revistas, e acaba não entendendo o motivo de não estar conseguindo se sentir daquele jeito.

— Eu fui criada acreditando que ser mãe era uma coisa instintiva... – A moça que estava de frente para ela também se encorajou e começou a falar. – E quando não consegui sentir isso... entrei em pânico.

— Eu olhava para elas e pensava: Nossa, elas conseguem amamentar o bebê delas. – A mulher que estava ao lado direito de Stella tomou a palavra para si mais uma vez, deixando um sorriso melancólico surgir em seu rosto. – Eu acho que foi nesse momento que a minha ficha finalmente caiu, porque eu não conseguia amamentar o meu filho, e para ser bem sincera, a amamentação foi a pior experiência do mundo para mim. Eu não conseguia me ligar a ele de jeito nenhum e também não tinha nada de mágico naquilo... toda vez que eu tentava amamentar, ele começava a chorar e a gritar.

— Eu olhava para aquelas fotos de mães com seus bebês e parecia tudo tão natural... mas ao mesmo tempo eu me sentia tão estranha quando segurava a minha filha no colo. – A mulher que estava sentada ao lado esquerdo dela disse. – Eu pensei que se eu pudesse ter o que elas tinham, ficaria tudo bem.

— Mas é exatamente isso que essa doença faz. – O doutor disse. – Esses sintomas são muito frequentes... mas diferem muito de pessoa para pessoa, não existem duas experiências iguais.

— E foi exatamente por isso que eu não consegui reconhecer. – A mulher que estava de frente para ele disse. – Eu só ouvia histórias terríveis a respeito disso.

Stella deixou um sorriso melancólico surgir em seus lábios.

— É muito difícil saber, não é?

— Eu pensei: Eu não matei o meu filho, mas a verdade é que a gente se engana muito pensando isso. A depressão pós-parto não é só isso...

— Mas se você admitir o que realmente está sentindo, as pessoas ao seu redor começarão a te olhar e a pensar: Oh, meu Deus! Então você é uma daquelas mães.— A mulher ao lado esquerdo dela levou a mão ao peito. – Então você tenta não pensar mais nessas coisas.

— Mas você também não quer que tirem o seu filho ou filha de você, então você acaba admitindo...

— Mas tem horas que você pensa que era melhor se eles fizessem isso mesmo. – A mulher sentada ao lado esquerdo dela completou. – Na maioria das vezes você acha que qualquer pessoa poderia ser uma mãe melhor do que você... e isso te deixa com muita vontade de chorar.

— Eu pensei que a machucaria...

— E eu nem entendia o porquê disso. – A mulher sentada ao lado direito dela lamentou. – Eu tinha uma carreira muito bem-sucedida... então como assim eu conseguia cuidar dos filhos dos outros e não conseguia cuidar do meu próprio filho?

— Eu acabei indo parar em Redfield. – Stella comentou. – E criei uma nova identidade...

— Eu tive um caso. – A mulher do lado direito dela confessou num sussurro. – Eu sei que a depressão pós-parto deveria tirar todo o meu interesse por sexo, mas eu me sentia tão triste e tão solitária... eu só queria estar com alguém que não me conhecia de verdade.

— Eu não queria nem ser tocada. – A mulher do lado direito do doutor confidenciou para o restante do grupo. – Eu estava tão infeliz e acho que o meu marido acabou percebendo isso, porque ele começou a me dizer para superar isso.

— Eu nem conseguia ver o problema. – A única mulher que ainda não tinha dito nada se manifestou. – Eu pensei que tudo o que estava acontecendo comigo era culpa minha.

— Um dia... – A mulher sentada do lado esquerdo de Stela abriu um sorriso tímido para ela e colocou uma mecha do próprio cabelo atrás da orelha. – Eu peguei uma daquelas revistas bobas que tinham fotos de mães com bebês, arranquei uma das páginas e disse para mim mesma que seguraria a minha filha exatamente naquela posição. Só para imitar a pose, sabe? – Sua voz embargou. – E então... comecei a pensar: Droga! Eu não conheço nenhuma canção de ninar e também não conheço nenhuma historinha de ninar. Então comecei a cantar uma música qualquer enquanto a beijava.

— Eu amo o meu marido e ele é um cara muito legal, mas ele não me entendia, então comecei a pensar: Oh, meu Deus! Se nem a pessoa que eu mais amo nesse mundo me entende... então estou mesmo sozinha nessa. – A mulher sentada ao lado direito do doutor desabafou. – Então comecei a achar que ninguém me entendia, mas o que mais doeu foi perceber que o meu marido não me entendia.

— Eu tenho muita sorte de ainda amar o meu marido. – Stella estava quase sussurrando. – E também tenho muita sorte de ainda estar apaixonada por ele.

A mulher do lado dela segurou a mão direita dela e abriu um sorriso radiante.

— Eu comecei a tomar os remédios alguns meses depois e eu admito que estava muito cética sobre aquilo... mas essa foi a melhor coisa que eu poderia ter feito por mim mesma.

— Essa foi a parte mais difícil para mim... – Stella entrou na conversa novamente. – Eu sou uma cientista, e eu sei exatamente o que eles fazem, mas também não queria aceitar que tinha que tomar... porque na minha cabeça, isso significava que eu estava falhando e que eu só conseguia ser mãe por causa dos remédios.

A mulher apertou a mão dela mais forte e perguntou:

— Mas você não pensou em parar de tomar, não é?

— Ah... não. – Abaixou a cabeça. – Eu sei que isso não é o certo... aprendi com os meus erros.

O doutor assentiu e sorriu para ela.

— Ótimo.

— Graças a Deus. – Stella ergueu as mãos para o céu e todas riram. – Eu nunca devia ter parado de tomar sem a sua permissão.

— É isso mesmo.

— Eu estava num lugar tão escuro, era como se eu tivesse uma venda nos meus olhos e foi tão ruim, tão assustador. – A mulher do lado direito do doutor murmurou. – Eu não queria mais me sentir daquele jeito.

— Eu não sei porque... e nem sei se isso é um avanço, mas eu sinto que a minha filha está bem. – Stella abriu um sorriso e viu as outras mulheres sorrirem também. – Ela está com o pai dela, e sei que é amada e... também estarei em casa muito em breve... eu fico ansiosa pensando no dia em que finalmente conseguirei segurá-la. – O seu sorriso se abriu ainda mais e seus olhos brilharam. – Eu estou muito animada!

— Isso é maravilhoso! – As outras concordaram.

O marido e a filha dela estavam prontos para dormir, mas o homem ainda queria passar um tempo conversando com o seu bebê e se certificando de que ela se sentisse parte do seu dia.

— Como foi o seu dia? – Will se sentou na poltrona ao lado do berço e acomodou a menina em suas pernas. – Eu espero que tenha sido muito melhor do que o do papai. – Beijou o topo da cabeça dela. – Espero que tenha sido muito melhor. Eu vou te contar um segredinho, tá? – Respirou fundo. – O papai não é um detetive tão brilhante quanto ele achava que era. – O bebê resmungou. – Tem muita coisa que eu não consigo fazer. – A criança deu um gritinho. – Sabe o que a mamãe diria se ela estivesse aqui? – Arrumou ela numa posição mais confortável. – Ela diria que eu tenho que acreditar mais em mim mesmo... diria que eu fiz o que pude e que não posso salvar todo mundo. Ela acredita em mim, e eu sinto muita falta disso. – Acariciou a barriguinha dela. – É... eu sinto muito a falta dela, você também, não é? Você sabia que ela me faz segurar o telefone no seu ouvido só para ela dizer que te ama? E ela te ama muito mesmo, é sério. – Beijou o topo da cabeça dela outra vez. – A mamãe está melhorando e logo logo ela vai voltar para casa e para nós... a família dela. – A menina esticou a mão e tentou tocar o rosto do pai. – É isso mesmo, princesinha. Seremos eu, você e a mamãe.

— Pa... – A menina continuava tentando tocar o rosto do pai. – Pa... – Repetiu, se esforçando ainda mais. – Papa. – Sorriu, mostrando os seus quatro dentinhos para o pai.

— É isso mesmo, Lily. – Também sorriu e lhe deu um beijo na testa. – Eu sou o seu papai.

Lily pegou no sono em alguns minutos, o homem se levantou com muito cuidado para não a acordar e foi ninando a filha até chegar no berço, colocando-a com muito cuidado dentro dele.

— Sabia que você é o meu amuleto da sorte, princesinha? – Sussurrou, inclinando-se sobre o berço para dar-lhe um último beijo na testa.


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Notas finais do capítulo

Eu tô morrendo de amores com esses momentos ♥.
Até o próximo!



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