Stella escrita por Vic


Capítulo 24
E se...?


Notas iniciais do capítulo

Bom dia, pessoal! Bem, consegui escrever mais um capítulo... deu um trabalhinho, mas está prontinho...
Espero que gostem, boa leitura!


CAPÍTULO REVISADO



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Retroceder é um instinto natural de todo ser vivo. Todo ser vivo tende a recuar quando se sente ameaçado ou quando alguma coisa não acontece do jeito que se era esperado. Stella estava na defensiva, mas a única coisa que ameaçava a sua vida era ela mesma. O seu marido não a julgava, ou pelo menos tentava não fazer isso. Ela era exatamente assim desde que a conheceu, devia ser mais um dos efeitos de ter sido criada num orfanato. Estar sempre tendo que se defender de tudo e de todos com tão pouca idade devia ser no mínimo estressante.

— Oi. – Ele a cumprimentou usando um tom muito baixo ao entrar no quarto.

A mulher estava acabando de arrumar suas coisas para voltar para casa, e pela cara que estava fazendo, não estava nem um pouco a fim de papo.

— Eu não sei porque eu tive que passar a noite aqui. – Reclamou enquanto tentava enfiar um casaco sobressalente dentro da bolsa. – Foi totalmente desnecessário. Tem tanta coisa para fazer em casa, aposto que tem uma tonelada de roupa para lavar. – Suspirou, odiava perder tempo. – Eu acho que devíamos contratar alguém para cuidar das coisas da Lily, seria uma coisa a menos para nos preocupar. – Riu enquanto terminava de fechar a bolsa. – Você odiou a ideia, não foi?

— Não. – Ergueu a mão em sinal de rendição. – Eu não odiei a ideia, só acho que você tem coisas mais importantes para se preocupar agora.

O psiquiatra sorriu para ela ao entrar no quarto.

— Boa tarde, Stella.

— O que você está fazendo aqui?

O homem lançou um olhar sugestivo na direção do outro.

— Você tem um compromisso.

— Eu não gosto de emboscadas. – Fechou a cara enquanto o seu médico deixava o quarto. – Essa ideia foi sua?

— E se tiver sido?

— Então por que não me interna de uma vez?

— Stella, não seja ridícula. – Diminuiu a distância entre eles. – Você sabe que tem um compromisso com essa doença e eu acho que devido às circunstâncias você não deveria perder mais tempo.

— E que circunstâncias são essas? – Cruzou os braços e franziu a testa. – Eu sofri um acidente ontem à noite, não tem necessidade nenhuma de chamar um psiquiatra para mim.

Ele respirou fundo e tentou usar o seu tom mais calmo.

— Será que você não percebe que precisa muito de ajuda?

— Mas isso é entre mim e o meu médico.

— Stella... isso é pelo seu bem, pelo meu bem e pelo bem da Lily... você tem que comparecer nas consultas.

— Ou o quê?

— Eu não vou cair nessa, Stella. – Continuou muito calmo, sabia que a mulher estava tentando encontrar um jeito de fugir do assunto, mas dessa vez ele não entraria no seu jogo. – Eu não vou deixar você me deixar com raiva para mudarmos de assunto.

Ela deu um passo para trás e olhou para a bolsa.

— Não precisa me obrigar a fazer isso.

— Ótimo. – Assentiu, satisfeito com a conquista. – Então me prova que você está mesmo comprometida com a nossa filha. – Virou as costas e saiu, deixando que o psiquiatra assumisse o seu lugar naquela conversa.

— Foi um acidente. – Foi logo se defendendo. – Mas é óbvio que você já tem uma opinião formada.

— Eu sempre tenho uma opinião formada a respeito dos meus pacientes.

— Eu me sinto como se estivesse numa espécie de caça às bruxas.

— E eu reconheço muito bem esse sentimento. – Aproximou-se um pouco mais dela. – Então por que não me diz o que você foi fazer naquele lago?

— Eu acho que você já sabe, mas eu vou te contar mesmo assim... – Cruzou os braços. – Eu fui lá só para pensar um pouco. Estava precisando de um tempo para pensar em tudo que você me disse e... tinha muita neblina e estava muito escorregadio... e eu caí. – Encarou o homem pela primeira vez desde que ele tinha entrado no quarto. – E o meu marido acabou me encontrando e me tirou da água.

— Você deu muita sorte.

Ela o encarou desconfiada, reconhecia aquele tom de voz.

— É, eu acho que deveria estar mais grata por isso. – Respondeu com muito desânimo. – Mas de qualquer forma... acidentes acontecem e eu me sinto muito melhor hoje. Acordei ansiosa para ir para casa e voltar para minha rotina. – Sorriu. – E também já até tomei os remédios que você prescreveu. – Fez questão de acrescentar esse detalhe. – Então acho que já posso ir para casa.

— Você tem um problema muito sério. – Esclareceu enquanto comprimia os lábios e a mulher o ignorava. – E precisa levar o tratamento a sério para lidar com ele... levar uma vida normal não é uma opção, pelo menos não até que se cure da depressão pós-parto. – Ela olhou para ele. – Mas você tem que se esforçar para dar certo. Isso não vai simplesmente passar.

— Pode ser que passe. – Murmurou. – Estudei as estatísticas.

Ele riu, aquela mulher era mesmo muito cabeça dura.

— Existem vários tipos de estatísticas. Você quer mesmo esperar para descobrir em qual delas você se encaixa?

— Olha... eu sei que tenho depressão pós-parto, sei que o que fiz foi errado e também sei que isso afetou muito o meu marido... até acho que ele também precisa de ajuda.

O homem abriu um sorriso.

— Terapia de casal é uma ótima ideia. E eu ficaria muito feliz em incluí-lo nas nossas consultas... ou então podíamos continuar sozinhos. A decisão é sua.

Stella não deu uma resposta definitiva e no momento não queria pensar no assunto, o seu desejo de escapar daquela situação a levou da sua casa direto para o seu local favorito na cidade. O marido até tentou convencê-la a passar um tempo com a filha, mas ela tinha outros planos. Ela olhou para o lago e então notou a presença do amigo, que estava de costas para ela e falava ao telefone.

— É melhor tomar cuidado. – Alertou. – Você também pode acabar escorregando e caindo na água.

Danny virou para ela e ensaiou um sorriso enquanto se aproximava.

— Eu pensei em ir te visitar no hospital.

— Então quer dizer que você já sabe o que aconteceu? – Ele assentiu. – Foi um acidente... o meu marido pulou na água e me puxou para fora. – Olhou para a água e sentiu um arrepio. – A neblina estava cobrindo tudo, estava tão escuro... e eu caí.

— Eu acredito em você.

— É tão bom ouvir isso.

— Eu sei que você se meteu numa confusão enorme... e eu quero que você saiba que eu vou te ajudar no que eu puder.

— Obrigada. – Abriu um sorriso tímido. – Eu sei exatamente o que eu tenho que fazer... só... não consigo fazer. Eu estava em pé bem aqui... – Começou a explicar o que havia acontecido na noite anterior enquanto parava exatamente no mesmo lugar onde estava no momento do acidente. – E o mais engraçado nisso tudo é que eu conheço esse lago como se fosse a palma da minha mão.

— Sim, mas você nunca teve depressão pós-parto.

A mulher cobriu o rosto com as mãos.

— Estou com muita dificuldade para me lembrar exatamente do que aconteceu... – Olhou para o amigo, esperando que ele dissesse alguma coisa. – Estou sempre tão cansada que acho que tive uma alucinação.

— E o que foi que você viu?

— Uma garotinha, ela estava bem aqui. – Lembrou-se do rosto da criança quando ela disse que a mãe não a queria. – Ela tinha uns dez anos, e também tinha olhos grandes e tão tristes... ela me disse que o pai dela era detetive. – Ele a encarou com preocupação. – Ela também disse que não tinha mãe... porque a mãe dela não a queria. – Ambos suspiraram, era muito difícil imaginar uma criança numa situação daquelas. – Ela disse que o nome dela era Lily.

— E você acha que imaginou tudo isso?

— Eu não sei, estou com medo... – Murmurou. – Eu tenho tanto medo da minha filha crescer achando que eu não a amo.

— Stella, ela ainda é só um bebê. – Tentou consolar a amiga. – Você ainda tem tempo para consertar isso.

— Eu sei que tenho. – Suspirou. – Mas eu amo a minha filha, Danny. Sempre amei, mas eu acho que talvez eu não devesse mesmo ser mãe.

— Você pode fazer o que você quiser, Stella. – Continuou tentando incentivar. – Você é uma das pessoas mais fortes que eu conheço.

Ela deu um longo suspiro, aquilo não fazia a menor diferença agora.

— E se eu não for mais? E se eu for só a pessoa que faz tudo que os outros querem que eu faça? – Virou as costas para ele. – Eu tomo os meus remédios, vou para a terapia e nada muda... e se todo esse pesadelo não tiver nada a ver com a depressão pós-parto? E se eu simplesmente não servir para ser mãe?

A conversa entre os dois durou horas, ela estava tão à vontade que nem queria mais voltar para casa.

— E é isso, está tudo absolutamente fora do meu controle... – Os dois sentaram-se no banco. – E isso é péssimo para uma maníaca por controle como eu.

— Certo. – Passou o braço por trás das costas dela. – E o que você acha que pode fazer para voltar a ficar no controle das coisas?

— Eu só não quero ser forçada a tomar antidepressivos. – Disse sem nenhum rodeio. – Eu até rasguei a minha receita. – O homem abaixou a cabeça, não concordava com essa atitude. – Eu só tomei porque o Will ficou me pressionando... e o Chad fez um discurso sobre os milagres da medicina. Eu odeio a ideia de ser dependente de um comprimido.

— Eu acho que eles foram feitos para serem usados por um determinado período de tempo. – Ela estava cansada de ouvir isso. – E eles também podem te ajudar muito.

— Mas você tomaria antidepressivos?

— Olha... – Arqueou a sobrancelha, ela sabia ser escorregadia quando queria. – Eu não tenho um bebê para cuidar... e a minha vida não está desmoronando. – Ela começou a rir. – O que foi?

— É que se o Will tivesse me dito isso, eu arrancaria a cabeça dele fora, mas é verdade e por algum motivo eu consigo aceitar isso quando vem de você.

Danny também riu.

— E sabe por quê? – Era uma pergunta retórica. – É porque você não gosta de pedir ajuda e eu não gosto de dizer aos outros o que eles têm que fazer.

— É por isso que nos damos tão bem.

Os dois riram.

— Então por que você não me diz o que está te deixando tão assustada?

Ela respirou fundo, encolheu os ombros e colocou as mãos nos joelhos, aquilo era uma coisa muito difícil de se dizer.

— E se o tratamento não der certo? E se...

— E se... – Ele começou a formular a pergunta por ela. – E se o que você está sentindo não for por causa da depressão pós-parto?

A mulher assentiu.

— E se eu não quiser ser mãe? – Indagou com a voz embargada. – E se... isso não tiver nada a ver com a depressão pós-parto? O que vai acontecer com a minha filha se eu não quiser ser mãe? – Levou as mãos à cabeça. – O que ela vai fazer? E se ela precisar do meu apoio e do meu amor?

— Você está se ouvindo? – Ele tentou olhar para ela, mas ela virou o rosto. – Você está preocupada com isso. Você quer que ela seja cuidada e amada... e é exatamente isso que todas as mães de verdade querem para seus filhos. – Ela olhou diretamente para o rosto dele. – Eu acho que você tem que continuar tomando os seus remédios e também acho que tem que continuar com a terapia, porque isso vale a pena.

Ela abriu um sorriso forçado, ainda não acreditava que a solução fosse tão simples.

— Quem é você e o que você fez com o Danny? – Riu. – O Danny que eu conheço não é muito de dar conselhos.

Ele também riu.

— Mas nesse caso ele precisou.

— Eu entendi tudo, cara. – Deu um soquinho no braço dele.

— Lembra de quando você me ajudava com a minha filha? – Mudou de estratégia. – Você era tão gentil, tão carinhosa e eu lembro que você a ninava para que ela dormisse. – Ela abriu um sorriso saudoso e abaixou a cabeça, se lembrava perfeitamente disso. – Eu nunca sabia o que fazer, mas você sempre sabia. Ela chorava e você a segurava no colo, sempre sabia exatamente do que ela precisava. – Aquelas eram boas lembranças. – Eu sei que tudo isso continua guardado aí em algum lugar e você precisa mostrar isso para a sua filha também.

— Eu vou tentar...

— Promete?

— Prometo. – Sorriu. – Muito obrigada.

Ele a envolveu num abraço apertado.

O marido dela tinha escutado quase toda a conversa, e quando os viu abraçados se sentiu como naquela noite em Redfield. Ficou observando por algum tempo e então decidiu ir embora, não valia a pena passar por isso novamente.

— É tão difícil assim encontrar uma pasta neste laboratório? – A irritação no seu tom de voz era evidente, ele não queria descontar as suas frustrações nos outros, mas era quase inevitável.

— Bom... – A moça começou a dizer enquanto evitava olhar para ele. – Cada um de vocês usa um sistema de arquivamento diferente, então meio que... não consigo saber o local exato em que elas foram arquivadas.

— Certo, mas volta lá e vê se consegue encontrar.

A moça saiu tão rápido que nem teve tempo para olhar para trás.

— Oi, isso tudo é por causa da Stella? – Lindsay colocou a mão no ombro dele e abriu um sorriso compreensivo, ela sabia que era muito difícil passar por uma situação como aquela.

— Não, a Stella está bem... – Ela conseguiu notar a ironia no seu tom de voz. – Ela até parece estar mais feliz.

Ela franziu as sobrancelhas numa careta.

— Então o que está te torturando?

— Olha... – Olhou para o rosto dela, pensando se ela merecia mesmo ouvir uma coisa como aquela. – Fui até o lago e encontrei a Stella nos braços do Danny... eu acho que estamos sendo traídos outra vez.

Foi só ele fechar a boca para o elevador se abrir e o assunto da conversa surgir na sua frente.

— Eu arriscaria dizer que não estavam falando de mim... – Aproximou-se dos dois. – Mas vocês ficaram muito quietos quando eu cheguei, então provavelmente estavam mesmo falando de mim.

— Você passou a noite em observação com hipotermia... então ainda não está em condições de trabalhar hoje. – Will colocou as mãos nos bolsos. – Vá para casa, você deveria...

— Que solução ótima! – Cruzou os braços. – É só me expulsar do laboratório, aí você vai poder continuar falando sobre a minha vida com a Lindsay. – Concluiu dando dois tapinhas no ombro da amiga, que permaneceu com a cabeça abaixada.

— A Lindsay é nossa amiga e ela é ótima. – Saiu em defesa da amiga. – Ela não merece ser tratada desse jeito.

— Mas é claro... – Olhou de um para o outro. – A Lindsay é uma super mãe e isso é tudo o que você sempre quis...

— Ótimo. – Lindsay disse com a voz trêmula. – Só estamos tentando te dar o benefício da dúvida, sabemos que está doente, mas o que você diz e faz ainda machuca... e em algum momento você vai ter que encarar os fatos, então assuma as rédeas da sua vida e aceite a ajuda que você sabe que precisa. – Saiu sem olhar para trás.

Stella deu uma gargalhada assim que a outra mulher virou as costas.

— Stella. – Censurou a esposa com um olhar. – Ela é nossa amiga e ela ficou sem trabalhar só para me ajudar com a Lily. – Levou as mãos ao rosto, tinha a sensação de estar andando em círculos. – Você podia pelo menos ser um pouquinho mais educada com ela.

— Tem razão. – Ergueu as mãos em sinal de rendição. – Mas não é com ela que eu estou zangada... é com você.

— Que surpresa.

— Eu já admiti que estava errada, já me desculpei e até já procurei ajuda, mas nada disso parece ser o suficiente.

Ele virou as costas para ela, ter aquela mesma conversa todos os dias já estava o deixando esgotado.

— E tudo isso é ótimo, mas eu queria saber quando é que você vai procurar ajuda de verdade.

Ela cobriu o rosto com as mãos.

— Mas eu já estou fazendo isso! – Gesticulou enquanto apontava para o elevador. – Já estou conversando com um psiquiatra e também já estou tomando o meu remédio como uma boa menina. O que mais você quer de mim?

— Você sabe... quer saber de uma coisa? – Usou um tom irônico. – Eu não tenho tempo para brigar com você agora.

— Mas é claro que não... – Usou o mesmo tom que ele. – Você é um detetive tão ocupado.

Ele virou para olhar para ela.

— E lá vamos nós de novo. – Colocou as mãos na cintura. – É só para isso que você precisa de mim, não é? Para ficar zangada comigo, para brigar ou para me culpar pelas escolhas horríveis que você faz. – Passou por ela. – Você não me enxerga mais de nenhuma outra forma.

O dia seguinte estava prometendo ser ainda pior que o seu antecessor. Stella precisava mais do que nunca escapar de si mesma, e tentar se refugiar no parque foi uma ótima ideia, mas em vez de caminhar como as outras pessoas, ela decidiu ficar apenas sentada no banco e observar o movimento.

— Será que você quer conversar um pouco? – Era a voz de Kristina que vinha detrás dela, a mulher usava as duas mãos para se apoiar no banco e tinha um sorriso muito amigável em seus lábios. – Às vezes faz um bem enorme...

Ela fechou a cara por um instante.

— O Will te pediu para fazer isso?

— Mas é claro. – Ironizou enquanto se sentava ao lado dela. – Ele me disse bem assim: Kristina, vá até a minha esposa e force ela a conversar com você. – Stella riu, adorava o fato da sua amiga ser muito bem humorada. – Eu gosto de conversar com as pessoas fora do meu trabalho... e tem um tempo que não faço isso, mas é óbvio que nada disso importa... – Riu, usando um tom mais engraçado para falar o nome da amiga. – Tudo no que eu penso é na Stella, Stella, Stella.

— Eu já entendi.

As duas começaram a rir.

— Faz tempo que eu não vejo o seu marido.

— Nossa, eu queria não ter visto ele hoje. – Confessou num sussurro desanimado. – Cara, por que tudo que eu digo soa tão mal desse jeito?

— Essa é uma ótima pergunta. – Comprimiu os lábios. – Porque para você estar querendo evitar o seu marido, você só pode estar doente mesmo, porque aquele homem é um... gostoso. – Alongou a última sílaba enquanto dava uma risadinha estridente, fazendo a outra cair na risada também.

A expressão da mulher se fechou e ela voltou a se lembrar da noite do acidente.

— Mas ele acha mesmo que eu pulei naquele lago.

— As más línguas dizem que você mergulhou como um cisne... – Stella riu. – Mas esse cisne acabou sendo pego numa correnteza e o Will teve que pular e te arrastar para fora.

— Então quer dizer que os boatos já começaram?

— Mas é claro.

Stella levantou.

— É bom saber que sou um caso perdido para esta cidade.

— Isso aqui é Nova York. – Riu. – Isso não quer dizer nada?

— Eu sei que sempre fui meio arrogante. – Coçou a orelha. – Eu era um pouquinho mais certinha do que sou hoje em dia, mas sempre fui muito boa em tudo que me propus a fazer. – Sussurrou a última parte. – E o fato de não conseguir cuidar da minha própria filha... é um pouco embaraçoso para mim.

Kristina também levantou, indo ao seu encontro.

— Então talvez seja hora de mudar.

— É só me dizer por onde começar.

No laboratório, Will ainda tentava reparar os danos causados por sua esposa.

— Ei, Lindsay. – Interceptou a amiga na saída do laboratório. – Escuta... eu só quero me desculpar pela forma com que a Stella te tratou. Ela passou dos limites...

— Mas ela tinha mesmo razão... estávamos falando dela.

— Sim, mas eu também podia ter mais cuidado com o que falo, em vez de simplesmente ter deixado escapar que a vi com o seu marido.

Ela abaixou a cabeça e abriu um sorriso triste.

— Tudo bem, eu só tenho que parar de pensar nisso...

— Sei como é...

— Eu só digo a mim mesma que eles são bons amigos.

— Sim, eles são mesmo...

— Obrigada. – Colocou uma mecha do cabelo atrás da orelha. – Eu sei que o Danny sabe ser muito solidário quando ele quer... até demais. – Ele comprimiu os lábios. – E você também deveria saber disso.

— Você tem toda a razão. – Assentiu enquanto sorria. – Tenho que voltar ao trabalho.

— Will. – Ele deu meia volta. – Vocês dois se amam, e eu sei que vocês têm um futuro brilhante pela frente, lembre-se disso. – Abriu um sorriso. – Tudo o que ela tem feito é por causa dessa maldita doença.

— Eu sei. – Assentiu. – Mas ela precisa começar a melhorar. Ela está tomando os remédios, está indo para a terapia, tem toda a assistência médica de que necessita e pessoas que a amam... e mesmo assim ela sempre está com raiva e sempre tem uma desculpa na ponta da língua para tudo.

— Eu acho que estou sendo repetitiva, mas... por que não tenta se abrir com ela? Conta para ela que você esteve em Redfield, conte que a viu com aquele cara, conte que sabe que ela só está dando uma desculpa para não admitir que pulou naquele lago...

— Eu acho que essa não é uma boa ideia.

— Mas acha que ela pulou mesmo naquele lago?

— Eu não sei... ela está tão deprimida... e é exatamente assim que eu tenho a visto nesses últimos dias. – Respirou fundo. – Eu só queria entender o porquê de ela estar naquele lago... ainda mais com uma neblina daquelas. – Ela não respondeu. – E se ela estava tão cansada ao ponto de ter alucinações, ela devia estar em casa... descansando ou sei lá... passando um tempo com a nossa filha.

— Eu acho que é exatamente isso que ela quer...

— Eu não me importo mais com o que ela quer. – Respirou fundo. – Estou tão cansado... cansado de ficar falando sobre isso e cansado de sentir raiva o tempo todo. – Abaixou a cabeça. – Eu nem me lembro mais de qual foi a última vez que eu ri.

— Eu acho que consigo te ajudar com isso...

— Me escuta... – Kristina segurou as mãos dela e a guiou até o banco. – Me escuta como sua amiga, Stella. – Elas sentaram. – Você não é mais tão imbatível. Você tem depressão pós-parto e isso não vai simplesmente passar... e para ser sincera, parece que está piorando.

— Você não sente saudades da época que podia simplesmente sair e beber uns drinks?

— Eu sinto saudades dos drinks, não daquele tempo. – Apontou para o próprio rosto. – Eu era cheia de espinhas...

Stella riu, colocando as mãos nos joelhos.

— Eu acho que vou me sentir muito melhor quando não sentir mais que sou a única pessoa nesse mundo que tem problemas.

— Então vamos até o bar do Jake para termos uma noite só das garotas.

— Só quando eu parar de tomar os antidepressivos.

— É... eles não combinam muito com os drinks.

— Estou tomando um bocado de comprimido desde o ano passado, e eu não consigo entender porque tomar mais um é um problema tão grande assim para mim...

— Então vamos tentar entender. – Deu um tapinha em suas costas. – Estou te ouvindo.

— Certo... – Coçou a nuca. – Quando tomo os meus remédios para o HIV, sinto que estou salvando a minha vida, mas quando tomo os antidepressivos... sinto que estou perdendo o controle da minha vida.

— Mas você não vai precisar tomá-los para sempre. – Pontuou. – A depressão pós-parto acaba rápido, é só você decidir cooperar.

— Mas eu posso perder o meu marido... – Abaixou a cabeça. – Se é que já não perdi.

— Eu duvido muito disso.

— Ele está muito zangado comigo e por um ótimo motivo.

— Ele te ama. – Umedeceu os lábios. – Ele mudou toda a vida dele só para ficar com você.

— Exato. – Virou o corpo na direção dela. – E olha só onde chegamos... eu só estou machucando-o e machucando a Lily no processo também.

— Certo...

— E ela precisa tanto de mim...

— Não, para. – Ordenou. – Já é o bastante. – Colocou a mão no seu ombro. – Me escuta como amiga e não como profissional, tá? – Stella assentiu. – Tome a droga do remédio, fique feliz por isso e deixe os outros cuidarem da Lily por enquanto. E pare de pensar no que você quer fazer e comece a pensar no que você deveria fazer, e faça apenas isso. – Stella deu um longo suspiro. – Encontre uma coisinha boa para fazer todos os dias... nem que seja só pentear o cabelo... ou vir conversar comigo. – As duas sorriram. – Comece a passar um tempo com o seu marido e com a sua filha, não tem que ser perfeito, mas tente não brigar e nem achar uma solução para os seus problemas, só saia um pouco de casa. – Fez uma pausa, aproveitando para olhar diretamente nos olhos dela. – Tentem encontrar algum jeito de aproveitar a companhia um do outro. – Stella sorriu. – Olhe ao nosso redor... estamos na primavera, o sol está brilhando. – Ela olhou ao redor, era mesmo um dia perfeito para passear com a família no parque. – Stella, hoje é um bom dia.

E era mesmo um ótimo dia, ela pensou nisso durante todo o trajeto de volta para casa. Aquele era mesmo um dia perfeito para passear com a família no parque, e ela não perderia essa oportunidade.

— Oi, senhora Taylor. – Kate a cumprimentou com um enorme sorriso, estava acabando de dobrar algumas roupas de Lily.

— Me chame só de Stella, por favor. – Sorriu. – Obrigada por estar aqui e obrigada por nos ajudar com a casa.

— Sem problemas.

— Será que você pode me fazer um favor? Arruma a Lily para mim enquanto eu ligo para o pai dela e peço para ele nos encontrar no parque.

A mulher suspirou, abaixando a cabeça.

— Ele já está no parque. – Explicou. – Ele veio buscar a Lily há alguns minutos.

O sorriso dela cresceu ainda mais.

— Essa é a melhor coisa que eu ouvi hoje, muito obrigada. – Saiu.

No parque, ele conversava com a filha enquanto os dois aguardavam a chegada da amiga.

— Você já sabe que a mamãe e eu estamos passando por um momento muito difícil... – Estava sentado exatamente no mesmo banco onde as amigas conversaram alguns minutos atrás. – Mas nós nos amamos e ela te ama. – Passou a mão na barriguinha da filha. – E ela não vai mais nos deixar. – Sorriu. – Eu nunca pensei que estaria aqui... nunquinha. – Colocou a chupeta que havia caído em sua perna na boca da menina. – Num parque com a minha filha, mas tenho que admitir que estou amando cada segundo disso aqui, e sempre serei grato a sua mãe e a você por me ajudarem a chegar até aqui. – Lily resmungou. – A sua mãe e eu achávamos que eu seria um péssimo pai... – Ela levantou a cabeça, olhando direto para o rosto do pai. – É sério... eu sei que não sou o melhor pai do mundo, mas quero que você saiba que nunca deve achar que está tudo ganho, tá? – Ela se virou para olhar os pássaros que estavam cantando. – E sempre tente dar o seu melhor... eu prometo que é exatamente isso que o papai vai tentar fazer por você. – Concluiu dando um beijo em sua testa.

— Oi, me desculpa pelo atraso. – Lindsay sorriu, segurando a mão esquerda da filha.

— Um passarinho. – A menina apontou para a ave e sorriu, fazendo sua mãe sorrir também.

Os dois estenderam as toalhas no chão e se sentaram com as crianças. Lindsay segurava Lily e Will estava sentado ao lado de Luz. Stella chegou nesse exato momento, mas escolheu ficar escondida os observando.

— Olha, o seu carrinho faz barulho de verdade. – Will cutucou a menina, que riu.

— Uau! Esse carrinho é muito barulhento. – Lindsay começou a fazer o barulho de um carro com a boca.

— Mais rápido. – Ele riu enquanto olhava para o brinquedo nas mãos da amiga.

— Exagerou.

— Mais rápido. – Pediu novamente.

— Vai, vai, vai! – A menina levantou os braços e ele aproveitou para lhe fazer cócegas.

Eles eram uma linda família aos olhos de quem olhasse de fora, e estavam rindo tanto que ela começou a sentir um buraco se abrindo em seu peito e até voltou a achar que talvez não servisse mesmo para ser mãe.


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Notas finais do capítulo

Calma pessoal, falta pouco para o arco da depressão pós-parto terminar.
Até o próximo!



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