Quase um mês havia se passado desde a transformação das meninas em sereias quando Sakura estava tomando banho e bateu o olho em uma caixa de tinta para cabelo guardada em um dos armários do trailer em que morava, se dando conta:

— Meu cabelo — disse a garota de cabelos rosa se sentando ao lados das outras duas amigas assim que chegou no pátio da escola e as viu. As aulas ainda não haviam iniciado.

— Oi pra você também – rebateu Ino de forma irônica.

— O que tem o seu cabelo? — Hinata perguntou ao notar o semblante angustiado da garota. — Tá lindo — elogiou.

— Eu não retoco desde que a gente virou, você sabe, sereia — Sakura sussurrou a última parte.

— E o que você fez pra ele ficar bonito assim? — Hinata perguntou surpresa.

Sakura mostrou a raiz para as duas e disparou:

— O meu cabelo tá nascendo rosa!

Isso deixou as outras duas garotas em choque.

— Ai não — soltou Ino. — Isso não é normal — percebeu. – Quais as chances das pessoas perceberem?

— Não tenho ideia — Sakura suspirou dando de ombros. — E não é como se eu fizesse questão das pessoas se lembrarem de mim.

Hinata trocou um olhar com Ino. 

— Não é como se as pessoas não te notassem, elas só não se aproximam muito — disse Hinata. — Você é nova na cidade e é bonita, você chama atenção — explicou o óbvio. 

— Ainda mais com essa cor de cabelo, tinha que ser rosa? — Ino questionou.

— Bom, não há nada que podemos fazer agora — Sakura suspirou se desviando da pergunta, o que não passou despercebido por Ino.

— E a lua cheia tá se aproximando — acrescentou Hinata.

— Você tem certeza que essa senhora é de confiança? — Ino perguntou se voltando para Hinata.

— Sim, ela sempre aparece nos momentos em que eu mais preciso, ela diz que sente quando eu vou precisar de ajuda — respondeu a garota de longos cabelos escuros.

— Tipo vidente? — Sakura questionou.

— A gente tem que conhecer ela — apontou Ino.

Hinata tinha conhecido uma senhora há alguns dias, depois de ter levado a irmã no parque aquático da cidade. As garotas ficaram preocupadas por Hinata ir para lá, obviamente era um lugar rodeado de água, mas Hinata insistiu que não ia deixar sua parte de sereia interromper sua vida como humana. E foi numa das apresentações dos golfinhos que conheceu a tal senhora que a ajudou. Ino e Sakura ainda não haviam a conhecido.  

— Eu posso falar com ela e marcar da gente se encontrar — Hinata deu a ideia. — Que tal esse sábado?

Sakura fez uma careta.

— Não posso, tenho que trabalhar esse sábado — a garota de cabelos rosa informou para as duas enquanto se levantava e ajeitava a mochila em um dos ombros.

— O dia todo? — Ino perguntou surpresa.

Sakura acenou com a cabeça.

— Vejo vocês depois — ela se despediu indo em direção a uma das salas de aula. O sinal já ia tocar.

— E aí meninas, tudo certo? — Naruto se aproximou das duas.

— Já perceberam que a gente não sabe nada sobre a Sakura? — Ino os questionou.

— O que tem pra saber? — Hinata perguntou.

— É, ela é, você sabe, descolada — disse Naruto.

— Ela não é descolada — Ino negou com uma careta.

— Pra gente como você, Shion e Sasuke pode não ser, mas pra gente ela é sim — Hinata a contrapôs. — Às vezes eu queria ser mais como ela, não ligar para a opinião de ninguém, fazer só o que me der vontade.

— É estranho! — Ino exclamou. — A gente não sabe nada sobre ela, onde ela mora, de onde ela vem, a família dela. Ela não fala nada! Além disso, o rosto dela não me é estranho, eu tenho certeza que já a vi antes, mas não sei de onde. 

— É um pouco estranho — Naruto concordou com Ino. – Ela podia falar ao menos onde mora – ele deu de ombros quando viu a careta no rosto de Hinata.

— Pode ser uma coisa difícil para ela — Hinata defendeu a garota de cabelos cor de rosa. — Vamos dar um tempo, assim ela fica mais confortável com a gente – deu o assunto por encerrado.

. . . 

Sexta-feira, lanchonete do Jiraya…

Era noite temática, toda primeira sexta-feira do mês tinha karaokê na lanchonete do Jiraya. 

— Isso é legal – disse Sakura em uma das mesas com Naruto, Ino e Hinata. 

— É constrangedor! – Hinata discordou.

Para Hinata pelo menos era, ela estava admirando Shion mandar bem em uma canção de amor em cima do palco. 

— Qual é Hinata? Karaokê é para ser divertido – Sakura insistiu batendo de leve no ombro da garota com o seu.

— E a nossa próxima candidata é Hinata – disse Jiraya em cima do palco. 

— O quê? – Hinata sussurrou horrorizada antes de se levantar. 

— Arrasa Hinata – Sakura fez um joinha com as mãos para ela.

— Você inscreveu ela? – Ino perguntou desacreditada. 

— Sim, qual o problema? – afirmou Sakura. –  Eu sou a próxima e então vai ser sua vez – apontou com um sorriso. 

— Você não devia ter feito isso – disse Naruto, um pouco amedrontado. 

— Por que não? – Sakura estranhou. – Ela não pode ser tão ruim. 

— Você vai ver – disse Ino, com pena de Hinata por passar por aquilo. 

— Ela vai cantar? – caçoou Shion. – Só vai me fazer parecer ainda melhor.

Ino não estava brincando, Hinata era mesmo ruim e o nervosismo da garota só piorava. Todo mundo na lanchonete vaiou e Jiraya tirou o microfone de Hinata sem nem deixar a garota chegar no refrão da música. 

— Ridícula – Shion disse para Hinata quando a garota passou por ela.

— Desculpa – Sakura pediu assim que Hinata se sentou na mesa. – Não liga para ela – apontou para Shion.

— A próxima candidata é Sakura – anunciou Jiraya. 

— Eu vou pagar mico pra você – Sakura dedicou para Hinata antes de subir ao palco.

Sakura começou a cantar uma música engraçada de comercial de TV e a fazer uma dancinha ridícula que arrancou uma risada de Hinata. Os que estavam presentes na lanchonete começaram a rir, mas a acompanharam, todo mundo conhecia a música e aplaudiram quando Sakura terminou de cantar. 

— Que coragem – disse Naruto batendo palma admirado.

Hinata balançou a cabeça concordando e, secretamente, sentiu um pouco inveja.

— Como você faz isso? – Hinata perguntou para Sakura quando ela voltou para o lugar ao lado de Ino. 

— Isso o que? – Sakura questionou antes de beber seu suco. 

— Não liga para a opinião dos outros! – apontou Hinata.

— A opinião dos outros não paga minhas contas – Sakura deu de ombros. 

— E o próximo candidato é… – disse o nome de alguém que não conheciam. 

— Tirou seu nome da lista? – Sakura se virou para Ino exasperada. 

— É claro, eu é que não vou pagar esse mico – Ino respondeu cruzando os braços e levantando o queixo de forma altiva.

. . . 

Sábado à noite…

Ino estava linda em um longo vestido azul claro, sentada ao lado da família nos lugares designados para eles na igreja. Aquele dia era o casamento da irmã mais velha de Shion.

Quando a marcha nupcial tocou, seguida de uma linda voz feminina acompanhando no coro, a mãe se virou para Ino e comentou baixinho: 

— Aquela não é sua amiga da escola? – apontou para a garota cantando ao lado da nave da igreja com uma banda a acompanhando.

Ino ficou extremamente surpresa ao reconhecer Sakura em um vestido preto simples de veludo de mangas longas que ia até a altura dos joelhos e uma peruca castanho escuro que parecia ser bem real. Não teria reconhecido a amiga se a mãe não tivesse falado.

Em meio a tantos celulares virados para a noiva, não foi difícil gravar um pouquinho de Sakura cantando e enviar para Hinata e Naruto no grupo que eles nomearam de “A Pequena Sereia” com a mensagem “Ela não falou que era cantora”.

De seu lugar na igreja, ao lado do pai e do irmão mais velho, Sasuke reconheceu Sakura assim que bateu os olhos na garota, mesmo com a peruca ela continuava linda, na opinião dele. Ele admirou ela cantar, bem diferente da versão divertida do karaokê no dia anterior. Não sabia o que ela tinha que o deixava balançado.

O encanto que ele sentia por ela tinha acontecido antes mesmo de se beijarem há um tempo atrás, antes de saber que ela era nova na cidade e na escola.

. . . 

Hinata estava na lanchonete do Jiraya sozinha quando recebeu a mensagem de Ino, aquela pontada de inveja bateu em seu peito novamente de forma indesejada. E daí que Sakura cantava bem?

Naruto estava demorando muito, então resolveu ir embora.

— Cuidado! – a senhora Tsunade a pegou antes de que tropeçasse no deque e caísse direto na água. – Você não quer que coisas estranhas apareçam, certo? – a senhora disse antes de sumir para dentro da lanchonete, deixando uma Hinata muito surpresa para trás. 

— Desculpa, demorei muito? – Naruto perguntou ao lado dela. – Você recebeu uma mensagem da Ino? 

— Naruto, o que você sabe sobre a dona Tsunade? – Hinata perguntou, o coração ainda aos pulos. 

— Só que é uma senhora com um barco antigo e que todos a chamam de fora da casinha, por que? – ele estranhou a pergunta.

— Porque ela sabe mais do que aparenta – Hinata respondeu de forma misteriosa.

. . . 

Domingo, perto do anoitecer…

— E aí, tudo bem? – Hinata perguntou para as meninas assim que atendeu a porta para que elas entrassem. – As bebidas já estão prontas, minha irmã está proibida de descer aqui para baixo e eu já pedi as pizzas – as informou.

— Ótimo – disse Sakura, colocando suas coisas ao lado do sofá. – Tô morrendo de fome. 

— Boa noite meninas – Naruto entrou na casa de Hinata como se fosse dele. – Eu não sabia que filmes vocês iam querer, então eu trouxe um de cada gênero – ergueu os DVDs que tinha em mãos.

O senhor Hyuuga, o pai de Hinata, não era muito adepto às novas tecnologias e planos de assinatura de streaming.

— O que você tá fazendo aqui? – Ino perguntou para ele. 

— Tô aqui para ajudar – ele respondeu como se fosse óbvio. – Não sabemos que efeitos a lua pode ter em vocês, então estou aqui.

— O que esse garoto está fazendo aqui? Achei que ia ser só para meninas – o pai de Hinata disse do alto da escada assustando os quatro. – Eu vou ficar de olho em você – apontou para Naruto, o fazendo engolir em seco.

A mãe de Hinata apareceu, puxando o pai de volta para cima. 

— Seu pai me odeia – disse Naruto para Hinata. 

— Meu pai odeia todos os meninos, pare de se achar – disse Hinata.

Eles fizeram a votação para decidir qual filme assistir e quando não adiantou, tiraram no ímpar ou par e o terror ganhou a pedido de Sakura. 

— Não entendo como você pode gostar desse tipo de filme – Hinata reclamou depois de tomar um susto em um das cenas. – Me dá medo.

As três estavam sentadas no sofá, enroladas em um cobertor, enquanto Naruto ocupava a poltrona.

— Esse tipo de filme não me assusta – Sakura pegou mais um pedaço de pizza. – A vida já é bastante assustadora por si só – disse com a boca cheia. 

— Se a vida já é assustadora, não devíamos assistir alguma coisa mais leve para apaziguar? – Hinata retrucou.

— Quando a lua aparece? – Ino perguntou para Naruto interrompendo a mini discussão entre as duas. 

— Cinco minutos… – Naruto olhou para o relógio que tinha no pulso. – Atrás. 

Todas as janelas, cortinas e portas haviam sido fechadas para que não entrasse nem uma fresta da luz do luar.

— Se sentem diferentes? – Ino perguntou para as outras duas. 

— Não – tanto Hinata quanto Sakura responderam. 

— Eu sabia, aquela senhora tava enrolando você – Ino falou para Hinata. 

— Vai com calma, que a ideia é que a gente não deve olhar para a lua – apontou Sakura. 

— Preciso ir ao banheiro – Hinata disse se levantando. 

— Alguém devia ir com você – falou Naruto. 

— Eu só vou ao banheiro – disse Hinata exasperada. – Eu vou ficar bem, já volto.

. . . 

— A Hinata tá demorando – percebeu Sakura. 

— Verdade – disse Ino –, ela já não devia ter voltado do banheiro?

Então escutaram uma espécie de canto descendo as escadas. Um canto muito bonito em uma voz que parecia mágica. Era Hinata. 

— Que isso? Quem está cantando? – os pais de Hinata desceram as escadas. 

— É a Hinata? – perguntou Hanabi, a irmã mais nova dela, descendo logo atrás. – Mas ela não sabe cantar – apontou. 

— Olha – Sakura murmurou para Ino. – As mãos dela estão molhadas, mas… 

— Nada de cauda – Ino completou percebendo. – O que você acha, Naruto? 

— Acho que ela tem a voz mais linda – Naruto se agachou em frente a Hinata, parecendo enfeitiçado.

Ino e Sakura trocaram um olhar. 

— Então é isso o que a lua cheia faz? – Sakura murmurou. 

— Essa não é a Hinata – Ino sussurrou. – Deve ser magia. 

— Magia da lua – Sakura acrescentou.

Uma batida na porta foi ouvida e a mãe de Hinata foi atender. 

— Quem tá cantando? – era Suigetsu, um colega de escola deles e amigo íntimo de Sasuke. – É maravilhoso – ele elogiou também encantado.

— Ela deve ter feito aulas – disse a mãe de Hinata tentando encontrar uma explicação. 

— Funcionaram muito bem – elogiou o garoto se agachando ao lado de Naruto e admirando Hinata, parecendo enfeitiçado também.

Hinata terminou de cantar e perguntou: 

— O que vocês acham? 

— Você foi ótima – o pai a parabenizou. 

— Então eu canto bem? – Hinata perguntou em um tom de voz desconhecido, quase encantado. – Canto bem de verdade? 

— Hinata, a gente precisa conversar – Ino a puxou para a cozinha.

Sakura pegou um pano de prato e enxugou as mãos da garota. 

— Hinata, escuta, você encostou na água e a lua cheia tá fazendo alguma coisa com você – disse Ino. 

— Eu sei cantar – Hinata disse feliz, sem prestar atenção em uma palavra. 

— Hinata, acorda, você não canta nada – disse Sakura exasperada. 

— Você tá com inveja agora que não é a única que sabe cantar – Hinata falou colocando uma mão no ombro de Sakura. – Mas tudo bem, eu ainda gosto de você. De vocês duas. Vocês são minhas melhores amigas – abraçou as duas.

Sakura e Ino trocaram um olhar assombrado e quando voltaram para a sala… tinham mais garotos. 

— É ela? Seu canto é tão lindo – disse um deles. 

— Cante mais um pouco – pediu outro.

— Acha que o Naruto pode ter alguma ideia? – Sakura murmurou para Ino. 

— Esquece – respondeu Ino observando o garoto. – Ele tá enfeitiçado, igual aos outros – apontou.

— Eu sou popular! – Hinata comemorou no meio da sala. – Isso não é ótimo?

. . . 

Tinha amanhecido e Hinata não parava de cantar.

Eles estavam no quarto de Hinata, Ino tinha dado fones de ouvido com abafador de som para Naruto e colocado músicas bem altas, ele folheava suas anotações. 

— Sabe o que aconteceu com a Hinata? – Sakura gesticulou para ele. 

— O que? Eu não tô ouvindo, mas acho que sei o que aconteceu com a Hinata! – gritou Naruto. – Ela é uma sereia, que nem as da mitologia, elas seduziam marinheiros para a morte, vamos torcer para que não seja tão perigoso assim. O melhor a se fazer é deixar ela trancada. 

— Vocês não vão fazer nada! – Hinata parou de cantar. – Essa é a melhor coisa que já me aconteceu, eu sou popular, as pessoas me adoram, isso não é o máximo? – e voltou a cantar.

Os pais de Hinata as chamaram para o café da manhã. 

— O que a gente vai fazer? Ela não pode ficar assim para sempre ou pode? – Sakura questionou. 

— Talvez o efeito passe depois que a lua cheia se for – disse Ino.

— Eu tenho a teoria de que isso vai passar depois que a lua cheia se for! – Naruto falou.

— Não é uma boa ideia ela descer agora – percebeu Ino. – Fica aqui! – mandou para Hinata.

Sakura e Ino saíram por poucos minutos e quando voltaram o pai de Hinata estava aos berros para a cena que via: Hinata beijando Naruto. Os fones estavam jogados na cama.

— SAIA JÁ DA MINHA CASA SEU MULEQUE!

— Não pode me proteger para sempre pai! – Hinata passou correndo por todos indo em direção a porta e quando a abriu tinha vários garotos que aplaudiram Hinata assim que ela apareceu. – Todos me amam!

Tinha uma multidão em frente a casa.

— Hinata, se explique agora, mocinha! – mandou o pai após arrastá-la para dentro de casa. 

— Quem são todos esses meninos? – a mãe de Hinata perguntou surpresa. 

— São meus fãs – ela respondeu sonhadora.

— São os namorados da Hinata – a irmã mais nova respondeu provocando e indo olhar para a janela. – Eles estão indo embora – ela falou estranhando. 

— Cadê a Hinata? – Ino perguntou. – Ela tava aqui há um minuto.

— Eu vou fazer um show na lanchonete do Jiraya! – Hinata gritou antes de sair pela porta dos fundos, ainda vestida em seu pijama.

— Como ela se move tão rápido? – Sakura perguntou desacreditada.

. . . 

— Quanto tempo ainda tem de lua cheia? – Sakura perguntou para Ino, que tinha pegado o relógio de pulso de Naruto. 

— Poucos minutos – Ino respondeu. – Não olha para o céu – avisou. 

— Isso vai ser um desastre – Sakura soltou olhando a multidão ainda maior fora da lanchonete.

O pai de Hinata brigava para entrar e buscar a filha que cantava atraindo ainda mais pessoas, agora não eram só adolescentes, eram homens e mulheres de todas as idades.

Hinata cantou e cantou até que a voz dela falhou algumas vezes e voltou ao normal. Parecia enfim ter voltado a ser ela mesma. Sem mais cantar parecia que todos tinham acordado de uma espécie de feitiço e isso dispersou a multidão.

— A lua cheia se foi – disse Ino aliviada. 

— Então acabou – Sakura respirou mais calma. – Seja lá o que a lua cheia faz com a gente… – balançou a cabeça de uma lado para o outro.

— Só dura enquanto a lua cheia estiver no céu – Ino acrescentou.