Os Retalhadores de Taurus escrita por Haru


Capítulo 8
— A Canção da Morte




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 — A Canção da Morte

O campo de batalhas estava cheio, as lutas começaram há mais de meia hora. Seguindo as táticas e as formações de combate ensinadas pelos arianos, os taurinos levavam visível vantagem sobre seus oponentes, tanta vantagem que eles mesmos não acreditavam. Nenhum dos seus foi morto até o presente instante. Os confrontos aconteciam sob o ardente sol do meio-dia, em meio a um calor que faria o mais resistente dos seres humanos pedir clemência. Isso, todavia, não servia a ninguém ali de pretexto para desistir. Pelo contrário, talvez. Motivava-os mais. Gritos vindos dos dois lados e sons de lâminas colidindo nunca davam espaço para o silêncio.

Indignado ante a visão de seus soldados sendo tão tranquilamente abatidos, o rei ordenou o avanço de mais um pelotão, o mais poderoso e numeroso que trazia consigo. Ele, junto com seus mais valiosos aliados, observava tudo de trás das árvores da floresta que cercava a grande arena. Esperava o momento certo de entrar em ação e dar um fim àquele teatro. Sim, teatro. Podia acabar com tudo com suas próprias mãos quando quisesse, escolheu deixar os conflitos se desenrolarem para chegar de repente e arrancar dos taurinos a esperança que eles conseguiriam conquistando tão pequenas vitórias ali. Queria passar uma mensagem para o mundo, deixar neles o sentimento de falha depois de se aproximarem tanto. 

 Arashi tocou o comunicador na orelha direita e falou com Noriko. Sua deixa, falou com ela, referindo-se aos guerreiros que o tirano enviou para a batalha. O combinado era que Naruhito, Toyotomi e ela entrariam em campo quando o déspota liberasse todo o seu exército. Assim como ele, o jovem primeiro ministro de Áries analisava os duelos dentro da floresta, esperando a hora oportuna de se envolver pessoalmente neles. Queria manter no ditador a ilusão de controle, desejava surpreendê-lo. Costumava dizer que o melhor inimigo é aquele que não sabe que você é inimigo dele. 

Noriko, Naruhito e Toyotomi se uniram aos taurinos e o rei logo de cara percebeu que eles três não eram como os outros. Havia algo de diferente neles. Logo o trio mostrou que em velocidade, força e técnica superava largamente qualquer um em terra. O soberano ficou de queixo caído. Só a garota valia por cinquenta retalhadores seus. Imagine sua surpresa quando ela começou a usar a essência. O campo das batalhas assumiu uma cor branca esverdeada, o solo se dividiu em vários quadrados minúsculos e, dos pés dos oponentes dela, pequenas flechas saltavam, matando alguns e tornando outros incapazes de continuar. 

A majestade quase caiu da árvore. Naquele ritmo, ele sabia, não restaria um guerreiro para lutar em seu favor. Foi então que resolveu que era a hora de enviar seus três guardas mais próximos: Murasaki, Yoritomo e Ayako, sua amada filha. Aname e Lila estremeceram quando a viram. Arashi viu a expressão das duas mudar e intuiu que o passado delas tinha algo a ver com algum dos novos últimos lutadores que desceram a mando do rei. Não pensou, entretanto, que fosse algo grave a ponto de vê-las desobedecer o planejado.

— Eu vou pra lá! — Lila gritou e se deslocou de seu ponto de partida. 

— Espera aí, Lila! Não! — Shiino, a seu lado, tentou contê-la mas falhou. 

Aname também foi incapaz de se controlar.

— Eu vou com ela! — Avisou, então se pôs a correr.

— Aname! — Daichi a chamou, quis dissuadi-la dessa ideia. Tarde demais.

 Arashi nem tentou falar com elas. Sabia que era inútil. Foi um imprevisto, mas já presenciou uma situação como aquela. Além disso, imprevistos acontecem. E quando eles acontecem só resta improvisar. Infelizmente, o ditador ouviu os gritos na floresta. A surpresa que preparava, graças a elas, não surpreenderia tanto quanto queria. Hora de agir. Bateu as mãos e fez com que delas uma águia de gelo alçasse um rápido voo, percorresse em círculos o perímetro. Através dos olhos daquele pássaro, poderia ver tudo com maior riqueza de detalhes. Poderia saber e prever todos os passos do rei. 

Praticamente todos os retalhadores dos dois lados estavam em cena. Lila e Aname uniram-se contra Ayako, Naruhito fazia frente a Yoritomo e Noriko e Toyotomi, juntos, combatiam Murasaki. O primeiro ministro do Reino de Órion e o rei da Terra de Taurus sabiam da presença um do outro. Só Arashi, porém, sabia com quem iria lutar. Uma vantagem imensurável a seu favor. Deu uma ligeira olhada em volta. Daichi e Shiino estavam dentro de seu campo de visão, alojaram-se em diferentes árvores acima dele. Aguardava pacientemente uma atitude do rei para agir e dar o comando aos dois. 

Foi quando cogitou a hipótese do tirano saber que o líder dos taurinos estava se escondendo e se deu conta de que o desgraçado não faria nada até ele dar as caras. Contatou Naruhito. Disse a ele que aumentasse o nível da luta que estava fazendo e ferisse mais soldados importantes do déspota, imaginando que assim o faria sair da toca. Naruhito consentiu. Recuou um salto, ergueu a palma das mãos para o céu e um conjunto de nuvens rubras fizeram o clima mudar. Delas, raios caíam impiedosos, matando ou ferindo gravemente os opositores da Resistência. Arashi riu quando viu frustração no rosto do rei.

Os arianos são... incríveis, Shiino notava, estarrecido. Ainda achava "incrível" um termo insuficiente para descrevê-los. O triunfo nunca lhe foi tão evidente quanto agora. Em poucos segundos não vai restar nenhum oponente, calculava Daichi. Demorou os olhos em Arashi. Como todos os seus amigos, ouviu histórias sobre os arianos, muitas sobre “o guerreiro glacial”, sabia que indo à guerra ao seu lado veria coisas extraordinárias até para um retalhador, mas o que estava presenciando ia além de “extraordinário”. Tudo estava acabando rápido e, por enquanto, sem baixas para a Resistência. Graças a somente quatro deles.

Como um rato caminhando para uma ratoeira, o rei fez exatamente o que Arashi queria: foi à luta. O único inconveniente foi que o tirano se provou mais forte e veloz do que o guerreiro glacial imaginava e, por causa disso, soldados da Resistência começaram a morrer sem nem saber o que lhes atingia. Noriko, Toyotomi e Naruhito ficaram atônitos. Quando Noriko ia ser esfaqueada no coração e morta, Toyotomi entrou na frente dela e segurou o pulso do soberano, que sorriu e recuou com um salto.  

Daichi, Shiino, Lila e Aname pararam tudo o que estavam fazendo para olhá-lo. As lutas cessaram por vários instantes. Ayako e os outros dois guardas dele trocavam olhares, sorriam. Num uniforme militar azul marinho com uma extensa faixa vermelha em torno do peito, o alto e poderoso homem de naturais cabelos loiros espetados, bem cortados, olhava a todos de cima. Sua atenção retornou para Noriko e Toyotomi. Definitivamente não são como os outros, concluiu sobre os dois e Naruhito. E não devem ser desse mundo. Já desde muito suspeitava que cedo ou tarde Hirihito pediria reforço de outro planeta. Perguntava-se de onde eles eram. 

Ayako atacou Aname com sua espada, Lila entrou no meio e parou o golpe com uma outra lâmina. Em seguida, uma tentou assassinar a outra, mas seus cortes faziam com que suas armas colidissem repetidamente. Aname fez chover sobre Ayako um disparo elétrico do qual, para escapar, a filha do rei teve que recuar com pressa. 

— Tenho que concordar com vocês duas... — A princesa dirigiu-se a elas, rindo sadicamente. — É realmente uma pena que seu amado Mitsu não esteja aqui... Eu queria ver a cara dele depois da destruição da Resistência! 

— CALA A BOCA! — Lila bradou e foi pra cima dela, enfurecida. Desferiu um corte tão letal e ágil que Ayako teria sido morta se não tivesse pulado e recuado para as alturas. 

A terra começou a tremer, a rachar. O ambiente foi tomado de uma leve coloração carmesim, esfriou-se bruscamente, depois uma série de correntes elétricas se alastrou aleatoriamente entre os guerreadores. Aname voltou o rosto para Ayako e seus olhos, possuídos por um intenso fulgor vermelho, miraram-na. Lila viu na expressão da amiga de infância uma raiva que jurou jamais ter visto antes. Num segundo Aname estava ali parada, no outro, estava a milímetros de distância da rival, ameaçando-a com os socos mais velozes que ela já foi forçada a desviar na vida. 

O que é isso?, se indagava impressionada a herdeira do trono. Conhecia a força daquelas duas, principalmente a de Aname, contra quem lutou antes e chegou perto de matar sem fazer muito esforço. Foi salva por Lila e Mitsu. Como é que ela ficou tão forte?, preocupava-se com descobrir, retornando ao chão. Esquivou-se de um jab, de um direto, de um cruzado de direita, de um cruzado de esquerda, de um chute alto, mas o segundo cruzado de direita de sua atacante emitiu uma luz tão forte que a cegou momentaneamente e a fez vulnerável para o murro que ela recebeu no estômago. 

Nesse intervalo de tempo, Lila chegou correndo e usou sua espada para matar Ayako, a garota desviou-se por pouco e levou um grande corte sobre o ombro. Depois recuou. Abismada, pôs a mão no sangue que descia de seu machucado e enxergou a premência de levá-las a sério. Não podia ser derrotada, ser morta por elas bem ali, na presença de seu pai. Não conseguia pensar em nada mais inadmissível. 

 — Nunca mais diga o nome dele, ouviu bem?! — Ordenava Aname. — Nunca mais!

O rei também achou aquilo inaceitável. Estava fugindo de seu controle. Foi decidido a acabar com tudo que ele esticou os braços, as mãos e uma flauta dourada, muito brilhante, tomou forma entre elas. Ele a levou à boca e soprou-a levemente, gerando uma melodia assassina. Literalmente fatal. Todos que a ouviam morriam misteriosamente depois de uma agonia terrível, de se contorcerem no solo frio. Predominavam em torno de todos a canção mortífera e os gritos de dor dos que eram afetados por ela. 


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