Os Retalhadores de Taurus escrita por Haru


Capítulo 9
— Os Olhos Congelantes




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— Os Olhos Congelantes

Sobre a técnica do rei, Arashi captou duas coisas: a primeira, que poderia parecer óbvia e desimportante, era que nem todos morriam após ouvi-la, afinal os aliados dele permaneciam vivos. Entretanto, não somente os aliados dele. Boa parte dos soldados da Resistência continuava viva enquanto a música soava. Seu chute era que a técnica entoada só surtia seu efeito assassino dentro de um limite espacial específico. Só precisava determinar exatamente onde o poder dela se esgotava. A segunda, aparentemente mais óbvia ainda, era que ela só funcionava quando ele tocava o instrumento e que, apesar disso, levava mais ou menos três segundos para começar.

Tudo bem, pôs-se a pensar. Sua águia de gelo deu três rápidas voltas na arena e se desfez. Acreditava ter conseguido delimitar o campo de ação da canção do tirano. Informou Toyotomi e o máximo de pessoas que conseguiu, eles, por sua vez, contaram a outros mais, até que isso se tornou conhecimento comum de todo o exército da Resistência. Quando viu seus inimigos se afastarem e ninguém perecer por sua ação, o rei deduziu que alguém contou a todos como driblar sua técnica. Alguém que o observava calmo, da floresta. Não faz mal, deu uma risada. Se correrem de mim, eu vou atrás de vocês

Desceu do monte com o ímpeto de eliminar Lila e Aname e teria conseguido, se o lendário guerreiro glacial não interviesse. Arashi usou a lâmina de gelo que lhe deu seu temido apelido de guerra para acertar a flauta do imperador e impedi-lo de tocá-la. Um fazia pressão contra a arma que o outro empunhava. Um olhava o outro no olho. 

— Arashi Suzume, retalhador de Áries! — Exclamou empolgado o tirano de Taurus. — Guarda costas pessoal da poderosa Yume...

Arashi pressionou a espada com mais força contra a flauta.

— Eu deveria saber quem você é? — Perguntou, mais por curiosidade do que por desdém.

— A reunião dos doze planetas de dez anos atrás. Eu estava lá na sala, como segurança do primeiro ministro da Terra de Taurus. — Explicou-se. — O que Áries está fazendo aqui? O tratado interplanetário proíbe a intervenção em assuntos de outros planetas.

— Áries e Taurus eram aliados muito antes da assinatura de qualquer acordo interplanetário. Além disso, está escrito que podemos nos ajudar caso as autoridades oficiais peçam reforços contra criminosos. — Retrucou o garoto. — Seu reinado termina hoje, Reiwa Kigara. 

Reiwa sorriu e se afastou com dois largos passos para trás.

— Que tal largarmos essas coisas? — Sugeriu, referindo-se à flauta e à lâmina que Arashi portava. — Veremos quanto você cresceu. 

Arashi aceitou a sugestão e largou a espada. Porém, cobriu os punhos com uma espessa camada de gelo afiada em várias partes. Ergueu a guarda. Após Reiwa investir com o primeiro golpe, teve início entre os dois uma troca de socos e chutes rápida demais para qualquer um em torno acompanhar. Daichi, Aname, Lila e Shiino entenderam na hora porque Arashi os privou de enfrentá-lo. Somente ele estava a altura, qualquer um em seu lugar já estaria morto. Ayako olhava incrédula para o que via. Achava impossível que alguém fizesse uma batalha de tão alto nível contra seu pai. Nem ela e os outros três guardas juntos eram páreo para ele. 

Reiwa esquivou-se de um jab, de um direto, desferiu um jab, um direto, desviou um gancho com a mão, contra-atacou com cruzado de direita, usou os braços para defender-se de um chute alto giratório e voou vários metros para atrás. Arashi se agachou, pôs as mãos no chão e uma parede cheia de espinhos surgiu nas costas do ditador. Reiwa parou a poucos milímetros de distância do mais afiado deles. No tempo que seu inimigo se distraía pensando em quão perto esteve da morte, Arashi correu na direção dele e o esmurrou no rosto. Falhou quando tentou encaixar o segundo soco, seu alvo se abaixou. Acertou a muralha de gelo atrás dele. 

Com o punho preso no muro, tornou-se presa fácil do imperador. Levou um soco na cara e se soltou, defendeu-se de um pisão mas, pego de surpresa pela força do ataque, caiu. Escapou para o lado quando estava a ponto de ser pisado, meteu a mão no muro que gerou, tirou neve de lá, jogou-a nos olhos de Reiwa e o socou na cara com tanta força que o arremessou longe. O tirano se pôs de pé num só pulo, correu e atacou o primeiro ministro de Áries com seu mais potente chute voador. O garoto protegeu o rosto pondo os braços na frente, mas a dor o desnorteou. 

Ainda no ar, Reiwa deu um salto mortal para trás, voltou célere para terra firme e, esperando pegar Arashi desprevenido, avançou sobre ele com seu soco mais poderoso. O ariano se recompôs rapidamente e cerrou os punhos. Um acertou o outro na cara, nenhum dos dois caiu. Uma nova e impassível troca de socos começou. O término dela se deu quando o guerreiro glacial bateu o pé no chão e fez uma corrente sair de dentro dele para agarrar o pé de seu adversário. Conseguiu o que queria, mas por ter se distraído ganhou uma cotovelada no nariz. Assim que se recuperou, deu na cara de Reiwa um cruzado de direita, um de esquerda e cabeceou-o com tanta força que o derrubou. 

Achando que o confronto dos dois terminara, que Arashi era já o vencedor definitivo, Aname esqueceu-se de Lila, de Ayako e saltou para cima do rei caído. Arashi não viu aquilo com bons olhos, entretanto, era tarde demais para ele fazer alguma coisa. Mesmo caído e com o pé acorrentado, Reiwa provou que não estava indefeso, que aquela batalha estava longe de acabar. Soou um suave canto contra Aname. O retalhador de Áries teve que saltar sobre ela para salvar-lhe a vida. Os dois foram ao chão. 

— Aname! Arashi! — Shiino gritava pelos dois. Despercebido, foi golpeado e caiu. 

— Ah... Desculpa... — Aname sussurrava, girando para o lado. — Perdi a cabeça... 

— Tudo bem. — Arashi a confortou, sentado. Estranhou continuar se sentindo bem depois de ter sido atingido em cheio pela técnica do tirano, pôs a mão no peito, procurava algum ferimento. — Isso ajudou a descobrir que ele estava escondendo-

Parou de falar quando sentiu algo pingar em seu pescoço. Pôs o dedo. Era sangue. Sua orelha direita jorrava um monte. Culpada, Aname se arrastou na direção dele para acudi-lo, mas a visão do rei libertando o pé da corrente com a qual Arashi o prendeu roubou suas atenções. Ele caminhava impiedoso na direção dos dois retalhadores caídos, com a flauta em mãos. Expandiu-a em largura para acertá-los com ela, tornou-a mais afiada, mas um escudo de cristais de gelo se materializou repentinamente e os salvou. 

O escudo que conteve o ataque de Reiwa despencou e a expressão facial do ariano já não era mais a mesma. Um sorriso cheio de maldade, um que o guerreiro glacial nunca exibiu na vida, esticava seus lábios. Arashi se levantou devagar, com toda a calma do mundo, o ditador tentou acertá-lo com a flauta mas mais escudos como o primeiro surgiam na frente, sem que o protegido precisasse mover um dedo. O déspota olhou dentro dos olhos dele. Viu que as pupilas do garoto tinham agora o formato de flocos de neve.

 Malditos arianos, pensou, recuando assustado. Têm sempre uma novidade. Já não sabia mais o que esperar de seu tão jovem oponente. Cansado de aguardá-lo, Arashi estendeu o braço direito, pôs sob ele o esquerdo, criou para a mão destra uma espada e realizou uma investida muito mais veloz do que qualquer outra que havia feito anteriormente. Reiwa não foi capaz de ver um só passo seu, quando se deu por si já estava rendido, com a ponta da lâmina de gelo a milímetros do pescoço.

Uma risada escapou da boca de Arashi. Ele soltou a arma que usava para render o rei, retraiu o braço e socou seu alvo no meio da cara. Reiwa ia cair para trás quando um muro de gelo cresceu no ar e o segurou, mandou-o para a frente de novo, para ganhar um segundo soco. Do terceiro, a muito custo, escapou, mas demonstrando ter agora uma força que não tinha antes, o punho de Arashi destruiu completamente o muro no qual as costas do imperador bateram antes. Sempre sorrindo, o ariano dirigiu os olhos para o déspota de Taurus. 

 Novamente sem precisar mover um dedo, fez surgir da esquerda de Reiwa um suporte de gelo do qual espinhos brotaram e por pouco não acabaram com a vida dele. Reiwa ficou com um corte na bochecha e na testa. Da direita veio mais um, o tirano teve que dar um passo para trás. Das costas dele veio outro, de cima também. Ele estava sem saída. 

— Pai! — Mesmo sem acreditar, Ayako largou tudo e correu para ajudá-lo. 

— NÃO! Ayako! — Gritou, a fim fazê-la desistir de se envolver naquela batalha. Em vão.

Arashi só precisou olhá-la para que um suporte parecido com o que rendia o tirano a detivesse e para que, dele, uma série de correntes de gelo a prendesse. Tinha ambos à sua mercê. Um a um, horrorizados, os soldados de Reiwa largavam as armas em desistência, até os mais leais. Inclusive os seguranças. Mesmo os membros da Resistência se mostravam assombrados com tamanha demonstração de poder e habilidade. Ninguém dizia nada. Todos o temiam. Aname ficou tão perplexa que chegou a esquecer o ódio que a movia minutos atrás. Continuava no chão.

Os olhos de Arashi voltaram ao normal e ele caiu de joelhos, sem forças. O que aconteceu comigo?, nem ele compreendia. Tirando proveito de seu visível momento de fraqueza, o rei puxou uma nova flauta para tocar e matá-lo. Aname, Lila, Shiino e Daichi cataram espadas e, simultaneamente, empalaram Reiwa.

— PAI! — Gritou a garota, indefesa. 

Shiino se voltou para ela e avisou:

— Não se preocupe, ele vai sobreviver. Não acertamos pontos vitais.

— Todos vocês vão sobreviver. — Daichi advertiu os demais. — Vão passar o resto de suas vidas atrás das grades!

— Pagando pelos crimes que cometeram! — Lila falou também. — A morte seria boa demais pra vocês!

Aname soltou a espada e se agachou. Chorando, olhou para o céu. Não sabia o que era mais cansativa: a dor ou o esforço que precisou fazer para não enfiar a espada no coração daquele maldito. Quando pensava em Mitsu, tudo melhorava. Vencemos, amor. 

Naruhito e Toyotomi foram até Arashi, ajudaram-no a ficar de pé e apoiaram-no neles. O retalhador de Áries encarou emudecido o homem que derrotou minutos atrás. Acenou de leve com a cabeça para os parceiros, eles entenderam que ele podia se sustentar sozinho, o deixaram. Ninguém entendeu o que o jovem ariano queria se aproximando de Reiwa.

— Que decepção. De segurança do primeiro ministro da Terra de Taurus pra... isso. — Disse, apontando as feridas do rei destronado. — Até sua filha você envolveu nessa loucura. Por quê? 

 O tirano vencido sorriu.

— Sou um retalhador, Arashi. — Respondeu. — Dominar e destruir é o que fazemos. Eu sou tudo o que você não teve vontade para ser. Você já morreu por dentro, mais do que qualquer outro nessa arena... Não olhe como se não soubesse do que estou falando. Você sabe. Conheço sua história, o que Santsuki fez com sua família, seu vilarejo. Ele te derrotou como ninguém nunca fez e nunca fará. 

Agora foi a vez do guerreiro de Órion tremer de ódio. Ele apertou os punhos tentando controlar a raiva, com uma sede assassina tão intensa no peito que quase o dominou. Aname tocou seu ombro e ajudou-o a recobrar a calma. 

— O triste pra você é que você não é Santsuki. Você é uma piada. — Replicou. — Consegue ser mais patético do que ele. Vai apodrecer na cadeia, morrerá sozinho e esquecido. Como um verme. 

Depois de dizer essas coisas, Arashi deu-lhe as costas para se retirar. Contudo, Reiwa se dirigiu a ele pela última vez:

— Quando escapar da prisão, meu alvo será a Terra de Áries, Arashi.

— Vamos te esperar de braços abertos. — Redarguiu rápido, sem olhá-lo.

...


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