Os Cavaleiros do Zodíaco: A Lenda de Seiya escrita por Masei


Capítulo 109
Esperança e Imortalidade


Notas iniciais do capítulo

Shiryu descobre o ponto-fraco de Siegfried e deixa a missão de derrotar o Último Guerreiro Deus para Ikki, Seiya e Geist.



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Siegfried nunca havia sentido tanta dor.

O mais poderoso dos Guerreiros Deuses herdou o posto de figuras celebradas em Asgard como Folker, derrotado pelo próprio filho, e seu irmão Sigmund, a quem já havia superado antes mesmo que este caísse em desgraça, trancafiado no fundo de Valhalla. Siegfried tinha sua fama, pois em Asgard ninguém ousava desafiar sua autoridade, e as bestas da Floresta Proibida, quando enlouqueciam de pecado, como diziam os aldeões, eram mortas por ele para impedir desastres maiores na cidade.

Em batalha, nunca foi vencido por nenhum dos aspirantes que buscavam um posto entre a guarda palaciana, tampouco era desafiado por aqueles que treinavam arduamente para tornarem-se Guerreiros Deuses na guerra futura que vitimaria todos os Deuses, o apocalipse do norte conhecido por Ragnarok. A batalha final de todos eles.

Nunca alguém havia feito com que ele sentisse aquela dor. Mais do que isso, o que o deixou amedrontado naquele momento em que se encontrava ajoelhado foi o fato de que, pela primeira vez, temeu por sua vida. Teve medo. Amedrontou-se por sentir medo.

Mas então engoliu o resto de sangue dentro da boca e levantou-se, percebendo que Dragão jazia estendida atrás do corpo moribundo daqueles três Cavaleiros de Atena. A Robe Divina do Guerreiro Deus o protegeu de uma maneira muito mais determinante do que aquela frágil Armadura de Bronze que Shiryu usava; mas, na altura do peito, ele percebeu que sua Robe Divina estava estilhaçada com um pequeno buraco onde o punho de Shiryu o havia atingido.

— Magnífico, Shiryu. — falou ele, ainda que ela não o pudesse ouvir. — Mas ainda que sua força seja impressionante, a minha Robe Divina foi capaz de proteger meu ponto fraco de seu poderoso punho.

Siegfried encarou os três Cavaleiros de Atena pronto para a batalha.

— Isso é o bastante. — disse Seiya, colocando-se à frente do grupo. — Agora Shiryu nos mostrou que você não é imortal coisa nenhuma. É possível te acertar e te vencer, Siegfried.

— E acha que vocês serão capazes? Se nem mesmo Shiryu pôde me derrotar?

— Shiryu foi estúpida por sacrificar seu escudo e quase a sua vida apenas para nos mostrar como derrotá-lo.

— Não fale assim, Ikki! — protestou Seiya com ela.

— Mas agora eu sei, Siegfried. — ameaçou Ikki.

— E o que poderá fazer, Fênix?

A Fênix inflamou-se novamente de fogo e, antes que Seiya pudesse argumentar qualquer coisa, ela novamente saltou na direção de Siegfried para reiniciar sua batalha. De imediato, o Guerreiro Deus notou como a estratégia de Ikki agora era muito mais clara do que antes; pois se antes ela buscava usar o céu ao seu favor, agora Ikki parecia lutar enraizada no chão, tal qual Shiryu, e sempre buscando atingir o coração de bétula de Siegfried.

Mas ainda assim, Ikki de Fênix sentia as dores de sua batalha anterior, de modo que a luta era de alguma forma desigual, e Siegfried levava clara vantagem, derrubando a Cavaleira ora sim, ora também. Mas ela se levantava e seguia tentando, até que o Guerreiro Deus arremessou seu corpo por sobre os ombros para espatifar-se e destruir uma pilastra daquele enorme pátio. Da nuvem de poeira que se levantou, Siegfried precisou saltar para esquivar-se de alguns raios de fogo que Ikki atirou na sua direção, e foi nesse momento que a Fênix furiosa saltou na direção de Siegfried no céu para tentar atingir o peito do Guerreiro Deus.

Mas o Dragão do Norte abriu os braços e as pernas gerando um pulso de energia que repeliu a investida de Ikki, jogando-a de volta para o chão, onde o Guerreiro Deus pousou, intocado. Mas ela novamente se levantou para seguir lutando, seguir tentando acertar aquele ponto fraco de Siegfried.

— Vamos, Guerreiro Deus, nossa luta ainda não acabou! — gritou Ikki, cambaleando.

— Mas não é possível, por que não desiste e cai nesse chão de pedra ao lado de Shiryu, Fênix? Por que se levanta? Por que insiste em lutar quando não há qualquer chance para você?

Ikki não respondeu e permaneceu encarando Siegfried.

— Eu nunca vi nada parecido. — falou ele, ao ver que até mesmo Seiya e Geist estavam prontos para lutar, mesmo muito machucados e praticamente sem suas Armaduras. — De onde vem tanta força?

— Vem de Atena. — falou Ikki, finalmente firmando as pernas e surpreendendo até mesmo a Seiya. — Vem de uma garota que levou uma flechada no peito e ficou entre a vida e a morte por um dia inteiro e ainda assim se levantou para apaziguar o mal do Santuário. Essa força vem dela. E também de todos nós! — apontou ela para os amigos rotos ao longe. — Você não luta apenas contra mim, Guerreiro Deus. O Cosmo de meus irmãos de batalha arde dentro de mim cada vez que eu abro as minhas asas. Assim como o meu Cosmo arde em cada um deles.

Siegfried foi quem permaneceu calado por um instante, pois em Asgard eles não conheciam o calor do sol e, por um instante, ele se perguntou se aquela era a força que faltava aos Guerreiros Deuses. De todos aqueles que haviam caído em batalha. Até mesmo Hagen, forjado na lava das cavernas, não parecia ter uma energia tão ardente como a daquela Cavaleira de Atena.

Mas então ele estava diante de um grupo de guerreiros que, ainda que houvessem sofrido golpes terríveis nos últimos meses, eram de uma fé inabalável em suas missões. Muito diferente do que Siegfried observava entre os Guerreiros de Asgard. Os maiores guerreiros daquela nação haviam caído, seja para a morte ou para o pecado; e os novos e jovens guerreiros a quem a missão recaiu não tinham o espírito inabalável que seria necessário para proteger Valhalla, pensou ele naquele silêncio.

Fenrir era uma fera abandonada pela humanidade, Hyoga sequer era um Guerreiro Deus, enquanto Alberich sempre foi um alto-conselheiro do estrangeiro, mas nunca um guerreiro. Apenas Siegfried, Hagen e Sid tinham dedicado suas vidas a se tornarem os incríveis Guerreiros Deuses que se tornaram. Mas Hagen e Sid estavam vencidos. E Siegfried estava sozinho.

Enquanto Ikki tinha todos seus amigos ao seu lado.

— Entende agora? Você pode nos derrubar quantas vezes for, mas nós iremos sempre nos levantar. Ao menos um de nós estará de pé para te vencer!

O fogo ao redor da Fênix intensificou-se novamente.

— Agora vamos, Siegfried, que nossa luta ainda não acabou. Use seus Dragões, Guerreiro Deus!

— Acha que pode acertar meu coração, Ikki de Fênix?

— Vou provar que enquanto você estiver debaixo do mesmo céu que todos nós você é um guerreiro como todos os outros que já enfrentamos.

Siegfried fechou os olhos, trancando dentro de si uma fúria.

— Vou mostrar ao Colosso de Odin que te protege que não há imortalidade alguma diante de mim. Tudo que eu vejo é…

— Eu não sou imortal!!! — bradou Siegfried, finalmente interrompendo a garota e calando seu discurso.

Todos se assombraram diante daquela revelação apaixonada do Guerreiro Deus, pois sua voz havia sido mesmo o rugido de um Dragão adormecido. Ele seguiu com a voz mais calma.

— Eu não sou imortal. — repetiu ele, mais contido. — Nem nunca gostaria de sê-lo. Ver meus amigos caindo um por um, saber que para sempre eu verei outros morrerem enquanto eu sigo sem rumo por uma vida-sem-fim?

Ikki o encarava.

— Somente os Deuses são imortais. — falou ele, apontando para o Colosso de Odin que estava atrás de todos. — Eu sou apenas um guerreiro abandonado pela morte.

— Abandonado pela morte?

— É isso mesmo, Fênix. Eu ouvi dizer que você pode voltar das cinzas se quiser, mas eu sequer sou visitado pela morte. Sou aquele que nunca caiu enfermo, tampouco sentiu medo de morrer. Nunca foram capazes de me derrotar e, ainda que meus oponentes se cansem, eu sigo em frente e caço meus inimigos até que eles peçam clemência. Assim como faço com você.

— Abandonado pela morte. — repetiu Ikki para si.

— Mas assim como nada parece ser capaz de me enviar para o inferno, a mim também foi negado o direito de tirar a vida de qualquer outra pessoa. Não sou imortal. Sou aquele que foi abandonado pela morte. Não morre e não mata.

— Mas o que está dizendo? — assombrou-se Ikki.

Seiya e Geist entreolharam-se diante da revelação e se o garoto parecia obrar seu cérebro machucado, a Cavaleira de Prata sentiu se encaixarem alguns fatos que realmente pareciam não fazer muito sentido naquela batalha final. Aquele era não somente o último, como também o mais poderoso Guerreiro Deus; e os Cavaleiros de Atena eram os algozes de praticamente toda sua irmandade de Asgard. No entanto, ali estava estirado o corpo de Shiryu, muito ferida, é verdade, mas viva. Seiya em farrapos ainda conseguia colocar-se de pé e mesmo ela também não morreria tão cedo.

E aquele Dragão do Norte tinha força capaz de os matar a todos de uma só vez, se ele quisesse. Ou pudesse.

— Que conversa mais ridícula. — falou Ikki, finalmente. — Eu não tenho tempo para esse tanto de drama das novelas de Asgard. Pare de falação e me ataque, Siegfried!

O Guerreiro Deus deteve um punho de fogo lançado por Ikki com apenas uma mão, desviando a rajada de fogo para o lado. Os dois encararam-se por um instante, quando uma voz cortou aquele pátio para atrair a atenção de todos.

— Ataque ela, Siegfried! — bradou Hilda de um púlpito à beira do abismo que ficava abaixo do Colosso de Odin, para onde as escadarias daquela montanha levavam. — Acabe logo com isso!

Siegfried olhou para sua senhora, surpreso com aquela aparição, e o invadiu uma força que ele não havia experimentado até então; pois ali estava a representante de Odin dando-lhe uma ordem clara. E sua vida foi dedicada inteiramente para servir àquela ordem. Siegfried fez seu seidr surgir ao redor de seu corpo, pois estava decidido a derrubar Fênix para que ela não pudesse mais bater suas asas de fogo.

— Está pronta, Fênix?

— Eu vou te fazer ajoelhar, Guerreiro Deus.

— Sentirá a fúria do Dragão do Norte e vai desejar que eu fosse capaz de te matar, Ikki de Fênix. Enfrente a força do Vendaval do Dragão!

— Golpe Fantasma de Fênix!

Seiya viu como Ikki foi absolutamente obliterada pelo punho de Siegfried, ao ponto de seu corpo ser arremessado para muito longe, sua Armadura de Bronze rachar-se em diversos pontos, suas penas serem espalhadas pelo ar e, muito longe dali, uma garotinha acordar no meio da noite em desespero ao notar que a pena vermelha que tinha debaixo do travesseiro nunca esteve com o brilho tão fraco.

— Ikki! — gritou Seiya até ela.

Seu corpo espatifou-se contra o paredão do Palácio Valhalla e voltou para o pátio, inerte, ainda trêmula, sem fôlego, escorraçada de sangue e com os olhos vidrados de dor.

— Por Atena, Ikki, o que foi que você fez? — perguntou Seiya ao virar o corpo da amiga e aterrorizado que ela sequer havia feito menção de se defender.

— Eu… o acertei no coração. — balbuciou ela.

O timoneiro olhou para trás e percebeu que, outra vez, Siegfried estava de joelhos. Se Ikki deixou-se atingir para ter uma chance de contra-atacar, o fez da maneira mais incomum, pois embora sua Armadura tenha sido estraçalhada pelo Vendaval do Dragão, Ikki acertou em cheio seu Golpe Fantasma diretamente no coração de Siegfried.

O Golpe Fantasma de Fênix.

A técnica tenebrosa de Ikki que Seiya sabia ser capaz de destruir a mente do inimigo, fazer com que seu oponente revivesse momentos de absoluto terror ao ponto de deixá-lo catatônico, como fez com Jabu, Shaina e outros inimigos. Os relatos eram sempre aterradores. Pois se o Golpe Fantasma era essa técnica que assombrava os piores pesadelos da mente de uma pessoa, Seiya não podia imaginar o que poderia manifestar ao atravessar o coração de alguém. E ao ver Siegfried sofrendo no chão, o garoto não deixou de sentir certa pena, pois era como se ele buscasse desesperadamente pelo ar que lhe faltava no pulmão, a mão direita na altura do coração parecia arranhar a Robe Divina buscando encontrar o animal que mastigava seu peito, enquanto a cabeça tremia de desespero.

A dor que estraçalhava o coração de Siegfried era algo que ele jamais havia sentido; não era exatamente o impacto ou a força com que foi atingido, mas a profundidade com que aquele golpe parecia ter envenenado o sangue que bombardeava de seu coração amaldiçoado. Olhou adiante e encontrou os olhos castanhos de Seiya, mas sua visão tremeluzia de maneira impossível, misturando formas e cores, misturando pessoas e inimigos, amores e dores.

Sua própria audição lhe traía, pois reverberava por todo seu corpo apenas o tambor que eram as batidas de seu coração, ecoando em cada veia que percorria seu corpo, apaziguando todas as sensações do mundo exterior. Sua pele formigava como se mastigada por milhares de formigas e seus olhos pareciam ter uma tela carmesim à frente. Olhou às suas costas e, ao longe, adivinhou sua senhora Hilda gritando-lhe algo que não podia escutar; de outro lado, os corpos de Fênix e Dragão, enquanto Pégaso e Geist colocavam-se de pé, observando-o como quem observa um animal em perigo. 

Levou as mãos à cabeça para que pudesse fazer parar aquela sensação terrível, quando seus olhos não apenas escureceram de vez, como seu labirinto girou feito a revolução de uma estrela veloz, fazendo-o cair de tontura e vomitar ao chão o sangue que se acumulava em seu estômago. E no reflexo daquela poça de sangue escura e amaldiçoada, Siegfried viu os olhos de seu irmão e levantou-se, amedrontado.

Levantou os olhos percebeu-se no mesmo pátio em que havia sido atingido, mas à sua frente agora estava uma figura que não esperava encontrar naquele instante. A Princesa Freia correndo na sua direção em prantos.

— Saia daqui imediatamente, Princesa Freia! — bradou ele, pois aquele lugar e aquele momento eram perigosíssimos à sua presença.

Hilda poderia se defender, mas a Princesa Freia não teria chances, ainda que fosse muito valente.

— Siegfried, você precisa ajudar minha irmã. — chorou ela.

E então não estavam mais no pátio externo, senão nas câmaras interiores do Palácio Valhalla.

— Ela está mudada demais, Siegfried. Por que vocês não me escutam? — tentava ela.

— Princesa Freia. — falou ele, ofegante, e olhando para os lados sem saber como havia parado ali. — Mesmo nós que somos guerreiros treinados sofremos com a influência das Safiras de Odin, eu não posso imaginar a força que deve ser a influência sobre sua irmã ao usar o Anel de Nibelungos.

Sua voz falou de maneira clara, mas Siegfried sentia-se um passageiro de um corpo que já havia vivido aqueles momentos.

— Isso não está certo. — retrucou Freia. — Esse não é o tempo do Anel despertar, ele deveria acontecer durante o Destino dos Deuses. O Último Tempo!

— Por favor, Princesa Freia, quem saberá a vontade dos Deuses? E quem dirá que essa tristeza e miséria que nosso povo passa não é sinal do final dos tempos, enfim? O Longo Inverno ao qual estamos submetidos. As catástrofes nos mares.

— Não quero que ela morra, Siegfried. — chorou Freia nos braços do Guerreiro Deus.

— Eu a protegerei com a minha vida, Freia. Com a minha vida. — repetiu ele para ela, pois ele sabia das histórias que contavam sobre sua impenetrável vida.

E nos braços de Siegfried, a Princesa Freia chorou por clemência e compreensão, mas a força de Siegfried havia sido forjada para seguir Hilda e Odin por qualquer batalha que fosse, jamais para ousar desafiá-la ou duvidar de sua santidade. Mas, tal qual as areias do tempo que sopravam pela vida do Guerreiro Deus, o corpo triste de Freia em seus braços desmanchou-se para escorrer por seus dedos e juntar-se aos vincos do chão de mármore de Valhalla.

Outra vez o Guerreiro Deus viu-se derrubado por imensa tontura, ao ponto de ele precisar se escorar na parede para manter-se de pé. Ao se recompor e abrir os olhos, percebeu que estava agora longe dali, em um lugar muito mais profundo do que a escuridão daqueles salões de Valhalla. Os calabouços onde um homem ferido era atendido pelo doutor do Palácio.

— Eu deixarei vocês a sós. — falou o velho Andreas, deixando que Siegfried encarasse o prisioneiro que não era outro senão seu próprio irmão, Sigmund.

Encararam-se um ao outro. Sigmund encontrou nos olhos de Siegfried uma profunda decepção, enquanto Siegfried viu que seu irmão havia rasgado o olho direito, usando uma faixa para esconder-lhe a ferida tratada; mas no olho esquerdo, ele adivinhou um pedido de perdão.

— Então é verdade. — falou a voz distante de Siegfried. — Você atacou Hilda.

— Sabe melhor do que ninguém o quanto isso me faria miserável, meu irmão.

— Então, por qual motivo, Sigmund?!

— Está errado. Estes não são os desígnios de Odin, irmão. Hilda não deveria usar aquele Anel amaldiçoado!

— Como ousa duvidar de Odin?! Nós clamamos por sua voz por todos esses anos, e agora que ele se faz ouvir através de Hilda, você ousou levantar a mão contra ela? Levantar a mão contra Hilda é o mesmo que o fazer contra Odin, nosso Pai Todo-Poderoso.

— É por Odin que eu fiz.

— Cale-se, Sigmund!

— Eu vi, Siegfried. Este presente não é de Odin. Havia mais alguém nas sombras.

— O Anel dos Nibelungos só pode ser um presente de Odin. De ninguém mais. É o que você mesmo me disse por todo esse tempo. 

— Não, não pense isso de mim…

— O Anel de Nibelungos é capaz de conferir um imenso poder ao seu portador, e uma imensa inveja e ambição ao seu redor.

— Não, Siegfried! — protestou o prisioneiro. — Não posso acreditar que ache que eu faça isso por ganância, Siegfried. Eu sou seu irmão.

— Esse ferimento em seu olho… — começou a falar Siegfried. — É a força do Anel dos Nibelungos. É um recado de Odin.

— Não é Odin! — bradou Sigmund, ecoando por todo calabouço e então lamuriando-se, como se buscasse perdoar a si próprio. — Eu tive de me defender.

— Você levantou a mão contra Hilda, a Representante de Odin! E essa marca é a prova de seu pecado. Não deveria estar em qualquer outro lugar, Sigmund.

— Siegfried! Siegfried! — chamou Sigmund, ao ver que o irmão deixava a cela. — Me perdoe, meu irmão.

— Se Odin não pode perdoá-lo, eu não poderei, Sigmund.

— Espere! — pediu Sigmund por uma última palavra, lamuriosa. — Havia mais alguém lá, Siegfried. Por Odin, havia mais alguém. Existe alguém nas sombras de Asgard. Alguém terrível. Eu não pude evitar, mas salve Asgard, Siegfried. Salve Asgard!

A voz de seu irmão reverberava aquele último pedido para sempre e agora Siegfried lembrou-se de que nunca mais esqueceu suas últimas palavras. Seu peito ardia de dor, mas também acalmava-se aos poucos ao notar que estava de volta ao frio da área externa do pátio do Palácio Valhalla.

À sua frente não estava mais a figura frágil da Princesa Freia, tampouco seu irmão ferido Sigmund; as duas pessoas que aquela técnica terrível de Fênix se apoderou para arrancar de seu coração para lhe relembrar do que o fazia tanto sofrer. Duas pessoas que ardiam com mais força os sentimentos mais profundos que guardava dentro do peito: o abandono. O medo de ter abandonada quem ele mais amava. Seu irmão. E Hilda.

À frente dele agora estavam os Cavaleiros de Atena que, aos poucos, levantavam-se para enfrentá-lo novamente.

— Novamente eles se levantam. — comentou ele para si mesmo, também colocando-se pronto para a batalha que recomeçaria. — A força de seus laços é realmente impressionante. Eu gostaria de não ter de enfrentá-los, mas…

Entre os quatro Cavaleiros de Atena, enquanto Geist velava as dores de Ikki, Seiya caminhou mais à frente deles e esperou o Guerreiro Deus estar de volta à batalha para fazer arder seu Cosmo mais profundo. E Siegfried, pela primeira vez, viu brilhar o cosmo ardente e magnânimo do Cavaleiro de Pégaso.

Pois ali diante dele estava Seiya. E, mesmo sem sua Armadura, ele seria sempre o Cavaleiro de Pégaso, realizador de milagres e salvador de Atena.

Ele tinha com ele apenas o uniforme de suas viagens pelos Sete Mares no corpo, mas talvez ali naquele momento ele não precisasse de mais nada que não fosse aquela vestimenta rasgada, que pouco guardava das cores originais, embora ainda tivesse brilhante a insígnia de Atena no peito. Com certeza ele estaria melhor protegido com sua maravilhosa Armadura de Bronze, mas aquele sobretudo quase destruído era ainda o resquício de suas aventuras pelos Oceanos, confiado em seu posto pelo próprio Capitão Kaire.

E ali, diante dele, Seiya sabia que estava a chance de completar a missão sagrada para a qual eles partiram da Grécia já há tantos meses atrás. E o Cosmo que brilhava ao redor de seu corpo era incrível, como nunca deixaria de ser com Seiya, o Cavaleiro da Esperança. Seu Cosmo ardia, pois ele lembrava-se de Lunara, onde quer que estivesse, como também de Marin e sua face sempre escondida e distante, e principalmente de sua irmã, que ele ainda desejava tanto reencontrar.

Não havia ninguém como ele para alcançar propósitos dentro de si para fazer seu Cosmo brilhar ao infinito.

— O que pensa que vai fazer? Você sequer tem a sua Armadura à disposição. Seu Cosmo é brilhante, mas seu corpo é de um garoto.

— Você não pode me matar, não é isso que você disse? Que foi abandonado pela morte e que não pode matar seus inimigos, não é verdade? — perguntou o menino, queimando sua vida ao redor de seu corpo. — Mas, ainda que pudesse me matar, eu não desistiria. A Shiryu sacrificou sua Armadura para nos mostrar seu ponto fraco e Ikki foi capaz de atingir seu peito com o Golpe Fantasma.

— Agora olhe para trás e veja como estão as duas.

Seiya não precisava fazê-lo, pois sabia que ambas estavam desmaiadas. Mas vivas.

— Por que acha que será diferente desta vez?

Ele não sabia. Mas Seiya raramente soube de alguma coisa quando sempre se levantou para seguir em frente. Pois se não sabia, ao menos ali ele lembrou-se de algo que o fez sorrir.

— Sabe, Siegfried. Certa vez, um grande Capitão do Mar disse que eu era capaz de realizar milagres. E que ele gostaria de estar ao meu lado para me ver realizá-los. — Seiya brilhava e fazia brilhar todo aquele pátio. — E eu sei que ele está comigo e vai me ver realizar mais um desses milagres.

Seus universos arderam cada qual ao seu modo; Seiya brilhou sua Cosmo-energia e Siegfried fez congelar o pátio externo com seu seidr. Mas seu frio não parecia ser páreo para o milagre que era a força de Pégaso, pois Seiya tinha ao seu lado e dentro de seu coração algo que faltava à Siegfried.

A fé de Atena.

Atena estava com ele através de seu Cosmo, de sua lembrança de Meko, dos laços de seus amigos e até mesmo na saudade de sua irmã.

Talvez Odin não estivesse com Siegfried.

Siegfried armou seu Vendaval do Dragão, que poderia se provar um golpe terrível para Seiya, que estava sem sua Armadura de Bronze, mas o garoto tinha olhos atentos e, mesmo muito ferido, seu Cosmo alcançou o Sétimo Sentido, despertando os milagres que Meko tanto queria ao seu lado. Milagres que eram capazes somente porque ele acreditava tão firmemente em Atena.

Atena que àquela altura rezava por ele e seus amigos ajoelhada diante do pedestal do Cabo Sunion.

Seu cosmo divino, que ela tanto implorava para aflorar, finalmente apareceu ao redor de seu corpo e invadiu o planeta inteiro com sua força. E mesmo Mundos distantes, Seiya sentiu o chamado de Atena e seu Cosmo reverberou com aquela força.

Seus Meteoros de Pégaso convergiram em um único ponto.

O coração de Siegfried.

E o último Guerreiro Deus foi finalmente atingido de tal modo que seu corpo foi arremessado ao longe e toda a proteção esquerda da sua Robe Divina destruída pela força de Pégaso.

O garoto também caiu de joelhos, exaurido pelo esforço e respirando com extrema dificuldade, mas sem tirar os olhos do corpo estirado de seu oponente. Shiryu rastejou no chão à sua direção chamando por seu nome, enquanto Geist surgiu às suas costas com um sorriso no rosto. Ikki também recobrava lentamente a consciência, como se houvessem sido despertos de um pesadelo por aquele instante em que Atena reverberou pelo Mundo.

Seiya abriu a palma da mão e viu as seis Safiras de Odin que seus amigos haviam juntado para que ele tivesse aquela chance derradeira; pois com a Safira de Siegfried ele poderia conclamar a Espada Balmung e livrar Hilda de seu feitiço, dando chance a eles para que selassem a última Relíquia do Mar sem que precisassem enfrentar mais uma resistência inútil.

Mas ao ver o corpo de Siegfried estirado, ele voltou a se assombrar.

Pois Siegfried de Dubhe levantava-se lentamente.

Se faltava à Siegfried a proteção de Odin através de Hilda que operava sob um feitiço, na verdade sobrava dentro dele a fé em si mesmo e a fé que ele depositava em Hilda. E por isso ele se levantava.

Como Shiryu se levantou tantas vezes. Como Ikki o fez. Como Geist. E principalmente como Seiya sempre faria.

Pois ele também.

Seiya nunca havia visto um inimigo tão determinado e, pela primeira vez, sentiu que lutava contra alguém como ele. Inabalável.

Geist adiantou-se na frente de todos, até mesmo de Seiya, para sua surpresa, e caminhou até Siegfried, que a encarou, finalmente, colocando-se de pé enquanto seu corpo inteiro tremia.

— Acabou para você, Dragão do Norte.

— Nunca. — falou Siegfried.

A Cavaleira de Argo, que naquele instante usava metade da Armadura de Prata de Shaina de Ofiúco, ergueu os braços aos céus e fez seu Cosmo prateado surgir diante de todos. Sua voz reverberou naquele pátio enquanto seu corpo emitiu uma luz que cegou a todos por um instante enquanto escutavam sua voz gritar pelos quatro ventos de maneira prolongada, até que seu fôlego desaparecesse.

— Argo!

Siegfried levou a mão aos olhos com a certeza de que seria finalmente vencido, mas absolutamente nada aconteceu; ao abrir os olhos viu diante de si Geist muito esbaforida e, atrás dela, os três Cavaleiros de Atena se ancorando para manterem-se de pé. Seu coração não havia sido atingido.

— É a minha vez. — anunciou ele, com a voz vacilante.

Mas antes que ele pudesse fazer com que seu Vendaval do Dragão varresse Geist da sua frente, todos ouviram um bradar profundo ecoar no céu branco de Asgard. Um barulho grave do madeirame retorcendo-se no ar até que o próprio piso do pátio externo de Valhalla passou a tremer de maneira muito sutil. O espetáculo revelou-se inacreditável e, enquanto Siegfried esperava algo lhe brotar do chão para levá-lo ao Hel, só muito tarde ele notou que as nuvens grossas e eternamente brancas daquele céu de sua terra romperam-se feito cortina rasgada mostrando a proa de um enorme galeão surgir no céu feito uma aparição milagrosa.

— Mas…

Siegfried deu alguns passos para trás, sem poder acreditar no que seus olhos vislumbravam naquele céu. Pois o navio fez uma curva brusca para baixo e a ponta de sua proa cravou no corpo de Siegfried e o arrastou, destruindo todo o pátio externo daquele Palácio, varrendo o Guerreiro Deus até que ele e o imenso galeão se chocassem contra um paredão eterno da montanha que velava Valhalla, destruindo o navio por completo e finalmente silenciando o último dos Guerreiros Deuses.


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Notas finais do capítulo

SOBRE O CAPÍTULO: Eu queria muito que Siegfried fosse um oponente realmente terrível e difícil. Como foi no Anime. Ele derrubou todo mundo e eu queria fazer essa comparação com Seiya. A história toda é escrita do ponto de vista dos Guerreiros Deuses, portanto eu queria que o principal Guerreiro Deus fosse tão resiliente quanto Seiya. E sim, eu decidi derrubar um navio na cabeça do Guerreiro Deus. E achei que ficou maneiro demais.

PRÓXIMO CAPÍTULO: O EMISSÁRIO DAS PROFUNDEZAS

A batalha entre Siegfried e os Cavaleiros de Atena é finalmente interrompida por uma estranha aparição.



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