O Despertar Infernal- Interativa escrita por Lady L


Capítulo 3
III- Deuses Não Dormem


Notas iniciais do capítulo

Olá! De volta com mais um capítulo, dessa vez um cheio de revelações... boa leitura :)



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/799923/chapter/3

06 de Dezembro de 2022; Acampamento Meio-Sangue

 

                                                       Antônio->

 

Eu sempre me perguntei o que levou uma deusa a se tornar nossa babá.

E não apenas uma deusa qualquer, mas Héstia, a Última Olimpiana. Decerto essa parecia uma ocupação bem curiosa para alguém que costumava ter o mundo na palma das mãos.

“Eu acho que ela só quer uma família”- Cat havia dito, certa vez, quando eu expressei essa dúvida em voz alta- “E, como ela jurou castidade, resolveu construir um lar para todos os filhos que ela nunca pôde ter”

Fazia bastante sentido para deusa da Lareira querer um lar. Mas, infelizmente, nós geralmente só batíamos à sua porta para levar caos. E é justamente o que planejávamos fazer naquele momento, conforme Amélia nos guiava até a Casa Grande.

O sol já começava a se erguer lentamente no horizonte, e o céu tomava um tom progressivamente menos escuro de azul, então eu supus que deviam ser  quase cinco horas da manhã. Nenhum campista ainda estava acordado àquela hora, então nossos passos e vozes ecoavam pelo silêncio do pátio. Eu me permiti apreciar a beleza dos primeiros e tímidos raios de sol sendo filtrados pelas folhas das árvores frondosas que ladeavam nosso caminho, e a paz que aquela cena inspirava, apesar dos sussurros ansiosos e irrequietos dos campistas que me acompanhavam.

—Tony?- Cat, que caminhava do meu lado, um pouco atrás de todos, me chamou.

—Sim?- eu respondi, virando o rosto para encará-la.

—O que você acha que está acontecendo? Acha que vamos precisar sair em uma missão? Eu estou assustada, não quero enfrentar o que quer que estava nos observando naquele sonho- ela disse, em um tom de voz rápido e nervoso, atropelando algumas palavras. Um sinal típico de que ela estava ansiosa.

—Eu não sei, Cat, mas o que quer que aconteça, estamos juntos nessa- eu respondi, pegando em sua mão. Ela apertou a minha, um pouco nervosa, antes de assentir.

—Obrigada, amor- ela disse, erguendo a cabeça um pouco para me beijar na bochecha- De qualquer jeito, enquanto eu tiver você, tenho certeza de que tudo vai ficar bem.

Eu sorri, a puxando para mais perto e passando meu braço sobre seu ombro.

—Eu também tenho.

Amélia e o restante do grupo nos esperavam na frente da porta da grande e aconchegante cabana de madeira no centro dos outros chalés. Laiza acotovelava os outros, tentando passar na frente, e Luciano e Pietro sussurravam ansiosamente entre si, mas Amélia parecia ainda estar tomando coragem para bater na porta.

Antes que ela pudesse sequer erguer a mão, contudo, a porta se abriu, revelando a Diretora.

—Olá, meus queridos!- ela disse, com um sorriso caloroso- Está muito frio aí fora, entrem logo, eu fiz biscoitos!

E ela realmente havia feito biscoitos. Amélia parecia ansiosa para dizer logo o que estava errado, mas Héstia não a deixou falar até que todos estivéssemos devidamente acomodados nos sofás e poltronas felpudas da sala, cada um com um prato de biscoitos e uma xícara de chocolate quente.

—Pronto, meus queridos- ela disse, parando atrás da poltrona na qual Amélia se assentava- Agora você pode me contar sobre a profecia, querida.

Eu não sei porque eu fiquei surpreso que Héstia já soubesse sobre a profecia. Ela era uma deusa, afinal, óbvio que ela sabia. Já devia ter sentido que algo estava errado antes mesmo que todos tivéssemos aquele sonho estranho.

Amélia explicou resumidamente o conteúdo do sonho, e então entregou o papel com a profecia para a deusa. Ela leu com rapidez, e franziu a testa levemente conforme passava os olhos pelas palavras.

—Bem, eu sempre soube que esse dia iria chegar. Só esperava que fosse mais tarde do que mais cedo- Héstia disse, devolvendo o papel para Amélia e dando a volta na poltrona, indo para o centro da sala.

—Esse dia?- Celina Campos interpelou, com uma calma assustadora para um momento tão tenso- Então o que sonhamos já era esperado?

Héstia se virou para ela, com um olhar triste e preocupado.

—Sim, minha querida. Essa profecia está sendo aguardada desde que derrubamos e aprisionamos os Titãs pela primeira vez. Eu só não esperava que os escolhidos fossem tão jovens quanto vocês. Eu os preparei bem, mas meu coração dói em ter de mandá-los para uma missão tão perigosa.

—Isso não faz sentido nenhum- Pietro Allen se manifestou, parecendo tão contrariado quanto na discussão que havia sido travada no templo- Eu tenho certeza absoluta de que o que eu senti no sonho era uma criatura infernal. Nada do Mundo Inferior poderia me fazer mal, e, além disso, meu pai não deixaria nada de lá escapar.

Héstia então focou seu olhar nele. Não havia raiva ou sequer irritação em sua expressão, somente a mesma tristeza e preocupação que ela havia direcionado a Celina.

—Você não está errado, Pietro, mas não sabe de todas as variáveis envolvidas. Existem forças bem mais poderosas em jogo, forças que nem mesmo seu pai pode controlar- ela disse, e ele fez uma careta.

—Já que há tantas forças e segredos que não conhecemos nessa história, nos explique pelo menos o mínimo- ele replicou, e eu o encarei, um pouco desconfortável com aquele tom insubmisso.

Nem mesmo Luciano ousaria falar daquele jeito com Héstia, e todos tínhamos um respeito muito grande por ela para questioná-la tão abertamente. Eu supus que talvez essa postura de Pietro se devesse ao fato de ele ser um novato no Acampamento, mas talvez ele só não tivesse temor algum por nenhum tipo de autoridade. Atlanta também era novata e parecia estar muito bem comportada, assentada em sua poltrona de pernas cruzadas e mordiscando os biscoitos educadamente, então ser novato não era desculpa.

—Vocês não estão sendo caçados por um Olimpiano, ou sequer por um Titã. O que está atrás de vocês é muito mais antigo e muito mais poderoso do que isso- ela disse, tentando manter o tom gentil, mas soando mais rígida do que eu jamais a havia visto- Essa criatura é um dos primeiros seres a habitar o mundo, uma energia tão primordial e intrínseca à existência de todas as outras coisas que jamais poderá totalmente destruída. Uma força descomunal, que está apenas adormecida, mas que pode despertar a qualquer segundo e libertar os horrores mais inimagináveis sobre a Terra. Você tem alguma ideia da gravidade disso, minha criança? Como eu poderia explicar isso a vocês sem aterrorizá-los completamente?

Um silêncio denso se instalou na sala, e eu senti um arrepio agourento percorrendo o meu corpo.

—É Tártaro, não é?- a voz de Cassandra quebrou o silêncio, e todos a encaramos, em um misto de curiosidade e terror- Eu já vi aquele lugar antes. Aquilo é o Tártaro. E aquela presença atrás de mim... não poderia ser outra coisa se não o dono do lugar, poderia?

Héstia a se aproximou dela, se abaixando na sua frente para olhá-la nos olhos.

—Sim, Cassandra, aquilo é o Tártaro. Você, em especial, já está sendo caçada há anos, desde que achou a entrada daquele lugar terrível por acidente. Mas agora ele está procurando por todos vocês, e eu não posso impedi-lo de achá-los por muito mais tempo.

—Então foi a senhora que o parou, no sonho?- Cora perguntou- Foi a senhora que o impediu de nos tocar?

Héstia assentiu.

—Sim, fui eu. E eu posso mantê-los escondidos por mais alguns dias, enquanto se preparam para sua missão, mas temo que à medida que Tártaro despertar, não haverá mais nada que eu possa fazer por vocês.

—E o que nós temos que fazer para impedi-lo?- Luciano perguntou, um brilho determinado, quase raivoso, em seu olhar.

Héstia caminhou até a lareira no fundo da sala, o calor do fogo e ela pareciam ser um, emanando pelas paredes, e, de repente, eu senti uma sensação supremamente reconfortante. Como se, apesar de todo o perigo, nós fôssemos ficar seguros, como se nada nesse mundo pudesse nos machucar. Acho que os outros estavam sentido aquilo também, pois, de uma hora para outra, nós parecíamos bem mais corajosos do que há minutos atrás, com posturas altivas e queixos erguidos, e nenhuma insinuação de medo em nossos rostos.

—Não será fácil, minhas crianças, mas vocês são os únicos capazes de cumprir essa missão- Héstia disse, e eu percebi que era ela quem gerava aquela sensação de conforto, e eu me senti muito grato por ela estar fazendo isto- Vocês deverão achar três itens poderosos, que apenas em combinação e uso perfeitos poderão conter Tártaro novamente: a flauta de Hipnos, as correntes de Prometeu, e a ampulheta de Cronos. Os servos de Tártaro esconderam e guardaram esses objetos, e recuperá-los não será fácil, mas tenho fé que vocês conseguirão. Com os itens em mãos, vocês deverão chegar ao Tártaro, achar sua forma física, e aprisioná-lo em um sono profundo de uma vez por todas. E deverão fazer tudo isso antes do Solstício de Verão, que é quando o seu poder chegará ao auge, e então se tornará impossível pará-lo.

—Parece tranquilo- Pietro zombou- Não sei porque não nos explicou isto tudo antes.

Eu arqueei uma sobrancelha, prestes a dar uma bronca em Pietro, mas então ele riu. E eu me peguei rindo também. Logo todos estávamos rindo, até mesmo Héstia. Eu nunca entendi muito bem o porquê, se era a confiança exarcebada que Héstia havia nos presenteado naquela madrugada, se era o sentimento de desespero que lentamente voltava a espreitar, mas fingir que seria tudo fácil e divertido pareceu absurdamente engraçado para todos nós naquele momento.

Quando nós saímos da Casa Grande, o nascer do sol estava em seu auge, iluminando o céu em tons de rosa e laranja. Eu segurei na mão de Cat conforme caminhávamos juntos até nossos respectivos Chalés. Longe de Héstia e de sua sensação de falsa segurança, eu senti as mãos da minha namorada começando a tremer nas minhas, o que me deixou preocupado.

—Ei- eu chamei, e ela erguei os olhos para me encarar. A expressão dela era de medo, o que fez meu coração se apertar dentro do peito- Está tudo bem?

Ela baixou os olhos, e então se virou minha direção.

—Não sei, Tony- ela murmurou- Estou com um sentimento ruim. Como se essa fosse a coisa mais perigosa que vamos fazer em todas as nossas vidas.

Eu larguei a mão dela para colocar ambas as minhas em seu rosto, segurando suas bochechas com afeto para que ela me olhasse nos olhos.

—Eu não vou mentir, Cat. Acho sim que essa será a missão mais perigosa de nossas vidas. Mas estaremos juntos, e enquanto eu respirar, juro que nada de ruim vai acontecer com você- eu prometi, e eu vi uma insinuação de sorriso se formando nos lábios dela conforme ela me puxava para um abraço apertado.

—Eu amo você- ela murmurou, e eu a segurei com mais força.

Então, em um movimento repentino e ágil, ela se desvencilhou de mim, disparando na minha frente pelo pátio, e se virando ligeiramente para me encarar com um sorrisinho travesso, já um pouco longe.

—Mas agora vamos logo, temos que chutar o traseiro de uma entidade primordial- ela disse, e eu me peguei sorrindo enquanto a seguia pelo pátio.

Só Cat mesmo para me fazer sorrir em uma caminhada em direção aos portões do inferno.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado. Qualquer erro na retratação dos personagens, podem me avisar! Vejo vocês nos comentários!