O Despertar Infernal- Interativa escrita por Lady L


Capítulo 4
IV- A Aberração de Quatro Rodas


Notas iniciais do capítulo

Olá! Essa semana teremos um POV da icônica Laiza, admito que foi bem divertido de escrever. E lembram que eu falei que haveria uma referência a uma piada interna em algum capítulo? É nesse. Boa leitura ;)



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06 de Dezembro de 2022; Chalé de Apolo, Acampamento Meio-Sangue

 

                                                            Laiza->

 

Eu estava completamente desesperada.

Como, em nome dos deuses, eu deveria levar somente uma mala para a missão?

“Levem só uma mochila, já é mais do que o suficiente”- Cassandra havia aconselhado, quando todos nos encontramos no final da manhã para discutir os preparativos- “Se precisarem de mochilas encantadas para levar itens maiores, tenho algumas sobrando no meu Chalé”

“Isso é besteira”- Luciano havia replicado- “Uma mochila normal já basta. Ninguém precisa de mais do que isso”

Acabou que eu, obviamente, precisava. Como iria me manter bem arrumada e estilosa com tão somente uma mera mochila? Isso é um ultraje, um atentado contra meus direitos!

Marchei até o chalé de Hécate com minha bolsa favorita em mãos: uma Louis Vuitton de couro preto e detalhes em dourado. Eu tinha um plano para evitar meu desastre fashion iminente.

Bati na porta, e um garoto de cabelos escuros e cara de sono me atendeu.

—Pois não?- ele disse, esfregando os olhos. Porém, quando me olhou direito, ele corou violentamente, percebendo o próprio estado deplorável e meu estado resplendoroso. Não o julgo, todos ficam meio humilhados em minha presença mais cedo ou mais tarde.

—Preciso falar com a Cassandra- eu disse, decidindo ignorar a reação dele- Ela está aí?

—E-está- ele respondeu, gaguejando um pouco- Pode entrar, vou chamá-la para você.

Cassandra chegou alguns minutos depois. Ela estava tão deplorável quanto o irmão dela: cabelos azuis (uma vítima da moda!) completamente embaraçados, blusa de moletom larga e meias de bolinhas roxas.

—Oi, Laiza- ela disse, em um tom neutro, como se ainda estivesse avaliando se seria legal comigo ou não- Está precisando de alguma coisa?

—Estou sim, Cassandra. Veja bem, eu preciso muito de uma mala maior, mas eu simplesmente odeio mochilas. Será que você poderia encantar essa bolsa para mim?- eu perguntei, em meu tom mais encantador, até mesmo fazendo um biquinho no final.

Eu percebi que Cassandra se segurou para não revirar os olhos. Que vaca.

—Olhe, Laiza, eu adoraria te ajudar, mas infelizmente estou muito ocupada com os preparativos da missão. Você pode pegar uma das mochilas encantadas, se quiser, mas eu realmente não tenho tempo para isso- ela disse, em um tom de voz frio, e depois saiu da sala sem me dar nenhuma outra satisfação.

Eu estava prestes a me levantar para segui-la e tentar convencê-la do contrário, quando o menino que abriu a porta para mim (Cassandra o havia chamado de Fernando ou Felipe, alguma coisa assim), se aproximou de mim timidamente.

—Eu posso encantar a bolsa pra você, se quiser- ele ofereceu.

Eu esbocei o meu sorriso mais ofuscante.

—Eu adoraria, Fernando- eu respondi, lhe entregando a bolsa e dando um tapinha leve em sua bochecha- Não demore muito, está bom? Volto em uma hora para buscá-la. E muito cuidado com essa bolsa, ela é mais cara que esse Acampamento inteiro.

—Meu nome é Felipe- eu o ouvi murmurando conforme eu lhe dava as costas e saía daquele muquifo de Chalé, mas decidi fingir que não tinha escutado.

Felipe/Fernando era meio esquisitinho, mas sabia fazer um encantamento bem razoável. Metade das minhas coisas coube na bolsa, o que já é bem mais do que os pertences de qualquer pessoa mais pobre, então me dei por satisfeita.

Agora era a hora de pegar algumas armas.

Eu certamente já levaria meu chicote e meu boomerang, afinal, haviam sido feitos sob medida para mim, e ninguém mais no Acampamento tinha armas tão exclusivas. Mas eu também estava pensando em pegar algumas peças de armadura, então fui até o depósito do Acampamento.

Encontrei Atlanta Vieira lá. Ela era a novata do Chalé de Afrodite, e se vestia razoavelmente bem se comparada aos nossos deploráveis companheiros de missão, mas talvez lhe faltasse uma pitada de sal, apesar de ela em geral ser bem bonitinha. Ela estava pegando flechas e uma aljava quando me aproximei, e se virou em minha direção para me cumprimentar.

—Oi- ela disse, e sorriu- Laiza, não é?

Claro que eu era a primeira e única Laiza Neves, não deveria haver dúvida alguma sobre isso.

—Oi- eu respondi, me forçando a sorrir também- Isso, sou a Laiza. E você é a Atlanta, não é?

—Isso mesmo- ela respondeu, pegando a aljava e a prendendo ao redor do ombro- Ansiosa pela missão? Eu sei que eu estou, e muito. É a minha primeira.

Isso era óbvio pra mim, ela estava praticamente rindo à toa antes de me perceber chegar.

—Estou um pouco. Também é a minha primeira missão, mas não vou negar que eu esperava alguma coisa menos... intensa- eu ri- Pelo menos parece que essa é uma missão importante, e é sempre bom ter seu nome vinculado a coisas importantes.

Ela me encarou por alguns breves segundos, e eu não entendi muito bem o que aquele olhar queria dizer. Seria aquilo... desconfiança? Não poderia ser, poderia? Ninguém nunca desgosta de mim.

—Eu suponho que sim- ela disse, já terminando de encher a aljava- Vou voltar para o meu Chalé agora, ainda tenho que terminar de fazer minha mala. Mas foi bom conversar com você, Laiza. Até mais tarde!

—Até!- eu respondi, enquanto ela se afastava, dando de ombros. Se ela queria deixar minha presença magnífica para fazer coisas menos importantes, o problema era dela.

Eu peguei algumas peças soltas de armadura que eu poderia enfiar na bolsa e fui embora.

O grupo inteiro havia marcado outro encontro no final da tarde, para concluir e checar os preparativos, uma vez que partiríamos logo pela manhã. Levando minha bolsa no ombro, desfilei pelo pátio em direção à garagem, onde o veículo em que faríamos a viagem estava.

Eu só não esperava encontrar a coisa mais horrorosa que eu havia visto em toda minha vida me aguardando.

Uma kombi. Uma kombi branca e vermelha. Velha e encardida. Horrível. Completamente horrível.

—Eu não vou entrar nessa aberração de quatro rodas!- eu gritei assim que vi o restante do grupo ao redor da kombi. Pietro colocava as malas na parte de trás do veículo, e Tony segurava a tampa do capô enquanto Catarina checava o motor. Todos eles pararam suas tarefas para me encarar.

Antes que eu pudesse continuar a reivindicar meus direitos por um veículo melhor, contudo, Cora, que ajudava Celina a checar as armas, se aproximou. Ela tinha uma energia tão tranquila que eu acabei parando meu surto, hesitando por uns poucos segundos.

—Só dê uma olhada na parte de dentro. Confie em mim, você não vai se decepcionar- ela disse, sorrindo, e eu me peguei a obedecendo, mais por curiosidade do que por qualquer outra coisa.

Aquilo devia ser obra de Cassandra e seus irmãos esquisitos, porque era bruxaria purinha. A parte de dentro da kombi era enorme, muito maior do que logicamente possível, se assemelhando muito mais a um ônibus de turnê do que ao veículo velho que aparentava ser do lado de fora. Haviam sofás e poltronas de couro, e uma porta nos fundos, pela qual foi possível ver alguns beliches. Tinha até mesmo uma pequena cozinha, com frigobar e microondas, e uma porta que se abria para um banheiro.

—Bem legal, não é?- Cora, que havia entrado logo atrás de mim, perguntou.

—Dá pro gasto- eu respondi, jogando minha bolsa em uma das poltronas- Já estive em transportes melhores.

—Mas nunca esteve em uma kombi tão rápida, eu te garanto- a voz de Cassandra me pegou de surpresa. Ela saiu do quarto no fundo do veículo, e veio caminhando na direção de onde eu e Cora estávamos- Muito menos em uma kombi voadora.

Eu a encarei, arqueando uma sobrancelha.

—Se for pra voar, eu ainda prefiro um jatinho. Mas é melhor que uma kombi normal, pelo menos- respondi.

Cassandra e Cora se entreolharam.

—Claro que sim, Laiza- Cassandra respondeu, meio distraída, então passou direto por mim para falar com Cora- Cora, pode chamar Celina para mim? Preciso de ajuda com algumas runas.

As duas voltaram aos seus respectivos trabalhos, mas eu decidi ficar por ali mesmo, me acostumando ao novo ambiente. Acho que dava mesmo pro gasto, afinal.

Depois que o resto do pessoal terminou suas tarefas (eu passei meu tempo tirando selfies para meu Insta. Bombadíssimo, diga-se de passagem, eu tinha batido quinze mil seguidores algumas semanas antes), Amélia chegou para dar algumas últimas orientações.

Nos assentamos no gramado do lado de fora da garagem, a maioria dos outros cansados por terem passado o dia se preparando, para ouvi-la. Ela trazia alguns livros velhos com capa de couro debaixo do braço, que ela soltou na grama à sua frente.

—Consegui determinar para onde vocês devem ir primeiro- Amélia disse, abrindo um dos livros- Tive que analisar muitos presságios e escritos, além de fazer algumas oferendas, mas tudo aponta para uma pessoa em específico, a única que sabe exatamente como derrotar Tártaro.

A página mostrava a pintura de uma mulher de meia idade. Parecia antiga. O tino artístico que eu havia herdado diretamente do meu pai me fez chutar que era do final do século XVIII, talvez início do XIX.

—Quem é a coroa?- eu perguntei, encarando a pintura.

Amélia me lançou um olhar de julgamento. Ela tinha aquela cara de julgamento o tempo inteiro. Mal sabia ela que não se pode julgar a perfeição.

—Uma das maiores feiticeiras vivas atualmente, e a mais poderosa desse país: Virgília Andrade- ela respondeu- E ela não é uma “coroa”, simplesmente. Essa mulher está viva há quase trezentos anos, acumulando conhecimento e poder.

Eu dei de ombros.

—Se ela sabe o que devemos fazer, ótimo- eu respondi- Alguma ideia de onde ela está?

Amélia abriu outro livro, de onde ela tirou um mapa.

—Em algum lugar na região metropolitana de São Paulo- ela disse, apontando um triângulo desenhado no mapa- Se vocês saírem logo de manhã, devem chegar lá um pouco antes da hora do almoço. Mas, para achá-la, deverão procurar com atenção. Ela só será encontrada se assim desejar.

—Então nós estamos indo atrás de uma feiticeira que pode não querer ser encontrada?- Pietro resmungou, com uma careta- Excelente...

—Que comece a caça às bruxas- eu respondi, sorrindo com deboche.

Cassandra me encarou com desgosto, e eu soprei um beijinho ela, só para espezinhar.

—Bem, ela pode querer nos ajudar, ou não. Só vamos descobrir quando vocês chegarem- Amélia disse, dando de ombros- Mas, ao que tudo indica, ela teve alguns problemas durante o despertar de Gaia, alguns anos atrás, então acho provável que ela tenha interesse em impedir o despertar de um novo primordial.

—Ela vai nos ajudar- Luciano disse, confiante- Não vamos lhe dar muita escolha quanto a isso.

Eu dormi pior do que esperava. Foi uma noite irrequieta, meus irmãos estavam empolgados que eu iria para uma missão, e pareciam não querer me deixar em paz. Pelo menos eu estava ganhando a atenção que eu merecia.

Mas havia outra coisa também, o que verdadeiramente estava me impedindo de dormir, algo que eu nunca admitiria para ninguém. Um medo profundo e irracional, a sensação inevitável de que corríamos grande perigo. De que, quando eu dormisse, eu fosse voltar para aquele sonho horrível, e acordaria novamente chorando que nem na última noite. Como eu poderia dormir, se eu ainda acreditava que algo estava lá fora, me vigiando?


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado do capítulo. Como sempre, podem avisar caso as retratações dos personagens não tenham ficado nos conformes. Obrigada por ler, vejo vocês nos comentários!

Ps: tem uma pequena atualização no tumblr, nada demais, só uma continuação da piadinha, hehe