O Passado do Lobisomem escrita por Heringer II


Capítulo 2
Capítulo 2


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem! ^^



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Seis horas antes da manifestação.

— Eu não sei se vocês sabem, mas existem muitos fatos históricos que precisam ser averiguados. – dizia meu professor de história – A própria descoberta do Brasil por Pedro Álvares Cabral ainda é alvo de dúvidas entre os historiadores, visto que existem textos escritos antes da chegada de sua caravana que possivelmente falavam sobre as terras brasileiras.

Eu não conseguia prestar atenção em nada do que ele falava...

— De fato – continuava ele –, até mesmo a história de que os portugueses não sabiam da existência de terras por essa banda é algo que muitos estudiosos discordam. Muitos acreditam que o Brasil não foi descoberto ao acaso, enquanto os portugueses iam para a Índia e desviaram seu trajeto. Há quem acredite que eles já sabiam que existia terra firme por aqui...

Ele parou e me viu deitada na cadeira, com a cabeça entre os braços cruzados, dormindo.

— Evelyn?

Eu não o ouvi, e continue dormindo.

— Evelyn! – disse o professor, com um tom de voz um pouco mais alto, mas ainda mantendo sua postura educada, eu acordei num susto e olhei para ele com uma horrível cara de sono. – Não dormiu à noite?

— Sendo sincera, não. – olhei para os lados e vi todos da minha sala olhando para mim, alguns aparentemente com tanto sono quanto eu, outros riam da minha cara por eu estar dormindo, e alguns queridinhos dos professores me olhando com olhares de reprovação, mas eu não me importei com nenhum deles.

— Escuta – disse o professor –, vá ao banheiro, lave o rosto, e depois volte.

Sem dizer nada, levantei da cadeira e fui até o banheiro.

— Você precisa rever a forma como está levando seus estudos, Evelyn.

Sem dar o mínimo de atenção ao meu professor, sai da sala, atravessei o corredor e cheguei ao banheiro. Comecei a falar comigo mesma.

— O que ele quer que eu faça? As aulas dele são chatas, e eu nem dormi ontem pensando na manifestação de hoje. Se ele não gosta que os alunos durmam na aula dele, dê uma aula mais interessante. Ah, mas quem eu quero enganar? O que tem de interessante numa aula de história? É igual àquelas aulas chatas de geografia, e eu nem quero pensar em filosofia e sociologia.

Coloquei uma rolha no ralo da pia do banheiro, esperei ela encher-se de água e mergulhei minha cabeça ali.

Não me questionem.

Pensava: “o que vou fazer da minha vida? Não gosto de humanas, não gosto de exatas, não gosto de linguagens, não gosto de biológicas... Que carreira eu posso seguir?”. Aquele era o primeiro ano em que o Exame Nacional do Ensino Médio seria usado para dar vagas aos alunos para as universidades, e sinceramente, eu não estava nem aí.

Comecei a falar sozinha de novo, agora fazendo bolhas na água.

Saiu uma outra garota de um dos banheiros e olhou para mim... Daquele jeito. Ela foi até a pia vizinha e lavou as mãos, e não tirava os olhos de mim. Levantei minha cabeça encharcada e olhei para ela, com o rosto todo molhado. Ela olhava para mim com uma cara de “qual o teu problema, garota?”. Eu a encarei por alguns segundos e levei minha cabeça de volta para a água.

*

Depois daquela aula, eu e minha amiga Jeanne sentamos perto da porta, esperando o próximo professor. Eu e Jeanne formávamos uma amizade improvável. Jeanne fazia o tipo "popular" do ensino médio, você com certeza conhece alguém assim; ela possuía um corpo bonito, devo admitir, com curvas que se acentuavam perfeitamente no uniforme escolar. Eu, por outro, lado, eram tão magra que o uniforme em mim parecia mais uma camiseta larga que aqueles rappers usam. Jeanne tinha

— Amiga, você tá horrível. – disse Jeanne.

— Esfrega na cara.

— Por que essa cara?

— Insônia.

— Algum problema?

— Na verdade, não. Só ansiedade mesmo.

— Ansiedade pelo quê?

— A manifestação de hoje à noite.

— Você vai mesmo participar disso?

— É claro que eu vou! E você também deveria!

— Deveria?

— Sim!

— Por quê?

— Ah, Jeanne! Já cansei de te explicar isso, temos que nos unir contra o prefeito.

— Mas o prefeito parece ser uma pessoa tão boa...

— Jeanne, fala sério! Olha o caos que a cidade está agora por causa daquele...

Fui interrompida por um colega nosso, Denis, que colocou na frente do meu rosto um jornal impresso.

— O que é isso? – disse eu, sendo cegada pelo jornal de Denis.

— Leia a primeira página. – ele disse.

“Misterioso lobisomem ataca fazenda no interior da cidade”.

— Ah, legal, Denis. Eu não tenho tempo para suas ficções científicas agora.

Denis era um gordinho que adorava a cultura pop, era muito fã de franquias como Star Wars, Indiana Jones, Percy Jackson, Harry Potter.

— Não é uma ficção, Evelyn! Veja, é o jornal local! Deixe-me ler para você: “um fazendeiro da zona rural relatou que na noite ontem, suas cercas foram violentamente destruídas e seus animais mortos. Ao escutar o barulho, saiu para ver o que era, e afirma ter visto uma fera bípede estranha, peluda e com cara de lobo, mas que se movimentava como ser humano”.

— Ok, ok, Denis, já contou sua historinha, agora para!

— Não é historinha, Evelyn! Se você for ver edições anteriores, vai ver que esse não é o primeiro relato sobre o lobisomem.

— Dá para acreditar nisso? – olhei para Jeanne.

— Bom, pra falar a verdade, dá sim. – ela me respondeu.

— Ah, não Jeanne! Tu também?

— Evelyn, se fosse um caso isolado, mas já se fala sobre esse lobisomem há meses! E nenhum dos relatos contradiz os outros.

— Acho que já chega de escola por hoje. – fui até a sala e peguei a minha mochila.

— Ei! Aonde você vai? – perguntou Jeanne.

— Para casa. Vou me preparar para a manifestação de hoje à noite.

— Você enlouqueceu? Temos duas aulas ainda!

— Se as duas aulas forem iguais a essa última, eu não estou perdendo nada.

*

Cerca de 20h30min.

Eu já estava terminando de me arrumar, quando minha mãe bateu na porta do meu quarto.

— Pode entrar.

Ela entrou, com aquelas sobrancelhas franzidas e aquele meio sorriso no rosto.

— Filha, você precisa mesmo ir hoje?

— Já conversamos sobre isso, não foi, mãe?

— Mas você vai sozinha?

— Sim, mãe, eu vou. Ninguém aceitou ir comigo, então eu vou sozinha.

— Isso não é perigoso?

— Não, mãe, quer dizer... Eu vou sozinha, mas vai ter muita gente lá. Não se preocupe, ninguém vai me assaltar, nem nada do tipo.

— Não é quanto a isso que eu estou preocupada.

— Então é com o quê?

— Você sabe, aquilo que os jornais vem informando.

— Ah, não, mãe! Não me diga que até você acredita nesse negócio de lobisomem!

Sem falar nada, ela pegou o controle remoto e ligou a pequena televisão que havia no meu quarto. Estava passando o jornal local.

— Chega a 10 o número de pessoas que afirmam ter visto o misterioso lobisomem. – disse o jornalista – O caso mais recente é o de um fazendeiro que afirmou ter tido as suas cercas destruídas e os seus animais mortos pela misteriosa fera. Quem assume essa reportagem é o nosso repórter...

Minha mãe desliga a televisão.

Olhei para ela com a mesma cara que ela fez ao entrar no quarto.

— Mãe – falei –, não tem lobisomem nenhum. Fica tranquila. Eu sei me cuidar.

Beijei a testa dela e sai dali. Meu pai estava concentrado assistindo o jornal na televisão da sala, passei por ele sem chamar sua atenção.

Minha mãe foi até a janela e ficou me olhando até que eu virasse a esquina. Poucos segundos depois de eu sumir da vista dela, aconteceu o apagão.

— AH! – gritou meu pai, assustando a minha mãe – Justo na hora do jornal!

Claro que, naquele momento, a última preocupação da minha mãe era com o jornal.

*

Devo admitir que fiquei com um pouco de medo quando as luzes se apagaram, estava eu sozinha, numa rua quase deserta e com um apagão na cidade! Seria a oportunidade perfeita para que aparecesse, sei lá, uma fera...


    NÃO! Claro que não! Não acredito que até eu estava considerando isso! Não existe lobisomem! E se por algum momento eu achava que apareceria um, era apenas fruto do medo que o apagão tinha me deixado.

Senti meu coração acelerar quando ouvi um forte barulho na calçada à minha direita. Quando olhei, era só um cachorro que tinha revirado uma lata de lixo.

Eu estava mesmo considerando voltar para casa, até que vi um grupo de jovens que iam em direção ao local da manifestação. Não conhecia nenhum deles, mas me senti mais segura na companhia de alguém. Eles me falaram que o tal apagão tinha sido provocado por manifestantes e contaram sobre o quanto estavam ansiosos para o protesto.

Chegamos ao ponto de encontro, nos reunimos a outras dezenas de grupos, e fomos todos em direção à prefeitura.

E foi aqui onde paramos na última vez.


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Notas finais do capítulo

Só bons exemplos nesse capítulo. KKKKKKKKKKK.

Espero que tenham gostado! ^^