Until My Last Breath escrita por Lady


Capítulo 9
Oitavo




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Hazel estava agitada. Nico estava desacordado a duas horas, pálido como leite e com bolsas escuras abaixo dos olhos. Quando viu o irmão desfalecer em sua frente, ela não pensou direito, gritou e chamou por Hades para que ele pudesse ajudar o irmão.

Se sentia culpada por ter compactuado com a ideia louca de Nico e, agora, vendo o irmão dormindo na cama, mais frágil do que antes, só piorava o sentimento.

— Ele ficará bem, Hazel. — A menina estremeceu ao ouvir a voz grave de Hades às suas costas. Os pelinhos do corpo se arrepiaram e ela engoliu em seco antes de encarar aqueles olhos negros do deus. Hades estava parado ao lado da porta, observando-a velar o sono do filho.

— Eu não sei por que deixei ele fazer isso... Eu poderia ter impedido... Eu não queria que isso acontecesse. — A cada palavra proferida a garganta doía com a vontade de chorar de nervosismo.

Hades nada disse. Olhava a menina a sua frente compreensivo, entendia o motivo dela não ter impedido o filho, não a culpava.

— Às vezes não pensamos direito quando estamos desesperados para ajudar quem amamos.

O deus suspirou e saiu. A passos rápidos marchou para a sala do trono, onde Alecto esperava sorrindo vitoriosa. Voava em círculos, ansiosa para se reportar a Hades e finalmente ter o sossego que não tinha há sete dias, desde que Will Solace fugiu do julgamento.

— Senhor! A alma de Will Solace foi encontrada! — Seu tom de voz era de alívio, um enorme peso parecia ter saído de seus ombros. — Ele estava há apenas três quilômetros de distância do castelo, senhor. A alma já está sendo trazida para cá.

— Finalmente. — Hades suspirou. Levantou-se do trono e rumou para o quarto de hóspedes onde o corpo do rapaz se encontrava deitado na cama envolto de uma fina camada de luz esverdeada, a camada protetora que Apolo colocou para que o corpo permanecesse saudável depois de morto.

Num estalar de dedos, velas negras sugiram no chão do quarto, formando um círculo envolta da cama. A luz do abajur ao lado da cama tremeluziu e enfraqueceu, deixando quarto mal iluminado. As velas não estavam acessas ainda, cada pequeno processo do ritual tinha sua hora para acontecer e os detalhes eram vitais para o sucesso. Hades observou o menino a sua frente e pegou-lhe a mão. Pele desbotada pela falta de sol, lábios secos, os cabelos ondulados estavam espalhados pelo travesseiro e levemente gelado. Se surpreendeu quando notou que Will não estava tão gelado como deveria estar e meneou a cabeça ao perceber que isso se dava ao feitiço de Apolo para a conservação do corpo.

Suspirou e saiu do quarto. Agora tinha apenas que esperar Alecto voltar com a alma para começar. Andou até a sala do trono e encontrou Hazel a lhe esperar sentada aos pés da escadinha que levava ao assento.

— Nico já acordou e está no quarto, senhor. — A menina disse. Olhos fixos no chão e mãos apertando a barra da camiseta que usava. — Não sei se depois de hoje o senhor me permitirá ficar junto dele, mas eu queria apenas pedir desculpas e deixar claro que a minha intenção nunca foi fazer mal ao meu irmão...

Hades sorriu levemente para ela. Embora a menina fosse filha de sua forma romana, ele não lhe repudiava, até gostava da importância que ela tinha na vida de Nico.

— Venha cá. Preciso conversar com você por um instante. — O deus falou e acenou para que ela lhe acompanhasse. — Sabe, Hazel, desde que me entendo com vida, fui uma pessoa difícil de conviver e até rude, insensível e indelicado na maior parte das vezes. Olhe como consegui minha esposa, afinal de contas!

Hades sorriu com a lembrança e deu de ombros.

— Mas desde que comecei a conviver com meu filho, o único que tenho... Veja bem, não pretendo magoá-la, mas você entende que não é minha filha, certo? Eu, como Hades, não sou se pai.

Hazel sorriu diante a fala do deus.

— Eu entendo, senhor. Sou romana e por mais parecidas que suas formas greco-romanas possam pareces, são deuses diferentes. Todos eles.

O deus olhou para a menina andando ao seu lado e concordou.

— Você é uma menina sensata, Hazel Levesque. — A menina apenas sorriu constrangida. — Enfim, desde que passei a conviver com Nico, eu comecei a mudar, por assim dizer. Somos deuses e não mortais, não sabemos como ser atenciosos com os detalhes, como aproveitar as oportunidades e, principalmente, não sabemos como ser pais. Eu venho aprendendo pouco a pouco tudo isso com Nico desde que ele veio morar aqui no castelo.

Ambos caminhavam lado a lado. Hazel apenas escutava o que o deus dizia e sorria com a imagem de Nico ensinando estes tipos de coisas para o deus da morte.

— Quando fui buscar meu filho no acampamento, quando toda a tragédia aconteceu, ele me fez uma pergunta que ecoou na minha mente imortal. Será que por ser meu filho ele não merecia a felicidade? — Hades parou e olhou para a menina. — O que você acha, Hazel Levesque? Meus filhos não merecem a felicidade? Meus filhos estão destinados a terem apenas a morte em seu caminho?

Hazel não sabia o que falar. Nunca em sua vida, ela imaginou que estaria numa conversa tão profunda com Hades. Aqueles questionamentos nunca haviam passado em sua mente, afinal Plutão não carregava tanto a áurea fúnebre que Hades carregava, esmo ambos sendo o deus da morte, e ela tinha sim encontrado sua felicidade no acampamento Júpiter ao lado de Frank. Sua boca abriu e fechou enquanto observava o deus retomar os passos e parar de frente a uma porta fechada.

— Foi pensando no bem-estar dele que resolvi fazer o que farei hoje. Não quero que Nico carregue o fardo da morte consigo, não quero que ele pense que é uma maldição ser meu filho. Entre, Hazel.

Assim que entrou, Hazel sentiu as pernas tremerem e a voz sumir da garganta. O choque de ver o corpo de Will Solace deitado na cama quase a fez perder o equilíbrio, as mãos tremeram e os olhos se arregalaram. Foram passos arrastados que a fizeram chegar na cama e tocar a mão do menino morto.

— O senhor... — A voz tremeu e um arrepio lhe passou na espinha. — O senhor irá reviver ele?! Mas... Como... Quando...?

— Não há necessidade de explicar todos os detalhes, mas quero que me faça um favor, Hazel. — O deus passou a olhar o corpo na cama, seus olhos demonstravam cansaço e Hazel se perguntou por que Hades não ressuscitou Will mais cedo se tinha como o fazer. — Agora que tenho tudo para fazer o ritual, farei ainda hoje mesmo. A alma precisará de um tempo para se reconectar ao corpo, Hazel, mas assim que Will acordar ele precisará de um lugar calmo para se recuperar. Converse com Reyna Ramirez e veja há possibilidade deles ficarem em Nova Roma para a recuperação.

— Eles?

Hades sorriu de canto e olhou para a menina.

— Acredito que Nico conseguirá cuidar dele e se recuperar. Eles precisam um do outro para se reerguerem. — A menina sorriu diante aquilo e apertou de leve a mão gélida de Will.

— Então eu vou voltar para o acampamento, preciso correr atrás dessas coisas para o meu irmãozinho! — Riu contente.

— Vamos, vou esperar a alma de Will Solace na sala do trono e já abro um portal para você ir ao acampamento.

*

Nico estava cansado. Sentia como se houvesse corrido uma maratona, seu corpo estava dolorido, sua cabeça latejava levemente e a boca estava seca. Estava ao mesmo tempo desapontado com a tentativa falha de invocar a alma de Will e animado de quase ter conseguido. Ele havia reconhecido a calça jeans que o loiro usava no dia que morreu, viu o All Stars encardido do namorado; o coração chegou a falhar uma batida com a possibilidade tão perto de poder falar com o rapaz, mas ainda estava fraco demais para prosseguir.

Forçou o corpo a sair da cama e andou até o banheiro. Queria tomar um banho. Queria que a água quente pudesse levar ralo abaixo todo o cansaço e vazio que sentia. Não podia culpar Hazel por ter se desesperado e ter chamado Hades quando desmaiou. A menina só queria seu bem, afinal.

O contato do chão gelado com os pés descalços após o banho fazia seu corpo se arrepiar e tremer. A toalha enrolada na cintura deixava seu dorso a mostra e evidenciava o peitoral magro do menino, os sete dias sem comer direito começavam a dar sinais. Sabia que precisava ir conversar com Hades a respeito da tentativa de invocação, não podia deixar Hazel assumir toda a culpa, já que a menina havia saído do quarto para ir falar com o deus. Vestiu um jeans qualquer, uma blusa azul escuro sem estampa e saiu do quarto.

Os corredores amplos e vazios do castelo já não lhe assustavam mais, até o confortavam as vezes. As figuras translúcidas que de vez em quando apareciam passando entre portas e paredes não se incomodavam com a presença viva do semideus, algumas até o cumprimentavam e tentavam puxar assunto, muitas das vezes Nico apenas respondia que não tinha tempo para conversas e saia andando. Se não fosse o luto, o moreno poderia até falar que pareciam as férias de inverno que passava junto ao pai.

A passos calmos andou até a sala do trono, sempre observando a quietude do castelo e as almas vagando por entre corredores.

— Nico! — A voz de Hazel lhe despertou dos pensamentos, nem ao menos havia notado que estava parado na porta do salão. — Tenho que já ir embora, mas prometo que nos veremos em breve!

— O que!? Isso é por causa do que tentei fazer hoje? Pai, Hazel não tem nada a ver com isso! Tudo foi ideia minha!

O desespero era aparente. Nico não queria se afastar de mais ninguém, estava frágil e debilitado, não aguentaria a solidão que as paredes do castelo lhe proporcionavam. Pelo menos não aguentariam são.

— Ei, ei não precisa ficar assim. Não tem nada a ver com o que aconteceu hoje, sério. — Hazel disse afagando os cabelos negros do irmão. — Vou voltar para o acampamento porque tenho algumas coisas para resolver por lá, mas eu prometo que não vai demorar pra gente se encontrar de novo.

Nico sentiu o coração lhe apertar. Sabia que não ia perder a irmã, mas o simples fato de ter que se afastar de mais alguém lhe doía o peito. Olhou para o pai, mas ele não parecia estar prestando atenção no que acontecia entre os irmãos, seus olhos estavam fixos na porta.

— Hazel, está na hora. — A voz grossa do pai soou quase como uma ordem. Nico estranhou como a menina pareceu estranhamente animada e quase não retribuiu o abraço apertado que a irmã lhe deu.

— Seja forte, eu sei que você vai melhorar rapidinho! — E com isso a menina beijou-lhe a bochecha e correu para uma porta negra que se abriu num estalo de dedos do pai.

Assim que a porta sumiu novamente, Nico se virou para o pai. A expressão de confusão nítida no rosto, a raiva crescendo dentro de si.

— Nico, volte para seu quarto, preciso resolver alguns assuntos importantes agora. Prometo que quando tudo aqui estiver resolvido, eu conversarei com você, explicarei porque Hazel Levesque teve que ir embora.

Nico queria protestar, queria saber naquele exato momento porque sua irmã praticamente fugiu do mundo inferior, por um momento quis até poder ter ido com ela. Só não queria ficar sozinho mais uma vez. Bufou e andou até o quarto, a raiva ainda fervendo no peito.

Quando Hades fosse conversar consigo, Nico não aceitaria nada menos que a verdade.

*

Will estava confuso.

Estava vagando junto as outras almas dos Asfódelos quando um monstro horrendo de nome Megera, com garras afiadas, cabelos em formas de serpentes e asas de morcegos o arrastou até o castelo. Não tinha mais coração, mas apostaria que se tivesse, ele estaria palpitando como um louco. Sentia apreensão, não fazia ideia do motivo que levava o senhor dos mortos a querer falar consigo. Será que em vida ele havia feito crueldades inimagináveis e agora Hades iria puni-lo pessoalmente por toda a eternidade?

O loiro balançou a cabeça em negativa. Não se lembrava de muita coisa, não tinha nem certeza se seu nome era mesmo Will, mas sabia que nunca havia feito nada cruel em vida. Ou pelo menos achava que nunca tinha feito, por qual outro motivo Hades mandaria um monstro horrível para ir buscá-lo nos Asfódelos? Certamente não seria coisa boa.

Quis gritar quando o monstro pousou, jogando o rapaz no chão gélido na entrada do castelo e outra criatura parecidíssima com a Megera esperava-os no portão. Seu corpo tremia de pavor, não queria receber uma punição por algo que nem sequer lembrava.

— Alecto, a alma está entregue. — O monstro falou e Will se arrepiou com o som desagradável que saiu da boca da besta. Alecto apenas assentiu e empurrou o loiro portão adentro.

Se não fosse o desespero da punição iminente, Will ficaria até embasbacado com a magnitude do castelo de Hades. Paredes ornamentais, quadros do deus com Perséfone e alguns outros que Will não conseguiu identificar, almas tremeluziam andando pelos corredores da construção e tochas com fogo eterno que iluminavam o caminho que seguiam.

Quando enfim entraram na sala do trono, Will não conseguiu fingir indiferença. O salão não era nada parecido com que Will pudesse algumas vez imaginar, não era obscuro e melancólico como alguns poderiam achar, mas tampouco exalava alegria e felicidade. Era algo que o rapaz não conseguia transcrever em palavras, tinham tantas coisas a serem observadas que por um momento Will esqueceu o real motivo de estar ali.

— Senhor, a alma de Will Solace. — Alecto falou, fazendo uma breve reverência ao deus sentado no trono.

— Muito bem, Alecto. Pode se retirar, eu conduzirei a alma até o quarto.

E com um aceno de mão do deus, a criatura horrorosa que escoltou o menino, sumiu. Will olhou assustado para o deus e congelou quando o homem de vestes escuras e que as vezes tremeluziam rostos agoniados andou em sua direção. Quis desviar o olhar quando os orbes negros do deus olharam os seus com uma profundidade esmagadora.

— Hum... — O deus estreitou o olhar e tocou-lhe o topo da cabeça. — Isso não é bom, meu jovem. Ainda lhes restam alguns resquícios de emoções humanas, mas as lembranças e memórias quase não existem mais, estão por um fio. Se lembra do seu nome?

Will não entendeu nada do que o deus disse, mas achou melhor responder a pergunta do homem.

— Acho que é Will... — Sua voz saiu num sussurro.

Hades meneou a cabeça. Um semblante preocupado se formou no rosto do homem e então um suspiro derrotado saiu de seus lábios.

— Me acompanhe, Will. Tentarei te ajudar, mas acho que já é tarde demais...

O menino quase não conseguiu mexer as pernas para acompanhar o deus que já se retirava do salão. A confusão dominava a mente dele. Como assim era tarde demais? Para o que era tarde demais? Hades não iria puni-lo, mas sim ajudá-lo? Seguei o deus em silêncio até um grande corredor cheios de portas, que Will julgou serem os quartos.

Foi então que ele sentiu algo. Alguma coisa fazia ele querer seguir adianta naquele corredor, mesmo Hades abrindo a porta do primeiro quarto. Seu corpo instintivamente foi impulsionado a continuar andando, nem ao menos entrou no quarto e viu o que Hades queria lhe mostrar para ajudar.

— Não se distancie muito deste quarto, o ritual não dará certo se você ficar a mais de novecentos metros de distância. — Escutou a voz do deus falar para si, mas não respondeu. Não entendeu o que ele quis dizer com tudo aquilo, mas não ligava.

Sentia que algo o chamava, não como havia acontecido mais cedo, quando uma força o puxava para um lugar e seu corpo começou a sumir gradativamente. Desta vez era algo que ele sentia estar o atraindo, mas não sabia o que era. Não sabia ao certo onde estava indo, suas pernas o moviam por vontade própria, o sentimento de ansiedade aflorou na sua alma e quando parou de frente a uma porta, o corpo travou.

O que estava sentindo? Medo? Aflição? Agonia? Tudo era meio abstrato para Will, já que eram emoções sentidas por pessoas vivas. Como Hades mesmo já havia falando, restavam-lhe poucas emoções humanas, mas sabia que sentia algo, algo que revirava suas entranhas. Sentiu o corpo se desfazer de forma engraçada quando atravessou a porta e então o viu. O rapaz estava de pé de costas para a porta, observando uma fotografia dependurada na parede enquanto segurava uma menor nas mãos trêmulas.

Will se mexia silenciosamente, finalmente parecendo o fantasma que era. Seus olhos percorriam as costas do rapaz a sua frente, algo dentro dia si se revirava. O rapaz suspirou e coçou os cabelos, então se virou enquanto falava, sua voz parecia cansada.

— Agathe, eu consigo sentia sua presença. Qual a parte de me deixe em paz você não- — Os orbes negros se arregalaram quando observaram o fantasma de Will e a foto que estava em suas mãos caiu no chão. — Will?


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Notas finais do capítulo

Megera era uma das três erínias (ou fúrias no romano) da mitologia grega. São elas Alecto, Megera e Tisífone.

Agathe é uma fantasma-empregada de Hades que serve o castelo. Ela já apareceu em outros capítulos servindo Hades. Personagem fictícia criada apenas para esta fanfic.

Este foi o penúltimo capítulo, espero que tenham gostado.



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