Quem lhe ensinou a amar? escrita por La Rue


Capítulo 10
A filha de Ares


Notas iniciais do capítulo

Olá meus queridos semideuses, tudo bem com vocês! Estou muito animada para esse cap. finalmente conheceremos um pouco mais sobre o envolvimento de Clarisse e Lucy e pra mim esse é o melhor capítulo da fic. Já que o passado foi praticamente o que menos gostaram kkkkk...

Boa leitura a todos!



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Aquilo só poderia ser algum tipo de brincadeira de mau gosto. Quando Mark lhe acordou mais cedo que o esperado, dizendo que Quíron queria conversar com os dois ela realmente achou que o assunto seria de cunho mais específico ou sério, até mesmo cogitou alguma possibilidade - por mínima que fosse - de que poderia sair em missão com o irmão mais velho, que finalmente colocaria os pés fora dos limites do Acampamento Meio-Sangue, que seus esforços de alguma forma estariam sendo reconhecidos… Mas não.

Ela tentou se concentrar nas palavras de Quíron, ela realmente estava dando o seu melhor para poder prestar atenção no discurso do centauro, mas ela havia focado sua atenção em um looping nas palavras "Ares", "semideusa" e "Acampamento". Pelo que havia captado, se é que estava certa, o próprio deus da guerra viera até o local para deixa aquele ilustre presente para ela e Mark.

—Ares acha que somos algum tipo de piada? - seu tom irritado fez com que o diretor de atividades interrompesse suas explicações e voltasse os olhos escuros e penetrantes para a semideusa. - lembrou que somos seus filhos e mandou um presentinho de Natal antecipado?

Em qualquer outra situação ela teria escutado o seu superior, não contestaria, se manteria calma no limite que sua personalidade explosiva permitisse, mas aquele não era o momento e ela não se sentia nada intimidada pelo treinador de heróis.

Mark lhe deu aquele olhar já bem conhecido por ela, La Rue se remexeu incomodada na cadeira e ficou calada, os braços cruzados sobre o peito. Quíron retomou sua fala, mas ela continuou a pensar em como Ares, o senhor da guerra, o deus todo poderoso e ocupado demais para dar um "oi" a qualquer um dos seus filhos tivera a "benevolência" de levar ele mesmo uma semideusa para o refúgio dos meio-sangue. E o pior de tudo, deixara a mesma sob a tutela confusa de Clarisse, Mark e Quíron.

O que Ares achava? Que eles eram algum tipo de babá? Que já não possuíam problemas o suficiente? Estava furiosa… Enquanto ela apodrecera por anos em um orfanato, esperando por algum consolo até que Rachel finalmente apareceu em sua vida e lhe entregou uma faca - a única coisa que realmente lhe ligava a sua parte divina - uma semideusa qualquer tivera o privilégio de ser enviada por seu próprio pai.

—Porque nós dois? - questionou Mark, o loiro parecia bem menos arredio que Clarisse quanto às ordens de seu pai.

Quíron remexeu em alguns papéis aleatórios em sua mesa enquanto limpava sua voz após um breve pigarro, ele também havia sido pego de surpresa com aquilo.

—Eu fui incumbido de cuidar da semideusa de forma mais restrita por ela ser muito jovem para dividir o alojamento com os mais velhos. - começou o centauro com a voz tranquila de sempre. - você foi escolhido por seu pai por estar à frente do seu chalé, você é o líder e como tal deve ter responsabilidades. - ele pigarreou novamente e direcionou a atenção para a garota ao lado do loiro, os olhos verdes lhe encaravam com desconfiança. - já a Srta. La Rue, bem… Creio que ela seja a mais próxima de você no escalão ou estou errado?

O conselheiro confirmou com a cabeça, não que tivesse sido intencional ou algo do tipo, mas a campista passara tanto tempo seguindo seus passos, sendo treinada por ele e aprendendo sobre os ofícios e competências de um semideus de alto nível que se havia alguém que pudesse ser reconhecida como segunda no comando esse alguém seria Clarisse.

—Que tal conhecerem ela? - tentou usar o seu tom mais animado e apaziguador, mas os filhos de Ares a sua frente não pareciam tão felizes assim com a possibilidade.

O centauro guiou os dois jovens pela Casa Grande até a ala onde ficava a enfermaria, os três permaneceram calados, mas os dois campistas pareciam dividir o mesmo pensamento… Afinal se a garota estava lá, não deveria se encontrar em seu estado perfeito.

—Fizemos alguns exames apenas por precaução. - informou Quíron como se soubesse exatamente o que se passava na cabeça dos dois. - mas a garota está bem.

Eles apenas assentiram com a cabeça antes de adentrarem o local juntamente com o mais velho, seguiram até onde a assistente do centauro se encontrava. Quando eles olharam para a maca eles esperavam uma semideusa com no mínimo dez anos, mas novamente se enganaram… Lá estava sentada e encolhida uma garotinha loira, com olhos castanho-esverdeados desconfiados e amedrontados. Ela não tinha sequer cinco anos.

—Olá Lucy. - a voz do centauro saiu de forma bondosa e tranquila. A menina pareceu menos tensa com a presença do mesmo. - eu queria te apresentar dois dos seus irmãos… Esse é Mark, líder do chalé de Ares e essa é Clarisse.

Os olhos da pequena transitaram entre os dois adolescentes que lhe encaravam com curiosidade, mas se prenderam aos olhos intensos da garota mal encarada de olhos verdes.

—Caso precise de algo, eles vão lhe ajudar no que for preciso. - comunicou à menina que ainda parecia dividida entre permanecer desconfiada com os desconhecidos ou se sentir surpresa por ter irmãos.

 

~***~

 

Os dias que se seguiram foram um verdadeiro tormento, a garotinha realmente levou ao pé da letra que poderia acompanhar os dois semideuses sempre que precisasse e isso estava minguando a pouca paciência quase inexistente de La Rue. O brutamonte do seu irmão mais velho havia se afeiçoado à pequena facilmente, até mesmo Silena caíra em seus falsos encantos assim que lhe conhecera, mas a garota era uma verdadeira pestinha com carinha de anjo. A filha de Afrodite insistira dizendo que deveria ser mais maleável, que ela era apenas uma criança perdida em meio aquele bando de desconhecidos, que estava assustada… Mas Clarisse tentava não explodir todas as vezes que a menina tentava lhe seguir pelo acampamento quando fugia da tutela de Quíron.

—Clarisse… - chamou Silena tocando em seu antebraço de forma carinhosa. - por favor, não seja tão cabeça dura.

Mas a morena permanecia com cara de poucos amigos e as sobrancelhas franzidas. Tornara-se uma pessoa irredutível, mas conseguia compreender os motivos, primeiro achava que era apenas ciúme, afinal ela estava pela primeira vez tendo que dividir a atenção que tinha dela e de Mark apenas para si até então. Mas não era isso, Clarisse tinha receio, preferia manter a menina longe de si não queria criar mais um vínculo, principalmente com alguém tão frágil e dependente.

—Eu vou atrás dela. - deu-se por vencida, soltando um suspiro pesado, ela não conseguia dizer não para Silena.

A morena lhe deu um beijo demorado nos lábios e deslizou o nariz contra seu pescoço em forma de agradecimento, La Rue correu a ponta dos dedos pelos fios negros antes de se apartarem de fato.

A filha de Ares aguardou de forma paciente para ser liberada e enfim resolver as coisas com a sua irmã mais nova de fato. O estopim de toda aquela confusão se deu justamente porque Lucy resolvera lhe seguir como um animalzinho de estimação que fora abandonado, os únicos momentos que não lhe via de fato era na hora de dormir e nas refeições… Sua última discussão com a pequena semideusa foi o que justamente lhe levou até a enfermaria.

O chalé de Ares estava em um treino intenso, do tipo exaustivo, estressante e perigoso, Mark estava bem inspirado. O choque entre escudos, espadas e lanças era a música que regia o treino dos campistas naquele dia, Lucy se infiltrara entre os mais velhos para poder ficar mais próxima de Mark, ela gostava de assistir os treinos, mesmo que de longe… Foi quando Clarisse levou uma estocada de lança que atravessara o escudo e ainda atingiu o antebraço, ou era isso, ou a menina seria gravemente ferida.

Clarisse ficou tão nervosa, não por ela, mas pelo que poderia ter acontecido aquela menina que sequer ela demonstrava ter alguma afeição que brigou com Lucy, disse palavras extremamente duras para a semideusa que havia ficado em choque tanto pelas palavras, como pelo golpe que a mais velha recebera em seu lugar.

 

~***~

 

Não conseguia esquecer o que havia acontecido, ela ainda tinha a imagem do sangue correndo pelo braço da irmã mais velha, Clarisse se machucara e foi por sua culpa. Não havia feito por mal, ela estava tão extasiada em saber que existiam outras pessoas como ela, que possuía irmãos, que não conseguia simplesmente ficar longe.

Ela não queria que se machucassem por causa dela, não mais, ela estava cansada daquilo. Quando a garota de olhos verdes direcionou a voz para ela de forma furiosa entrou em pânico.

—Eu sinto muito… - sussurrou com a voz levemente trêmula, ela não estava com medo da campista, mas ficara triste com o que havia acontecido.

Havia estragado tudo, Clarisse estava com raiva, jamais gostaria dela depois daquilo, simplesmente correu, mesmo escutando as vozes pedindo para que parasse. Saiu da Arena e correu o máximo que pode, mesmo que fosse perigoso ela seguiu mata adentro, correu tanto que suas pernas ficaram extremamente doloridas e seus pulmões ardiam em busca de mais ar.

Olhou ao seu redor, não sabia onde estava, mas sabia muito bem que não deveria estar ali, Quíron lhe advertira diversas vezes de que os bosques eram território proibido, perigoso até mesmo para semideuses bem treinados. Estava perdida, deu mais alguns passos incertos, a mata era muito fechada para saber qual seria a direção correta para retornar.

Caminhou a passos mais tranquilos e cautelosos, sabia que a qualquer momento poderia trombar com alguma criatura não muito amistosa e caso isso acontecesse ela seria pelo menos um aperitivo. Tentou pensar em alguma solução, mas não sabia o que fazer, ela já conhecia bem algumas partes do acampamento por sair escondida, mas nunca pensara em vagar por aquele local, muito menos sozinha.

Continuou por alguns minutos até chegar a uma clareira, sentou-se à sombra de um das árvores, estava cansada e não conseguiria ir muito longe. Abraçou os joelhos contra o peito, tentou não se desesperar, coçou o nariz tentando evitar as próprias lágrimas, ela não era fraca, prometera a sua mãe que seria forte.

Escutou passos se aproximando, seu coração palpitou, sabia que por ali havia dríades e outras ninfas, por mais que não tivesse encontrado com nenhuma até então, quem sabe alguma delas poderia lhe ajudar a retornar aos limites da floresta. Levantou a cabeça devagar ao sentir o cheiro de pinheiro, mas o que encontrou próximo a ela não parecia ser alguma das ninfas que viviam nas árvores.

Seus cabelos escuros e encaracolados caíam sobre os ombros e ostentavam uma guirlanda de víboras, deveria ser uma adolescente pela estrutura corporal e rosto jovial, trajava uma pele de pantera e possuía um cajado estranho em suas mãos. Seus olhos eram extremamente vermelhos, assim como os lábios, uma coloração nada natural para um humano ou semideus.

—Você é Dionísio? - o tom utilizado pela adolescente era levemente carregado, como se estivesse sobre efeito de alguma substância e seus olhos também pareciam enevoados e distraídos.

 

~***~

 

Já havia procurado por todos os lugares possíveis e conversado com Mark, mas o conselheiro não possuía qualquer notícia sobre o paradeiro da sua irmãzinha. O loiro ficou encarregado de fazer uma nova ronda, Lucy gostava de se esconder e como estava chateada deveria ter se embrenhado em algum lugar com pouca probabilidade de lhe encontrar.

—Ela não está na Casa Grande. - afirmou o centauro passando os dedos grossos nos cabelos castanhos e espessos. - pensei que estivesse com vocês, por isso não me preocupei. - meio que já estava se acostumando com as saídas furtivas da menina nos últimos tempos.

A semideusa suspirou de forma pesada, a última esperança que ela tinha era de que a garota tivesse retornado para o local onde normalmente passava a maior parte do dia - quando não estava fugindo do olhar atento do centauro.

—La Rue… - chamou o mais velho, os olhos intensos e castanhos se fixaram aos da garota. - ela é como você, não soube como é ter uma família de verdade, ela apenas quer se sentir segura.

Ela fez um sinal positivo com a cabeça, não sabia o que havia acontecido a Lucy antes que a mesma chegasse ali, tampouco sobre o paradeiro de sua mãe ou se algo teria acontecido a ela, ou pior, se havia abandonado aquela garotinha pequena e magricela a própria sorte. Bem sabia como a vida de um semideus não era nada fácil, poucos os que realmente tinham ciência do que eram e conseguiam sobreviver até os vinte anos ou ter uma vida normal. 

Por precaução pegou sua lança e seguiu seus instintos como bem gostava de fazer e eles não estavam lhe dando um bom sinal. Ela atravessou o campo de morangos, aproveitando o aroma agradável do local, passou pela linha de tiro de arco e flecha agora vazia sem os filhos de Apolo e seguiu pelo lado sul da floresta. Em breve o sol iria se pôr e agradecia pelo clima do acampamento ser controlado por magia, diferente dali o restante de Long Island estava imersa em neve e frio intenso e esses seriam dois fatores que além de dificultar sua busca lhe causaria ainda mais preocupação com a loirinha.

Fez um percurso considerável pela mata fechada até conseguir de fato encontrar os rastros que estava procurando, um arrepio na nuca lhe deixou ainda mais em estado de alerta. A floresta estava muito tranquila, talvez tranquila até demais, ninfas, sátiros e alguns monstros de diversos portes habitavam as imediações, mas não escutara nada além de seus passos entre as folhas caídas e pequenos gravetos se partindo… Talvez os seres místicos estivessem lhe dando um aviso, era melhor se manter distante, assim como eles.

Afastou os pensamentos ruins e seguiu de forma mais rápida, tentando manter a cautela, ela conseguia ver agora um rastro diferente, pegadas maiores e algo que preferia não ter visto, algumas árvores estraçalhadas como se tivesse acontecido algum tipo de batalha… Sentiu mais um arrepio ao tocar o tronco de uma delas, se havia árvores destruídas significava que algumas dríades morreriam sem ter para onde retornar. Correu ainda seguindo a trilha um tanto confusa devido o rastro de destruição por ali presente, até que sentiu um solavanco no peito… Lucy estava ali perto, machucada e havia uma garota mais velha próxima a ela.

—Lucy! - chamou pela menina a plenos pulmões, sabia que a atitude não fora nada esperta da sua parte, deveria ter analisado a situação e o seu inimigo primeiro, para depois tomar alguma atitude, mas ver a menina daquela forma lhe fez perder a razão. - se afaste dela, agora!

Os olhos vermelhos como vinho focaram a guerreira com interesse e um sorriso inocente surgiu em suas feições que estavam bem longe de ser das mais amigáveis. Clarisse segurou a lança com precisão, a ponta elétrica faiscando, estava pronta para agir a qualquer momento.

—Ela não é Dionísio… - comentou de forma desnorteada. A semideusa lhe olhou confusa, como se tivesse falado a asneira mais infundada que já escutara. - mas vai servir como sacrifício!

Demorou apenas alguns segundos para que La Rue tivesse alguma reação e partisse para cima de quem quer que fosse. A garota desviou o golpe da lança com uma espécie de bastão de forma muito fácil, mas não escapou das cargas elétricas. Clarisse deu um sorriso convencido de canto, aquilo deveria ter doído, mas seu sorriso se dissolveu no momento seguinte, a garota ria de forma descontrolada e a risada lhe lembrava mais um animal do que qualquer outra coisa.

O sangue da semideusa gelou quando seus olhos focaram melhor no bastão que a garota usara para bloquear a lança, havia videiras entrelaçadas ao mesmo e uma pinha na ponta… Era um tirso.

—Você também quer ser um sacrifício? - a voz da garota parecia empolgada com a possibilidade.

Clarisse correu até Lucy e lhe pegou nos braços a menina estava em choque, correu em qualquer direção, mas não conseguiu escapar das garras que estilhaçaram parte das costas da sua camisa, travou a mandíbula ao sentir o cheiro de sangue e a dor aguda no local.

—Clarisse… - sussurrou a pequena contra o seu pescoço de forma assustada.

A garota estranha tinha agora longas garras afiadas que pingavam com o sangue de sua irmã e dentes assustadores amarelados e pontiagudos. Não parecia muito preocupada se os seus "sacrifícios" estavam fugindo ou não.

—Vai ficar tudo bem! - afirmou a mais velha lhe abraçando ainda mais forte contra o corpo, queria poder passar toda a segurança possível para a menina. - temos que fugir, não podemos lutar contra ela.

Clarisse tivera um mau pressentimento assim que colocara os olhos naquela garota, ainda bem que conseguira chegar a tempo ou talvez não tivesse sobrado muito da pequena para levar de volta ao acampamento. Aqueles olhos e os lábios em tom de vinho, a expressão levemente avoada e embriagada, mas principalmente aquele tirso em suas mãos acionara todos os alarmes de perigo em sua cabeça. Não tinha dúvidas de que era uma ménade - uma ninfa seguidora de Dionísio - era o tipo mais feroz e perigoso de força da natureza, pois não possuíam qualquer controle de seus atos… O pior de tudo era apenas poder fugir, as ménades não poderiam ser mortas, caso alguém o fizesse Dionísio castigaria o responsável com a loucura ou a morte, ou se o deus estivesse no pior de seus dias com as duas coisas.

 

~***~

 

Ela correra por tempo suficiente para despistar aquela maluca, mesmo assim estava insegura. Parou próximo a algumas árvores onde se manteriam escondidas, seu rosto pingava um suor gélido e seu corpo tremia, era febre... Não queria nem ver como estava o estado de suas costas.

—Você está bem? - perguntou assim que colocou a menina em terra firme novamente. - ela lhe fez algum mal? - examinava a menina, mas apesar dos hematomas, pequenos arranhões e o corte no lábio, Lucy não parecia ter sido ferida gravemente.

—Algumas dríades tentaram me ajudar. - informou a pequena com a voz ainda falha, estava com medo, vergonha e chateada com tudo o que havia acontecido. - mas elas, elas… - os soluços tomaram conta de sua voz e as lágrimas banharam o rosto sujo.

Como Clarisse suspeitara assim que chegou ao local, algumas ninfas foram mortas, por mais que elas pudessem renascer ainda assim era algo triste de se presenciar, principalmente para uma menina de apenas quatro anos.

—Lucy… - tentou acalmá-la, não seria nada bom que chamassem a atenção da ménade. - você aguenta correr?

A menina demorou alguns instantes até realmente entender as intenções da mais velha. Ela negou veementemente com a cabeça, com novas lágrimas ameaçando rolar pelo seu rosto:

—Eu não vou deixar você sozinha… - o desespero na voz era evidente. - você está machucada!

Clarisse lhe trouxe para perto, lhe envolvendo com os braços para lhe confortar enquanto tentava encostar-se à árvore sem sentir tanta dor.

—Se seguir direto você vai conseguir chegar ao acampamento. - La Rue segurou no rosto da menina assim que a mesma se acalmou. - precisa voltar e conseguir ajuda… Ela vai me rastrear pelo sangue, não posso deixar que ela me siga, colocaria a vida de outros semideuses em perigo.

A garotinha até tentou rebater, mas Clarisse estava certa, ela não conseguiria correr por mais tempo lhe carregando nos braços, se lhe esperasse acabaria atrasando a irmã… Ela ajudaria da melhor forma que fosse possível.

—Eu vou voltar, prometo! - garantiu com convicção. Clarisse sorriu de canto, ela conhecia aquele brilho de determinação nos olhos da menina, não duvidava que ela retornaria de fato.

Quando Lucy deixou o local Clarisse fez um esforço descomunal para se manter de pé novamente. Usou a lança como apoio, suas costas já estavam dormentes devido à dor, aguardou pacientemente, escutou algum barulho próximo, ela não sabia o que fazer, mas tentaria ao máximo atrasá-la, precisava manter a irmã segura.

Não demorou a ser atacada novamente, conseguiu se desviar por pouco, mas caiu de joelhos após travar as novas investidas… Sentiu a raiva correr de forma borbulhante em suas veias, aquela desgraçada era rápida, forte e estava se divertindo.

—Minhas irmãs ficaram satisfeitas com um sacrifício como você. - o tom irônico chegou aos ouvidos de Clarisse no mesmo momento que os dedos se firmaram ao redor do seu pescoço, lhe erguendo do chão… Sua lança caiu enquanto suas mãos seguraram com força as mãos da garota. Sua vista que já estava embaçada escureceu aos poucos e a última coisa que conseguiu registrar foi uma mesa saindo do onde escutara um barulho antes de ser atacada… Uma mesa que andava e soltava fumaça, que coisa mais maluca de se ver antes de morrer.

 

~***~

 

Acordou de forma sobressaltada, estava em um lugar desconhecido e com a iluminação razoável, ao se levantar mãos gentis lhe forçaram a deitar novamente, ela não lutou contra, suas costas ainda doíam, mas ela repousou sobre a superfície improvisadamente confortável. A próxima coisa que conseguiu registrar foi a imensidão azul dos olhos de Silena e os lábios delicados contra os seus.

—Pelos deuses… - a filha de Afrodite suspirou aliviada, seus olhos ardendo pelas lágrimas. - eu senti uma dor forte no peito, sabia que você precisava de ajuda.

Clarisse lhe envolveu com os braços e aprofundou o beijo enquanto sentia as batidas descompassadas do seu coração.

—O que aconteceu? - estava zonza, mas se ela estivesse em alguma espécie de paraíso talvez não fosse tão ruim assim.

—Eu tive tanto medo. - beijou novamente os lábios da namorada que apenas retribuiu. - eu vim para a floresta o mais rápido que pude, eu encontrei Lucy e Charles no caminho… Por pouco não perdi você.

A filha de Ares procurou se sentar para assimilar melhor o que havia acontecido, Beauregard lhe ajudou no processo. Seus olhos correram pelo recinto desconhecido, havia muitas prateleiras, bancadas de trabalho gigantescas, luzes pendiam do teto iluminando o local e mais ao fundo havia um letreiro mágico piscando em cores natalinas e desejando um "Feliz Natal".

—Onde estamos? Onde está a Lucy? - sua voz ainda denotava certa fraqueza, provavelmente havia perdido uma quantidade de sangue considerável, mas a preocupação era evidente.

A resposta não veio da morena, mas sim do lado oposto de onde estavam. Charles Beckendorf, um semideus afro-americano, conselheiro do chalé 9 e filho de Hefesto se aproximava com uma bandeja na mão, uma mesa que andava e soltava fumaça pelas gavetas e Lucy, sua irmã tinha pequenos curativos, mas estava bem… Seu coração comprimiu, mas em alívio.

—Estamos no Bunker 9. - disse o rapaz alto e muito forte para a sua idade. - encontrei esse lugar há poucos meses, ainda precisa de bons reparos, mas pelo que descobri foi um esconderijo usado pelos filhos de Hefesto na Primeira Guerra Civil dos Semideuses.

Beckendorf lhe estendeu uma caneca e ofereceu um sorriso amigável, Clarisse murmurou um “obrigada” e aceitou a bebida de bom grado. Ela e o rapaz não se falavam muito, principalmente pelo fato de que Charles namorara Silena pouco tempo antes das duas garotas se envolverem de fato, porém La Rue sabia que ele era uma boa pessoa.

—Buford me alertara que havia algo muito estranho na floresta, ele costuma fugir um pouco e me deixar trabalhando sozinho. - começou a explicar enquanto distribuía as outras canecas antes de se acomodar em uma bancada próxima. - as ninfas, animais dentre outros seres começaram a fugir e estavam extremamente assustados.

Clarisse dera atenção ao relato enquanto tomava pequenos goles do chocolate quente… Estava muito bom.

—Quando fui verificar encontrei sua irmã, Silena e bem… - ele passou a mão livre pelos cabelos pretos como se não fosse nada bom reviver aquele momento. - fico feliz de ter levado o equipamento certo. - ele apontou para uma mesa de trabalho mais afastada onde havia um cinto de ferramentas e algo que parecia uma rede. - é feita com um fio especial desenvolvido por Hefesto, basicamente a mesma rede que prendeu os pais de vocês quando ele descobriu a traição de Afrodite.

La Rue não era a melhor semideusa para se lembrar de fatos longínquos que envolviam os Olimpianos, mas ela sabia a qual história ele estava se referindo, a tal rede prendia qualquer ser, sem lhe dar chances de se soltar. Afrodite e Ares caíram na armadilha quando Hefesto descobriu sobre a infidelidade cometida por sua esposa.

—Charles levou aquela desvairada até Quíron, ele realmente ficou assustado por uma ménade ter aparecido por aqui. - completou Silena mudando um pouco o foco do assunto. - graças aos deuses que apenas ela se perdeu do grupo, nem consigo pensar na carnificina que poderia acontecer se todas elas tivessem se deslocado até aqui.

—Silena cuidou dos seus ferimentos enquanto estive fora. - Beckendorf tinha um tom orgulhoso ao se referir à morena. - ainda bem que esse velho bunker é muito bem equipado, tinha néctar o suficiente para estancarmos os cortes, bandagens e outros itens emergenciais… Conseguimos até alguns materiais para fazermos um colchonete de última hora. - ele se levantou e deu leves tapinhas na mesa que havia se posicionado próximo ao seu dono. - que tal buscarmos alguns petiscos Buford? Creio que seja mais prudente passarmos a noite por aqui.

A mesa se remexeu animadamente e soltou mais fumaça, os dois saíram novamente para os fundos, Clarisse não tinha nenhuma noção de onde eles tirariam comida, mas ficaria extremamente agradecida se fosse verdade.

—Vou pegar mais chocolate quente… - Silena beijou os lábios da morena de forma demorada e depois o ombro.

Lucy fez um barulho para chamar a atenção das duas, indicando que ela ainda estava ali. Beauregard sorriu fazendo um breve carinho nos cabelos loiros da criança antes de se afastar.

Clarisse fez um sinal com a cabeça para que a irmã se aproximasse e assim ela o fez, mesmo que timidamente. A morena passou o braço pelos ombros pequenos e fez um breve afago no braço enfaixado. Lucy ergueu os olhos surpresa, era a primeira vez em dias que a mais velha lhe demonstrava algum afeto.

—Você foi uma heroína. - afirmou com um meio sorriso que foi correspondido pela garotinha de olhos esverdeados. - salvou minha vida.

A pequena semideusa olhou para os próprios pés, achando-os extremamente interessantes. Ao fundo começou a tocar uma música natalina bonita, Silena conversava animada com Beckendorf trazendo mais chocolate quente e Buford tinha uma bandeja com petiscos variados e que fizeram o estômago das crias de Ares se manifestarem assim que ambas sentiram o cheiro bom preencher o ambiente... Ambas sorriram. 

—Lucy… - chamou-lhe a atenção de forma branda, à menina fixou os olhos nos seus, tinha um sorriso bonito e que irradiava felicidade. - Feliz Natal.

—Feliz Natal… - desejou sentindo os olhos arderem antes de abraçar a guerreira com cuidado.


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Notas finais do capítulo

E então o que acharam? Espero que tenham gostado, como disse antes esse pra mim é o melhor capítulo da fic e sei lá me senti tão bem e fluiu melhor do que imaginava, tanto que saiu esse cap. grandão se comparando aos outros.

Bem, senta que lá vem bastante história hoje kkkkkk…

Hoje conhecemos as ménades, eu quis fazer um pouco do que tem delas em PJO com as da mitologia original. Talvez vocês conheçam ou tenham escutado sobre essas ninfas como Bacantes - a versão romana - e a mais usada na literatura e afins.

As ménades são descritas como ninfas selvagens e endoidecidas, de quem não se conseguia um raciocínio claro, seguidoras do culto de Dionísio. Durante o culto, dançavam de uma maneira muito livre e lasciva, os mistérios que envolviam o deus, provocavam nelas um estado de êxtase absoluto, entregando-se a desmedida violência, derramamento de sangue, sexo, embriaguez e autoflagelação.

Normalmente elas usam um tirso - a arma mais máscula de toda a mitologia rsrsrs - um bastão envolvido em hera e ramos de videira com uma pinha na ponta, essa mesma arma é usada pelo deus Dionísio.

Antes que vocês me achem uma chata de galocha falarei um pouco sobre Buford e o Bunker 9. Buford é uma mesa que anda, pertence atualmente a Leo Valdez - o atual conselheiro de Hefesto e que aparece em Heróis do Olimpo juntamente com a Piper e o Jason.

Já o Bunker 9 existe a pelo menos 200 anos e com certeza foi um ponto estratégico para os filhos de Hefesto na Primeira Guerra Civil entre os Semideuses. Ele só pode ser aberto e fechado por meio de fogo, por isso somente o Léo consegue reativá-lo - ele manipula chamas -, mas como o Charles é meu filho de Hefesto favorito e eu queria muito colocar ele nesse capítulo eu acabei deixando-o como "descobridor" do local, sem esse lance de fogo.

Já a Primeira Guerra Civil aconteceu em 1864 e a batalha durou muitos dias. Foi travada com perdas terríveis de ambos os lados. Horrorizados pelo derramamento de sangue, os deuses forçaram os semideuses romanos e gregos a lados opostos do país e manipularam a névoa para ser tão forte o suficiente para que os dois campos nunca se encontrassem e o incidente nunca se repetisse.

Um grande abraço e vejo vocês nos comentários!

PS: Já tem cap. novo de O Convite e até domingo vai sair o de Fios do Destino.



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