Apocalipse escrita por Natália Alonso, WSU


Capítulo 11
Capítulo 10 – A Resistência




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Serena vai te ajudar nas flores... o anel... será rápido, sempre é rápido com você, Arthur.”

 

O frasco de sedativo é colocado junto dos óculos transparentes. Arthur tinha vários, na velocidade que corria, uma mosca no olho poderia cegá-lo. Agora, os amigos percebem que não têm mais nada dele. Serena carrega um ramalhete de flores e coloca junto dos objetos, as lágrimas pararam, secaram, não há mais como chorar.

Um murmuro em lamento é entoado internamente pelos vermelhos, como se cantassem sem abrir a boca, ecoando no grande dorso naurú de cada um. Jonas acende o fogo na pequena pira, a gestante permanece de pé, apática. Olha para as chamas amarelas aumentarem e iniciar o derretimento dos óculos, em silêncio ela vai embora.

— Serena? — Henrique chama a mulher enquanto a alcança.

— Deixe-me em paz.

— Eu só quero dizer que sinto muit...

— Você e os saqueadores tiraram Arthur de mim com sua estúpida guerra! Duas vezes.

— Isso não é verdade...

— Não? Não foi você quem veio até nossa casa a seis meses pedir que ele lutasse pela resistência?

— Foi, mas... ele não tinha contado a todos nós também... — tenta se explicar.

— Se ele não tivesse corrido, ele estaria comigo, com seu filho na redoma! E agora, essa criança terá que nascer nesse maldito mundo cheio de fuligem atômica e ficar fugindo para sempre de monstros!

— A aliança é uma ditadura!

— Sim! Ela é! Mas é o lugar onde ele não teria que correr, onde meu filho poderia conhecer o pai.

Os outros do grupo se aproximam, junto de Henrique.

— Vocês não entendem, não é? Já estão acostumados a lidar com monstros, vocês lutam com eles desde que nasceram, eu não. Eu nasci na redoma e não sou anestesiada com esse mundo de horror.

— Serena, nós vamos fazer algum lugar de refúgio para a resistência. Você poderá ficar lá conosco. — fala o Aracnídeo em visível lamento.

— Um refúgio como o de Pernambuco, Jonas? Ou como o de São Paulo, de Curitiba, do Rio de Janeiro... Esse lugar, não é mais a terra que conhecemos. Vocês não são mais humanos que tiveram a terra invadida. Esse lugar... olhe em volta... por que acha que os demônios lutam tão bem aqui? Isso é o inferno já.

— Pra onde você vai? — questiona Henrique.

— Para longe de vocês. Não posso mais voltar para a redoma, pois o major me viu com vocês, mas agora é mais seguro eu ficar longe de quem vão atacar.

 

 

 

*********

 

Em outro ponto, próximo da redoma, K3.316 comanda a operação de aliens controlando fugitivos da redoma. Ela se aproxima e observa as clonadas atacando as pessoas, os gritos dos civis ecoam em sua mente. As clonadas continuam falando “a Aliança é a justiça”, mas agora, ela ouve o tom de voz usado e percebe o quanto é robótico. Algo a incomoda, e não sabe bem o que.

Ela se recuperou bem do tiro que levou de Dimitri, o projétil passou parcialmente por seu cérebro e ela perdeu massa encefálica naquela noite. Mas a regeneração acelerada da alien permitiu que sobrevivesse, ficou uma pequena marca na lateral de sua cabeça, mas nada mais grave. A Aliança teve muitos prejuízos ultimamente, não estava em posição de jogar fora uma adulta treinada e comandante. Como se recuperou, em 73 horas foi colocada novamente em operação.

A meses ela tem ouvido vozes, mas sempre se controlou quanto a isso, agora ela ouve gritos e sussurros. Então percebe que são das pessoas presas, se aproxima ouvindo-as falar: “essas malditas clonadas”, “esses ditadores, fascistas de merda”. Então se choca ao notar que ninguém move os lábios. Tudo são seus pensamentos ela para confusa.

— Você ouviu isso? — pergunta a comandante para a outra clonada.

— Ouvir o que?

K3.316 olha, ela pode ouvir os pensamentos dos prisioneiros, mas não ouve nada das clonadas. Até quando repetem a palavra de ordem “A Aliança é a salvação da humanidade”, não saem vozes de suas mentes, como se estivessem de fato vazias.

— Não importa. Vamos levá-los de volta para a redoma.

O grupo parte voando, carregando os prisioneiros. No ar, K3.316 observa a destruição ao redor, até o horizonte há prédios caídos, casas destruídas, postes de luz no chão. Ela paira no ar quando nota que o carro retorcido tem marcas de mãos. Provavelmente foi uma Karen que destruiu o veículo para tirar alguém de dentro, ou até mesmo matar. Ela pensa em como nunca tinha notado isso antes, e qual o motivo disso a estar incomodando agora.

Após retornarem à redoma, os prisioneiros foram levados até a triagem. Alguns são examinados quanto a possibilidade de serem nomans, outros recebem eletrochoques para o tratamento de calmaria. As aliens conduzem os selecionados para cada ala, não falam entre si, elas sequer olham uma para as outras. Sempre que está perto de humanos, corrompidos e oficiais K3.316 pode ouvir seus pensamentos, mas não ouve nada com as outras clonadas. O silêncio é como se não estivessem ali, e de fato, não estão.

Um militar se aproxima fazendo exames de rotina nas aliens que saíram, ele leva uma pequena lanterna a frente das pupilas da alien ao lado. Ele olha para os lados colocando o corpo na frente das câmeras do alto da sala, sua mão sobe e disfarçadamente acaricia o seio de dela. Sorri e arfa tocando si mesmo, para quando ouve o barulho de outro oficial se aproximar da sala.

— Terminou com essas?

— Sim. Só preciso verificar essa outra mais tarde.

— Verificar? — O oficial ri em malícia. — Ainda bem que não engravidam, não é?

A resposta é um sorriso lateral, mas então ele olha para K3.316 e estranha, ela não está na expressão suave, mas com o cenho franzido.

— Estranho. — murmura o oficial.

Ele olha para a lateral, o sensor cardíaco dispara indicando reação da alien, as linhas desenhadas na tela mostram grande atividade cerebral.

— Mas que merd...

A mão de K3.316 segura o oficial pelo maxilar, institivamente ele pega a pistola, mas o tiro é abafado pela mão da alien. Ela esmaga a mão do homem junto do metal da arma, ele berra, mas não é ouvido através das grossas camadas de vidro a prova de balas do laboratório. Ela olha ao redor, nota que as Karens ao lado sequer se moveram.

— Pare de gritar, ou vou te esmagar sua outra pistola.

O homem começa a respirar fundo tentando se acalmar.

— Não vai adiantar apertar o botão de alarme, eu vou te matar antes que chegue lá. — avisa ela.

— Como você...

— Você está pensando alto. — Ela olha para as irmãs ao lado. — Por que elas não reagem?

— Não é para reagirem, nem você...

— Como fazem isso?

— Vai sonhando que vou falar para você sua puta do espaç... — O grito interrompe a fala, K3. 316 levou a mão até os testículos do oficial. — Não! Não, espera... só com o controle por meio de um líquido que o major tem...

— Que líquido?

— Eu não sei como ele faz isso.

A mão se move por cima da calça, o homem suplica em desespero.

— Eu juro, eu juro que não sei, ninguém sabe.

— O que fazem com as que não são aprovadas aqui.

— Elas vão para o depósito, depois o major leva para o salão onde o major testa as armas horusianas que replicamos e se livra das clonadas. Ele sempre faz isso.

— Como?

— Eu não vi como, só o major e subcomandantes acompanham o processo de limpeza.

— Leve-me lá.

— O que, eu não...

— Agora!

— Eu não tenho acesso! Só dá acesso por meio do crachá do major Manson.

K3.316 mostra irritação.

— Elas vão para algum depósito depois?

— Depois?

— Depois de mortas, mostre-me onde estão.

— Certo... certo, eu posso te levar...

Ela o solta, ele se atrapalha para pegar crachá e abre a porta do laboratório. Ele anda devagar pelo corredor lado a lado da alien que o alerta.

— Se pensar fazer algo errado, minha mão vai atravessar seu peito e perfurar seus pulmões antes mesmo de falar.

Ele concorda com o rosto, os olhos estatelados mostram que sabem que ela fala a verdade. Caminham no corredor, sempre com as Karens em silêncio e oficiais em seus pensamentos monstruosos. Ele sobe no elevador, olha para o sinal de emergência e a mão de K3.316 paira no ombro dele. O oficial olha para ela e sussurra:

— Eu sou casado, tenho filhos, por favor.

— Por que isso me importaria?

Ele a conduz até a porta, o crachá é colocado na frente do sensor e a luz vermelha pisca. Ele aproxima novamente e a luz vermelha retoma com uma gravação. “Entrada não autorizada”, o oficial vira-se tentando se explicar. Ela não o ouve, se aproxima, enfia o braço direito atravessando as camadas metálicas provocando faíscas pelos fios cortados. A porta finalmente se abre, os contêineres de metal estão espalhados pelo gigantesco galpão.

— Tivemos muitas baixas esses tempos, muitas estão saindo com defeito da clonagem ultimamente. — tenta se explicar o oficial.

K3.316 olha estarrecida, paira no alto e nota que são muitos contêineres, estão abertos na parte superior com dezenas de corpos em decomposição dentro de cada um. Percebe que eles estão marcados com inúmeras datas ao lado de cada um, ela voa até um com a data de dois dias atrás, quando ela fora alvejada pelo noman no laboratório do acelerador de partículas.

Então sobe e entra no contêiner, vários corpos estão empilhados, duas delas muito queimadas pelos gêmeos, e repara. Uma delas tem marcas de que alguém de força extrema abriu seu tórax com as próprias mãos, ela nota os punhos e encontra um dente preso em uma das falanges. Vai até o segundo cadáver queimado, o rosto dessa está severamente destruído, com alguns dentes faltando no maxilar.

Ela percebe que o controle os faz economizar nas armas, ela nota um saco plástico de lixo, vai até ele e o abre. Dentro um pedaço craniano, partes de cabelo e um pouco de massa encefálica. A forma do osso quebrado é a mesma de sua própria cabeça e no meio da massa cinzenta um brilho metálico, um chip que provavelmente era o que a controlava.

O barulho de passos do oficial a faz lembrar do que ele é capaz, ele corre em direção a saída, mas ela aparece na porta em poucos segundos.

— Eu fiz o que me pediu. Eu não vou contar pra ninguém que você está sem controle, eu só quero...

Antes dele terminar a frase ela segura o seu maxilar e o gira com violência, o som da coluna quebrada é agudo e ele cai no chão no mesmo instante. K3.316 quer saber tudo o que está acontecendo, e de como pode mudar isso tudo. Em uma inspiração ela identifica mais aromas, e lá fora tem muito mais. As botas militares da garota saem do chão, ela voa mais leve agora, sem o peso do chip de controle, sentindo mais profundamente seus poderes. Olha para o alto e vai em direção a saída.

 

 

Vale dos Ventos, 2º Círculo, A Luxúria

 

Mefisto sai dos aposentos de Súcubo usando um roupão verde escuro, os cornos longos e curvos do rei dos infernos pesam na cabeça que se delicia com frutas na farta mesa. No salão, Baal olha apreensivo, o demônio faz barulho com seus cascos ao se aproximar do rei.

— Baal? O que faz aqui? — fala Mefisto enquanto mastiga uma ameixa. — Está com Banshe? Ela tem dentes venenosos, tem que tomar cuidado...

— Eu não... espero não estar incomodando, senhor.

Mefisto olha para os lados.

— Aconteceu alguma coisa na superfície?

— Não. Está tudo ocorrendo bem. Só estou apreensivo... — Baal fica constrangido. — O senhor tem passado muito tempo nos subterrâneos, talvez seja bom vir na superfície mais vezes...

— Acha que estão armando algum complô?

— Não.

— Interceptou algum plano de ataque ou de tentativa de golpe?

— Não, senhor.

Os risos de Súcubo escapam do quarto, Lilith aparece com seus longos cabelos negros, pega uma cesta de frutas que Mefisto entrega em suas mãos. Ela exibe uma proeminente barriga de gestante e entra no quarto com Súcubo.

— Pode então falar logo? Se não notou, estou um pouco ocupado.

— Tem estado muito ocupado ultimamente.

Mefisto franze o cenho, estranhando a fala.

— Eu não sei de nada diretamente, Mefisto, mas Lucy tem notado sua ausência...

— É claro que nota, ela não é idiota.

— E não acha que isso é arriscado? Deixá-la sozinha, algo pode acontecer.

— Estamos mesmo falando da minha mulher? Tenho pena de quem tentar matá-la.

— Não estou dizendo de segurança física, senhor.

Mefisto fica em uma face séria e inquere:

— Veio até aqui, para falar de meu casamento? — Então ele se aproxima olhando profundamente para os olhos de bisão do demônio. — Esquece que posso ouvir os desejos de todos?

— O que?

Mefisto solta uma gargalhada.

— Você a deseja? — Os risos do rei ecoam no salão. — Eu não acho que ela se interesse por um oroba, sem ofensas.

— Lucy controla os vampiros, se perdermos esses aliados podemos ter problemas...

— Acha que isso é um problema? Não acredito que seja tão inocente...

Mefisto se aproxima e conduz Baal para a porta de seu harém.

— Isso, Baal, é que será o nosso futuro exército. — fala enquanto mostra as inúmeras demônios e centenas de jovens amaldiçoados.

— Um exército com seus filhos?

— Não exagere, nem eu consigo ter tantos filhos assim. Eu fiz um acordo com um grupo pouco estimado, bons guerreiros como os orobas. Sei valorizar um bom braço quando vejo.

— Mais guerreiros? Mas há tantos vampiros...

— Dependentes de sangue. Não me leve a mal, Lucy é uma excelente guerreira, mas os vampiros podem depois se tornarem um problema. Por isso estou fazendo alguns ajustes.

— Ajustes?

— Diga-me Baal, você conhece os goetia?

— Demônios asquerosos que tomam posse de corpos de pessoas, são sujos, pois isso é uma forma covarde de...

— Em uma guerra, Baal, não existe honra alguma. — Mefisto sorri ao dizer colocando a mão no ombro do gigantesco oroba.

Enquanto falam, na terra um grupo de vampiros está sendo atacado por goetias, os demônios de aparência grotesca se arrastam serpenteando e arrancando as cabeças dos que bebem sangue.

 

 

*********

 

K3.316 sobrevoa os escombros da cidade, ele nota alguns orobas correndo atrás de uma pessoa que se esgueira pelas construções destruídas. Os demônios galopam carregando lanças e armas medievais e o rapaz usa uma capa de retalhos cobrindo o rosto para proteger da fuligem. Então a alien nota que há mais demônios para onde o rapaz se direciona, ela se aproxima e ouve.

Temos que levá-lo para a vampira”, “cerquem o garoto, pode ser um noman” pensam os monstros com cabeça de touro e cavalo. Quando os orobas da frente atacam o rapaz com lanças e espadas a alien aparece de repente em seu voo de supervelocidade, esmagando o oroba de trás no chão. Quando o segundo a ataca, o golpe a atordoa, mas logo o soca de tal forma que seu maxilar é destruído. O rapaz luta com demônios mais adiante, ela avança golpeando também os demônios libertando o garoto que seria levado para ser transformado.

Assim que o último demônio cai, ela vira-se para o garoto que apoia suas mãos nos joelhos, ofegando da luta e corrida. Quando olha para ela, ele para apavorado.

— Você está bem? — fala ela tentando acalmá-lo.

— Fique longe de mim! Não vai me levar! — Ele berra atirando várias vezes, as balas batem no rosto da loura e ricocheteiam para os lados. Uma delas atinge o braço do atirador que recua rapidamente e corre em fuga.

Ela não reage, apenas observa o rapaz, aterrorizado por sua figura. Aparentemente, ela é tão assustadora quanto um demônio ou um vampiro. Ela paira devagar cada vez mais alto, ao subir vê as marcas de bombardeios efetuados pela Aliança, a fuligem atômica é presente e atrapalha a visão. Até o horizonte somente destruição e caos, antigas cidades transformadas em pó.

Ela voa por mais tempo, se afasta cada vez mais da cidade de Primavera, nunca estar fora da redoma lhe fez tão bem, o ar limpo de lá não permitia que ela visse o que realmente estão fazendo. Então uma figura lhe é familiar, do alto ela vê dois rapazes idênticos caminhando até uma casa. Reconhece os dois de pele clara e cabelos cor de chumbo que atacaram os laboratórios a três dias. Em torno há tendas dos vermelhos, ela sabe que entrou em território hostil, baixa o voo para se aproximar devagar.

Seus trajes militares irão lhe denunciar facilmente, então encontra um cadáver na área em torno. Veste seu moletom sujo por cima do uniforme camuflado, usa o capuz para cobrir os curtos cabelos louros e se mistura entre os saqueadores. Ela consegue seguir os gêmeos e para do lado de fora da casa, observa pela fresta de uma das janelas e se concentra para conseguir entender telepaticamente o que falam.

— Acham mesmo que ainda temos chances? — fala Dominique enquanto massageia a panturrilha direita, ainda doendo pelo tiro que levara semana passada.

— O que sugere? Se entregar para a aliança e voltar a ser rato de laboratório? — rebate Daniele. — Ou talvez se entregar para os Cains e torcer para não te transformarem em comida de vampiro.

— Os vampiros bebem, e nem todos os demônios comem carne humana. — fala Jonas.

— Como se isso fizesse diferença. — replica a naurú. — Nós vermelhos podemos lutar ainda, se organizarmos um ataque eles nunca irão esperar.

— Atacar com o que? Não temos o anjo da outra dimensão, não temos as armas malditas, e agora, nem mesmo Arthur... — Jonas fala desanimado.

— Ele não era o único com poderes! Os gêmeos, você, temos todos os naurús... — Henrique se exalta.

— Sim, muito bons em se esconder!

— Pelo menos nos mantivemos vivos. — finaliza a pitanga. — Olhe, precisamos de uma estratégia, tirar os aliados dos Cains aos poucos, não podemos contra todos, mas se neutralizarmos os Caveiras podemos tomar suas armas...

— Ficou maluca? — questiona Jonas.

— É a nossa melhor chance. Podemos fazer isso, temos muitos nomans...

— Fomos arrasados da última vez!

— Pois foram pegos distraídos, se fizermos isso direito temos grandes chances e enfraquecemos os Cains, pelo menos em armas.

Eles se entreolham, Aradia flutua uma pena negra na palma da mão.

— O que vocês teriam a perder? Querem se esconder como ratos a vida toda? Temos que retomar essa terra dos Cains, dos Caveiras e da Aliança. Perdas sempre ocorrem.

— Sim, a antiga liga dos assassinos sabe muito bem disso... — provoca Jonas. — Ah! Não tem mais liga, não é mesmo? Só sobrou você justamente por não saberem trabalhar juntos...

A bruxa lança seu olhar fuzilante, mas não responde.

— Bom, a menos que tenham uma ideia melhor, é melhor atacarmos. — finaliza Daniele. — Os Vermelhos estão sobrevivendo a tempos, podemos ajudar.

O grupo olha sem muita energia, estão exaustos, mas balançam a cabeça concordando, Henrique levanta-se e fica ao lado da líder pitanga.

— Pode contar com os saqueadores. — Ele se aproxima para sussurrar a ela. — Se você não fica conosco, nós é que ficaremos com vocês.

Caíque, o guerreiro tupi nota a intimidade de ambos.

— Está brincando com fogo, Henrique. Sabe que os vermelhos são tradicionais nisso, eu não deveria...

— Achei que brincava com lobos... — responde risonho. — Não tem problema, sei lidar com animais. E fora que se apegar a tradições em uma guerra é no mínimo tolice.

A líder de olhos pretos sorri discretamente. O momento tranquilo é interrompido por uma gigantesca explosão, o som do fogo é completado pelos tiros de metralhadoras e gritos do lado de fora.

K3.316 se assusta ao ver as picapes dos Caveiras aos berros enquanto atacam os naurús e saqueadores refugiados. Ela se abaixa tentando não ser notada quando o grupo sai da casa em defesa do território.

Os gritos de guerra dos naurús se transformando se misturam ao som de bombas incendiárias lançadas pelos motoristas insanos. Os explosivos foram jogados antes para atingir os vermelhos antes que se transformassem, antes de tornarem-se animais vorazes e à prova de balas comuns. Os indígenas se contorcem realocando os músculos rapidamente, os rosnados tomam lugar dos gritos tupis.

Os carros com lanças correm entre os guerreiros, muitos atiram nos saqueadores feridos que tentavam se esconder. O fogo toma as tendas, alguns indígenas que não tinham terminado a transformação saem com o corpo em chamas, os tiros dos mascarados de caveiras terminam por matar.

Caíque, depois de transformado, fica com o dorso gigantesco, ele corre e salta direto para uma das picapes. O indígena atravessa o vidro frontal e o carro perde o controle quando o motorista está sendo dilacerado. Os tiros do passageiro são inúteis na dura couraça vermelha. O fogo é controlado por Dimitri e Dominique que direcionam para jogar nos carros. O ronco de um dos carros se destaca e o monster truck de Marcos começa a subir em um dos carros menores.

Marcos tem o rosto pintado dando a forma de caveira na sua face inteira, a outra é a máscara acrílica que exibe seus ossos reais. Ele ri monstruosamente enquanto Matheus, seu primo, usa a metralhadora sentado no passageiro. Os tiros são em direção a Daniele, mas um mamute enrola a tromba gigantesca no braço de Matheus, quebrando-o junto da arma. O primo do Caveira grita e assusta o motorista que vira para tentar atropelar o animal. Henrique usa as patas para subir no capô e o eixo cai quebrado.

Marcos puxa Matheus pela gola da camisa florida tirando-o do carro, pouco antes dele ser esmagado pelas patas de Henrique. Os dois correm usando pistolas contra saqueadores e uma revoada de corvos ataca outro traficante que atirava nos naurús. Aradia controla as aves para atacarem os invasores.

Em outra picape, os traficantes lançam redes em corrompidos já exaustos da luta. Quando uma dessas cai sobre Dimitri ele faz o próprio corpo pegar fogo queimando a trama sintética.

K3.316 anda abaixada ainda usando o moletom sujo como disfarce. Ela vai atravessar uma área quando um traficante em um carro cheio de espetos se direciona para atropelá-la. O carro bate em seu corpo e rodopia no ar, o motorista fica de cabeça para baixo no veículo capotado sem entender o que aconteceu. Ela nota que Aradia está sendo cercada. Ela usa a magia em feixes negros que atravessam os caveiras, mas eles são muitos e ela protege um grupo de saqueadores feridos, sem poderes.

K3.316 salta por trás deles, em um soco um cai no chão com a mandíbula quebrada. O segundo é lançado em outro atirador, Aradia aproveita o momento e pede que os feridos saiam de lá, indo para dentro de uma das casas. Quando vira-se novamente, ela vê que um caveira alveja a desconhecida de capuz, e as balas caem no chão sem ela se mover. Então ataca o atirador com socos que o deixam caído no chão, o capuz desliza revelando seu rosto.

Aradia olha abismada, o que uma alien estaria fazendo ali, e por que estaria lutando a favor deles? Antes que ela perguntasse qualquer coisa, K3.316 vira-se em fuga e rapidamente voa saindo do local. Marcos começa a dar mais ordens ao seu grupo:

— Peguem os corrompidos e nomans! — Ele se vira para Matheus que atira com uma pistola com a outra mão. — Só toma cuidado pra não virar outro maneta do grupo, esse cargo é só meu!

— Vá se ferrar!

Marcos encontra Daniele, em sua forma de naurú, ela rosna de forma feral e corre em direção a ele que pega uma Magnum 40 da cintura. As grossas balas de prata foram especialmente selecionadas, ela percebe e tenta desviar, mas o tiro acerta seu ombro a fazendo cair. Os traficantes se aproximam e jogam redes, cercando-a. Quando está presa, algemas de prata são colocadas em seus pulsos e tornozelos.

Marcos recebe um fuzil, ele ajusta o apoio no ombro e atira no quadril da fera um dardo sedativo, em poucos instantes ela que se debatia acaba dormindo no chão. As redes e dardos são usadas em diversos nomans e corrompidos, alguns deles acertam as robustas ancas do corpo de elefante de Henrique. Ele gira o corpo usando a tromba e as presas para lançar caveiras ao longe.

Um dos traficantes pega uma rede e lança sobre o Aracnídeo que cai no chão, Matheus usa o punho da pistola para acertar a cabeça do corrompido o fazendo desmaiar. Dominique percebe e corre em direção, gira a mão lançando uma gigantesca bola de fogo nele, atingindo de forma certeira, virando uma tocha viva. Os berros desesperados assustam seu primo, que logo tenta pegar uma lona de tenda para apagar as chamas. A lona está presa, ele precisa pegar uma faca para cortar as cordas da tenda, se lançando para a apagar as chamas.

Os movimentos são rápidos. Marcos cobre o primo que rola no chão, tentando apagar as chamas do uniforme tático. A mão de Marcos se queima, o braço mecânico fica manchado com o fogo, ele grita para o primo pedindo que pare o movimento. Então, outros caveiras se aproximam com água e ajudam a apagar as chamas. Marcos tira devagar a lona e tem o seu olho arregalado próximo ao rosto de Matheus. Ele vê o ser em carne viva e negra soltar um grunhido devagar e falho.

— Fica quieto, eu levo você pra...

Matheus treme o corpo, a boca parcialmente colada se movimenta tentando falar, mas os tremores param e ele se cala.

— Matheus?

Marcos olha o peito parado.

Ele não responde, apenas as pequenas fumaças brancas levantam devagar do corpo grudento. Marcos levanta o mesmo olho e mira em Dominique que se aproxima mancando para ajudar Jonas. O olho castanho do traficante acompanha o movimento, e depois volta para o primo novamente.

Marcos fica em silêncio. Em fúria, ele pega a pistola de um dos traficantes ao lado e corre em direção a Dominique, atirando nos dois joelhos do rapaz. O noman urra de dor caído no chão e antes que consiga estabilizar a chama, o braço mecânico de Marcos o esmurra com violência fazendo um som de quebrado ao cair no chão.

— Peguem os corrompidos, vamos embora. — ordena para o grupo de traficantes.

Marcos cobre a lona na lateral do corpo e carrega Matheus para o carro que parou próximo, dessa vez ele não dirige, entra no bagageiro para ficar ao lado do corpo do primo. Na picape ao lado, os corrompidos são jogados em um tipo de jaula, Jonas e Dominique estão entre eles, Daniele arfa em uma jaula própria. Os caveiras jogam panos umedecidos com clorofórmio para mantê-los apagados pelo caminho.

O grupo rapidamente leva diversos prisioneiros, vários corrompidos do grupo dos saqueadores, os carros se distanciam deixando para trás os vermelhos sangrando e chamas entre os sobreviventes.


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