A Clínica dos Poderes Disformes escrita por Pamisa Chan


Capítulo 3
O jantar da discórdia


Notas iniciais do capítulo

OI GALERISSSSS! TURUBOM?
Espero que gostem do cap :D
No capítulo anterior, Kate terminou de conhecer os pacientes da clínica, alguns com histórias de vida bem sofridas. Após dizer que aceitava o trabalho apesar das dificuldades, a senhora Hipkins a convidou para jantar com eles.



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Após receber várias orientações sobre o trabalho na clínica e aprender as regras básicas da instituição, Kate se reuniu com os pacientes e funcionários no refeitório. Havia três mesas com doze lugares cada: Uma para as pacientes mulheres, outra para os pacientes homens e uma para os funcionários. O jantar ia das 20 às 21 horas e os pacientes faziam fila para entrar. Logo na entrada, cada um recebia uma bandeja com seu prato e talheres e se dirigia ainda em fila para a mesa self-service onde ficavam os alimentos. Depois dali, cada um podia pegar sua bebida no refrigerador de bebidas e escolher um lugar para se sentar.

Kate ficou observando cada uma dessas etapas. Antes, ela havia sido informada que os talheres eram contados para que nenhum sumisse. Ela percebeu então que havia talheres sobrando na mesa onde eram distribuídos. Ao olhar ao redor, ela se deu conta. Sean não estava presente.

— O Sean tá bem? — Ela perguntou discretamente para a senhora Hipkins enquanto ambas se serviam na mesa de alimentos.

— Sim, querida. Ele só está dormindo na sala de reclusão. O medicamento deixa ele bastante sonolento.

Kate pediu permissão para se sentar na mesa junto com os pacientes já que havia lugares sobrando e a senhora Hipkins consentiu, afirmando que isso a ajudaria a conhecê-los melhor. A garota então pegou sua bandeja de comida e se sentou na mesa das garotas.

— Oi! — Ela disse um pouco acanhada ao ver todos os olhares se voltando para si.

— OI, KATE! QUE BOM TE VER DE NOVO! — Riley a cumprimentou e os copos na mesa dos funcionários começaram a tremer.

— Riley, come a sua comida! — Cherrie enfiou uma colher cheia na boca da amiga para silenciá-la.

— Gente, alguém viu o Sean? — Melinda, que usava coturnos de ferro para segurar seus pés no chão, perguntou preocupada ao notar a ausência do colega.

— É, ele tá mais sumido que eu — Julia comentou rindo, fazendo as garotas a encararem com um olhar de desgosto. — Uau, como vocês são bem humoradas! — Ironizou e voltou a comer.

— Eu ouvi as enfermeiras pensando sobre ele... — Felicia disse quase inaudivelmente.

— O que você disse? — Kiara perguntou.

— Ele deve ter tido outro surto, não tem com o que se preocupar — Lilian falou indiferente enquanto levava sua colher à boca. — Vocês sabem que isso sempre acontece.

— Lilian, querida, será que você poderia ser um pouco mais insensível? — Mary perguntou com um ar sarcástico mas classudo enquanto lambia as próprias patas.

— Será que ele vai ficar bem? — Christine perguntou preocupada enquanto comia com seus talheres metálicos escuros, diferentes de todos os outros.

— Nessa maravilha de clínica imprestável duvido muito! — Sophie rolou os olhos.

— Então a culpa é toda sua! — Kiara gritou de repente, batendo a mão na mesa e esticando seu braço apontando para Kate.

O barulho fez o refeitório inteiro ficar em silêncio e olhar para a mesa das garotas.

— Peraí, o que eu fiz? — Kate se assustou.

— A Fe acabou de me contar o que as enfermeiras estavam pensando sobre o Sean! Isso é tudo culpa sua! Você fez perguntas difíceis e ele surtou!

— Do que você tá falando? Ele não tem superinteligência? Eu só quis tirar uma dúvida! — Kate respondeu à altura.

— Eu tava lá, ela não fez de propósito! — Kyle, na outra mesa, levantou e defendeu a novata, fazendo todos direcionarem os olhares para ele.

— É, a menina nem conhece ele direito, por que ela faria isso de propósito? — Jeremy concordou.

— Pelo mesmo motivo que ela mal me conhecia e me chamou de estranha! — Kiara relembrou e todos olharam chocados para Kate. — Você acha que só porque você não tem poderes defeituosos você é melhor que a gente, né?!

— Senhorita Ljungberg! — A senhora Hipkins a repreendeu do outro lado do refeitório.                                                       

— Isso é um absurdo! — Kate retrucou. — Você quer que eu veja uma pessoa maquiando a outra com os pés e ache isso normal?! Eu não tenho poderes, eu não tô acostumada com isso! Me desculpe se meus pensamentos te ofendem!

Antes que mais alguém pudesse dizer alguma coisa para acalmar ou piorar a briga, um grito agudo ecoou pelo ambiente. Kiara viu que o som vinha do seu lado. Era Felicia, que estava com as mãos na cabeça se balançando para frente e para trás.

— Fe! Felicia, calma! — Kiara segurou a amiga pelos ombros — Viu! Isso é tudo culpa sua! Você só veio atrapalhar nossas vidas! — A garota elástica vociferou contra Kaitlin. — Primeiro o Cabeça e agora a Fe!

Imediatamente as enfermeiras saíram da mesa e pegaram Felicia, levando-a para o andar de cima. Kiara tentou ir junto mas foi impedida. A senhora Hipkins ia seguir as enfermeiras mas antes de sair do refeitório falou com firmeza:

— Eu não quero ouvir mais um pio! O próximo que falar vai ficar no quarto! — Ao dizer essas palavras, ela saiu pelas portas duplas do refeitório e deixou apenas os pacientes, Kate e o restante da equipe de funcionários ali num clima tenso.

Não se ouvia mais som nenhum além dos talheres batendo e sons de mastigação. A maioria dos pacientes sequer se atreveu a olhar para qualquer outro lugar que não fosse seu próprio prato. Kiara porém, ficou encarando Kaitlin com raiva por uns bons segundos, até que a garota sem poderes arrastou sua cadeira para trás, pediu licença quase sem abrir a boca e abandonou o local com a cabeça baixa.

Os olhos de Kate começaram a lacrimejar e ela decidiu subir as escadas do saguão em direção ao segundo andar. Um turbilhão de pensamentos daquele dia passavam por sua mente, desde os momentos mais felizes até os mais complicados. Tudo aquilo era demais para sua pequena mente humana sem poderes processar. Ela passou então a se perguntar se era aquilo mesmo que queria. Se valeria a pena passar seus dias naquele lugar convivendo com pessoas tão imprevisíveis e diferentes. Ao chegar no segundo andar ela se sentou no sofá de canto e ficou observando o enorme céu noturno cujo luar resplandecia dentro do ambiente por meio das grandes janelas de vidro.

De repente, Kate ouviu um ranger no meio daquele silêncio. Era uma enfermeira saindo da enfermaria. Ao vê-la, Kate se levantou e correu em sua direção.

— Como a Felicia tá?

— Ela está melhor.

— Eu posso ver ela, senhorita... — A garota espremeu os olhos para enxergar o crachá no escuro — Zeng? — Ela pronunciou como se lê em inglês.

A mulher de cabelos pretos e lisos e olhos puxados pensou por alguns segundos antes de responder.

— Você pretende trabalhar aqui, certo?

— Sim! — Kate respondeu com certeza após uma pequena hesitação.

— Vem comigo. — Ela levou a garota para a enfermaria — Ah, e meu nome é Zhāng.

— Chan?

— Quase isso.

Kate já havia conhecido a sala de espera da enfermaria antes mas agora iria conhecer um lugar que ainda não havia entrado, o corredor de reclusão da ala feminina. Ali haviam oito quartos com janelas de vidro nas portas. Cada quarto era adaptado para diferentes tipos de poderes. Em um desses quartos, inteiro branco, estava Felicia deitada em uma cama. Kaitlin ficou a observando pela janelinha da porta e percebeu que a garota estava com as mãos na cabeça.

— O que ela tem?

— Ela é telepata. Ela não costuma ficar muito tempo onde tem muita gente porque ela lê os pensamentos de todos ao mesmo tempo. Ainda mais quando tem um tumulto como teve no refeitório, a mente dela vai a mil e ela acaba tendo fortes crises de dor de cabeça. Mas geralmente ficar na reclusão com isolamento acústico já resolve.

— Entendi... — Kate encarou a garota por mais alguns segundos antes de perguntar — Chan... Você acha que dá pra uma pessoa sem poderes trabalhar aqui?

— Bom, eu trabalho aqui.

Ao ouvir isso, Kate tirou os olhos do vidro e encarou a enfermeira, surpresa.

— Você... também não tem poderes?!

De repente, a figura da enfermeira começou a mudar, até que ela se transformou em um homem de meia idade, de estatura mediana e bigode acinzentado. O homem riu e disse:

— A senhorita Zhāng saiu daqui quando você começou a encarar a janela do quarto — ele fez uma careta imitando o olhar de Kate pela janela — Eu sou só o zelador. Pode me chamar de Kal. — Ele pegou o carrinho com materiais de limpeza que estava no corredor e começou a andar com eles pelo corredor — Mas a senhorita Zhāng realmente não tem poderes, mocinha.

Kate ficou totalmente sem palavras depois desse ocorrido mas resolveu procurar a enfermeira chinesa para ver se o zelador estava falando a verdade. Quando ela se virou, porém, antes que pudesse começar sua busca, uma pessoa entrou no corredor.

— Kate? O que está fazendo aqui?

— Senhora Hipkins! — Kate se sentiu melhor ao vê-la — Podemos conversar um pouco?

— Tudo bem. Eu só vim buscar minhas coisas para ir embora.

Depois que a mulher pegou seus pertences, as duas desceram as escadas e saíram da clínica. Dali, foram caminhando para casa. Kate descobriu que a senhora Hipkins morava no mesmo bairro que ela. O céu estava escuro mas havia vários postes de luz no caminho, dando mais segurança durante a caminhada noturna.

— A senhora acha mesmo que a culpa de tudo que aconteceu hoje foi minha?

— Do que você está falando?

— O Sean surtou, depois a Felicia... A Kiara disse que era culpa minha... E se for mesmo, eu acho que não seria bom trabalhar na clínica. Eu queria ajudar, mas se eu ficar fazendo todo mundo sofrer não vai dar certo...

— Kate, essa não é a primeira vez que isso acontece. E infelizmente provavelmente não vai ser a última. Entenda, essa é uma clínica para disforme-poderosos. Os problemas que acontecem lá não tem um culpado a não ser a imperfeição da biologia. Em vez de se concentrar nos culpados, nós nos concentramos na solução e prevenção... Além disso, você é nova aqui, nós sabemos que não fez nada por maldade. Releve os comentários da senhorita Ljungberg, ela é muito apegada com os outros pacientes. Eles são como uma família para ela. Logo vocês vão se entender.

— A senhora acha?

— Tenho certeza. Mas se você realmente achar que a clínica não é o lugar certo para você, não posso te forçar a ficar. A decisão é sua.

Kate chegou em frente à sua casa e ambas ficaram paradas ali. Depois de pensar por alguns segundos, ela disse:

— Eu vou pensar um pouco mais.

— Tome o tempo que for necessário, querida.

Naquela noite, na clínica, os pacientes se reuniram no espaço de convivência depois do jantar e ficaram conversando sobre a garota nova.

— Será que a Kate vai voltar? — Kyle perguntou com o rosto apoiado na mão, suspirando e olhando para o além.

— Depois do showzinho da Borracha, duvido muito — Sophie respondeu olhando com desprezo para Kiara, que retribuiu o olhar.

— Por mim ela podia não voltar mesmo! Ou vocês também querem ir parar onde o Cabeça e a Fe estão agora? — Ela retrucou.

— A menina não fez nada demais... — Richard falou sem tirar os olhos de seu jornal, causando estranhamento dos demais.

— Tocha defendendo alguém? Essa é nova... — a gata debochou enquanto desfilava pelo tapete no centro da sala.

— Será que o fogo dele finalmente começou a aquecer esse coração de pedra? — Jeremy subiu no ombro do pirocinesista, que usou seus poderes de fogo para expulsar o homenzinho dali — Ai! Era brincadeira. — Ele pulou de volta no sofá, deixando Richard de lado.

— Eu não tive muita oportunidade de falar com a garota nova, mas eu senti uma aura positiva vindo dela... — Melinda falou, com seu bom humor costumeiro, enquanto flutuava perto do teto.

— É, ela não pareceu ruim... — Cherrie concordou e olhou para Riley, que estava prestes a se manifestar — Riley, já tá tarde, fica quieta. — Ela tapou a boca da amiga, que fez um olhar triste.

— Ela até que é bonitinha — Wayne falou com um sorriso de canto, enquanto sentava esparramado no sofá com os braços apoiados no encosto.

— Não mais do que eu — Uma voz do além respondeu e todos ficaram procurando de onde vinha.

— Julia? — Christine perguntou, encolhida em sua poltrona de imperânio.

— Você tá sem roupa de novo?! — Lily perguntou num tom de desgosto fazendo uma careta de nojo.

A garota invisível não disse nada, apenas gargalhou.

— No meu tempo as pessoas não fazem essas poucas vergonhas! Dá pra implantar o poder de enxergar coisas invisíveis! — Herbert exclamou com o indicador para cima.

— Você não sabe como faz pra implantar esse poder, vovô? — Wayne sorriu olhando na direção da voz de Julia e de repente cobriu o rosto, gritando de dor — Não precisava me dar um tapa!

— E você, Toque, o que achou da garota nova? — Melinda perguntou para o colega que estava sentado em um canto desenhando concentrado.

— Não sei, não falei com ela. — Respondeu, sem tirar os olhos do caderno.

— Na verdade, ela tentou conversar com ele, mas pelo visto ele nem percebeu — Mary lembrou da cena.

— E você, Shane? — Mel perguntou novamente.

— Também não falei com ela, não tive tempo. Aliás, eu teria tempo se esse imbecil não ficasse o dia inteiro me enchendo o saco! — O garoto respondeu olhando para o clone.

— Olha quem fala... Faz tudo errado e reclama que eu fico perto pra ajudar.

— Você que faz tudo errado!

Os dois avançaram um no outro para se esmurrarem mas de repente Jason apareceu no meio deles com um teleporte e apartou a briga.

— Até que eu tô ficando bom nisso — O atleta se parabenizou.

Às 22 horas, uma sirene tocou e uma enfermeira saiu da enfermagem e mandou todos irem dormir. Todos se levantaram, a maioria com um suspiro de decepção, e foram em direção aos seus quartos.

— Espero que a Kate volte amanhã... — Kyle comentou com Jeremy, que estava em seu ombro.

— É, eu também.

No dia seguinte, às 7 horas da manhã, a sirene tocou anunciando o horário de acordar e tomar café da manhã. Como de costume, Cherrie e Jason já estavam acordados havia uma hora fazendo sua corrida matinal seguidos por Riley, que sempre era impedida de falar. Ao ouvirem a sirene, se dirigiram até o refeitório e começaram a se servir.

— Ovos com bacon! Meu café da manhã favorito! — Jason sorriu ao sentir o delicioso aroma vindo da mesa.

— Ainda não entendo como você consegue comer isso de manhã. — Cherrie olhou com aversão para o prato cheio do amigo, enquanto passava geleia de morango em sua torrada.

— EU GOSTO DE...

— Riley, por favor, vai acordar os vizinhos!

Os outros pacientes começaram a chegar no refeitório e a se servir. Todos se animaram ao ver Felicia e Sean chegando. As garotas todas ficaram perto da telepata a enchendo de perguntas preocupadas.

— Ela tá bem, gente, parem de ficar perguntando senão ela vai piorar! — Kiara respondeu perceptivelmente irritada.

— E você, Sean, como está? — Melinda voou até o colega.

— Melhor. Cadê a garota nova? Eu precisava responder a pergunta dela.

— Tá falando da despoderada que fez você surtar?! — Kiara perguntou sem acreditar que ela era a primeira pessoa que o rapaz mencionou após recobrar a consciência.

— A Borracha fez a menina se sentir um lixo e é provável que a gente nunca mais veja ela. — Sophie explicou.

— Como assim?!

— Qual é, Cabeça! A menina te fez ir pra reclusão! — A garota elástica argumentou.

— Não foi bem assim também, né! — Kyle defendeu — A gente já falou mil vezes que ela não fez por mal!

— Parece que tá com ciúme da menina... — Jeremy acrescentou.

— Eu só quero o melhor pra vocês! — os olhos de Kiara começaram a marejar — Vocês sabem que são minha família... Eu não quero que ninguém machuque nenhum de vocês... — Ela escorreu uma lágrima dos olhos.

— Tá tudo bem... — Mel abraçou a garota — A gente sabe o quanto você se preocupa... Mas a garota nova não parece uma ameaça. Nós podemos todos nos tornar amigos!

— Agora já não faz mais diferença, ela provavelmente nunca mais vai pisar aqui! — Sophie lembrou, com os braços cruzados se inclinando para trás na cadeira, quase caindo.

Logo, os funcionários e funcionárias começaram a entrar no refeitório. Depois de cada um entrar e cumprimentar os pacientes, uma última pessoa entrou, com um empolgado "bom dia".

Era ninguém menos que ela. Kaitlin Burns.


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Notas finais do capítulo

(E aí, Kal, se sentiu representado pelo zelador? kkk)
ESSE FOI MAIS UM CAPÍTULO GENTE!
O que acharam da treta no jantar? Vocês são team Kiara ou team Kate? :v
O que acharam do zelador misterioso? xD O que acharam das interações entre o pessoal?
Como será que vai ser o primeiro dia de verdadeiro trabalho da Kate?
Descubram domingo que vem ;)



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