Um Caminho Para O Coração escrita por Sill Carvalho, Sill


Capítulo 34
Capítulo 33 — Na Companhia da Vovó




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Algumas horas após a chegada conturbada de Cheryl, Emmett finalmente conseguiu um tempo para ir a cozinha preparar o jantar. Rosalie se ofereceu em ajudar colocando a mesa.

Olívia esteve o tempo todo contando a avó praticamente tudo de que se lembrava desde que ela os deixou. Aproveitou o momento para mostrar seus brinquedos e material escolar, também.

— Não sei se confio em deixar você e Ollie sozinhos com sua mãe esta noite — mencionou Rosalie diante a mesa de jantar que acabou de deixar pronta.

— O que quer dizer com isso? — Emmett se movimentou pela cozinha, tirou o assado do forno levando ao centro da mesa.

— Que você e ela possam vir a discutir na presença de minha menina.

— Não vou fazer isso.

— Não foi o que vi quando sua mãe chegou.

— Você viu como foi fria e indiferente com Olívia. Minha filha quis dar amor e carinho, minha mãe se recusou receber. É inacreditável que tenha feito isso com a própria neta.

— Isso me chateou também, não tenho como negar. Mesmo assim, Ollie gosta dela. Amo tanto minha menina — confessou. — Não consigo perceber como pode alguém não querer bem a ela?! Ainda mais quando esse alguém é um parente tão próximo como é o caso de sua mãe.

Emmett parou com a mão na mesa.

— Me arrependo amargamente por ter passado por esse caminho, o da indiferença — admitiu.

— Eu sei… Desculpe, não disse isso para te chatear.

— Estaria no seu direito se o fizesse. — Chegou mais perto dela. — Obrigado por ter acolhido minha filha, desde o primeiro momento, com tanto amor. — Levou as mãos à cintura dela, seus corpos se tocando durante a troca de um beijo.

As mãos de Rosalie foram aos braços dele com a intenção de tê-lo ainda mais perto. Recuando ao ter a sensação de estar sendo observada.

— Pensei ter dito que eram somente amigos. Na verdade, mais amiga de minha neta que de meu filho — A voz de Cheryl soou como uma provocação, na entrada na cozinha.

Emmett deu um passo para trás, virando na direção da voz da mãe.

— Não comece — alertou, incomodado, sem fazer questão de esconder.

— Não tenho nada contra estar saindo com alguém. Apenas comento, porque ela me disse por telefone que vocês não tinham nada. Embora eu não tenha acreditado muito nisso.

Rosalie tomou a palavra. — Naquele momento, as coisas eram diferentes.

— Não precisa ficar nervosa. — Cheryl colocou assim.

— Não estou nervosa. Só não quero ser motivo de joguinhos de indiretas.

— Gosto de você. — admitiu a mãe de Emmett. — Tem personalidade. Meu filho precisava de alguém assim. Não sei o que fez, mas, Emmett voltou a viver. Tentei isso por muito tempo, e não deu certo. Olívia te ama muito, já deu para perceber. Vejo em seus olhos que esse amor é recíproco.

— Rose é gentil, bondosa e humana — defendeu Emmett. — Seria perfeito se algo assim partisse de você também, mãe.

— Eu amo minha neta… do meu jeito — defendeu-se Cheryl. — Não pode se queixar sobre eu não ter sido boa mãe para você.

— Olha… — Emmett ia falando, porém, a presença de Olívia o fez silenciar. Dedicando atenção à menina. — Oi, amorzinho. Já está com fome?

— Um pouquinho só. — Ela mostrou nos dedos o quanto era pouco.

— Vem cá! — Emmett ofereceu a mão — Papai vai te ajudar com a cadeira. — Segurando na mão pequena de Olívia a conduziu a seu lugar à mesa.

— Seu joelho está doendo? — Rosalie foi quem perguntou.

— Só quando eu ando rápido.

— Logo vai estar bem outra vez. Então vai poder correr lá fora normalmente.

Cheryl se aproximou do fogão avaliando a refeição que o filho preparou para eles.

— Você gostou que o papai limpou lá fora para você? — pediu Emmett.

Olívia balançou a cabeça.

— Gostei muito.

— Ela realmente amou — Rosalie fez questão de dizer. — Estava uma alegria só, até… — discretamente olhou para Cheryl, que trazia mais comida para a mesa. Emmett entendeu exatamente o que quis dizer.

— Papai, quando que vai ter flores no jardim?

— Podemos iniciar o plantio de algumas espécies, mas só irão florir na primavera, amorzinho. Elas não aguentam o frio do inverno.

— Entendi papai.

— Vamos jantar, então — declarou Cheryl.

Emmett puxou a cadeira para Rosalie, ao lado de Olívia. E ele sentou-se à cabeceira da mesa. Cheryl reconheceu sua gentileza. Isso a fez lembrar-se do marido gentil e atencioso que foi para Sarah antes.

— Olívia, o que você acha de seu pai se casar com Rosalie? Seria como se ela fosse sua mãe.

A pergunta de Cheryl fez o casal pensar, porque trazer o assunto à mesa sem antes falar com eles?

O olhar radiante de Olívia foi inteiramente para Rosalie.

— Você vai ser minha mamãe?

A mão de Rosalie segurou sua mão pequena.

— No meu coração você já é minha filha, Ollie. — A menina piscou sem deixar de olhar no rosto dela. — O que acontecer a partir de agora, será um bônus.

— O que isso quer dizer? — quis saber Olívia.

Emmett achou por necessidade intervir.

— Ollie, é hora do jantar. — Mostrou a ela o pratinho já servido. — Por que não prova? Está tudo uma delícia. Papai caprichou.

A atenção continuou voltada a Rosalie e a pergunta que não queria calar.

— Você não quer casar com o meu papai?

O olhar de Rosalie encontrou o de Emmett. Ele soube pelo modo como o olhou que estava pensando no retorno a Atlanta. Outra vez, Cheryl incitou a conversa.

— Ela quer, sim, se casar com seu pai, Olívia. Está apaixonada por ele e ele por ela. Se você não percebeu, já estão namorando.

Um sorriso desenhou os lábios da menina. No instante seguinte, estava saindo da cadeira para abraçar Rosalie.

Emmett insistiu que comece, lhe entregando o talher na mão, quando voltou ocupar seu lugar.

— Olívia, seu jantar — disse.

Sem perder o entusiasmo, Olívia passou a comer um pouco de cada alimento disposto em seu prato. Mesmo com a boca cheia, não conseguiu segurar as palavras e elas deixaram seus lábios, atrapalhadas e alegres.

— Rose vai ser minha mamãe. Esse é um dia muito feliz pra mim. Até a vovó veio me visitar.

Rosalie não falou muito pelo tempo que durou o jantar. Emmett reparou na mudança, embora tenha se empenhado em parecer bem para a filha. De tempos em tempos, Cheryl o flagrava olhando em sua direção.

Pouco depois de o jantar, Emmett levou Olívia para a cama. Rosalie ficou com ela até estar dormindo, e ela custou pegar no sono fazendo perguntas. Do lado de fora do quarto da menina, Rosalie parou encostando-se a parede. Emmett se posicionou diante ela.

— Perdoe a intromissão de minha mãe durante o jantar. Ela não tinha nada que se meter nesse assunto. — Ele segurou sua mão. — Sei que é cedo para dizer isso — fez uma pausa antes de voltar a falar: — Eu realmente gostaria de tê-la como minha esposa. — A expressão de desânimo mostrou que pensava no retorno dela a cidade de origem. Ainda assim, teve de perguntar: — Quando vai acontecer… — relutou um pouco — seu retorno a Atlanta?

Faltou coragem a Rosalie para olhar em olhos nesse momento.

— Deve acontecer ainda por esses dias… — Sentiu os dedos dele deixarem os seus. Emmett recusou até suas costas estarem tocando a parede oposta no corredor. Rosalie finalmente olhou para ele. Arrependeu-se ao perceber o quanto ficou desapontado. — Desculpe — murmurou. Cruzou a curta distância que os separava, passando os braços ao redor da cintura dele. Permitindo a cabeça descansar no peito musculoso. No primeiro momento, Emmett não demostrou qualquer reação. — Preciso resolver assuntos relacionados ao trabalho… Questões pessoais e mal resolvidas — insistiu ela. Sentiu que ele balançou a cabeça, inconformado. — Ei — tentou novamente — abraçando-o mais forte, até ele retribuir. O queixo dele descansou no alto de sua cabeça um instante.

— Então é isso… — hesitou Emmett — nossa história termina com você voltando a Atlanta? — questionou.

— Não precisa acabar — ainda que soasse motivadoras suas palavras, ele não conseguiu deixar de se sentir desanimado.

— Como isso daria certo? Você lá, eu aqui?

— Você e Ollie podem ir me visitar em Atlanta enquanto resolvo minha situação por lá, se isso demorar.

— Sabe que vai ser muito difícil… nossa relação desse jeito. O afastamento de Olívia e você. — Balançou a cabeça, inconformado.

Quando Rosalie piscou, uma lágrima escorreu em sua bochecha, molhando de maneira quase imperceptível a camisa que ele vestia.

— Não sei como fazer isso sem magoar ninguém — admitiu.

— Porque essa maneira não existe, Rose. — Abraçaram-se com mais intensidade em meio ao silêncio que se seguiu. Quando Emmett voltou a falar, foi para fazer um pedido. — Não volte à casa de seu avô essa noite. Fique aqui comigo.

Olhando em seu rosto, Rosalie respondeu:

— Sua mãe está aqui, não me sinto à vontade ainda. Aliás, onde ela vai dormir?

— Acredito que no mesmo lugar que sempre dormiu, quando esteve aqui com a gente tanto tempo atrás.

— Mas, aonde?

— Eu não sei.

Um balançar de cabeça revelou achar difícil acreditar que nem mesmo isso ele tivesse prestado atenção.

— Então, você vai ficar? — ele insistiu.

— Não dá… nesse momento, sua mãe me deixa desconfortável.

— Tem razão. Minha mãe sabe como ser inconveniente quando quer.

— Promete para mim que vai conversar com ela sem brigar?  — como demorou em responder, Rosalie insistiu. — Promete? Não estou ouvindo você me responder.

Ele balançou a cabeça.

— Prometo.

— Não senti verdade — Rosalie cutucou.

Emmett firmou o olhar no dela, demorando-se em dar uma resposta válida.

— Farei o meu melhor. Mas ela também tem de colaborar.

— Não deixe Ollie perceber o atrito entre vocês.

— Sabe o que é mais fascinante em você? — testou ele.

— O quê?

— Seu amor por Olívia. Seu coração generoso…

Cheryl chegou ao corredor onde eles conversavam interrompendo a conversa.

— Não tem condições de eu dormir naquele colchão que encontrei na garagem — se queixou. — O cheiro está horrível. Você precisa jogar aquilo fora.

— Tudo bem, mãe — Emmett tentou. — Pode ficar na minha cama. Eu vou dormir lá embaixo, no sofá da sala.

— Ela não vai dormir com você? — ao olhar para Rosalie mostrou que se referia a ela. Mas Rosalie respondeu antes de Emmett.

— Vou voltar para casa de meu avô.

— Quem é seu avô?

— Norman.

— Norman. Norman Hale é seu avô?

— Sim.

— Eu conheço seu avô.

— Ele me disse, há pouco tempo, que te conhecia.

— Seu avô é um bom homem.

— Sim, ele é — Rosalie respondeu sem se dar conta que sorria ao falar no avô.

— Bem, vou deixá-los a sós. — Cheryl avisou, a caminho do banheiro levando a nécessaire e uma troca de roupas que Rosalie reconheceu como pijama.

Rosalie aguardou a porta de o banheiro ser fechada para voltar a falar com Emmett.

— Me acompanha até o carro? — pediu.

Ele tomou a mão dela na sua, antes de se encaminharem a escada.

[…]

Ao passar pela porta, depois de se despedir de Rosalie, Emmett encontrou a mãe na sala.

— Precisa realmente trocar algumas coisas nessa casa. A começar pela cama da menina.

— Olha só — Emmett sinalizou com a mão. — Não é hora para isso… — dando entender que não queria discutir. — Estou cansado. Quero apenas me deitar. — Ele percebeu no sofá o travesseiro e os lençóis. — Vejo que já trouxe minhas coisas. Agradeço por isso, mas, se puder, gostaria de ficar sozinho.

Cheryl ignorou seu pedido, estendendo a conversa.

— Vi que já não tem mais os pertences de Sarah. Olívia me contou que o violoncelo que pertenceu à mãe, será dela no futuro.

— Sim, é isso mesmo — afirmou. A seguir, ficou em silêncio.

— Converse comigo, Emmett?

— Eu quero dormir, mãe.

— Está fazendo terapia. Olívia me contou também. Que bom que está retomando sua vida como era antes.

— Não foi com sua ajuda, não é mesmo? — acusou.

— Não pode me culpar de não ter tentado. Estive aqui por quatro anos.

Emmett sacudiu a cabeça, como não significasse muito.

— Aturei seu humor ruim. Vi sua autodestruição com a morte de Sarah. Fiz tudo o que pude para você reagir. Perdi as contas quantas vezes disse que tinha de buscar ajuda de um profissional. Cuidei de sua filha para você. E tudo que recebi em troca foram ofensas e ingratidão. Chegou um momento que não dava mais para mim. Foi preciso abandoná-lo para forçá-lo reagir de alguma maneira.

— Não abandonou somente a mim. Abandonou a Olívia, também. Ela te amava. Ainda te ama, na verdade. Por muito tempo foi sua única referência materna. Tudo bem ter me deixado com minha dor, eu quis a solidão. Mas você deixou Olívia, uma inocente para trás. Se a amasse, teria levado com você aonde quer que fosse.

— Você exigiu que não voltasse a te procurar — Cheryl lembrou.  — Quanto à menina, ela era responsabilidade sua não minha. Pois bem, Emmett, você quer falar de amor, vamos falar de amor então. Esqueceu que se recusou por muito tempo a ser o pai dessa criança? Que não a amou ao trazê-la para casa?

— Está enganada. Eu sempre amei Olívia, desde o primeiro momento. Lembro-me como me senti quando ouvi seu chorinho ao nascer. Foi simplesmente a coisa mais incrível que vivenciei em toda minha vida.

— Mas enfraqueceu quando soube que a mãe dela havia morrido.

Emmett se exaltou.

— Não preciso de você aqui. Então já pode voltar para sua vida perfeita.

— Não vim por você, Emmett. Vim pela minha neta.

— Que bom, porque ela, sim, sentiu sua falta, todos os dias, nos últimos dois anos.

— Sei que está na defensiva por eu ter deixado vocês.

— Errado! — apontou. — Estou assim por ter deixado Olívia. Podia ter ficado com ela. O que fez, ao ir embora, teve tudo para acabar mal. Muito mal. Por sorte, Olívia tem um anjo da guarda que não dorme em serviço. E, não faz muito tempo, soube o que é o amor de uma mãe. Rose deu mais amor e cuidado a ela em algumas semanas que você nos quatro anos que esteve aqui.

— Se com isso você quer dizer beijos e abraços deveria saber que nunca fui disso. Dei a ela o que precisava, e ela ficou bem.

Havia mágoa em sua voz ao responder:

— Cuidou dela por obrigação, não por amor.

— É o que muita gente faz.

— Pelo amor de Deus! — disparou. — Estamos falando se sua neta.

— Eu gosto de minha neta, ainda que não acredite. Precisei fazer o que fiz. Você não entende.

— Não, eu não entendo.

— Ainda que esteja sentindo raiva de mim agora, estou feliz, porque vejo que hoje a ama desesperadamente. Que é o medo do que poderia ter acontecido a ela em minha ausência e seu isolamento que faz nascer essa raiva toda. É o medo de que hoje poderia não estar com você. Era isso que eu queria que sentisse medo de perdê-la. Que voltasse a ser a mesma pessoa de antes. Que fosse o pai que é hoje para Olívia. Capaz de tudo por ela.

Emmett suspirou ao falar:

— Felizmente ainda posso corrigir alguns erros que cometi com ela.

— Agora posso voltar e viver em paz. Porque tenho consciência que está totalmente recuperado. Só me deixe dizer mais uma coisa.

— O quê?

— Se está gostando mesmo dessa moça, Rosalie, vá em frente. Case-se com ela. Dificilmente irá encontrar outra mulher igual. Sabe do que estou falando — fez uma pausa. — Não quero mais discutir. Então, eu vou subir e me deitar. — Ela se levantou. — Boa noite, Emmett.

Emmett ficou em silêncio vendo a mãe subir a escada, para dormir em seu quarto, na sua cama, enquanto ficava com o sofá da sala. Uma vez que Cheryl sumiu de vista, sentiu-se confortável a ocupar o sofá, pensando em tudo o que ouviu dela. Naquilo que fez e no que deixou de fazer.

Olívia acordou, após sonhar com a avó. Preocupada que tivesse ido embora sem se despedir, levantou e saiu para procurar por ela. A luz acesa no quarto do pai e a porta entreaberta a convidaram ir até lá, carregando o cobertorzinho embaixo do braço. Levou a mão à maçaneta abrindo um pouco mais o espaço por onde passar. Não era o papai lá dentro, era a vovó, justamente quem procurava.

— Vovó?

— Por que não está na sua cama? Pensei que estivesse dormindo.

Olívia largou a maçaneta, segurando apenas o cobertorzinho.

— Ainda fica com esse cobertor o tempo todo, Olívia?

A menina abraçou o cobertorzinho nos dois braços como Cheryl fosse capturá-lo.

— Seu pai podia ao menos ter lavado ele para você.

— Não.

— É claro que sim.

— Vovó?

— O quê, Olívia?

— Posso dormir com você hoje?

— Não. Tem sua cama, não tem?

A resposta deixou Olívia cabisbaixa. A caminho da porta, Cheryl chamou por seu nome.

— Olívia?

Olívia se virou para olhar no rosto dela.

— Sim, vovó?

— Tudo bem, você pode dormir aqui essa noite. Mas só essa dessa vez.

A menina sorriu. Sem pensar duas vezes, correu para a cama do pai cuja avó era quem ocupava essa noite. Acomodou a cabeça ao travesseiro junto à cabeceira. Deitou-se se remexendo, buscando uma posição confortável na cama que não era a sua.

Cheryl prestou atenção a seus movimentos sobre as lentes dos óculos de leitura.

— O que está lendo vovó?

— É apenas um livro sem muita importância.

— Livros são importantes, vovó.

Cheryl fechou o livro sem se importar em marcar a página para uma próxima leitura.

— Vou apagar a luz agora, está bem?

— Vovó?

— Sim, Olívia?

— Por que você foi embora?

— Eu tinha coisas a resolver.

— Eram muitas as coisas a resolver. Porque demorou muito para voltar, vovó.

Cheryl não soube o que dizer.

— Vovó?

— Fale Olívia.

— Senti sua falta. Você sentiu minha falta, vovó?

— Vamos dormir Olívia, já está tarde — pediu Cheryl, e apagou a luz. Deitou, e logo sentiu Olívia se mexendo ao seu lado.

— Você não me respondeu vovó.

— Sim, eu senti sua falta. Agora fique quietinha e volte a dormir. — Olívia se mexeu outra vez. — Vamos, fique quieta. Assim não vou conseguir dormir.

— Não consigo vovó.

— Por que não?

— Não consigo ver seu rosto no escuro. Como vou saber que me disse a verdade?

— Está me chamando de mentirosa?

— Não, vovó.

— Mais essa agora — resmungou Cheryl. — Ou fica quieta, ou volte para sua cama.

— Eu vou ficar quietinha.

— Assim espero.

— Vovó?

A avó resmungou com impaciência.  

— Pelo amor de Deus, o que é agora? — Olívia não respondeu, magoada com a forma como reagiu. — Fale Olívia, o que você quer?

— Só queria dizer que eu te amo.

Cheryl tocou seus cabelos ruivos no escuro.

— Eu também amo você, Olívia.

A menina se virou de lado, abraçando o cobertorzinho.

— Que bom que veio — murmurou, finalmente, antes de começar ficar sonolenta outra vez.

[…]

A noite foi difícil para Emmett, ficar no sofá da sala lhe trouxe uma baita de uma dor nas costas. Agora o que mais perturbou seu juízo foi que Rosalie retornaria a sua cidade de origem em breve.

Ainda se sentindo cansado, levantou e foi ao lavabo, pensando que era hora de acordar Olívia para se aprontar para ir à escola.

Percebeu sua ausência na cama mesmo antes de abrir as cortinas e deixar a luz pálida de mais uma manhã fria entrar.

— Olívia? — chamou, pensando que pudesse ter se escondido por alguma razão. — Amorzinho, onde você está? Não é hora para brincar de esconde-esconde. — Encontrou a ovelhinha na cama, mas não o cobertorzinho. — Olívia? — chamou mais uma vez. A voz adquirindo um tom de preocupação. Voltou ao corredor, chamando seu nome novamente. — Olívia? — então no alto da escada. — Ollie? — Voltando, encontrou Cheryl saindo de seu quarto.

— Por que está gritando uma hora dessas? — queixou-se. — Não acha que é cedo para isso? — As roupas de dormir e os cabelos levemente bagunçados, indicava que acordou ao som dos gritos dele.

— Não estou encontrando Olívia. Ela deveria estar na cama…

Viu um sorriso surgir no rosto da mãe. Incomodado, questionou:

— Do que está rindo? Isso não é engraçado.

— Seria se pudesse se ver agora. Esse era o pai que desejei tivesse sido desde o começo. Esse também é o pai que Sarah quis que fosse.

Ele pareceu desolado ao murmurar.

— Fracassei mais uma vez. Perdi minha garotinha de vista.

— Pare com isso. A menina está dormindo na sua cama.

— Mas…

— Ela acordou a noite e foi até lá me pedir para dormir comigo. — Não pôde deixar de notar o alívio atingir o rosto dele. — A menina vai à escola hoje?

— Sim.

— Bom, já sabe onde ela está. Vou dar uma melhorada na aparência e já desço para preparar o café da manhã.

— Obrigado — respondeu sem mesmo olhar no rosto dela, só queria encontrar a filha. — Olívia? — chegou mais perto da cama. — Amorzinho? — Mexeu no cobertor pesado encontrando a cama vazia mais uma vez. — Ollie?

— Estou aqui, papai.

Percebeu a voz infantil vindo de algum lugar perto dali. Ao virar na direção do som da voz, encontrou a menina saindo do closet de Sarah, carregando o inseparável cobertorzinho. Suspirou, aliviado, por vê-la bem.

— O que fazia lá dentro?

— Estava vendo o celo da mamãe.

Ele lhe ofereceu a mão. Olívia chegou mais perto pondo a mão pequena na sua.

— Você me assustou — disse.

— Mas eu nem fiz “buh”.

Emmett riu.

— Agora fiz você rir papai.

— É fez, sim. Estava te procurando para se trocar para ir à escola.

— E a vovó?

— A vovó não vai à escola.

Então foi a vez de Olívia sorrir.

— Não, papai. Onde que a vovó tá? Ela foi embora?

— Ah, não. Sua avó disse que ia dar um jeito na aparência, depois prepararia nosso café da manhã.

— Que bom que a vovó não foi embora.

Os dois saíram da suíte de mãos dadas.

— Posso faltar na escola hoje? — pediu.

— Sinto muito, mas você precisa ir. Acredito que sua avó ainda vai estar aqui quando voltar da escola.

— E a Rose? — Entravam no quarto dela, quando fez a pergunta.

— Rose também vai estar aqui.

Olívia soltou sua mão e foi deixar o cobertorzinho em cima da cama. Se apressando em escolher a roupa que usaria para ir à escola esta manhã.

— Essa, papai? — perguntou algumas vezes até se decidir.

— Que penteado vai querer que o papai faça hoje?

— Quero… — pensou um pouco antes de responder. Enquanto isso retirou o pijama e o deixou na cama. — Quero duas assim. — Mostrou as mãos, uma em cada lado, no alto da cabeça. — E o restante solto.

— Vamos começar, então.

Emmett foi pegar os assessórios de cabelos e a escova enquanto ela se trocava. Deixou tudo em cima da cama e a ajudou com os tênis. Olívia ficou quietinha aguardando arrumar seus cabelos. E, como acontecia sempre, correu para se olhar no espelho ao final.

— Está aprovado? — aguardou. O jeitinho animado dela revelou que sim, estava aprovado.

— Muito aprovado, papai.

— Vamos lavar o rosto e descer para tomar café?

— Uhun.

Dessa vez, foi ela quem ofereceu a mão pequena a ele. Emmett segurou sua mão, em seguida, a pegou no colo. Olívia sorriu ao sentir a barba do pai cutucar a pele do rosto.

— Para, papai!

Brincou sacudindo o corpo miúdo fazendo rir um pouco mais. Cheryl percebeu as risadinhas quando retornava ao segundo andar. Viu os dois entrarem no banheiro, e então Olívia em cima da escadinha diante a pia. Viu-a gargalhar quando o pai, propositalmente passou a barba em seu pescoço. Sentiu uma emoção diferente ao olhar a cena. Pai e filha finalmente estavam felizes. Os deixou ali e foi para o quarto da menina buscar roupas sujas para jogar na máquina de lavar.

— Papai? — chamou Olívia.

— Oi.

— Você é muito doido.

— Eu sou muito doido? — Emmett não aguentou e caiu na gargalhada. Foi inevitável, Olívia acabou gargalhando com ele.

De volta ao quarto, Olívia logo deu por falta do cobertorzinho.

— Cadê, papai?

— O quê, amorzinho? — Ele segurava a mochila dela na mão.

— O cobertorzinho.

— Não está na mochila?

— Não, eu deixei bem aqui. — Ela mostrou a cama, agora, livre de todos os lençóis e fronhas. — Sumiu tudo.

— Não — murmurou, imaginando o que poderia ter acontecido. — Acho que sei o que aconteceu, Olívia.

— O quê aconteceu?

— A vovó deve ter levado junto com as roupas de cama para lavar.

— Mas eu não quero. — Olívia se desesperou, correndo para fora do quarto e então à escada ignorando os pedidos do pai que parasse.

— Não, vovó — gritou do alto da escada.

Emmett estava logo atrás dela.

— Olívia, cuidado! — ficou aliviado ao ver que chegou bem ao térreo. Mas ela seguiu correndo pela casa até estar no porão, no alto de outra escada.

— Vovó?

Cheryl deixou de lado as roupas no chão, separadas por cores, chegando ao pé da escada para olhar a neta.

— O que foi Olívia?

— Meu cobertorzinho.

— Vou pôr ele para lavar agora.

Emmett chegou perto da filha bem quando Cheryl explicava.

— Não quero — protestou a menina.

Cheryl voltou para as máquinas de lavar e secar. Olívia desceu a escada no porão, chorando.

— Não é para lavar, vovó — pediu, procurando pelo cobertorzinho no meio das outras roupas.

— Não está aí, Olívia.

A menina levantou a cabeça olhando para a avó. Emmett desceu a escada no porão também.

— O cobertorzinho está aqui. — Mostrou o cesto em cima da máquina com o cobertorzinho e a ovelha de pelúcia. Olívia ficou de pé apressando-se até eles. Os pegou de dentro do cesto e os manteve junto ao peito. Ainda chorando olhou no rosto do pai.

— Não é para lavar — tornou pedir.

Emmett a pegou no colo, beijando sua bochecha molhada de lágrimas.

— Estão imundos — Cheryl insistiu.

— Não tá não, vovó.

— Este cobertorzinho não é lavado desde que fui embora. Dá para ver pela cor.

Emmett foi quem falou dessa vez.

— Pelo amor de Deus, mãe. Já deu!

— Não é possível. Você não ver a sujeira disso?

— Mãe, eu já sugeri que lavasse. Rose também. Só não pode ser assim, obrigando. Ela precisa concordar. — Ele deixou a menina na escada e ela subiu até a cozinha.

— Podemos lavar quando estiver na escola — sugeriu Cheryl.

— O cobertorzinho vai com ela para todo canto. Ainda que não fosse assim, não faria dessa fora. Ela se sentiria traída. Isso é o que menos quero agora. No momento certo, sei que vai aceitar que lavemos aos dois.

Cheryl estalou a língua, mostrando seu descontentamento.

— Ainda penso que devíamos lavar, mesmo que não queira.

— Por favor, mãe, não quero discutir. Então, não vamos falar disso. Não faça Olívia chorar de novo. Percebe que fez isso algumas vezes desde que chegou.

— Tudo bem. — aceitou Cheryl. — Vou lavar as roupas e pronto.

— Lave a casa inteira se quiser, apenas não lave o cobertorzinho e a ovelha.

— Não queria que ela chorasse — confessou. — Não pensei que fosse tão forte assim o apego com os objetos, especialmente com o cobertorzinho.

Emmett anuiu. Virando as costas começou subir a escada até a cozinha. Encontrou Olívia sentada à mesa, segurando o cobertorzinho e a ovelha.

— A vovó não vai mais pegar eles — garantiu. — Não precisa ficar com medo. — Como Olívia não disse nada, serviu o café para os dois. Depois a acompanhou até o ponto para esperar pelo ônibus. — Pode deixar a ovelha com o papai. Não vou deixar que sua avó jogue na máquina de lavar.

Olívia entregou na mão dele a ovelha, mas o cobertorzinho, esse foi na mochila com ela para a escola.

— Não deixe a vovó fazer isso, papai — pediu.

— Não, claro que não. — Emmett beijou seu rosto. Ela subiu os degraus na porta do ônibus. — Tenha um bom dia, amorzinho. — A porta se fechou. Olívia acenou para ele, que acenou de volta com a mão que segurava à ovelha de pelúcia. Trocando de mão, assim que percebeu.

 


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Notas finais do capítulo

Se você gostou, e puder, deixe seu comentário para mim.