Um Caminho Para O Coração escrita por Sill Carvalho, Sill


Capítulo 35
Capítulo 34 — Pequenos Momentos




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Após liberar Olívia para a escola, Emmett retornou para casa. Cheryl ajeitava algumas coisas na cozinha, quando passou a caminho da garagem, depois de entrar pela porta da frente e pegar as chaves no aparador.

— Precisarei ir ao trabalho hoje — comunicou. — Não vou poder ficar e te fazer companhia. Faltei ontem para limpar o jardim…

— Tudo bem — Cheryl respondeu. E não havia nenhum incomodo nisso. — Não me importo de ficar sozinha por algumas horas. Não quero atrapalhar. Você pode ir tranquilo fazer suas coisas. Ficarei bem.

Emmett anuiu, sem parar para estender a conversa.

— Emmett, espere um instante. — Ela secou as mãos no pano de prato e o deixou em cima da ilha. — Tenho que te falar uma coisa.

Ele parou para ouvir, ainda que estivesse com pressa.

— Pode falar.

— Não quer sentar um minuto?

Balançou a cabeça como não houvesse saída que não fosse sentar e ouvir.

— Não posso demorar — lembrou. Aproximou-se das banquetas, puxando uma delas onde pudesse sentar. Cheryl cutucou com as unhas pintadas a vasilha de biscoitos. — Mãe? — insistiu Emmett. — Eu preciso ir trabalhar.

— Sim. — Ela afastou a vasilha de biscoitos para o centro da ilha. — Volto para Pensilvânia amanhã.

Emmett sacudiu a cabeça aceitando. Já espera que não fosse demorar. Cheryl continuou, atenta a expressão em seu rosto atrás de algum sinal de irritação.

— Estou trabalhando em uma casa de repouso já faz um tempo. Não posso me demorar.

— Olívia e eu vamos ficar bem. O pior já passou.

— Eu sei que sim. Tem lutado por esse tempo. Mas, não é só isso, quero te contar outra coisa.

— Bem, pode falar.

— Estou com uma pessoa agora. Ele se chama Joseph. A companhia dele tem sido muito boa para mim. Nós nos entendemos muito bem.

Emmett sustentou seu olhar.

— Há quanto tempo? — questionou.

— Pouco mais de um ano.

— Por que só agora estou sabendo disso? — acusou sustentando seu olhar.

— Não queria falar comigo, Emmett. Não finja que esqueceu. O que fiz foi cumprir seu desejo, apenas.

— Nos excluiu de sua vida — acusou ele. — Sua neta e eu.

— Não, está enganado. Quem fez isso foi você.

O punho dele descansou no mármore na ilha.

— Olha, é sério. — lembrou. — Não quero brigar. Meio que já estou cansado dessa coisa toda.

— Eu também não quero. Só disse por que, sendo meu filho, tinha o direito de saber que não estou mais sozinha.

Emmett se levantou.

— Está certo.

— Quero muito que você faça o mesmo — colocou assim.

— Esse Joseph é realmente bom para você?

— Sim. — Sorriu de leve ao lembrar-se do companheiro.

— Qual a profissão dele? Pergunto isso porque me preocupo que possa estar com algum encostado.

— Joseph é um bom homem. Quanto a isso não precisa se preocupar. Sobre a profissão, Joseph é policial aposentado.

Emmett anuiu. Afastou-se antes de parar e falar:

— Quando vou conhecer ele?

— Na próxima vez que voltar aqui, eu posso trazer ele comigo. Se não se importar, claro.

— Contando que me avise antes.

— Como quiser.

— Realmente, preciso ir agora. — Moveu o braço na direção da garagem.

— Que horas Olívia vai chegar?

— Ela sai às três e quarenta. Rose vai esperar por ela no ponto de ônibus.

Cheryl balançou a cabeça, concordando.

— E você, almoça em casa?

— Volto apenas no fim do dia. Como disse, não trabalhei ontem. Preciso adiantar umas coisas por lá.

— Tudo bem, então. Qualquer coisa eu almoçarei em algum restaurante. Tenha um bom dia de trabalho.

— Obrigado.

[…]

Rosalie saiu da casa do avô pouco mais cedo que de costume para esperar por Olívia. Tinha um convite a fazer e, se aceito, deixaria sua pequena muito feliz.

Cheryl tomava uma xícara de café, sentada no banco na varanda da casa deles, observando o jardim que foi limpo no dia anterior. Rosalie deixou o carro junto ao meio-fio. Percebeu Cheryl olhando em sua direção. Acenou para ela indo a seu encontro.

— Olá! — cumprimentou ao se aproximar.

— Já está na hora de Olívia chegar? — pediu Cheryl. — Não estou com nada aqui que me permita ver as horas, não tenho ideia que horas possa ser agora.

— Tudo bem — garantiu Rosalie. — Faltam alguns minutos até o ônibus chegar.

— Ah — murmurou a outra, segurando a xícara com as duas mãos.

— Posso? — indicou Rosalie o assento ao lado de Cheryl.

— Fique à vontade. — Cheryl apoiou a xícara nos joelhos.

— Gostaria de te convidar a esperar Olívia comigo. — Ela olhou em seu rosto, como não esperasse pelo convite. — Olívia iria gostar que a avó estivesse comigo, esperando ela chegar.

— Você acha?

— Claro que sim. Olívia sentiu muito sua falta, Cheryl. Mais do que imagina.

— Eu não deveria ter feito o que fiz — admitiu, referindo-se a ter deixado Olívia para trás quando resolveu voltar à cidade onde vivia antes de ela nascer. — Se não estiver enganada, Emmett mencionou se conhecerem não faz muito tempo.

— Esse tempo se revelou suficiente para amá-la como fosse minha.

— Dá para ver no seu olhar que está dizendo a verdade.

— Olívia é o meu arco-íris.

— O seu tom de voz dá entender que minha neta deu outro sentido a sua vida.

— E deu. Olívia não nasceu do meu ventre, mas no meu coração. — afirmou Rosalie.

— Me desculpa dizer isso. Olhando assim para você, não me parece alguém que tenha passado por provações. — Cheryl julgou sua aparência. Ao que Rosalie possuía.

— As aparências enganam — contestou.

— Me desculpe… Estou sendo inconveniente outra vez. Criando suposições.

— Está tudo bem — tranquilizou Rosalie.

Cheryl descanou a mão esquerda no joelho.

— Que cabeça a minha, nem perguntei se gostaria de tomar café comigo.

— Não sou muito de tomar café. Prefiro chá.

— Eu sei que não deveria me meter — alertou. — Acontece que, durante o jantar ontem à noite, quando mencionei casamento, você e meu filho reagiram de um jeito estranho.

Rosalie ficou alguns instantes pensando a respeito.

— Não sou da cidade — disse, por fim. — Não pertenço a Edenton. Minha vida está em Atlanta. Meu trabalho está lá.

— Entendo… Sua vida está em Atlanta, mas, seu coração está aqui. Quer ficar, mas não pode evitar sentir medo da decisão final. Também me sentiria assim se tivesse de decidir algo tão importante.

Rosalie não disse nada. Não havia o que dizer.  A resposta para o que sentia tinha sido exposta.

— Se ainda tivermos tempo, poderia dizer como conheceu minha neta? — Ela assistiu Rosalie verificar o horário no visor do celular.

— Ainda temos alguns minutos — garantiu. Então, de forma resumida, contou a Cheryl porque tirou um tempo para si ao sair de Atlanta para ficar com o avô, até o ponto de sua vida cruzar com a de Olívia e Emmett. Passando também pela senhora Smith. — Conheceu a senhora Smith? — questionou Rosalie ao final de toda a história.

— Encontrei com ela algumas vezes na igreja e aqui mesmo na vizinhança. Conversamos muito pouco, na verdade.

— Sabe alguma coisa a respeito do marido e a fotografia de uma garotinha no porta-retratos em cima da lareira dela?

— Ouvi certa vez que vivia amargurada por conta do que aconteceu com o divórcio dela. A única filha do casal ficou com o pai. Ao que parece conseguiu a guarda e o direito de levar a menina com ele para a Holanda, seu país de origem. Tem algo a ver com um ocorrido com a criança enquanto esteve com a mãe. Mas isso já faz muitos anos. Acredito que o último contato com a filha tenha sido na idade da fotografia que você diz ter visto.

— Se tudo isso aconteceu no passado da senhora Smith. Ser impedida de ter contato com a própria filha. Não poderia ter sido confiado a ela o dever de cuidar de Olívia. Será que Emmett tinha conhecimento desta parte do passado da senhora Smith?

— Se for ver pelo modo como estava quando fui embora, o provável é que não soubesse. Nem mesmo tenha buscado referências. Ele só queria alguém para ficar com a menina depois da escola, e ela o dinheiro extra.

— Infelizmente… — lamentou Rosalie, voltando olhar no visor do celular. — Acho que agora podemos ir — avisou, se colocando se pé. — Ollie está a caminho.

Cheryl levantou logo depois dela. A xícara vazia ficou no banco. Seguiram ao ponto de ônibus uma ao lado da outra, na calçada que antecedia o gramado dos vizinhos.

— Você sabe mesmo o horário que ela chega — admitiu.

Rosalie sorriu. O ônibus amarelo apontou na rua. Em pouco tempo, ouviu-se o barulho dos freios. A porta foi aberta revelando uma menininha de rosto desenhado de sardas, sorrindo para elas.

— Rose! Vovó!

Cheryl se pegou sorrindo de volta. Olívia abraçou a cintura de Rosalie, depois a da avó. Cheryl não pôde deixar de notar que Rosalie ficou com a lancheira numa mão e na outra segurou a mão pequena da menina.

— Vovó — começou Olívia.

— Sim? — o barulho do ônibus retornando a rua atrapalhou um pouco a conversa.

— Posso segurar também sua mão? — pediu Olívia.

Rosalie buscou o olhar de Cheryl, silenciosamente, sugerindo que aceitasse o que a menina pedia.

— Pode Olívia — disse a avó, tranquilizando Rosalie com a resposta. — Você pode, sim, segurar minha mão. — A mão pequena foi então colocada na sua.

— Sabia que o vovô da Rose também é meu vovô? — Olívia seguiu falando de Norman pelo curto trajeto que as levaram de volta para casa.

Depois de muito tagarelar, correu para lavar as mãos e Rosalie lhe serviu um lanche antes de fazer a lição de casa. Dessa vez, Olívia escolheu a mesa da cozinha em vez da sala de jantar para fazer a lição enquanto a avó cuidava do jantar deles. Rosalie ficou ao seu lado ajudando o tempo todo sem nunca se queixar ou fazer cara feia, Cheryl não pôde deixar de notar. Sempre que olhava, via satisfação no rosto da menina. O amor incondicional que uma tinha pela outra. Presenciou todas às vezes que sorriram juntas. Quando a neta segurou o rosto de Rosalie entre as mãos pequenas beijando a ponta de seu nariz ficou com a certeza que no coração de ambas já eram como mãe e filha. Tentou disfarçar ao ser pega espiando por Rosalie.

Pela forma como a olhou, Rosalie desconfiou que estivesse imaginando a separação das duas. Afagou os cabelos da menina quando o pensamento lhe ocorreu. Sem desconfiar, Olívia olhou em seu rosto e voltou a olhar a lição, segurando o lápis na mão direita.

O barulho do motor da caminhonete entregou a chegada de Emmett.

— Papai chegou! — se animou Olívia. — Já chegou o papai.

— Achei que fosse chegar só mais tarde — admitiu Cheryl de detrás da ilha, onde picava alguns legumes.

— Algumas vezes ele volta mais cedo — Rosalie respondeu.

Olívia se ajeitou na cadeira aguardando o momento que o pai entraria na cozinha. O barulho das chaves no aparador e o som de passos pela casa indicou que estava perto.

A princípio, Emmett estranhou que o material escolar de Olívia não estivesse na mesa da sala de jantar como quase sempre acontecia quando chegava do trabalho desde que Rosalie passou a ficar com ela.

O aroma do assado estava por toda a casa. As vozes no interior da cozinha lhe deu a sensação de acolhimento. De estar em família. O que acontecia com frequência desde que Rosalie entrou em suas vidas.  Seguiu o aroma e o som de suas vozes. A cena que encontrou só mostrou que seus sentimentos estavam certos. A mãe preparando o jantar. Rosalie ajudando Olívia com a lição de casa. Essa era sua família agora.

— Oi, mãe — falou.

Olívia saltou da cadeira no chão correndo para os braços dele.

— Oi, Emmett.

Cheryl continuou o que estava fazendo, porém, atenta ao que acontecia ao seu redor.

Emmett piscou para Rosalie ao pegar Olívia no colo. A menina não chegou a perceber.

—Oi, amorzinho. — Ele beijou seu rosto. — Você está bem?

Olívia balançou a cabeça, confirmando.

— Papai, você não falou com a Rose — acusou.

— Falei.

— Não, eu não vi.

— Ah, é? — brincou. Então inclinou a cabeça para olhar Rosalie. — Oi, Rose!

Ela sorriu quando respondeu de volta.

— Oi, Emmett.

A mão pequena afagou sua barba, avaliando seu rosto.

— Muito bem, papai.

— Obrigado. — Olívia deu sinais de querer sair do colo, então ele a colocou no chão. — Espere! — segurou sua mão pequena. — Você não quer ver o que o papai trouxe?

Olívia se virou, olhando em seu rosto.

— O que é papai?

— Não posso falar.

— Então onde está?

— Lá fora. Na carroceria da caminhonete.

— Vamos lá papai.

— Põe o agasalho, Ollie — Rosalie lembrou. — Está frio lá fora. — Seu olhar cruzou com o de Emmett. Ele sinalizou que fosse com eles.

Olívia foi à frente. Emmett vestiu o agasalho nela antes de abrir a porta. Acompanhou a menina até a caminhonete estacionada na entrada de veículos. Rosalie permaneceu na varanda, com as mãos nos bolsos do agasalho, observando pai e filha interagindo.

— O que trouxe papai? — pediu a menina, curiosa, dando pulos em torno da caminhonete.

Ele a ergueu no colo mostrando dentro da carroceria.

— O que são essas coisas, papai?

— Material para reformar sua casinha no jardim dos fundos.

Um sorriso desenhou os lábios de Olívia, e os olhos brilharam.

— Adivinhe quais cores tem aqui?

Ela fez cara de quem não sabia.

— As cores do arco-íris — revelou, cutucando a barriga da menina. — São latinhas com as cores que mais gosta. Para ser pintada como você quiser. Estas são madeiras para a casinha e aquelas, para fazer sua cama nova. — Braços pequenos envolveram seu pescoço. Rosalie sorriu atenta aos dois, mas, algo no celular chamou atenção, depois disso, o sorriso desapareceu de seu rosto.

Emmett colocou Olívia no chão. A menina correu para os fundos da casa. Ele então foi ao encontro de Rosalie. Parando diante ela levou um tempo para um dos dois dizer qualquer coisa. Ela segurou o celular na mão como ajudasse no que tinha a falar.

— É do meu emprego — começou. — Eles precisam que eu volte. — O olhar triste refletiu o de Emmett. — Não quero magoar vocês. Jamais quis isso.

Estendeu o braço tomando Rosalie para si. Abraçando apertado, permitindo o queixo descansar no alto da cabeça dela.

— Sei que não é intenção sua nos magoar. Sobretudo magoar Olívia. Estaria mentindo se dissesse que está tudo bem. Mas, eu não posso pedir que fique quando sei que sua vida está em outro lugar. Não vou dizer o que fazer como seus pais fizeram a vida toda. É livre para decidir sua vida.

— Papai, papai — o chamado de Olívia vindo dos fundos da casa o interrompeu.

Rosalie se afastou dele.

— Vai lá — incentivou. — Vá ver o que nossa pequena quer.

Emmett anuiu, sorrindo de leve, porque, Olívia era a pequena deles agora. Ninguém mais mudaria isso.

— Papai, papai.

Ele deu dois passos a caminho dos degraus na varanda, parando um instante para falar:

— Quando vai contar a ela? É a única que pode fazer isso.

Rosalie balançou a cabeça, aceitando que era uma revelação difícil mesmo para ela. Ainda que a intenção seja de voltar.

— Não posso fazer isso nesse momento. Não vou estragar a felicidade dela em ter sua mãe por perto lhe dando uma notícia ruim. Não seria justo com a minha menina. Eu lutei por esse momento na vida dela, não serei eu a estragá-lo.

A voz de Olívia soou novamente.

— Papai?

— Vai lá — insistiu Rosalie.

— Você não vem? — Ele se afastou.

— Encontro vocês em alguns minutos.

Emmett se encaminhou a lateral da casa, aceitando que Rosalie precisava desse tempo para avaliar a conversa que teria com Olívia em breve.

— Papai?

— Estou indo, filha — respondeu. Dando uma última olhada na varanda. A última coisa que viu, foi Rosalie voltando a sentar no banco.

A menina foi se encontrar com ele ao avistá-lo se aproximando do caramanchão.

— Papai, eu vou poder ajudar pintar a casinha?

Vendo o quanto gostaria de fazer parte, não teve como ser outra a resposta que deu.

— É claro que pode.

— A gente vai começar hoje? — segurou na mão dele, sacudindo de um lado para o outro.

— Não, hoje não. Antes o papai precisa trocar algumas madeiras que estão podres. Daqui a pouco vai estar escuro.

— Quando, então? — pediu a menina.

Emmett olhou para os lados se certificando que Rosalie estava chegando aos fundos da casa. Não a viu, então, se concentrou em responder Olívia: — No fim de semana.

— Vai demorar?

Emmett achou graça de sua impaciência.

— Não, chega rapidinho.

— Tá bom, então.

Na janela da cozinha, Cheryl observou os dois.

— Vou chamar a Rose — disparou Olívia de volta a varanda, na frente da casa. Nesse momento, Emmett avistou a mãe na janela. Acenou para ela, ainda pensando em Rosalie e Olívia. A forma como o olhava levou Emmett entender que sabia no que estava pensando. De alguma forma, isso lhe trouxe o sentimento de não estar sozinho. Olhou uma última vez na direção da janela e começou se afastar pelo mesmo caminho feito por Olívia.

Foi somente ao alcançar o último degrau na varanda que Olívia percebeu Rosalie de cabeça baixa. Chegando mais perto, viu lágrimas no rosto dela. Sentiu medo por encontrá-la tão triste. Apressou-se acabando com a curta distância que as separava agora. A felicidade parecia, de repente, algo distante como foi um dia. Braços miúdos acolheram Rosalie com amor e medo, grudando nela, cheia de receio.

O calor de seu pequeno e desesperado abraço levou Rosalie retribui-lo com igual intensidade.

Emmett alcançou a varanda. Parou diante os degraus. Imaginou que estivesse contando a Olívia sobre ter de ir à Atlanta, mas, soube que não ao ouvir a menina falar:

— Por que você está triste?

Viu Rosalie beijar com um estalo o ombro de Olívia.

— Só estava pensando numa coisa…

Olívia tocou seu rosto limpando as lágrimas assim como Rosalie havia feito tantas vezes enxugando seu choro.  

— Não pense nessa coisa então. Ela te deixa triste e te faz chorar. Não gosto que você chore.

O coração de Rosalie transbordou de amor. Todo amor e cuidado dedicado a Olívia havia criado raízes fortes e duradouras. Não poderia viver longe deles. Seu coração os pertencia.

— Não pense no que te deixa triste, Rose — tornou pedir a menina.

Rosalie colocou um sorriso no rosto, por ela.

— Tem toda razão, meu amor. Não vou mais pensar em coisas que me deixam triste. — Beijou o rosto de Olívia, que olhou para o lado ao sentir que o pai se aproximava.

— Papai, me ajuda fazer Rose sorrir?

Emmett chegou mais perto. O olhar de Rosalie cruzou com o seu.

— Como o papai pode fazer isso? — perguntou.

— Assim — Olívia começou fazendo cócegas em Rosalie. Pensando ser uma boa opção, Emmett fez como Olívia, obrigando Rosalie sorrir e gargalhar ao preço de cócegas. Até que, numa troca de olhares, decidiram que Olívia merecia o ataque de cócegas também. A menina se contorceu e gargalhou no colo dela. Foi nesse momento que Rosalie teve um beijo roubado por Emmett. Olívia percebeu e o sorriso que já estava em seu rosto só cresceu.

A porta da frente foi aberta revelando a figura de Cheryl, com um avental na cintura.

— O jantar está pronto — avisou. Todos os olhares foram em sua direção.

— Posso chamar vovô Norman para jantar com a gente? — Olívia pediu.

— Por mim, tudo bem — o pai concordou.

Diante a resposta dele, Rosalie pegou o celular no bolso buscando o número do telefone fixo de Norman na agenda. Enquanto chamava, entregou na mão de Olívia.

— Ele vai ficar feliz — disse Olívia levando o aparelho ao ouvido.

Norman chegou à casa de Emmett com uma torta de maçã para sobremesa. Completando a que Cheryl havia preparado. Depois do jantar, Olívia pegou o jogo de damas para jogar com Norman. Cheryl aguardou que um deles perdesse para então jogar com o vencedor.

Rosalie e Emmett dividiram o mesmo sofá na sala. A televisão se encontrava ligada no noticiário, embora nenhum deles prestasse atenção ao que era dito. Ambos calados, com os pensamentos na partida de Rosalie que, a cada segundo, se tornava mais próxima e inevitável.

O braço em volta dos ombros dela, de tempos em tempos, lhe fazia um carinho no braço. A voz de Olívia, e, em alguns momentos sua risadinha, eram a única coisa da qual não conseguiam se desligar.

Finalmente, após duas partidas de dama com Norman e uma com Cheryl, Olívia buscou aconchego nos dois, indo sentar entre eles no sofá. A televisão foi sintonizada no canal infantil. Entre um carinho e outro, pegou no sono, recostada a Rosalie.

Norman encerrou o jogo de dama. Despediu-se de todos, alegando estar tarde. Rosalie anunciou que iria com ele. Emmett levou Olívia para a cama.

Como Norman estava de carro, Rosalie teve de segui-lo com o seu. Antes disso, Emmett foi com ela até o carro, apertou ela em seus braços, desejando muito que ficasse, não somente essa noite.

Acabou arrumando o sofá da sala para passar mais uma noite. Passos na escada avisou que não estava sozinho. Cheryl estava lá quando olhou.

— Achei que estivesse na cama — comentou, voltando estender o lençol no sofá.

— Estou preocupada — ouviu dizer.

— O que te preocupa? — sondou ele.

— Você. — O modo como inclinou a cabeça mostrou estar surpreso. Cheryl então continuou. — Estou indo embora amanhã e logo será a vez de Rosalie. Preocupa-me como Olívia e você possam ficar na ausência dela. Ainda que seja temporário.

— Se o que te preocupa é que eu abandone Olívia outra vez, isso não vai acontecer. Nunca mais. Demorou até eu enxergar, mas, hoje percebo com clareza, minha filha é número um em minha vida. Vai ser difícil não ter Rose aqui com a gente pelo tempo que estiver resolvendo a situação dela em Atlanta. Mas, temos que passar por isso. — Cheryl balançou a cabeça mostrando entender. — Decidi que quero a felicidade. E ela começa com minha filha. Vou fazer minha menina feliz. E, quem sabe, compensá-la pelos anos de escuridão.

— Então posso ir embora tranquila? — Cheryl buscou a confirmação.

— Apenas prometa voltar.

— Isso é pela minha neta?

— Isso é por sua neta e eu.

Cheryl abriu um sorriso.

— Será que eu posso abraçar meu filho? — arriscou, abrindo os braços.

Cheryl ficou pequena junto dele. Apreciou o abraço, ainda que ele estivesse pouco à vontade. As brigas constantes, no tempo que viveu sob o mesmo teto que ele, depois da morte de Sarah, deixou marcas que seriam amenizadas com o tempo.

— Me desculpe — pediu ela. — Não foi certo ter deixado os dois sozinhos quando precisavam tanto de mim.

— Eu não facilitei — admitiu ele.

— Não mesmo.

— Demonstre seu carinho a Olívia e, de minha parte, estará tudo perdoado — colocou assim Emmett.

[…]

Ainda pela manhã enquanto Cheryl arrumava as coisas para ir embora, Olívia ficou seguindo seus passos aonde quer que fosse.

Emmett viu a filha com lágrimas nos olhos ao pegar a mala da mãe e levar para o carro. A menina chegou ao seu lado, ainda de pijama, carregando o cobertorzinho.

— A vovó vai embora para sempre?— sussurrou.

— Não, a vovó irá voltar em breve.

Não falou de volta, porém, o olhar preocupado dizia não ter certeza. Emmett se abaixava para ficar na altura da filha, quando avistou, de canto de olho, a mãe se aproximando. Acabou que não disse nada, ficou de pé segurando na mão da menina. Ambos aguardaram. Pegou-se desejando que Cheryl dissesse qualquer coisa que acalmasse o coração de sua filha.

— Não precisa chorar Olívia.

— Você vai voltar vovó?

— Não se preocupe logo nos encontraremos novamente. Vamos nos falando por telefone até lá. — Não se abaixou para falar com a menina como Rosalie ou mesmo ele teria feito. Olívia chegou perto dela quando lhe estendeu os braços. O abraço foi breve. A avó beijou seu rosto. — Fiquem bem, os dois— pediu. — Cuidem um do outro. — Emmett anuiu. — Em breve voltarei para mais uma visita.

— Tenha uma boa viagem de volta, mãe.

— Obrigado. Aviso quando chegar.

— Tchau, vovó.

— Tchau, mãe.

Cheryl se acomodou atrás do volante. Acenou uma vez antes de finalmente partir.

Ao perceber que Olívia chorava, Emmett se colocou na mesma altura que ela. As mãos em seus ombros pequenos.

— Amorzinho, não fique triste. Sempre que quiser falar com sua avó, pode me dizer. Eu ligo para vovó e te passo o telefone. — Ele beijou sua testa. — Mas, por agora, o que acha de começarmos arrumando a casinha. Aposto que vai gostar.

A menina olhou no rosto dele, um pouco menos triste que alguns segundos atrás.

— Você e eu? — arriscou. 

— Eu e você— garantiu Emmett, sorrindo para ela.

— O papai e Olívia? — Ela tinha um leve sorriso a desenhar o rosto agora. Emmett sabia que estava entrando na brincadeira.

— A Olívia e o papai — respondeu, fazendo cócegas na barriga dela. Olívia gargalhou, antes de ele colocá-la sobre os ombros.

— Wou! Quase consigo tocar o céu com as mãos, papai — brincou.

— Por acaso a senhorita não está me chamando de gigante, está?

— Meu gigante favorito de todos — a resposta levou Emmett a gargalhar. Seguiu com a filha sobre os ombros o curto caminho até a garagem onde estava guardado todo o material da reforma na casinha. A pequena construção de madeira no jardim dos fundos estava prestes a ganhar uma nova imagem. E, certamente, os dois teriam um tempo de qualidade trabalhando juntos.

 


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