O Sangue do Mestiço escrita por Júlio Oliveira


Capítulo 5
União forçada


Notas iniciais do capítulo

Já quero começar agradecendo Yokichan e Diamond que deram toques importantes lá no primeiro capítulo do livro. Revisei e fiz algumas alterações para melhorá-lo (não mexi nada na história, podem ficar tranquilas). Agradeço demais por cada sugestão, dica e elogio ♥

Espero que se divirtam com o prosseguir da história!



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A porta da delegacia foi aberta abruptamente. Arnold despertou de seu cochilo assustado, ainda mais com a cena em questão: um mestiço e um índio sendo conduzidos pelos homens de Edward Muller. Muralha e Joseph carregavam os prisioneiros com vigor, enquanto Rico andava mais atrás coçando sua perna que havia sido perfurada. A flecha não estava mais ali, mas era difícil não demonstrar o incômodo causado pela dor. Ainda assim, o homem estranho se manteve junto do grupo.

— Quem são esses? — Arnold questionou incredulamente.

— Suspeitos — disse Muralha. — Possíveis assassinos da Jessica Muller.

Aquelas palavras machucavam profundamente o espírito de Adaky. O nativo se sentia pior do que nunca. Não bastava ter perdido o amor da sua vida e o seu tio em pouco tempo, ele agora ficaria preso na vila dos brancos. Como o mundo poderia ser tão injusto?

— Eu já prendi o assassino — falou o xerife. — Digo, suspeito. Richard Olsen. Conhecem?

Arnold deu um sorriso arrogante, como se fosse superior ao trio. Entretanto, Joseph não ligou para aquela atitude e disse:

— Não tem problema algum. Tenho certeza que há espaço na cela.

Naquele momento, Patwin finalmente se manifestou.

— Somos inocentes! — Falou o mestiço com veemência. — Qual a legalidade desse processo, xerife?

Arnold, Joseph e Muralha riram com a pergunta de Patwin. O jornalista olhou com espanto para os três, enquanto Rico aguardava o fim daquela situação mais atrás.

— Qual a graça? — Patwin estava cada vez mais agitado e nervoso.

Segurando o mestiço com força pelo ombro e o conduzindo lentamente, Arnold disse:

— A graça é que quem paga meu salário é o Edward. Ele é a lei.

Com essas palavras em mente, Patwin e Adaky foram arrastados até uma cela. Entretanto, o lugar não estava vazio: Richard se fazia presente. O garoto estava desperto, observando a cena atentamente enquanto batia repetidamente com a mão esquerda no chão.

— Você? — Patwin ficou surpreso.

Richard apenas acenou positivamente com a cabeça. O mestiço e o nativo foram então jogados dentro da cela sem qualquer cuidado, a porta sendo trancada logo em seguida. Do lado de fora, Muralha e Joseph sorriam com o cumprimento da tarefa.

— Pensei que seria mais difícil — disse Muralha.

— Mas afinal, onde vocês acharam esses dois? — Arnold questionou.

Ouvindo aquela conversa, Patwin chegou a fechar o punho e a preparar alguma fala de protesto. Mas a razão falou mais alto e o jornalista viu que não havia escapatória. Ele não seria solto dali, não daquela maneira. Aqueles homens eram apenas executores, só estavam seguindo ordens de alguém muito maior. O mestiço só teria duas possibilidades: falar cara a cara com Edward Muller ou fugir. Ele torcia para que o diálogo resolvesse tudo, ao mesmo tempo em que imaginava como que isso se daria. Edward parecia ser o tipo de homem que tinha poder demais em mãos para ser confiável. Havia ainda o fato de ter perdido recentemente a filha. Um pai cheio de raiva e desejo de vingança sempre era um grande perigo. Patwin teria que ser cauteloso.

— Andavam pela floresta — Joseph respondeu a pergunta do xerife. — Muito estranho, não? Um mestiço e um índio?

— Realmente — respondeu Arnold. — E esse mestiço é novo aqui, se não me engano.

— Estou ansioso para ver o que o Edward vai fazer — disse Muralha para logo em seguida gargalhar.

Adaky acompanhava tudo com o rosto escondido entre suas mãos. Sentado em um canto da cela, o nativo se martirizava pela recente morte de Wohali. Ele então pensou em como sua tribo o trataria caso ele conseguisse voltar. Imaginava os xingamentos, a desonra e as agressões. Afinal, ele já tinha um histórico negativo: se relacionava com uma moça da vila. Além disso, levou Wohali para a morte. “Se eu não tivesse amado Jessica, nada disso teria acontecido”, ele pensou.

Com a madrugada chegando, os homens de Edward Muller se retiraram. Ao mesmo tempo, Arnold também partiu, deixando os três presos à mercê da luz do luar. Ainda que fosse tarde, nenhum deles dormia. Pelo contrário, estavam bastante acordados. Cada um em seus pensamentos, vivendo seu pesadelo particular. Até que, finalmente menos nervoso, Patwin começou a falar.

— Já que estamos no inferno, que possamos compartilhar um pouco dos nossos pecados. Como você veio parar aqui, Richard? Lembro-me de te ver desenhando no bar. Qual a sua história?

O artista olhou para Patwin com desdém. Ele estava irritado, suas costas doíam e ele sentia o mais profundo tédio. O mestiço entendeu a mensagem.

— Eu começo, então — Patwin disse. — Eu poderia estar muito bem sentado de frente para uma mesa agora. Estaria redigindo algum artigo genérico para o jornal que trabalho em Nova York. Receberia meu salário, iria para um ou dois jogos da liga nacional de futebol depois. Talvez saísse com alguma moça do trabalho, não sei. Sabem, a vida de um exemplar genérico de americano.

Adaky e Richard prestavam atenção às palavras de Patwin.

— Mas eu sentia um vazio, sabe? Como se uma peça não se encaixasse em mim. Ou talvez eu que não me encaixasse. Não era incomum olharem torto para mim, mas isso era algo que eu não ligava. O grande problema estava dentro de mim. Minha mãe morreu quando eu ainda era adolescente, enquanto meu pai era literalmente um índio vivendo na cidade grande. Ainda assim, ele parecia feliz. A única decepção dele era, talvez, o fato de eu não ligar tanto para suas histórias. Mesmo assim, ele sempre contava — Patwin continuou. — Mas teve um dia em que ele adoeceu. Problema no coração, algo do tipo. E então ele fez um pedido para mim. Pediu para que eu conhecesse mais do meu sangue, da minha origem. E agora vim parar aqui. Dá para ver que eu deveria ter ignorado o pedido. Talvez fosse melhor ter continuado a ser um americano genérico.

As palavras e a sinceridade de Patwin surpreenderam até mesmo ao desanimado Richard, apesar dele não ter demonstrado notáveis emoções. Adaky já conhecia parte da história, mas ainda se sentiu mais calmo ao ouvir aquelas palavras. Não eram todos inimigos, afinal.

— Eu era só mais um na tribo — Adaky começou a falar. — Um dia, eu me deparei com uma bela moça vagando pela floresta. Era a Jessica. Ela tinha uma alegria única, um sorriso, um olhar. Ela era simplesmente indescritível.

Mesmo com alguns tropeços no inglês, o nativo estava sendo completamente compreensível para Richard e Patwin, que ouviam com atenção.

— Com o tempo, criei coragem de me aproximar dela. E descobri que ela também havia me visto naquele dia. Com ela, aprendi mais da língua de vocês. Mas não só isso: vivemos momentos únicos. Nós nos amávamos profundamente — o nativo parou de falar por um momento para chorar. — Mas tinha um problema: Edward Muller começou a desconfiar dela e ficou ainda mais difícil de nos encontrarmos. Até que chegou o dia em que ela não estava mais viva.

Foi impossível Patwin não se emocionar com o relato do jovem. Apesar de não ter passado por algo do tipo, o jornalista podia imaginar como era perder alguém que amava de uma maneira tão violenta. Apesar dele ter perdido os dois pais, nenhum deles foi de maneira brutal. Sempre era uma doença ou algo que preparava quem estava perto para a partida daquele ente. Mas com Jessica Muller? Adaky não teve a menor chance de se despedir, além de toda a questão da violência na morte da moça. “Ele deve pensar no quanto ela sofreu”, Patwin refletiu.

— Eu fico pensando se isso poderia ter sido diferente. E se eu tivesse aparecido mais cedo? Ou se não tivéssemos marcado de nos encontrar? Ela poderia estar viva — lamentou o pobre nativo.

Patwin colocou calorosamente a mão sobre o ombro de Adaky, em sinal de apoio. Os dois então passaram a encarar Richard, que permanecia calado. O garoto permanecia indecifrável, e aquilo assustava levemente Patwin. Ainda assim, o jornalista não acreditava que ele fosse o assassino. “Não dá para acreditar na justiça daqui”, ele pensou.

— O que te trouxe aqui, Richard Olsen? — Questionou o jornalista.

O jovem artista apresentou uma expressão de irritação com aquela pergunta, mas ao ver que Patwin não reagiu, o garoto disse:

— Eu só pintava, certo? Sou um maldito pintor e quero meus pincéis! Toda essa droga é um grande mal entendido, essa é a verdade. Eu só quero a droga de um pincel e mais nada. É pedir muito?

Patwin quase riu com os dizeres do garoto. Adaky não entendeu muito bem tudo aquilo, permanecendo em silêncio. O jornalista então disse:

— Eu não te julgo. Aprecio o fato de ter falado, de verdade. Cada doido com sua mania.

Richard quase demonstrou um sorriso, mas acabou apenas acenando com a cabeça. Com a madrugada avançando, foi difícil para o trio se manter acordado. Não demorou para que todos estivessem dormindo enquanto esperavam com medo e ansiedade o que o dia seguinte traria. Naquele momento, eles nada podiam fazer.

Enquanto isso, na floresta, havia quem não estivesse dormindo. Andando velozmente, ainda que com cautela, uma nativa observava os arredores atenciosamente. As árvores, o solo, pequenos animais e até mesmo as folhas no chão. Carregando uma lança e com os olhos escuros bem abertos, ela procurava os desaparecidos Wohali e Adaky. Os desaparecidos haviam saído da tribo há algumas horas e simplesmente não deram retorno. “O que diabos aconteceu?”, ela se questionava. Apesar da escuridão, a lua cheia daquele dia era sua amiga e seus olhos já estavam bem adaptados a falta de claridade. A índia tinha o hábito de caçar à noite, estando bem disposta apesar da hora avançada.

Apesar de um bom tempo de busca ter passado, a nativa nada havia encontrado. Olhando mais a frente, ela sabia que seria um risco avançar. Estava cada vez mais próxima da vila e ela tinha conhecimento que, apesar de alguns homens brancos fazerem trocas com membros da tribo, não era recomendável atravessar aquela faixa sozinha. Ainda assim, medo era uma característica que pouco se fazia presente nela. Mantendo a cautela, ela avançou cada vez mais fundo, cada passo se aproximando mais da vila dos brancos. Seu coração não palpitava e ela não apresentava nenhum outro indício de nervosismo. Aquilo era como uma caçada para ela, com a diferença que deveria encontrar membros da tribo.

Quando o tédio e a irritação já estavam invadindo a mente da nativa e ela já pensava em desistir da busca, uma imagem chamou sua atenção. A alguns metros, quase que totalmente oculto na escuridão, havia um corpo. Dessa vez, o medo se instalou no coração da nativa. Mas não era o tipo de medo que paralisava, mas o tipo que a deixava ainda mais esperta. Olhando para os lados, ela viu que não havia nada ou ninguém. Ela estava, de fato, só. Aproximando-se lentamente, a pouca luz ali presente finalmente começou a chegar até seus olhos. O corpo foi ganhando forma, definição. E então a nativa se encheu de fúria: Wohali estava morto. Ela correu até o cadáver e, após se ajoelhar, disse:

— Tio!

Os olhos de Wohali estavam vazios, sem qualquer sinal de vida. Seu corpo estava frio e traços de dor eram visíveis em seu rosto. O desespero tentou se apoderar da nativa, mas ela respirou fundo e segurou as lágrimas. Não poderia fraquejar naquele momento. Ainda que Wohali estivesse sem vida, havia esperança para Adaki, já que a nativa não tinha visto nenhum sinal dele.

— Quem te fez isso? — Ela questionou.

Examinando com mais calma o corpo, ela logo viu o ferimento a bala. O projétil acertou em cheio o peito de Wohali, perfurando seu coração. A nativa sabia muito bem como era um ferimento causado por flechas, lanças ou mesmo mordidas de variados animais. Ela rapidamente chegou a conclusão que não foi um nativo e muito menos um animal que matou seu tio. “Malditos brancos”, ela pensou. Enquanto encarava mais uma vez o rosto do tio, ódio começou a fluir dentro de si. Ela sabia que, cedo ou tarde, teria sua vingança.

Mas isso teria que esperar. A tribo precisava saber dos fatos. Tomando as armas do tio para si e fazendo um grande esforço para carregá-lo, a nativa caminhou lentamente em direção a tribo. Os dias de paz entre brancos e índios estavam contados.

Os primeiros raios de sol encontravam o solo da vila quando Patwin fora acordado com um balde d’água. A água estava gelada e aquilo assustou profundamente o mestiço. Ao seu lado, Adaky e Richard já estavam despertos. O nativo mantinha sua eterna expressão triste, enquanto o artista louco permanecia entediado. Mas Pat? Patwin sentia medo. Do outro lado das grades, o jornalista pôde vislumbrar o responsável por toda aquela água: um velho de cabelos brancos e barba espessa. Os olhos dele transmitiam raiva, surpresa e, ao mesmo tempo, alívio. Edward Muller, por outro lado, via um mestiço amedrontado, um índio triste e um civil de comportamento muito suspeito. Três homens, todos possivelmente autores do pior crime dos últimos anos em Roanoke.

— Então você é o mestiço de que tanto falam? O homem que chegou no mesmo dia em que minha filha foi encontrada morta. Coincidência, não? — Edward Muller encarava Patwin sem desviar o olhar.

Não era necessário que nenhuma outra palavra a mais fosse dita. Pat sabia que estava de frente com o todo-poderoso da vila. O rei de Roanoke, aquele que poderia cortar sua cabeça, mas também sua possível chave para a liberdade. Apesar do medo e da raiva por aquele tratamento, o mestiço sabia que deveria se comportar. Sua vida estava em jogo.

— Meu nome é Patwin — o jornalista se apresentou. — Eu estou aqui a trabalho. Não tenho nada a ver com a tragédia envolvendo sua filha, senhor.

O mestiço fora polido. Mas aquilo era algo que simplesmente não fazia efeito algum em Edward. Dando um sorriso típico de desprezo, o poderoso disse:

— E o que explica sua proximidade com o selvagem?

O velho apontou para Adaky. Ainda em meio ao mar de tristeza e medo, o jovem nativo manteve-se em silêncio.

— Eu estava apenas entrevistando. Por Deus, por que eu mataria sua filha? Digo, por que qualquer um de nós três faria isso? — Patwin respondeu.

— Você pode ser um mestiço, mas não conhece a selvageria como eu, Patwin — disse Edward.

O ricaço se afastou da cela e, enquanto caminhava, resmungava algo para si mesmo. Pat olhou para o lado e viu Adaky ainda resoluto, enquanto Richard fechava e abria as mãos repetidamente. Ainda que estivessem juntos, o jornalista se via só. Além disso, ele se preocupava com David. O garoto estava só e o mestiço ainda temia que desconfiassem dele. Aquilo era algo que não poderia acontecer em hipótese alguma.

— Sabe, está mais que evidente que não foram vocês três que mataram minha filha. O mestiço e o índio podem até ter feito juntos, mas Richard é um caso a parte. O que dizer daqueles quadros, seu desgraçado? Mas isso não importa agora. Vou apresentá-los um amigo meu — falou Edward. O homem logo deu passagem para que Muralha se tornasse visível aos prisioneiros. — Este aqui se chama Muralha. Ele vai apertar os botões até que finalmente saibamos quem é ou quem são os culpados. Cooperem que tudo será mais rápido.

Richard se assustou com o tamanho do homem do outro lado da cela. Adaky continuava a ansiar pelo fim daquilo tudo, enquanto Patwin pensou no quão covarde Edward era ao usar uma outra pessoa para fazer aquele serviço sujo. Recebendo do seu chefe a chave da cela, Muralha destrancou a porta e se aproximou assustadoramente dos prisioneiros.

— Por quem eu começo? — Ele questionou.

— A festa é sua, Muralha — respondeu Edward. — Só uma pequena dica para vocês três aí: a verdade é menos dolorosa, acreditem.

Muralha sorria de um canto ao outro da boca. Era um sorriso sincero. Aquele maldito estava sentindo muita satisfação em ter o trabalho de esmurrar alguns homens. Ele encarou os três e, finalmente parando o olho em Patwin, disse:

— Vamos seguir a ordem.

Sem ter tempo para qualquer reação, o jornalista foi acertado em cheio no rosto. Muralha não era só grande, mas também verdadeiramente forte. Sua mão era pesada e o punho gerou um impacto de pura dor e sangue próximo ao maxilar do mestiço. Caindo de joelhos no chão, ele cuspiu sangue e sentiu toda sua cabeça doer. Parecia que ele tinha levado um coice de um cavado na cara. Mas não, era apenas a mão do Muralha que pesava. Sem nem poder se levantar, Patwin recebeu um chute em seu peito, deixando-o sem ar. O jornalista agonizava no chão enquanto Muralha gargalhava e Edward acompanhava a cena com deleite.

Vendo aquilo, Adaky nem pensou em reagir. Ele sabia que seria o próximo e, caso se atrevesse a tentar algo, seria muito pior. Ficar quieto seria a melhor opção. Quando a Richard, ele pouco se importava. Apenas queria sair dali. Ele não via ajudar Patwin como uma decisão sábia ou mesmo certa, não que isso importasse para ele naquela situação. Finalmente recuperando o fôlego, o mestiço olhou para cima enquanto sangue escorria do seu rosto. Sua visão estava turva e tudo que ele via era uma grande mancha sombria.

— Nenhuma palavra, mestiço? — Muralha questionou.

Patwin queria ter algo para falar. O jornalista queria simplesmente dizer que viu o assassino ou que sabia quem era. Mas o coitado não sabia nada do caso. Estava apenas no lugar errado na hora errada. Mas definitivamente ele queria uma forma de aliviar as dores durante aquela terrível tortura. O pobre mestiço passou a vida na cidade e não estava acostumado com a dor. Ainda assim, sua resposta foi o silêncio. Encarando seu algoz, os olhos de Patwin pediam clemência, mas Muralha simplesmente riu. Sendo acertado por mais um forte soco, o enfraquecido homem desmaiou.

Agora vendo que seria a próxima vítima, Adaky começou a tremer. Um grande medo apoderou-se do nativo, deixando evidente toda sua fraqueza. “Vai ser como esmagar uma barata”, pensou Muralha.

— Algo a dizer, garoto? Você ainda tem chance — disse o gigante.

Adaky sabia que sua relação com Jessica Muller era proibida. Dessa maneira, ele preferiu esconder esse fato. Se a situação já estava ruim, ela poderia ficar muito pior.

— Eu não sei de nada. Apenas conversava com Patwin e Wohali — Adaky falou.

Muralha deu uma olhada para Edward, que balançou afirmativamente a cabeça. Voltando seus olhos para o indiozinho a sua frente, o grande homem acertou um forte soco em seu estômago, fazendo-o se dobrar para frente. Nisso, Muralha acertou uma joelhada em seu rosto. Caindo para trás, Adaky estava com a face coberta de sangue. Seu nariz, possivelmente, havia sido quebrado. A dor era intensa e ele mal tinha coragem de levantar.

— É só dizer uma palavra, garoto — Muralha disse enquanto levantava a força o índio.

Seguindo os comandos como um escravo, Adaky permaceu de pé apenas para cair mais uma vez ao levar um soco. A mão de Muralha já estava vermelha, mas ele parecia não sentir dor alguma. O nativo, por outro lado, respirava com dificuldade. Edward pediu para que o torturador prosseguisse para o próximo prisioneiro, tendo em vista que o índio aparentava ser escasso de qualquer informação.

Richard agora era encarado de frente. Seus olhos temiam o gigante ameaçador e sua boca queria soltar qualquer palavra que o livrasse daquela terrível punição.

— Algo a dizer, estranho? — Muralha zombou do garoto.

Apesar do medo, o artista queria rir pelo fato do quão deprimente aquela situação era. “Tudo isso por uns malditos quadros”, ele pensou. E então o garoto encarou o grande punho do seu algoz. A qualquer momento aquela verdadeira arma estaria se chocando contra seu rosto, gerando dor e sangue de uma maneira que ele não nutria admiração alguma.

— Eu sou só um pintor — Richard começou. — Mas não sou como os outros.

Aquela frase freou a mão de Muralha. Edward, do outro lado, disse:

— Arnold já nos contou a verdade. Seus desprezíveis quadros, sem qualquer respeito ou decência. Você é um doente!

Após respirar fundo, Richard Olsen falou:

— Posso ser um doente por amar representar a morte, mas eu definitivamente não sou um assassino.

Adaky olhou para o companheiro de cela com estranheza, enquanto Patwin permanecia desmaiado. Edward se enfureceu com aqueles dizeres, entrando na cela e, estando na frente de Richard, dizendo:

— Você não passa de um abutre.

Ao dizer isso, o próprio velho desferiu um soco no rosto do rapaz. Apesar da idade, Edward definitivamente sabia como bater. Com uma dor intensa no maxilar, Richard acabou cuspindo um dente após o golpe.

— Só isso? — Muralha questiona o seu chefe.

— O dia está apenas começando — disse Edward enquanto se retirava da cela junto de Muralha enquanto ela era trancada. — Eles ficarão aqui por um bom tempo. Isto é apenas o começo.

Com aquelas palavras, o poderoso homem se retirou com o gigante. Logo em seguida, Arnold adentrou a delegacia e riu da situação dos presos. Do lado de fora, Edward imaginava se estava fazendo a coisa certa. Ainda assim, uma voz em sua cabeça dizia que ele estava vingando a morte da sua filha. Sim, Jessica precisava ser vingada. E seu pai não deixaria que questionamentos bobos da sua consciência impedissem isso.


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Notas finais do capítulo

Parece que a vida nunca dá uma trégua para o Patwin, hein?
Nos vemos semana que vem ;)



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