Caso 47 - Segredos de um Crime Vol. 1 escrita por Caroline Rodrigues


Capítulo 4
Capítulo 3




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O Rocoo’s continuava do mesmo jeito que eu me lembrava. Mesas de tampo de vidro e bancos com estofado vermelho vivo. Eles ainda serviam Milk Shake de qualquer coisa que você pedisse e o cheiro de hambúrguer ainda era,  definitivamente,  magnífico. Assim que entramos meu pai pediu um hambúrguer com molho de queijo e um Milk Shake de morango para mim. Eram meus favoritos quando parti daqui, e confesso que sentia falta do sabor “de casa”.

 

— Achei mesmo que ia gostar de voltar aqui - meu pai comentou quando não consegui esconder o sorriso ao olhar para o local.

 

— É, eu não esperava que continuasse do mesmo jeito - respondi sustentando o sorriso.

 

Meu pai não disse nada, apenas me encarou procurando por algo que eu não sabia o que era.

 

— Porque não me avisou que viria ? - perguntou por fim após alguns minutos de silêncio.

 

— Pai… -comecei mas parei respirando fundo - Eu fiquei sabendo que viria ontem, não tive tempo de pensar direito.

 

— Não teve tempo de dar um telefonema de cinco minutos? - pude sentir a repreensão em seu tom.

 

— Eu pensei em avisar do quando chegasse aqui - menti engolindo em seco.

 

— Não, você não avisaria. Eu conheço você até quando mente - novamente engulo em seco sentindo minha garganta ressecar - Já fazem sete anos Nina,  quase oito. Sete anos que não vejo você se não por fotografias. Você mal liga ou manda noticias, e sinceramente eu já cheguei a duvidar que você estava viva - ele arrumou os óculos de grau no rosto - Eu quase fui até você, mas lembrei que não sabia nem sequer onde você morava.

 

Pisquei várias vezes seguidas afastando as lágrimas que se formaram em meus olhos, por pouco consegui afasta - las . Ouvir aquelas palavras vindas dele me feriam profundamente. Eu reconheço meu erro, mas não posso dizer que mudaria alguma das decisões que tomei.

 

— Eu sei que errei. E errei muito, mas… - olhei para os lados - Eu não pude evitar, eu precisava desse tempo.

 

A garçonete se aproximou deixando nossos pedidos em cima da mesa. Embora estivesse com vontade de comer meu estômago estava embrulhado pelo teor de nossa conversa.

 

— Sei que precisava disso querida - meu suspirou olhando sua salada em cima da mesa - Mas não precisa sumir sem dar notícias, se não fosse Paul eu….

 

— Paul ? - o interrompi apertando os olhos - O que Paul tem a ver com isso ?

 

Meu pai engoliu em seco como se tivesse sido pego. Sei disso porque tínhamos as mesmas reações ao confessar algo.

 

—  Bem… - ele começou limpando a garganta - Somos velhos amigos, da faculdade.

 

Se meu maxilar fosse solto, provavelmente ele teria ido ao chão. É certo que eu sabia que Paul tinha conhecimento sobre quem era meu pai, mais isso pelas vezes que o velho apareceu em revistas sobre medicina. Era comum ele ser capa de alguma revista do tipo como médico do ano. Mas eles serem amigos? Isso eu nem sequer poderia imaginar.

 

— E quando pretendiam me contar? - perguntei com o olhar fulminante em cima dele.

 

— No mesmo momento que você resolvesse entrar em contado comigo por mais de cinco minutos - devolveu levantando uma das sobrancelhas por baixo dos óculos de grau.

 

Touché— falei me recostando na cadeira e reconhecendo meu próprio erro - Mas então, foi ele quem contou que eu estava aqui ?

 

Aos poucos a lanchonete ia se enchendo de pessoas vindas do trabalho, escola ou faculdade. Era normal que ao saírem se encontrassem aqui, já que ficava próximo ao centro comercial e as escolas. O final de tarde se aproximava, e me surpreendi ao constatar que passei boa parte do dia analisando alguns relatórios em um quarto de hotel e outra metade em uma sala fria de um legista sem  nem mesmo me alimentar direito. Olhei rapidamente para meu prato pensando se deveria ou não comer.

 

— Sim - a resposta vinda de meu pai me trouxe de volta para o momento - Me contou antes de você viajar creio eu, mas esperei que você me liga-se para avisar. Como não aconteceu…- deu de ombros.

 

Bufei frustrada. Não posso ficar irritada com nenhum dos dois, já que a escolha de se esconder foi minha. Mas Paul deveria ter me contado, não deveria?  Antes que eu pudesse responder, meu celular vibrou no bolso do casaco. Retirei já sabendo quem era.

 

 

Stephen : Terminei com o legista, você não estava aqui e o policial intrometido disse que você saiu com o homem que te chamou. Voltei para o hotel e você não estava, devo me preocupar?

 

 

Balancei a cabeça em negação. Stephen não gostava muito de demonstrar sua preocupação, mas falhava miseravelmente todas as vezes em que tentava a esconder. Respondi rapidamente antes que ele coloca-se até a SWAT atrás de mim.

 

 

Nina: Não deveria se preocupar, deveria cuidar da sua vida. Mas já que perguntou,  estou com meu pai. Nada alarmante. Falamos mais tarde.

 

 

Pode parecer que estou sendo grossa, mas era assim que nos tratávamos. Tornava as coisas mais simples não esperar um tratamento cordial de ambas as partes. Guardei o celular novamente e voltei e encarar meu pai pegando meu hambúrguer e dando uma generosa mordida. Estava bom.

 

— Desculpe, era Stephen - expliquei depois de engolir - Ele..- ponderei a escolha das palavras - Não sabia onde eu estava.

 

Stefan?  - perguntou pronunciando errado. Segurei o riso - Seu parceiro?

 

Stephen— corrigi pausadamente - E sim, é meu parceiro. - respondi e vi ele apertar os olhos -Do FBI - completei depois de perceber como as palavras soaram juntas.

 

— Certo, Stephen— testou a palavra e depois sua cara suavizou - Vocês se dão bem ?

 

—  Na medida do possível. -dei de ombros sendo evasiva, não é como se eu fosse admitir que ele era um dos poucos, se não único, amigo.

 

— Entendo.

 

O silêncio que se instalou se tornava gradativamente desconfortável. Não era nada interessante estar presa em um silêncio constrangedor com seu pai em uma lanchonete onde as pessoas conversavam animadamente. Dei mais algumas mordidas em meu hambúrguer e tomei alguns goles da bebida gelada enquanto meu pai mal tocou em sua salada.

 

—  Acho que preciso ir - falei por fim limpando as mãos com um guardanapo - Ainda tenho alguns relatório para analisar até amanhã.

 

— Oh. .. - exclamou parecendo frustrado - Eu entendo, quer que eu te leve até onde está hospedada?

 

— Não é necessário - recusei dando um sorriso amarelo - O hotel fica a poucas quadras daqui, e acho que gostaria de ir andando pelo parque.

 

Olhei pela janela percebendo as luzes que iluminavam a cidade preenchendo as ruas escuras.

 

—  Tudo bem - ouvi ele concordar - Mas não pense que vou esquecer. Me procure Nina, falo sério.

 

— Eu sei pai -sorri me levantando junto com ele - Assim que tiver uma folga, volto a falar com o senhor.

 

Nos despedimos com uma abraço meio desajeitado de ambas as partes e eu parti para o lado oposto ao que ele seguiria. Passavam das 19hrs e as ruas já começavam a esvaziar.  Chestnut não era um bairro conhecido por suas atividades noturnas e com o outono chegando, as chuvas afastavam qualquer um que pudesse ter a idéia de uma saída em plena quinta - feira.

 

Ainda sim, caminhei pelo parque vazio com certa despreocupação. Algumas pessoas, casais em sua maioria, passavam por mim sorrindo enquanto dividiam um guarda chuva, enquanto eu, me deleitava com a sensação dos respingos de água gelada em meu rosto. Sempre gostei de banhos de chuva, desde pequena.

 

Percebi uma movimentação mais intensa a alguns metros a frente. Liguei meu modo alerta quando vi uma pessoa passar  correndo por mim. Tentei chamar sua atenção mas um grito bastou para me virar para o outro lado e sacar minha Glock do coldre e correr em direção ao grito. Parecia ser uma mulher. Meus pés pisavam em poças de água e lama sujando minhas botas de chuva.

 

— Chamem a polícia!  -ouvi a mesma voz do grito soando chorosa.

 

—  Ela pode estar viva ainda - uma outra voz masculina gritou para alguém - Já chamei a polícia e o resgate, estão a caminho mas acho que…

 

— Ei! - chamei a atenção abaixando a pistola. Era um grupo de três pessoas. Dois homens e uma mulher. A mulher parecia aflita e os rapazes assustados. Os três estavam parados próximo a uma  protuberância no chão frio -  FBI  - mostrei o distinto me aproximando ainda com a pistola próxima a cintura - O que aconteceu aqui ?

 

— Graças a Deus ! - a mulher exclamou se segurando no homem próximo a ela. Ela parecia suar e usava uma roupa de ginástica. Ninguém me respondeu.

 

— Então, vão me responder ou terei que usar algemas nos três? - perguntei já impaciente.

 

— Olha… nós só estávamos correndo quando. .. - o rapaz que usava uma blusa azul sem mangas e uma bermuda agarrada demais para meu gosto,  começou - Nós não temos nada a ver com isso, mas olhe só. ..

 

— Diga de uma vez - mantinha certa distância embora eles não me aspirassem nenhum tipo de ameaça.

 

— Acho melhor você mesma olhar - o outro homem falou pela primeira vez apontando para a protuberância no chão.

 

Me aproximei rapidamente, o lugar era iluminado pelas luzes fortes do parque e era nitido o que estava ali . Um corpo. De uma mulher.

 

Seus olhos estavam fechados, havia cicatrizes neles que os deixavam com dois grandes círculos negros em sua volta. Sangue, agora seco, havia escorrido deles em fileiras grossas por sua face até seu queixo. O corpo estava escondido em um saco plástico preto, mas a cabeça estava para fora. De longe podia ouvir algumas sirenes se aproximarem, a delegacia era próxima então era de se esperar que em minutos eles já estivesse aqui.

 

— O homem que deixou isso aí,  correu assim que nos viu - a mulher disse chorosa atraindo minha atenção. - Juro que não temos nada a ver com isso.

 

— Acredito em vocês - disse olhando para os lados - Para que lado ele correu?

 

Não teria chances de acha-lo agora, mas não custava tentar pelo menos saber em que direção ele foi .

 

— Ele correu para a mesma direção que você veio - o cara de cabeça raspada falou dando de ombros.

 

Ótimo! Bufei me crucificando. O provável assassino passou por mim e eu não fiz nada ! Se eu tivesse o feito parar, talvez ele estaria preso agora.

 

— Stewart? - ouvi a voz do velho comedor de rosquinhas próxima a mim. - O que faz aqui antes de nós?

 

— Estava indo para o hotel - respondi me virando - Parece que fiz uma boa escolha vindo por esse caminho - apontei para o corpo jogado no chão.

 

— Conseguiu ver alguma coisa ? - perguntou enquanto via um médico do resgate se aproximar do corpo ouvindo o que o rapaz de camiseta azul falava.

 

— Além do assassino passar por mim ? - perguntei sarcástica - Não, não vi nada.

 

— Como assim o nosso cara passou por você e você não fez nada Stewart?  - a voz autoritária que eu era obrigada - de bom grado admito- a ouvir todos os dias chegou aos meus ouvidos antes mesmo de seu dono estar próximo a mim.

 

— Não comece Winston! - ralhei quando ele estava próximo o suficiente para que eu não precisasse gritar - Eu não sabia que ele era,  e nem temos certeza ainda. E quando eu pensei em para-lo, a moçinha de filmes de terror aí começou a gritar - revirei os olhos apontando para a moça de roupa de ginástica que olhava descaradamente para meu parceiro.

 

— Dr. Robbins já está a caminho - Wilde ignorou nossa troca de farpas - Mas só de por olhos já percebo que ela está exatamente como a outras vítimas do nosso cara.

 

Em poucos minutos um Mazda 96 estacionou atrás de uma das viaturas da polícia. Dr. Robbins pulou para fora do carro e mesmo a alguns metros era possível ver a carranca por trás dos óculos de grau. Ele passou por nós como um furacão sem se dar ao trabalho de se anunciar.

 

— Boa noite para o senhor também - Stephen forçou o sorriso para o legista que o olhou mortalmente. Alguém estava de mau humor.

 

— Acredite meu jovem,ser tirado do conforto se sua casa em meio a chuva depois de um dia de trabalho não é nada que eu possa chamar de boa noite. - respondeu enquanto colocava as luvas - Mas vamos acabar logo com isso, sim?

 

Apenas concordamos com a cabeça enquanto ele se baixava junto ao seu assistente, que não deveria ter mais de 25 anos.

 

Stephen me entregou um par de luvas e uma maleta com um kit forense. Ele já usava as luvas e tinha sua maleta em mãos. Me perguntei onde ele poderia ter escondido aquilo, mas preferi me calar.

 

O jovem retirou o saco plástico com um cuidado excessivo, deixando o corpo da jovem exposto. A vítima tinha os cabelos loiros e lisos que agora estavam grudados em sua cabeça. A pele pálida tinha manchas roxas não só no rosto, como pelos braços desnudos. Ela usava uma camisola que muito lembrava as de hospitais, com algumas manchas de sangue em toda sua extensão. Mas o que mais chamava atenção era a região dos olhos. Estavam envoltos por grandes círculos roxos, quase negros e inchados. Era possível ver as fileiras grossas de sangue seco que agora eu percebia irem além de seu rosto e pescoço. Era uma visão e tanto, do tipo que da pesadelos.

 

Dr. Robbins se aproximou dos olhos e abriu um deles mostrando algo mais perturbador ainda.  O globo ocular da vítima havia sido retirado completamente. Havia uma perfuração ali além do vácuo que pertencia aos olhos.

 

— Ele retirou o globo ocular - Dr. Robbins constatou o que já sabíamos. - Só um minuto - ele abriu sua maleta retirando de lá uma espécie de tubo de metal. Com cuidado, e ajuda do rapaz ao seu lado, colocou o tubo pela perfuração - Bem, tem cerca de 15cm de profundidade pelo teste rápido -falou retirando o tubo aos poucos e o limpando com um pano - Vou analisar melhor no laboratório, aparentemente posso afirmar que foi a mesma pessoa, mas nada muito além disso. - se posicionou mais para o lado - Podem fazer o trabalho de vocês agora, me avisem quando eu puder retirar o corpo.

 

Assenti rapidamente e fui mais para perto do corpo estendido. Stephen também se aproximou, mas foi diretamente para os pés da garota os observando. Me foquei no rosto. Procurava por qualquer vestígio ou indício do que nos leva - se ao assassino. A camisola. Era um modelo especificou, de hospitais, não eram achadas em qualquer lugar. Me abaixei e movi o corpo dela para frente, mesmo com os ossos e carnes rígidas, era extremamente leve. Puxei a gola da peça procurando pela etiqueta, achei a mesma. Estava gasta , mas podia ver que ali existiram algumas palavras. Com a ajuda de uma pinça e uma tesoura do kit retirei a etiqueta. Peguei a pequena lanterna e a aproximei da luz. Pude perceber ser o nome de alguma instituição, mas não saberia dizer qual. Coloquei a etiqueta em um saco plástico de provas e fiz uma vistoria completa no resto do corpo enquanto peritos faziam buscas nos arredores. Olhei para meu parceiro, Stephen estava concentrado nos pés da garota. Péssima hora para dar uma de necrofilo de pés.

 

— Achou alguma coisa ?-  perguntei me levantando e caminhando até estar próxima a ele.

 

— Acho que sim - falou guardando a pinça novamente e se erguendo com um saco nas mãos - Olhe isso.

 

Peguei o saco plástico e olhei o conteúdo. Era uma espécie de planta, alguma folha em formato geométrico. Lembrava um prisma mais alongado. Era fino e de uma cor de azul metalizado. Na fazia idéia de qual flor ou planta era aquilo.

 

— Sabe o que é?  - perguntei dando uma última olhada naquela folha de formato estranho antes de entregar a ele.

 

— Não faço a menor idéia, mas já é alguma coisa - ergueu as sobrancelhas levemente e apontou para meu saco plástico - E você, o que é isso ?

 

— Uma etiqueta - balancei o saquinho nas mãos - Ela está usando uma camisola de hospital, e quantos lugares você conhece que vendem camisolas hospitalares?

 

— Do meu conhecimento, nenhum, além dos próprios  hospitais - deu de ombros .

 


— Exatamente - pontuei estalando a língua - Talvez nos de alguma luz.

 

Olhei novamente para o cadáver da moça jogada ali e balancei a cabeça.Nós viemos para cá com o intuito de impedir mais um corpo, e é exatamente o que temos agora.

 

— É melhor parar - Stephen me repreende enquanto retirava as luvas, quase como se soubesse o que eu estava pensando.

 

— Temos mais um corpo, Stephen. Sabe o que isso significa? - perguntei desviando os olhos rapidamente.

 

— Que nós chegamos hoje - constatou o óbvio - Não pode esperar que recolvamos isso em algumas horas. É impossível e você sabe disso Stewart.

 

— Ok. - concordei meio contrariada - E o que vamos fazer ? Além de investigar ?

 

— No momento, vamos ligar pra D.C e pedir que Sullivan mande o resto da nossa equipe. Com toda certeza vamos precisar deles agora.


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