Time Web escrita por Mabée


Capítulo 15
Capítulo 15 - Confissões




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Peony nunca foi de acreditar em tudo que seus olhos viam. Logo cedo, a garota aprendeu que o mundo não era o conto de fadas que lembrava vagamente da voz dócil e amanteigada de sua mãe em noites mal dormidas por medo do monstro que supostamente residia abaixo de sua cama, e sim, um lugar péssimo para a vida humana; na realidade, horrível, e cheio de mentiras cobertas em várias camadas de ouro, coisas que a jovem nunca entenderia, certo?

Mas quando seus olhos sonolentos começaram a se abrir lentamente e encontraram uma figura azul e vermelha sentada em sua poltrona de leitura — em uma posição nada confortável — ela soube que sua mente só podia estar de brincadeira.

Levantando de imediato, a garota colocou-se apoiada sobre os cotovelos que afundaram em seu travesseiro macio e tudo ao seu redor pareceu girar por uns firmes segundos enquanto respirações fundas escapavam de seus pulmões pesados, sabendo que havia caído sua pressão. O suposto herói em sua frente levantou-se e moveu as mãos em vinte posições diferentes, não sabendo lidar com o que estava ocorrendo.

               — Ei, calma! — Chamou ele, aproximando-se perigosamente da jovem que recuou cada passo dado pelo mascarado. — Você não está em ótimo estado para ficar sentada. Se deite que será melhor, eu prometo.

               — Você não manda em mim — a garota cuspiu as palavras com uma pitada de veneno, mas obedeceu, deitando-se, ainda atordoada. — Aliás, como você entrou aqui? Vigilante da cidade, ok, mas isso já é um tanto stalker da sua parte.

               — O quê?! — O herói deixou o falsete fluir com a voz, cruzando os braços, claramente ofendido. — Eu não sou um stalker! Eu te salvei, esqueceu?

               — Salvou de quê? Eu sei me cuidar, muito obrigada — a jovem enfiou-se debaixo das cobertas novamente, mas sem tirar os olhos de esmeralda do mascarado.

               — Então veremos na próxima vez que você cair de um trem em chamas — o garoto disparou, seu tom irritado. — Aí você se cuida.

No entanto, as palavras soavam estranhas para a jovem, quase sem sentido. Seus olhos mal acreditavam no que ela via, muito menos no que ela não via.

               — Trem? Em chamas? — A garota virou-se na cama, intrigada, mas logo sentiu uma pontada de dor na região lombar. — Ai!

               — Você não lembra? — Questionou ele e o olhar branco da jovem permaneceu. — Uau, bom, eu vou te ajudar então, porque tenho certeza de que você gostaria de saber.

Ajustando-se na cama, a jovem lançou um de seus fuzis cobertos por írises e respirou fundo, aguardando respostas.

               — Eu cheguei um pouco depois, mas você estava dentro do trem quando ele partiu ao meio, e salvou todos que estavam lá dentro, quase dando sua própria vida por um senhor que ficou preso — disse ele, chocando a jovem. — Mas como você deu toda sua força para ele, acabou caindo do trem e, humildade à parte, se não fosse por mim, você teria caído no fogo verde e agora estaria sabe-se-lá-onde.

Peony passou a mão entre os fios castanhos e respirou fundo, olhando para o teto sem-graça por alguns segundos, processando tudo que havia sido dito.

               — Eu não… eu não lembro de nada disso — sua voz soou em um murmúrio que foi captado pelos ouvidos potentes do garoto.

               — Do que você lembra?

               — Hm… eu lembro de ter acordado, ido para a escola, trabalhado no jornal… falado com Peter e Gwen… o que mais… ah sim! Da cara da Zara Copeland quando eu acabei com ela. Mais nada, branco, completamente branco — comentou a jovem, transitando o olhar do teto para o garoto. — E você sabia onde eu moro? Há quanto tempo está aqui?

               — Você me deu seu endereço e disse algo sobre aspargos — comentou ele. É, soa como eu, pensou a jovem. — Eu fiquei porque você implorou para que eu não te levasse ao hospital, mas tem um roxo na lateral do seu rosto e sangue caindo do seu cabelo, então eu resolvi ficar de olho.

               — Eu odeio hospitais — sussurrou a morena para si mesma.

               — Por que?

               — Más memórias. Coisas que eu não compartilho com pessoas que me salvam e invadem minha casa — Peony revirou os olhos e levantou-se, injuriada e com cansaço refletindo nos olhos.

               — Ei, ei, ei, onde pensa que vai? — O herói levantou em conjunto.

               — Vou fazer um curativo — afirmou ela, não agradando muito o outro.

               — Você não…

               — Perdão, sr. Correto, caso você não saiba, estamos na minha casa, sob meu teto e minhas regras, então você pode se sentar e fazer sabe-se-lá-o-que-é-que-você-faz e eu lido com meus problemas, ok?

Que inferno.

               — Eu estou tentando te… quer saber? Eu não ligo — o Homem-Aranha jogou as mãos para o alto e virou-se para a janela, ignorando a jovem que caminhava para sua penteadeira e abria uma das gavetas, retirando um de seus kit-médicos que ela deixava espalhados pela casa. Só em seu quarto tinha seis escondidos. — Tem alguém por aqui para te ajudar?

               — Meu pai está trabalhando — comentou a garota enquanto tocava ao redor da ferida na testa para ver se saía sangue para que medisse corretamente a quantidade de álcool e gaze para serem utilizados. — Relaxa, eu sei me virar. Desde pequena.

Com isso, a garota olhou por cima do ombro, encontrando o herói parado, também com um curto olhar em sua direção. Lançando um curto sorriso, a jovem começou a aplicar o álcool e franziu o nariz, contorcendo toda a região pela dor ardente. Pelo espelho, ela conseguia enxergar o outro atrás de si, sua linguagem corporal insegura para qualquer outra postura.

               — É sério! — Ela exclamou, revirando os olhos. — Por que você não acredita em mim?

               — Não é questão de acreditar ou não — o herói fez uma curta pausa para deixar um suspiro escapar, abafado pela máscara. — Você não devia ter que fazer isso tudo sozinha.

Peony virou-se naquele momento, toda a raiva que ela sentia por culpa da situação evaporando-se em fina fumaça, sumindo desamparada no ar enquanto ela permanecia ali, aquecida pela leveza de seus ombros. O herói deu de ombros e caminhou até a janela, colocando uma das pernas para fora, pousando no telhado, mas antes que ele pudesse sair, a jovem protestou:

               — Espere! — Exclamou, atraindo a atenção dele no mesmo instante. Sua garganta queria fechar-se para que nada escapulisse dali, suas cordas vocais tão focadas na adrenalina do momento para notarem que ela precisava dizer algo. — Obrigada.

O Homem-Aranha apenas assentiu e fez uma curta reverência antes de deixar o quarto por completo, deixando, também, uma nova ideia implantada na cabeça da jovem.

[…]

Sua testa ainda doía e causou um grande efeito em seu pai quando ele chegou em casa ao nascer do sol. Os olhos claros de Dustin Seagha se arregalaram e houve uma curta argumentação sobre um repouso, mas não era negociável perder mais de um dia de escola para a garota.

Gwen foi visitá-la no dia anterior, levando margaridas e uma caixa de cookies caseiros para a preparação de uma tarde que seria entediante por culpa do repouso exigido pelo pai, mas as duas administraram bem o dia para que fosse mais interessante que dormir a cada quinze minutos. Após uma maratona de comédias românticas escolhidas pela loira e barrigas cheias de cookies, as duas estavam prontas para finalizar o dia. Peter também havia mandado mensagens, mas a jovem não quis entrar em detalhes sobre o que havia ocorrido.

E, mais uma vez, para não quebrar o hábito, a jovem encontrava-se atrás de sua escrivaninha, riscando artigos impressos que eram inválidos para seus parâmetros de aceitação. A tela do notebook brilhava no fundo de sua vista enquanto os dedos esguios selecionavam em vermelho o que iria para a edição e o que iria para o lixo.

Duas batidas na porta e alguns cachos castanhos foram o suficiente para que ela levantasse seu olhar do trabalho e abrisse um sorriso, observando o garoto que reciprocava suas ações com lábios brincalhões e um pequeno vaso com uma bela orquídea violeta em mãos.

               — Muito ocupada? — Questionou ele, adentrando o local enquanto a jovem afastava os artigos intocados e descansava o queixo sobre uma das palmas, inclinando um tanto sua cabeça.

               — Depende do que você quer comigo — a jovem lançou um curto sorriso irônico e analisou a orquídea com calma e coração quente. — É para mim?

Peter assentiu e aproximou-se da escrivaninha, entregando o pequeno vaso nas mãos da jovem, que o pegou como se fosse um recém-nascido, tomando todo o cuidado do mundo. Com um sorriso bobo espalhado em sua boca, a jovem levantou o olhar para encontrar dois olhos de avelã em sua direção, mordendo o lábio inferior e sabendo que suas bochechas se encontravam vermelhas — mas isso não a incomodou tanto quanto deveria.

               — Orquídeas lilases são o poder para a sedução de seu interesse amoroso — ela comentou mais para si mesma, querendo que o garoto ouvisse ao mesmo tempo.

Com isso, o jovem tornou-se inquieto, movendo os braços para todos os lados e gaguejando palavras balbuciadas que mal saíam de sua boca antes de se esvaírem com o ar.

               — E-Eu, a orquídea… foi May quem escolheu e eu não… hm, eu não sei sobre flores — colocando-se em modo de defesa, o jovem parecia um pimentão, atiçando risos no fundo da garganta de Peony.

               — Eu estou brincando, Parker — a jovem sorriu. Será? — Obrigada.

               — Você está melhor? — Questionou ele. — Eu ouvi que… que foi uma batida feia.

               — Sim, mas a concussão foi leve — respondeu ela, sorrindo e levantando a franja para mostrar o pequeno curativo que fez naquela mesma manhã. — Talvez nem deixe cicatriz.

               — Mesmo assim, foi legal o que você fez — ele sentou-se em uma das cadeiras que ficavam de frente para a escrivaninha, observando enquanto a jovem levantava-se para colocar a orquídea onde batia o sol da janela.

               — Como você soube o que eu fiz?

               — O homem que você salvou deu um depoimento, e tem imagens suas pendurada nos trilhos. Eu reconheci por causa da bolsa — ele apontou para a bolsa que estava já na estante e a garota sorriu, voltando para seu assento.

               — Eu fiz o que eu tinha de fazer — a garota revirou os olhos. — E eu estava cuidando de tudo até a chegada daquele… idiota.

               — Ele te salvou, não? — Peter pareceu um tanto ofendido, mas a jovem sabia que era porque ele era um grande fã do herói.

               — Deixe ele pensar que sim. Eu estava bem sozinha, não precisava de ajuda… muito menos dele no meu quarto — respirando fundo, Peony abriu o bloco de notas e encontrou alguns rascunhos de rosas que ainda não foram pintadas, então virou a página para anotar anúncios especiais que seriam entregues para Betty mais tarde. — Acredita que ele teve a coragem de invadir minha casa?

               — Ele fez isso porque você estava inconsciente — disparou Peter em um tom um tanto mais alto que seu normal. Peony franziu o cenho ao encará-lo. — Eu imagino.

               — Sim, eu estava, mas mesmo assim… — ela lembrou-se da conversa com o vigilante e dos cuidados que ele apontava ter, trazendo um breve sorriso para seus lábios. — É, talvez ele tenha feito por bem. Sei lá.

               — Vou te deixar em paz — comentou ele. Não, fique. — Até o almoço!

Peony sorriu enquanto assistia o garoto deixando o escritório, terminando as anotações finais e levantando-se para entregá-las para Betty antes dos anúncios. Com suas botas de tornozelo mantendo um barulho seguido de saltos que ecoava no editorial quase vazio, a jovem trombou com Gwen, que parecia miserável com um copo de café em mãos e fortes olheiras abaixo dos olhos.

               — Ei — chamou Peony, notando que até a postura da loira estava estranha. O cabelo perfeitamente penteado agora estava apontando para todos os lados. — Noite ruim?

               — Troque noite por semana, e voilà, sua resposta — Gwen tomou um longo gole do copo de plástico e esfregou os olhos maquiados sem muito esforço. — Como você está?

               — Eu estou bem, você quem parece mal.

               — Logo passa, hoje é sexta-feira e eu tenho o resto da tarde para ter uma longa conversa com meu travesseiro — comentou ela, abrindo um curto sorriso e apontando para os papéis nas mãos da outra. — São para Betty?

Peony assentiu e entregou-os para a jovem, cruzando os braços acima do sobretudo bege, respirando fundo enquanto segurava sua língua, sem muito sucesso.

               — Peter me deu uma orquídea — a morena mordeu o lábio inferior, fazendo a amiga congelar no lugar. — Ele simplesmente trouxe hoje no meu escritório e foi engraçado, porque ele sempre fica vermelho com coisas assim e eu brinquei sobre o significado da orquídea que é…

               — Eu tenho que te contar uma coisa — comentou Gwen, cortando o assunto.

Um tanto surpresa com a interrupção que não era característica da amiga, Peony franziu o cenho e assentiu.

               — Diga — fez um sinal com as mãos para que a loira prosseguisse.

               — Gwen? Eu preciso dos anúncios! — Gritou Betty de dentro da cabine, alarmando a garota que parecia presa entre duas situações.

Seus olhos azuis pousaram em Peony por alguns segundos e a morena sorriu, dando de ombros.

               — A gente se fala no almoço — sugeriu e a loira assentiu, correndo com os papéis na mão e sumindo totalmente.

[…]

Enquanto Peony sentava na aula de cálculo e rodava a caneta na superfície de sua carteira, seus olhos estavam focados em uma figura que digitava em seu celular no canto da sala, ignorando completamente a aula — e ele podia, porque o dinheiro comprava tudo hoje em dia.

Ela fazia esforços, olhava para os orbes verdes-azulados e para o cabelo loiro escuro na esperança de ter a faísca de volta em seu peito e aquela sensação engraçada de movimento na barriga — como chamavam? Ah sim, as borboletas! — e nada fazia efeito. Assim que tocou o sinal para o almoço, Peony decidiu que era o momento de testar a si mesma, então ignorou todas as vozinhas em sua mente e caminhou até o herdeiro Osborn, segurando suas coisas perto do peito como proteção.

               — Ei — disse ele ao notar a presença dela perto de si.

               — Oi — a garota sorriu simpática, tentando fazer conversa fiada. — Como você está?

               — Bem, bem — ele sorriu de volta, guardando o celular no bolso. — Eu não te vejo desde a festa. Deu tudo certo, no fim?

               — Sim, eu só decidi que álcool e eu não nos misturamos mais — comentou a garota, ganhando uma risada vinda dele enquanto os dois caminhavam para fora da sala. Olhe nos meus olhos, por favor. — Peter me ajudou.

               — Ele faz isso — afirmou Harry, olhando de relance para a morena e voltando os olhos para o chão. — Cuidar das pessoas que ele se importa…

               — Ele cuidou de mim porque se sentiu obrigado — a jovem afirmou, um tanto decepcionada com sua realidade.

               — Eu conheço o Peter desde os cinco anos — comentou Harry, agora olhando para a jovem. — Eu sei quando ele se importa com alguém.

Após uma longa pausa, Peony sentiu a faísca, mas não pela presença do Osborn ou qualquer elemento ao redor deles, mas pela menção de um cenário que ela havia criado nas profundidades de sua consciência e nunca deixou que subisse à superfície, bloqueando com tijolos maciços.

               — Mas pensando bem, Peter se importa até com as formigas que ele pisa na rua — completou o garoto e abriu um curto sorriso. — Preciso ir, a gente se vê outra hora!

Pode ser…?

Não.

Mas será que…?

Não, não. Impossível.

Talvez…

Não.

               — Claro — a jovem sorriu de volta, observando a saída do loiro e respirando fundo.

Sumiu, tudo, basicamente. O sentimento que estava ali antes, por que não estava mais? O que mudou, afinal? A chegada de Peter em sua vida não foi tão impactante… mas… se bem que muitas coisas estavam se moldando diferente.

Ela dizia "obrigada" mais do que jamais admitiria e estava ajudando pessoas ao seu redor. Em que universo paralelo ela faria isso? Não era de sua personalidade… ou era? E mais dúvidas surgiam em sua cabeça enquanto a garota caminhava até as portas do refeitório já reformado, procurando a cabeleira loira de Gwen perante à multidão esfomeada que formava uma fila como formigas civilizadas — exceto a parte da civilização.

Encontrando Gwen em uma das mesas, a jovem caminhou até lá e retirou a maçã embrulhada de dentro da mochila, sentando-se de frente para a garota e abrindo um curto sorriso de recepção.

               — Estranho te ver sentada aqui. Você normalmente está no clima para almoçar fora — comentou Peony enquanto procurava por um elástico de cabelo, começando a fazer um coque no topo da cabeça, deixando apenas a franja repicada cair sobre os olhos.

               — Como eu disse antes, está sendo uma semana estranha — Gwen tentou ajeitar a bagunça que era seu cabelo e enfiou os punhos abaixo das mangas de seu suéter azul, sorrindo sonolenta. — Agora eu preciso te contar aquilo que falei antes.

               — Quanto suspense — Peony retirou a garrafa de café da bolsa e levou-a à boca para beber. — Diga logo.

               — Eu ouvi uma conversa entre Peter e Ned e você vai adorar! — A garota aderiu-se à um ânimo sobrenatural para seu cansaço de espírito, arrancando outra sobrancelha arqueada da morena. — Peter vai te chamar para sair.

Peony engasgou no gole de café e cobriu a boca com as mangas do suéter cinza, respirando fundo até parar de tossir e observando de relance o olhar faminto por alguma reação da amiga.

               — O quê?!

               — Eu sabia! Eu sabia! — Gwen cruzou os braços e debruçou-se sobre a mesa. — Você está afim dele.

               — Eu não estou! — Contrariou Peony, abaixando a garrafa de café e lançando seu pior olhar para a garota. — Como você tem tanta certeza de que ele vai fazer isso?

               — Eu não tenho, na verdade, mas a conversa foi bem implícita e… hm… deixa eu lembrar — a garota respirou fundo e bocejou em seguida. — Ah sim! Eles estavam conversando e Ned perguntou "quando você vai chamar ela para sair? Tá claro que vocês se gostam" e concorde comigo, realmente está claro que vocês se gostam.

               — Me ajude aqui, porque eu não enxergo isso em lugar nenhummentira, mas Peony não queria se entregar ainda.

               — Como não? Você está cega por algum acaso?

               — Cega? — Uma voz clandestina soou atrás das duas e Peony virou-se no mesmo instante, encontrando o dito-cujo, a manchete do dia parado ali, segurando sua câmera nas mãos enquanto tentava colocar-se numa postura que não parecesse tão desconfortável. A jovem sorriu pelo esforço. — Desculpe, e-eu… Peony, posso falar com você? Juro que não vai demorar.

Foi então que seu coração fez algo que ela não sabia que ele podia fazer; deu cambalhotas.

Um curto olhar para Gwen e a resposta de confirmação imediata foi recebida, a jovem levantou-se da mesa e ficou de frente para o garoto, só então percebendo a diferença não tão grande da altura, mas imaginando que ele podia aninhar o queixo sobre o cabelo dela em um abraço. Seria tão bom abraçá-lo.

               — C-Claro — a garota sorriu de canto, um tanto sem-graça. — Aqui ou…?

               — Lá fora, está bom para você?

Assentindo freneticamente, Peony passou a seguir Peter para as portas duplas que se abriam para o pequeno jardim de Midtown, utilizado pelo clube de jardinagem que já não existia há alguns bons anos, mas ainda era mantido por equipes de limpeza e aproveitado por casais de adolescentes cheios de hormônios que gostavam de privacidade.

Peter está me levando para o jardim.

Respirando fundo, a garota olhou por cima do ombro para encontrar Gwen que parecia conter um ataque epilético de tanta alegria que lhe preenchia naquele instante. Olhando para frente de novo, tão nervosa que mal conseguia respirar corretamente, a jovem observou que Peter havia segurado uma das portas para que ela passasse, então rapidamente tentou tirar o elástico do cabelo para deixá-lo solto, mas o elástico resolveu se prender em um curto nó.

               — Quer ajuda? — Peter soltou uma curta risada enquanto notava o trabalho da garota.

               — N-Não, tudo sobre controle.

Revirando os olhos, o moreno caminhou um tanto até ficar frente a frente com a garota e posicionou seus dedos esguios sobre os dela, tentando achar a origem do nó para desfazê-lo sem que prejudicasse as mechas castanhas. Em movimentos breves — às vezes lentos, como se ele quisesse aproveitar a sensação de quando sua pele escorregava sobre a dela — o garoto conseguiu retirar o elástico e acariciou a cabeça de Peony com cuidado para ajeitar os fios rebeldes.

               — Você é muito teimosa — ele sorriu e afastou-se um tanto.

Peony respirou fundo, deixando todo o ar preso em seus pulmões escapar e olhou para cima, finalmente encontrando os olhos de Peter e notando a proximidade que se estabelecia entre os dois, além da tensão no ar que era maior que ela por inteira. Pigarreando, a garota tomou um passo para trás e sorriu com vergonha nos lábios, mas sentindo falta do calor que o corpo de Peter irradiava.

               — Sobre o que você queria falar? — Ela perguntou, recompondo-se um tanto antes de pronunciar-se.

O garoto olhou para baixo e enfiou as mãos nos bolsos, brincando com as pontas de seus tênis no pequeno gramado, acariciando a grama com os pés.

               — E-Eu não me dou muito bem com esse tipo de coisa, sabe? — Peter comentou, sua voz ficando um tanto aguda no meio da frase, mas Peony encontrava-se intrigada demais para provocá-lo. — Mas eu preciso tirar isso do meu peito e… te perguntar.

               — Pergunte — a garota deu um passo à frente, seus olhos ganhando uma nova espécie de brilho que era distinta até para si mesma, mas não era nada ruim.

               — Tem essa garota que eu… hm… estou… afim? Algo assim, ultimamente e… — Peter parecia estar com problemas para se expressar, mas a jovem mal conseguia esperar o fim da sentença.

Tudo está certo. Tudo está apontando para o correto. Não era mais Harry, era Peter em sua frente, vulnerável e brincando com a grama abaixo de seus pés. As constelações de sardas que se espalhavam em seu nariz claramente visíveis… não tinha como ter algum erro ali.

               — E eu não sei como dizer isso, ou falar sobre ela… é difícil.

               — Sou só eu aqui, Peter. Você pode confiar em mim — a jovem reforçou, dando mais um passo para frente e suas mãos já conseguiam sentir os dedos dele no ar, segurando-se para não os entrelaçar aos seus naquele momento. — Pode falar quem é essa garota.

               — Ela é… o nome dela é…

É agora. É agora, ele vai dizer. É o momento, certo? Não podia dar errado, aquele era o jardim, Peter estava com os dedos encostados aos dela, quase juntos como antes, ambos corpos lutando contra a força da gravidade para poderem se encaixar em um abraço que tanto fazia vazio em seus peitos.

               — Diga — Peony olhou fundo nos olhos do garoto, como nunca havia feito com ninguém antes

É isso, vulnerabilidade. Ela estava se entregando por inteiro. Peter estava vendo sua alma nu e crua, a realidade de Peony Seagha sem a muralha que ela mesma construíra por precaução, por medo do mundo real.

Peter a tinha.

               — O nome dela é… ela é a Liz.


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