Rubbergeddon escrita por Samuel Schiavoto


Capítulo 3
Capítulo 2


Notas iniciais do capítulo

Definitivamente, o capítulo que mais deu trabalho para escrever, até agora. Desejo a todos uma boa leitura!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/729770/chapter/3

Um garoto de cabelos castanhos e ondulados, com o corpo em boa forma, despertou bruscamente de seu longo sono ao ouvir seu telefone celular tocar ao lado do seu travesseiro.

Ele pegou o aparelho que vibrava e tocava uma música irritante incessantemente, e, com os olhos fechados, atendeu a ligação.

— Alô...? — murmurou ele, a voz muito cansada e rouca.

Gabriel, é o Dylan — disse a voz do outro lado da linha, quase sussurrando. — A gente tá ferrado. Muito ferrado.

— Quê?

É sobre o nosso plano. Invadimos a base do Trevor, mas... — ele hesitou por um momento antes de continuar: — fomos pegos.

Gabriel esfregou e arregalou os olhos e sentou-se na cama, lutando contra o sono para se concentrar.

— Estou ouvindo — falou, tenso.

Sei que está. É o seguinte: estamos dentro de uma cela. Tenho que admitir que é bem confortável, mas... Bem, Trevor disse que, em três dias, nós vamos morrer. Felizmente, eu, Will e Julie estamos vivos no momento.

— Ótimo. Eu acho...

Sim, é ótimo. Acontece que eu não estou ligando só para anunciar que vamos morrer. Na verdade, eu quero evitar isso. Sei que você, sendo o gênio que é, vai conse...

— Ah, Dylan, será que não dá pra ser...

Contanto que você venha nos resgatar dentro do tempo de vida que temos, tudo bem. Mas precisamos que você se infiltre na mansão do Trevor com sucesso, consiga a chave, entre na prisão e nos liberte. Depois disso, cuidaremos do resto.

Gabriel esfregou os olhos com o polegar e o indicador da mão livre.

— Eu acabei de acordar — murmurou ele —, mas verei o que posso fazer. Eu te ligo em caso de novidades. Ligarei para te avisar quando eu for, também.

Excelente, esse é o meu garoto. Mas evite ligar: mande uma mensagem, é mais seguro. Agora escute: não seja descuidado. Se você for capturado também, a gente realmente já era.

— Farei meu melhor — finalizou Gabriel, e desligou a chamada.

Enquanto Dylan calmamente levava o celular ao bolso, seus dois amigos o encaravam ansiosos. Ele olhou de Julie para Will e deste de volta para a garota, então sorriu.

— Ele virá — anunciou Dylan — dentro do tempo que ainda nos resta. Pelo menos é o que ele prometeu.

— Graças ao Criador — suspirou Julie, se jogando de costas na cama.

Will também foi tomado por um alívio que ele já sabia que viria. Então escutou sua barriga roncar e esfregou-a por cima da camisa vermelha que vestia.

— Tô com fome — disse, e pôs-se de pé. Dirigiu-se à geladeira metálica de cor vermelha e já abrira a porta quando Julie o interrompeu:

— Você realmente vai comer a comida que aquele psicopata louco tem a nos oferecer? Vai se dar a esse luxo?

Will revirou os olhos, passando os dedos pelos cabelos.

— Prefiro morrer com um tiro na cabeça do que de fome. — Ele pegou queijo branco, requeijão, uma folha de alface e um saco de pão de fôrma que se encontrava em cima do micro-ondas. Montou um sanduíche improvisado e, sentando-se novamente na cama, começou a comer. — A comida é boa, pelo menos — comentou, de boca cheia.

Julie salivou ao observar o amigo comer o sanduíche. Então soltou um suspiro impaciente, pulou da cama e foi até a geladeira, preparar a própria comida. Will e Dylan não conseguiram conter o riso.

 

A única pessoa para quem Trevor abaixava a cabeça como um inocente cachorrinho obediente era seu chefe, o verdadeiro comandante d’Os Kaiser. Dante Tacanna, mais conhecido na mansão de Trevor como Ratbag, era um homem amedrontador por natureza: alto, corpulento, a pele morena. Uma expressão séria eternizada em seu rosto exibia sua autoridade em qualquer um que olhasse para ele. Seus cabelos enrolados e médios eram curtos, e o lado esquerdo de seu couro cabeludo estava raspado, com um símbolo desconhecido em estilo tribal tatuado na pele.

E Trevor pensava no quanto intimidadora era a única pessoa que tinha poder superior ao dele, enquanto encarava a superfície de madeira da larga mesa à sua frente, evitando olhar nos olhos do chefe. Ratbag o encarava com os cotovelos apoiados na mesa e os dedos entrelaçados na frente do rosto, os olhos castanhos por trás de seus óculos quadrados brilhando.

— Então você capturou o líder da Estrela Vermelha e seus amiguinhos. — A voz grave do chefe ecoou pela sala espaçosa. — Meus parabéns.

— Obrigado. — Trevor ousou erguer os olhos para encarar Ratbag e dar um sorriso, então voltou a encarar a mesa o mais rápido possível.

— Em qual cela eles estão? — perguntou Dante, baixando o olhar para continuar o desenho que fazia em uma folha de papel.

— Na cela A, chefe.

Ratbag parou de desenhar subitamente e encarou Trevor por cima dos óculos. Um calafrio percorreu a espinha dele.

— Você colocou os nossos piores inimigos — disse o chefe, com a voz pausada — na nossa melhor cela?

Trevor engoliu em seco, mas sentiu um indescritível alívio quando Dante riu.

— Nunca vou entender esses seus costumes.

O líder submisso forçou-se a rir também, mas seus lábios logo não passavam de uma linha retilínea.

— Quando será a execução? — perguntou Ratbag, voltando para o seu desenho.

— Em três dias. Escolheram morrer com uma bala no cérebro.

Escolheram?

— Dei a eles essa liberdade — falou Trevor, gradativamente reunindo coragem para tentar permanecer impassível, para não exibir fragilidade.

Ratbag contraiu os lábios.

— Sem problemas. Mas três dias é muita coisa. Você conhece esses rebeldes desgraçados. Sempre têm seus macetes. — Ele estalou a língua. — Se você não adiar essa execução para no máximo amanhã, eles vão achar um jeito de escapar, vá por mim.

Trevor respirou fundo.

— Já temos execuções demais agendadas para amanhã. A agenda está cheia...

— Então desmarque uma. Tenho certeza de que nenhum prisioneiro que vai morrer amanhã é tão importante quanto aqueles três. — Ratbag pegou sua caneca de cerveja, bebeu um gole e bateu com o copo na mesa. — Desmarque uma e adie a execução dos membros da Estrela Vermelha para amanhã à noite, no máximo. Isto é uma ordem.

Trevor abaixou a cabeça e fechou os olhos.

— Sim, chefe.

Dante encarou o líder secundário de seu império durante alguns segundos.

— Você está dispensado — disse.

Trevor fez uma reverência com a cabeça, se levantou da cadeira vermelha e acolchoada e saiu pela porta dos aposentos de Ratbag.

 

— Você parece cansado — disse Angel para Trevor, quando ele se juntou à irmã e Jake para almoçar. — Tá se sentindo bem?

O líder comeu um pedaço da carne.

— Ratbag ordenou que adiássemos a execução dos três bostinhas da Estrela Vermelha para amanhã. — A sala de jantar adquiria um tom agradável quando exposta ao sol da tarde, cuja luz entrava pelas janelas altas.  — Disse que eles escapariam se esperássemos “tanto tempo”.

— Ele está certo — comentou Jake, de boca cheia. — Já aconteceu antes. Mas não foi com ninguém da Resistência.

— Céus, nem me lembre dos Liberati. — Trevor encarou a outra extremidade da comprida mesa de jantar da mansão. — Precisamos de guardas mais competentes. Não acredito que eles tiveram a capacidade de jogar uma mulher na cela sem tirar os grampos do cabelo dela. Depois acham ruim quando são executados e substituídos.

Angel bebeu um gole de suco.

— Quando você vai avisar os três porquinhos que eles vão morrer amanhã? — perguntou ela.

— Assim que eu terminar de comer — respondeu Trevor, a voz cansada. — Saco. Tô exausto. Maldito cargo esse de líder.

— Pelo menos você ganha mais que a gente — disse Jake, rindo pelo nariz.

Trevor não respondeu. Jake tinha a insuportável mania de fazer piadas apenas nas horas erradas. Então, o líder apressou-se em terminar sua refeição, deu um beijo na cabeça da irmã e rumou para o salão das celas.

 

No final daquela tarde, Will pulou da cama quando ouviu a porta do salão abrir, ao longe. Ele e Julie, apreensivos, correram para a frente da cela, agarrando as barras brancas de metal. Dylan permaneceu deitado em sua cama, encarando o teto.

Trevor caminhava na direção da cela deles com um ar de quem não dormia há dias, muito diferente do seu modo brincalhão e sarcástico de ser. Até parecia outra pessoa. Dessa vez, ele não zombou dos prisioneiros nas celas pelas quais passava; sequer olhou para eles, e foi direto até os membros da Estrela Vermelha.

O líder respirou fundo e começou:

— Bom dia, tarde... Tanto faz, não sei que horas vocês acordaram, e isso não vem ao caso. Vim para anunciar que a presença insignificante de vocês em nosso planeta foi reduzida. Vocês têm até amanhã à tarde para se despedirem um dos outros.

Quê? — exclamou Will, erguendo as sobrancelhas ao fazer uma careta de dúvida consideravelmente cômica.

— Oras — arfou Trevor, apoiando a cabeça na mão —, a execução de vocês foi adiada para amanhã. Vocês só têm mais umas vinte e poucas horas.

— É só o que precisamos — disse Dylan, sem tirar os olhos do teto.

Trevor conseguiu sorrir ao olhar para o homem.

— Você é um rapaz interessante, Dylan — disse ele. — Ouso dizer que seria um bom general em nossas forças armadas.

— Corta essa, Sr. Converso Com Minhas Vítimas Antes De Matá-las. Não sirvo para obedecer a ordens. Diferente de você, eu não abaixo a cabeça para ninguém — falou Dylan, ainda deitado, sem esboçar qualquer reação.

O sorriso no rosto de Trevor desapareceu sem deixar qualquer resquício.

— O quê? — disse ele em tom de indagação, como se não houvesse entendido.

— É só um palpite, mas imagino que alguém puxe a sua coleira.

A aura negativa e cheia de ódio que certou Trevor obrigou Will e Julie a se afastarem. Os olhos negros do líder dos Kaiser se arregalaram.

— Você não sabe de nada da minha vida! — esbravejou Trevor, socando uma das barras de metal da cela. — Não ouse ficar falando daquilo que não é da sua conta, seu pedaço de lixo! Pode ter certeza que você vai ser o primeiro a morrer amanhã!

Dylan sorriu.

— E por que você não me mata agora? — perguntou, vitorioso. — Ah, é. É porque você está seguindo ordens.

Trevor bufou e cuspiu no carpete dentro da cela. Então voltou, furioso e irritado para a porta do salão, xingando e esbravejando no caminho, como uma criança mimada.

— Sabe — disse Dylan —, eu tenho a capacidade de irritar até a mais séria e focada pessoa da raça humana. — Com um sorriso ainda perdurante, ele se levantou da cama e foi olhar através da janela do salão, observando o que poderia ser o último pôr do sol que ele veria na vida.

— Estou preocupada — choramingou Julie, sentando-se na cama e abraçando os joelhos.

— Eu confio no Gabriel — disse Will. — Acho que ele tem um bom plano. Dylan, você acha...

Will não terminou a sua frase. Ao ver que Dylan estava com seu celular encostado na orelha, em silêncio, preferiu não interromper.

 

Dylan escutou os bips repetitivos em seu celular enquanto tentava ligar para Gabriel. Quando finalmente escutou o som familiar do amigo atendendo à chamada, ele se concentrou.

Alô — disse Gabriel, do outro lado da linha.

— Gabriel — falou Dylan, a voz cansada —, preciso que você refaça seus planos de resgate.

Quê? Por quê? — indagou o outro, indignado.

— Escuta aqui, não estou brincando. Estamos em um estado crítico e precisamos que você venha na madrugada. Não há tempo para explicações.

E como você...

Dylan desligou na cara do amigo.

 

Gabriel certamente estava confuso e irritado, mas confiava em Dylan. Sabia que aquilo tinha um motivo. E, se ele realmente era fiel à Estrela Vermelha, ele os resgataria naquela madrugada.

Ele foi à sua escrivaninha. Pegou clips, um grampo, dardos, uma lanterna, um pente de fuzil e seu comunicador. Então se virou, arfando.

— Certo — disse a si mesmo —, eu vou correndo, entro pela porta da frente após derrubar os guardas, visto a roupa de um deles, passo despercebido até encontrar a cela dos meus amigos e, bem, aí faço minha mágica. Devo ser rápido e silencioso. Eu preciso mesmo desses três? Certo, melhor eu parar. Vamos logo.

Gabriel deu um tapa na própria testa para se livrar de vez da crise de pânico que acabara de ter.

 

A lua estava alta no céu. Gabriel se escondia atrás de uma árvore. À sua frente, a uns dez metros, a mansão de Trevor se encontrava, alta e imponente. Dois capangas armados com fuzis — com balas de borracha, Gabriel sabia — montavam guarda, cada um de um lado da alta porta dupla da entrada.

Então Gabriel deu início ao seu plano. Ele pegou uma pedra e jogou-a no chão, na parte de concreto.

— O que foi isso? — disse um dos guardas ao ouvir o barulho.

— Vá checar — disse o outro, inflexível.

Um dos guardas, aquele à esquerda da porta, vestindo suas roupas de exército com proteções corporais e um capacete no mínimo ridículo, semelhante ao de um motoqueiro, começou a caminhar até a árvore onde Gabriel estava.

Era uma árvore bastante grossa: eram necessárias pelo menos umas quatro pessoas para poder envolvê-la com os braços. Então, quando o guarda descuidado e desinformado passou à frente de Gabriel, que estava escondido pelas sombras, o rapaz pegou seu dardo e enfiou-o no pescoço do capanga, que imediatamente caiu no chão, inconsciente.

Gabriel foi rápido: tirou o uniforme e o capacete do homem e vestiu-os. Pegou sua arma, também: um fuzil com balas de borracha, que ele substituiu pela munição que trouxera consigo. Felizmente, ele e o homem nocauteado tinham estruturas corporais semelhantes. Ele só precisaria disfarçar a voz. Então, cuidadosamente, ele saiu de trás da árvore e se reuniu ao outro guarda.

— Não é nada — disse Gabriel, engrossando a voz de forma convincente.

— Certo — disse o outro guarda.

— Hum... eu... preciso entrar. Tenho que... ir ao banheiro.

— Beleza, vai lá.

Gabriel sorriu por baixo do capacete que cobria seu rosto. Se os capangas de Trevor eram burros o suficiente para esquecerem de revistar Dylan ao jogá-lo na cela, aquilo nem o impressionava. Então ele empurrou a porta alta de carvalho e adentrou a mansão.

Um corredor comprido e pouco iluminado o recebeu. Isso facilitaria. Aos lados, dois grandes lances de escadarias levavam aos andares superiores. A mansão estranhamente lembrava um shopping center.

Gabriel estranhou a ausência dos guardas, mas não se importou com isso no momento. Caminhou próximo à parede à esquerda, buscando não ser visto. E funcionou. Dylan, anteriormente à missão de invasão à mansão do Trevor, na qual eles foram capturados, o dissera o caminho para as celas, caso o pior acontecesse. Era só subir aquele lance de escadarias que Gabriel encarava no momento, virar à direita, então à esquerda e seguir reto até uma porta metálica.

Assim ele fez. Não havia nenhum guarda no caminho. Talvez tivessem tirado a noite de folga. Então ele correu silenciosamente até a porta metálica que havia no fim daquele corredor.

Gabriel tirou o capacete. Foi fácil destrancar aquela porta com os clips. Um perturbador estalo ecoou por toda a mansão quando a porta se abriu, e Gabriel se esgueirou para dentro do salão.

Era difícil observar o estado de todos os prisioneiros naquelas muitas celas, mas ele não parou para pensar nisso. Quando se pôs a procurar seus amigos, ouviu a familiar voz de Dylan, sussurrando alto.

— Gabriel, estamos aqui.

O rapaz foi até a fonte do som. Seus amigos o aguardavam sorridentes, agarrados às barras da cela.

— Gabriel, eu te devo meu corpo — disse Will.

— Não é para tanto. — Gabriel, com uma tremenda facilidade, destrancou a porta da cela.

Porém, assim que os três saíram, um alarme soou por todo o local. Provavelmente o guarda deixado inconsciente fora encontrado.

— Droga — xingou Gabriel.

— Esperem — falou Julie —, as tropas estão chegando. Precisamos nos separar para fugir, senão atrairemos todos os soldados para a nossa cola e não teremos tanta chance de escapar.

— Certo — disse Dylan. Então, determinado a fugir, continuou: — Eu e o Gabriel vamos pular daqui para o andar de baixo. É uma queda pequena. Julie, você tenta sair pela lateral, e Will, corra para o salão no segundo andar e fuja pela janela de lá.

Julie e Will assentiram, então desapareceram por trás das celas. Mas mal Dylan terminara de falar, eles ouviram os guardas entrarem e correrem na direção do salão das celas.

— Eu tranquei a porta — disse Gabriel, um pouco desesperado.

Então os guardas, ao perceberem que a porta estava trancada e eles não tinham a chave, começaram a bater com os ombros na porta, tentando arrombá-la.

— Vamos logo, Dylan! — gritou Gabriel.

— Não posso — disse o rapaz, os dentes cerrados. — Preciso de uma arma.

A porta estava começando a abrir.

— Gabriel! — berrou Dylan, subitamente. — Eu vou abrir a porta. Assim que eu o fizer, você vai arrumar um jeito de roubar o fuzil de um dos guardas.

Gabriel arfava, incerto.

— É isso ou morremos! — Dylan berrou ainda mais alto.

— Vamos, vamos, eu tenho uma arma! — disse ele, mostrando o fuzil.

Os dois correram para a porta e se posicionaram ao lado da mesma, ao lado das dobradiças. Então Dylan a destrancou.

A porta voou para o lado, quase esmagando-os, e Gabriel rolou para a frente e acertou um tiro certeiro no primeiro dos quatro soldados que entraram correndo no salão. E eles mal tiveram tempo de reagir: assim que viraram, Gabriel fuzilou todos, mandando-os ao chão, mortos.

— Bom garoto — arfou Dylan, dando tapinhas nas costas de Gabriel. Ele foi até os guardas caídos e pegou a arma de um deles. — Você tem mais balas de verdade ou vou ter que usar estas porcarias de borracha?

— Só trouxe um pente — respondeu Gabriel. — Mas dá aqui, vamos trocar. Sua mira é melhor.

— Obrigado. — Dylan recolheu o fuzil de Gabriel e entregou o seu a ele. — Escute, temos que nos separar, senão vamos atrair muita atenção.

— Tudo bem — respondeu o outro. — Vá você. Eu fico aqui e saio pela porta dos fundos, por onde saíram o Will e a Julie.

— É muito perigoso — censurou Dylan. — Vá pela frente. Você é melhor em se esconder. Eu darei a volta.

— E você é melhor em correr! — Gabriel estava perdendo a paciência. — Dylan, eu me viro, pode deixar. Aqui, tome esta faca.

Ele entregou uma faca de combate ao amigo, que a aceitou e guardo-a no bolso. Então, com um último olhar confiante, Dylan saiu pela porta da frente, deixando o amigo para trás.

O rapaz correu, segurando o fuzil roubado em uma das mãos; ele via o corrimão que protegia o limite do andar superior, no qual ele estava. Entretanto, dois capangas de Trevor o surpreenderam quando ele virou à direita, obrigando-o a frear bruscamente e a disparar desesperadamente com seu fuzil, sem nem mirar direito. Mas os dois soldados estavam mortos em menos de dois segundos.

Dylan pulou os corpos e se apressou a chegar à escadaria, ali à frente, e desceu os degraus de três em três quando a alcançou. Chegando à grande praça circular interna da mansão, centralizada por uma fonte, ele percebeu que estava sendo perseguido por mais três capangas e correu o mais rápido que pôde até derrapar para trás da mureta da fonte central da praça, desviando das balas de borracha que eram disparadas dos fuzis dos capangas. Então, por cima da mureta, sem ver, Dylan apontou o próprio fuzil para os soldados e segurou o gatilho, varrendo o ar com a arma, até ouvir os três tombando no chão.

Dylan se levantou, correu até uma porta próxima e a abriu com um chute. Ele estava do lado externo da mansão, num corredor lateral cercado por sebes, mas mal teve tempo de se acostumar ao ar frio da madrugada — algo acertou sua nuca com força, fazendo-o cambalear até ir de encontro com a sebe próxima, dando de cabeça no concreto revestido por folhas.

— Meu deus, me desculpe! — Era a voz de Julie, e Dylan a observou sair do lado de Will (que estava com a mão na testa, incrédulo), largar um pedaço de pau no chão e correr ao seu encontro. — Pensei que fosse um dos capangas do Trevor. Você está bem?

Dylan piscou diversas vezes para se livrar das estrelas que a pancada o fizera enxergar.

— Sim, estou — respondeu, ainda meio tonto. — Vamos... vamos achar o Gabriel e dar o fora daqui. Ele virá daquela direção. — ele apontou para a esquerda, para onde o corredor externo fazia uma curva para a direita.

Julie e Will assentiram e puseram-se a se deslocar sorrateiramente entre as sebes e as paredes da mansão. Porém, quando começaram a se morrer, ouviram um barulho distante.

Eram tiros — muitos tiros simultâneos, vindos do outro lado da mansão. Os três estavam ali, juntos, o que significava que...

— Gabriel — disse Dylan, os olhos arregalados. — Vocês dois, sigam para a frente da mansão. Preciso resgatá-lo.

— Tá doido? — disparou Will, impaciente. — Precisamos de você. Não temos arma alguma!

Dylan xingou, com pressa, e deu a Will a faca que Gabriel o dera.

— Fique com isto.

Will abriu a boca para protestar novamente, mas Dylan já estava de volta para dentro da mansão.

Ele percorreu todo c aminho de volta, milagrosamente desobstruído, até a porta do salão das celas. Não havia ninguém para impedi-lo. Então, após abri-la, disparou em altíssima velocidade para a longínqua porta dos fundos e a abriu.

Ele estava sobre um mezanino, uma sacada. Ao alcançar a cerca de proteção e olhar para baixo, deparou com o que parecia uma área de lazer: uma piscina de tamanho médio cercada por várias cadeiras de praia. Próximo ao lugar, havia um armazém.

Mas o que chamou sua atenção primária foi o fato de vários corpos estarem entre as cadeiras e Gabriel estar dentro da piscina, lutando contra dois capangas;

Sem pensar duas vezes, Dylan atirou na cabeça dos dois soldados. A água logo se tornava mais e mais vermelha com o sangue que vazava de seus corpos quando eles caíram para o lado, mortos.

Arfando, ele se dirigiu à escada ao seu lado, desceu os degraus e foi à beira da piscina.

— Você está bem? — perguntou Dylan, ofegante, estendendo a mão para ajudar o amigo a sair da piscina.

Quando Gabriel abriu a boca para responder, eles ouviram um clique vindo da porta de onde Dylan saíra. Os dois correram desembestados para a porta do armazém mais próximo, sem se preocupar com quem saíra do salão das celas. Quem quer que fosse, milagrosamente não os notara — eles foram rápidos demais.

Dylan olhou pela fechadura da porta para ver quem estava descendo as escadas. Era Trevor. Um calafrio percorreu sua espinha. O líder dos Kaiser exalava fúria, segurando uma pistola na mão direita, e parou de pé na beira da piscina, encarando os corpos de seus soldados flutuando na água ensanguentada.

Sinalizando para Gabriel acompanhá-lo, Dylan chutou a porta e disparou contra Trevor. Infelizmente, ele errou; a bala foi parar sabe-se lá onde, mas Trevor deu um grito rouco e, assustado, caiu na piscina.

Não havia tempo para atirar mais: o desespero tomava conta. Então, Dylan e Gabriel dispararam até a escada e subiram até a sacada. O líder dos Kaiser emergiu no meio do processo, seus cabelos longos encharcados.

— Sabe, você ficou bem sensual molhado assim — disse Dylan, provocativo.

Furioso e impaciente, Trevor apontou sua pistola para os dois. Mas a água em sua arma impediu que os projéteis fossem disparados, e seus dois inimigos já estavam à porta da prisão, entrando no salão das celas.

 

Will e Julie não podiam ficar onde Dylan os pedira para ficar — eles seriam pegos uma hora ou outra. Então, decidiram correr até o pátio frontal, onde, teoricamente, os soldados não se concentrariam, e, esperançosamente, os dois conseguiriam sair de fininho e se esconder até Dylan retornar.

Eles tinham ouvido disparos e algo caindo na piscina, mas não podiam dizer quem fora. Os dois se esgueiraram na parede e espiaram o pátio. Três soldados estavam lá. E os dois viram a cabeça de Will quando ele se inclinou para o lado para espiar.

Ao ver os três homens correndo na direção dele, Will xingou baixinho. Sem pensar, ao ver a sombra de um soldado próxima, ele pegou a faca que Dylan o entregara e golpeou o capanga no peito, perfurando seu coração, matando-o imediatamente.

Mas um dos soldados acertou uma coronhada na nuca de Will. O rapaz caiu de cotovelos no chão, desnorteado, sentindo uma angustiante dor, e ouviu Julie, sua amiga longa data, berrar e se debater enquanto outro soldado a agarrava, levando-a para o centro do pátio, assim como foi feito com Will, que foi segurado pelas costas da camiseta, arrastado por alguns metros e jogado de cara no chão, ao lado dos joelhos da amiga.

Um dos soldados, o mesmo que trouxera Will, agarrou seus cabelos e forçou-o a ficar de joelhos. O zunido em seus ouvidos já se esvaia, e ele olhou para o rosto choroso de Julie, banhado em lágrimas.

Com o fuzil apontado para os dois, o capanga à frente deles pegou seu comunicador e apertou um botão.

— Soldado 37 falando. Trevor, está na escuta?

Um chiado foi ouvido.

Para com essas formalidades desnecessárias — rosnou a voz de Trevor. — Diga.

— Perdão, chefe. Temos o líder da Estrela Vermelha e sua amiguinha rendidos aqui no pátio. Tenho sua permissão para executá-los?

Você não precisa pedir permissão para fazer coisas como esta. MATE-OS.

O capanga desligou o comunicador e prendeu-o ao cinto.

— Adeus, Will — disse ele, apontando o fuzil para a testa do garoto. Julie soluçava. A morte estava chegando, ininterrompível e potente como um trem-bala. Will fechou os olhos.

Então, disparos foram ouvidos. Pareciam ser distantes. Simultaneamente, seus corações gelaram, suas peles ficaram pálidas e suas pernas ficaram moles como gelatina. Os dois sentiram um pânico agonizante, mas não estavam mortos. Então, Will abriu os olhos: os dois capangas estavam caídos ao chão, mortos; ele e Julie olharam para trás, bem a tempo de ver Dylan e Gabriel correndo ao encontro deles, armados. Eles haviam acabado de salvar a vida dos dois.

Julie e Will se levantaram. A garota abraçou seus salvadores, enquanto o rapaz apenas assentiu com a cabeça, grato.

— Vamos embora — disse Dylan. — Rápido. Embora.

Julie fungou, ainda chorando, e os quatro correram para o mais longe possível da mansão, sem nem pensar em olhar para trás.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Não se esqueça de deixar sua avaliação nos comentários. Até o próximo capítulo!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Rubbergeddon" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.