Crônicas das terras arrasadas: O sentimento algoz escrita por Abistrato


Capítulo 12
Capítulo 12 - Jennifer Wagen




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Capítulo 12 – Jennifer Wagen 

 

Sinto um líquido quente lentamente escorrendo sobre meu olho esquerdo ao passo que meus ouvidos aos poucos começam a discernir os barulhos que me cercam além de um estridente apito. Primeiro escuto o arfar rápido de Dimitri sobre mim e depois, ao longe, escuto um ranger de metal, ordens gritadas e motores. Meu olho direito se abre apenas para ver o rosto do meu escudeiro em meio à escuridão. Logo percebo que ele está com minha mochila em suas costas e eu sobre seus braços enquanto se esconde atrás de uma coluna no subsolo. 

― O que está acontecendo? ― Minha voz é mole e lenta. 

― Eles estão tentando tirar a caminhonete para nos perseguir... ― ele sussurra. 

― Você pegou minhas coisas? ― Tento com dificuldade me pôr de pé enquanto me apoio na coluna tateando o corte que sangrava em minha testa. ― Onde estamos? 

― Sim. Eu não se... 

Um estrondo forte seguido de passos rápidos e altos me desperta de parte do meu torpor. 

― A entrada do metrô tá livre, Chefe!  

― Ótimo, vocês, levem a caminhonete de volta para o prédio, nós vamos caçá–los. ― Essa voz masculina precede passos desordenados que se aproximavam junto de flashes de luz.  

Eu me escoro na coluna cinza e lisa tentando me esconder na procura de alguma fuga, mas era quase impossível ver alguma coisa cercada por aquele breu, mais eu me sentia assustada, porém continuava impotente com minha cabeça ainda rodando e cada vez mais latejando de dor. Uma luz logo passa por nossa coluna revelando um antigo banheiro atrás de nós e logo Dimitri puxa minha mão naquela direção. 

O som das armas que meu escudeiro carregava logo alertou um dos assaltantes e aquele mesmo flash voltou para nossa direção, mas não antes de conseguirmos entrar no banheiro feminino. Eu ouvia os passos curiosos nos perseguindo com relutância, mas ali, apesar da dor de cabeça forte, eu já havia aprendido o que fazer para me livrar de alguém nesse tipo de banheiro.  

Dentro desse banheiro azulejado em branco sujo uma serie de cabines de mesma cor e repletas de desenho contrapunha um grande espelho quebrado onde podia ver a ferida que já não mais sangrava na minha testa e a trilha de sangue incapacitando meu olho esquerdo. Eu estava deplorável, mas não tinha tempo para isso. 

Logo sinalizei para que Dimitri entrasse na última cabine e eu entrei na penúltima me certificando que ela não alcançava o teto. Assim que entrei o som dos passos invadiu o banheiro. Eu encarava a porta com vários desenhos nojentos e frases indecentes ouvindo cuidadosamente o som das pancadas que arrombavam as portas ao meu lado. Eu me contorci silenciosamente por cima cabine assim que a minha seria arrombada e o assaltante não me encontrou lá, mas ficou feliz por ter sobrado uma única porta.  

― Te peguei! ― Ele comemorou sadicamente. 

― EU te peguei! ― Sussurro ao subitamente degolá-lo com minha faca abafando seus gritos com minha mão. 

Lentamente deito o cadáver no chão e sinalizo para que Dimitri, que agora estava mais que aliviado do pavor de ter esconderijo violado, para que não se movesse temerosa que ele fosse escorregar na poça de sangue que se formava no chão. Com muito cuidado, debrucei-me sobre o corpo para apagar a lanterna que estava amarrada com fita adesiva na minha submetralhadora recém adquirida. 

Meu escudeiro me olhava assustado na expectativa da próxima ordem com orelhas que mexiam tanto quanto as minhas refletindo no suor a pouca luz que definia sua volumosa silhueta. Eu tinha a sensação de ouvir seus batimentos nos longos e tensos minutos que seguiram a nossa espera, ambos torcendo para que não percebessem que faltava alguém, para que não viessem para perto. Não tardou para que a mesma voz de autoridade voltasse:  

― Vamos embora, não adianta nada perdermos nosso tempo com ela... 

― O quê?! Não vamos embora até achá–la! Aquela vadia arrancou minha mão fora e ela vai pagar! 

― Não, nós vamos embora agora! ― ordenou com firmeza o líder ― Não é bom ficar muito tempo nesses túneis... ― Sua voz era séria ― Fora que ela não vai durar muito tempo aqui embaixo. 

― Como assim? Você vai mesmo deixar ela fugir por medo de uma porcaria lenda que contaram pra te enganar, hein, seu covarde? 

― Se quiser fique você aqui... Eu estou cansado de perder gente à toa... 

― Eu já disse que eles tinham desertado! 

― Se você não percebeu... ― o líder tinha certa tristeza em sua fala ― Mais dois já sumiram... ― Dimitri me olha ainda mais assustado. 

A mulher soltou algum som parecido com um rosnado de raiva e frustação. Passos seguiram para longe escada acima, mas sem aliviar em nada nossos corações. 

Cuidadosamente saímos do banheiro à procura da cotoca que não foi achada em lugar nenhum. Com calma eu passei a nova arma para Dimitri e peguei as minhas antigas deixando a mochila com ele. Então pulei para dentro túnel propriamente dito para seguir caminho. 

― Tem certeza que é bom irmos por aí? Você não ouviu o que o cara falou? 

― Claro que ouvi e como eu não quero morrer pra armadilha que ele aprontou lá em cima eu vou por aqui mesmo 

― Calma, você acha que tudo aquilo era mentira? Uma atuação? 

― Você tem tanta coisa para aprender... ― Dei tapinhas em seu ombro, entretanto eu não tinha certeza nenhuma. 

...__________... 

 

Andar pelos túneis do antigo metrô era como tentar achar a saída de um labirinto há muito tempo abandonado. Onde eu estava com a cabeça quando botei o Dimitri no volante? Ou melhor, onde ele estava com a cabeça quando decidiu se jogar dentro do metrô com uma maldita caminhonete?! Puta que pariu! Vai ser burro assim no inferno, mas não comigo no passageiro. Minha testa ainda dói devido ao corte, meu estômago ronca, minha bexiga reclama e minhas pálpebras estão perdendo a luta contra a gravidade, mas eu só consigo pensar em como eu vou fazer para recuperar a Woman O’War.  

Quase sem munição, cansada, faminta e em menor número é praticamente impossível imaginar uma situação que eu conseguiria tomá–la de volta... Mas e se eu deixar o Dimitri como isca e roubar a caminhonete de volta?... Esquece, ele é a única companhia que eu tenho, mesmo sendo uma anta.  

― Me lembre de nunca mais deixar você pilotar ― Eu dou um tapa na nuca dele. 

― Se você quisesse eu podia ter ficado com a metralhadora ― Ele aponta para a AK. 

― Acontece que eu achei que você ia fazer menos merda com uma caminhonete do que com uma arma! Mas parece que eu subestimei sua incapacidade! 

― Olha, Jenny, nós podemos ficar discutindo o caminho todo, mas parece que eu e você vamos ficar presos juntos por um bom tempo então... ― Ele se silencia quando eu puxo minha faca em seu pescoço. 

― Vamos ficar juntos mesmo, Dimitri? Eu acho que já deu pra perceber que eu não sou exatamente um exemplo de pessoa calma, então não me venha com “vamos ser amiguinhos” por que não vai rolar, quando eu quiser discutir nós vamos discutir, se eu quiser te xingar, eu vou te xingar, se eu quiser brigar, você vai apanhar. Deu pra me entender? 

― Calma aí, princesa guerreira, eu posso ter te deixado brava, mas... 

― Me deixado brava?!! Eu tô puta da vida! É isso que eu tô! Você podia ter me escutado, mas não, você me fez perder a minha caminhonete, boa parte da minha munição e do meu sangue ― eu aponto para minha testa rasgada, quando percebo que minhas pernas começam a tremer. Isso não é bom. 

― Tá bom, eu não piloto mais. ― Ele levanta as mãos em rendição. 

― Ótimo... ― Eu o largo, já à procura de algo para comer, com medo de desmaiar do lado de alguém que acabei de ameaçar. 

― Então é assim que você se desestressa? 

― Eu não tenho tempo pras suas bobagens! ― Corto. 

― Ameaçar, brigar, gritar é assim que você expõe seus sentimentos? 

― Vai se foder, Dimitri. 

― Vou considerar isso com um sim... 

Assim que o russo se cala nos deparamos com um número cada vez maior de insetos que a cada passo se tornavam mais estranhos. Seus movimentos caóticos de fuga da luz me lembravam da minha fome e do que aconteceu da última vez que minhas pernas tremeram e eu não comi. Até que eu pego um besouro mais lento e o devoro. Dimitri me olha enojado enquanto eu saboreio o delicioso inseto. Eu ofereço, mas ele recusa.  

Como diria Emily uma vez exploradora sempre exploradora. Eu acho que ela tinha razão quando disse que eu tinha que continuar com ela e o Marcus. Mas depois que eles começaram a namorar sobre o tronco de uma árvore morta enquanto devoravam insetos e lagartas da madeira ela nunca mais teve tempo para me ouvir reclamando da vida. Bem... que se foda. Eu estava cansada daquela vida de panos leves, não fazer barulho, fugir e se esconder. Fora que Herrenvolk me inspirava, o couro me protegia e Will... o Will... Ele me acalmava. Mesmo assim eu não consigo me livrar dos hábitos de uma exploradora 

― E agora o que vamos fazer? ― Dimitri interrompe meu banquete. 

Um trem destruído logo há frente bloqueava a passagem. Eu pensei que se nos espremêssemos seria possível passar entre o trem e a parede do túnel, mas a marombice do meu companheiro não o permitia então eu decidi que teríamos de passar pelo interior do expresso fantasma. 

― Vai, Dimitri, use esses músculos para algo útil ― digo empunhando Esperança. 

― Ok ― Ele fez um pezinho. 

Dessa forma eu alcanço a maçaneta da porta que, como eu esperava, estava trancada. Eu dei três coronhadas quebrando o vidro que permitiu que eu abrisse a porta por dentro. A primeira coisa que pude ver quando entrei foi uma série de esqueletos por toda parte. 

― Deus, que cheiro é esse? ― Dimitri tampou o nariz. 

― Esse vagão deve estar fechado a uns duzentos anos com corpos dentro. Não dava pra esperar nada além disso ― respondo. 

O clima lá dentro era muito pesado. A escuridão, o barulho silencioso dos insetos, a dificuldade de respirar, a sensação claustrofóbica e o sono, nenhum desses fatores era muito reconfortante, na verdade tudo parecia saído dos filmes de terror que uma vez por semana eram exibidos no Acampamento. Eu me lembro de adorar ir com Will, não para assistir aos filmes, mas para vê-lo tomando sustos. Eu noto um feixe de luz iluminando o final do vagão, então com voz arrastada e sem olhar para trás eu digo: 

― Dimitri, se você tomar um susto e me acertar com essa arma eu juro que te mato. 

― Ops... ― ele disfarça ― Desculpa. 

― Não pede desculpas, deixa de ser burro, caralho! 

Quando ele abaixa a arma junto do feixe de luz eu noto um corpo familiar no chão. Ele tem grandes fones de ouvido, roupas femininas e uma mochila em suas costas. Eu sinalizo para Dimitri parar e assim ele faz. Com seu modo Urso tático, Dimitri, dá-me cobertura como o otário que é. Sério, o que ele acha? Ninguém deve ter passado aqui nos últimos dois séculos. Dentro da mala eu acho alguns cadernos, livros e canetas. 

― Essa daqui devia prestar muita atenção nas aulas ― Eu mostro uns dos cadernos que continha algumas anotações e muitos desenhos. Dimitri dá uma olhada, mas não se interessa. 

Continuo minha busca até que acho um pequeno aparelho com uma tela grande e um único botão na parte inferior. Dele saiam dois cabos: um que atravessava a mala e ia para os fones e outro que aparentemente se encaixava em uma tomada. 

― Interessante... ― sussurrei tirando minha mala das costas para guardar minha nova aquisição. 

Ao me levantar dou de cara com Dakota sentadinha em um dos bancos.  

― Roubando dos mortos? ― Ela diz com desaprovação em seu rosto infantil ― é melhor devolver... 

― Ela não vai mais precisar. ― Eu tô cansada demais pra lição de moral. 

― Eu sei, sem problemas ― Dimitri responde. 

― Você sabe que coisas ruins acontecem com quem rouba dos mortos, né? ― Dakota alerta, mas eu só mostro o dedo e vou embora. ― Bem... eu avisei... 

― Ué, mas eu concordei com você! ― Dimitri fica perdido. 

...___________... 

Não demora muito parara cruzarmos todos os vagões voltando ao túnel cheio de lanchinhos fotofóbicos. O som de pingos d’água atingindo o solo agora se juntava aos vários sons que tornavam o clima macabro, mas isso entregava a condição do clima na superfície. Hummm... Tive uma ideia. 

― Dimitri ― Eu chamo baixinho empunhando Herrenvolk. 

― O quê? ― Ele empunha sua submetralhadora e sussurra junto em modo urso tático, me fazendo segurar o riso. 

― Tá ouvindo isso? 

― Isso o que? 

― Presta atenção... 

― Hum... Nada... 

― Você não é surdo, porra... Me fala sobre tudo que você tá ouvindo.  

― Som de insetos e de goteira. 

― Argh, que raiva... Só usa a cabeça, o que esses sons significam? 

― Hum... Tem muitos insetos aqui e tem um cano furado no teto?  

― Não... isso significa que... ― Uma gota cai entre nossos rostos e eu olho para cima lentamente a medida que eu falo ― Ele tá em cima de nós... 

― O quê?! ― Ele rapidamente mira para cima desesperado ao ponto de dar alguns tiros pra cima fazendo pó e até um tubo do encanamento caírem sobre sua cabeça. 

Eu me matava de rir enquanto ele punha a mão no galo que acabara de surgir em sua cabeça. Quando recuperei meu folego disse: 

― Meu herói. ― Pondo as duas mãos juntas no peito como uma princesa. ― Sério, grandão, você achou o quê? Que o Alien estava em cima da gente? ― Eu voltei a rir de novo — Não, não, melhor, um Wendigo ou quem sabe um vampiro ou um lobisomem! 

― Porra, Jenny!!! Por que você faz isso? ― ele pergunta indignado. 

― Essa é uma brincadeira pela qual eu tive que passar duas vezes na minha vida. É pra te ensinar o valor do significado dos sons. E relaxa, cidades abandonadas são mais perigosas por conta de pessoas do que de animais. 

― E o que eles significam então, fuzileira? ― Ele me desafiou. 

― Lá fora está chovendo e os insetos estão agitados o que significa que não estão acostumados com gente, logo — Eu pus Herrenvolk sobre meus ombros ― Faz muito tempo que ninguém passa por aqui. 

― Se você já sabia, por que você não me explicou primeiro? ― Acho que ele se tocou do ridículo que estava passando. Nós voltamos a andar. 

― Não tem graça se você não tomar o susto. 

― Por que você tem que ser tão sádica? ― Ele tá começando a pegar como as coisas funcionam comigo. 

― Eu só tô fazendo você entender como o mundo funciona, do meu jeito... Sabe, você já deve ter percebido, com a ajuda da nossa amiga maneta, que o mundo não é só trabalhar lavando louça pro seu pai e foder as filhas e esposas de comerciantes que só querem uma noite de êxtase com um russo sarado. 

― Eu percebi isso quando eu quase virei uma peneira lá em cima... 

― Bem...nós vamos recuperar minha caminhonete... E depois eu vou te deixar na primeira parada que acharmos, mas não se preocupa eu te dou um pouco de dinheiro e pode ficar com suas armas. 

― Obrigado... 

― Cala a boca. 

― Ei! Não precisa ser... 

― Cala... a... boca... ― Eu faço símbolo de silêncio. 

― Se essa for mais uma... ― Eu fecho a boca dele com a mão.  

Um som repetitivo e abafado ecoa baixinho quando chegamos na entrada da estação. Eu ponho a bainha em Herrenvolk levando Dimitri a erguer sua submetralhadora mais uma vez. 

― Tem gente escondida em alguma sala... ― sussurro. 

― Como você sabe? ― diz ele no mesmo tom. 

― Esse som é de motor, onde tem motor tem gente para alimentá–lo. O som seria muito mais alto e limpo se estivéssemos no mesmo lugar que ele o que significa que deve estar numa sala. Se está numa sala, não pode ser um carro ou uma moto, só faz sentido que seja um gerador. Alguém que ligue um gerador deve estar usando energia elétrica, sendo assim, a pessoa deve estar perto do gerador. Se alguém tem um saguão inteiro para ligar um gerador decide que é melhor ficar se intoxicando com o escapamento dentro de uma sala, deve ser por que ela está se escondendo, provavelmente dos assaltantes, e onde tem gente, tem comida... ― Eu sorrio sadicamente sabendo que os dias de lanches crocantes acabaram. 

― Você me assusta de vez em quando... ― Ele se cala quando olho feio para ele. 

Eu subo na plataforma o mais silenciosamente que posso, mas o meu pupilo acaba com meu trabalho ao deixar o revólver em sua cintura cair ao sair da linha do trem. Um segundo depois do choque de metal contra o concreto o barulho de motor cessa. Junto dele meu coração para e juntos eles voltam. Deve ter sido só uma falha no motor. O russo pega sua arma de volta ao passo que eu olho para ele com cara de bosta. Eu já estou vendo não vou conseguir me despedir dos insetos tão cedo. 

O som vem do segundo andar da estação. Não importa o quanto eu veja as construções do pré-guerra eu sempre ficarei impressionada com a grandiosidade delas. Dois andares! Cravados na pedra! E polida! Simplesmente fantástico. Mas se eu tivesse que apostar em qual lugar das mil e uma salas dessa estação o dito cujo está eu diria que em uma sala como uma placa dizendo “apenas pessoal autorizado” na porta. 

Eu e Dimitri, cada um em uma, subimos as escadas com corrimãos emborrachados. O som aumenta repentinamente indicado que a porta do lugar foi aberta. Essa é a nossa chance de pegar o dito cujo no susto! Eu corro para cima e Dimitri me segue. Com armas apontadas e lanternas a procura do indivíduo encontramos o corredor com as catracas que levavam a saída do metrô. Saltamos as catracas ao som da chuva que vinha da saída da estação. A nossa esquerda perto das catracas estava a enfadonha sala de onde era possível ver luz e gases saindo. Logo pouco à frente do lado direito estava a bilheteria cujos vidros estavam todos quebrados. 

Com cuidado, Dimitri e eu nos aproximamos da sala na expectativa de encontrar aquele ou aqueles que se escondiam. Um cheiro forte e repulsivo emana da sala junto com os gases do gerador. Esfregando-me na parede eu deslizo até a lateral da porta aberta e mando Dimitri checar verticalmente. Ele se inclina com sua arma em mãos. De repente com os olhos estalados ele diz assustado: 

― Meu Deus! ― A suplica é seguida de vômito. 

Eu inclino a cabeça apenas para ver uma cena atroz. Um corpo em vestes Draugs iluminado por lâmpadas ligadas no gerador nos olhava fixamente com os dois grandes olhos mortos estalados. Seu torso estava pregado um metro acima do chão por duas barras de ferro, uma em cada ombro, que saíam da parede destruída e repleta de sangue, entretanto seu quadril permanecia sentado no chão ambas as partes ligadas apenas pelas vísceras. As botas estavam jogadas no chão um dos pés havia sido desossado até o joelho. 

― Merda! Interrompemos alguma brincadeira muito doentia... ― Eu estava abismada. Era exatamente isso que eu fazia com animais. 

Depois do choque inicial eu notei que a sala estava repleta de itens de limpeza. No chão havia uma lata com bordas queimadas e na parede havia escrito em sangue as palavras: ME CONTE TUDO QUE SABE. 

― Vamos sair daqui, Jenny, eu tô com um mau pressentimento, talvez o cara tava certo, tem algo aqui. ― Dimitri limpava a boca. A arma dele tremia mais do que daquele rapaz do Laboratório do senhor Jonhson. Vamos lá, Jenny, pensa como é que vamos sair daqui vivos! 

― Agora não dá mais, já caímos na armadilha, se fugirmos é ai que o negócio vai ficar feio... Segura aqui ― Eu dou minha mochila para ele ― O doente tá usando o barulho do motor para se mover sem que o escutemos e o escuro para se esconder... ― Muito sagaz... Mas eu já sabia disso desde a época de exploradora ― Já sei! Desliga a luz, as lanternas e o motor. Eu vou pensar numa fuga ― Eu fecho os olhos pra imaginar a melhor situação ao passo que coço minha cabeça. O animal (ou animais) está usando a luz para nos ver e a escuridão para se esconder, mas esse é um jogo para dois! Sem a luz ele não arriscará nenhum ataque que entregue sua posição. A não ser que... não... seria tão real quanto o Alien de Dimitri, fora que, nesse caso, já estaríamos mortos.... Quando abro os olhos novamente as luzes já haviam sumido, mas o barulho do gerador ainda não ― Eu já mandei você desligar o gerador. 

― Mas eu já desli... ― Enquanto ele terminava a palavra eu estalava os olhos e meu coração parava. MERDA! De repente meu coração acelerou ao pico rapidamente no mesmo tempo que minhas orelhas se retraiam. 

― Dimitri! CORRE!!! ― Nós saímos em disparada desesperados fugindo em direção a saída da estação onde o chão estava tão molhado pela chuva quanto minhas costas pelo suor gelado. Calafrios me atingiam a todo instante ao pensar no único ser capaz de fazer aquilo com um homem, sumir no escuro e carregar um motor para onde quer que vá. Um ser que faria o Alien e o Wendigo fugirem amedrontados. Um ser que faz parte das histórias de terror e do imaginário das terras arrasadas. Um ser que achei que seria apenas uma mentira e subestimei sua existência. 

Conforme corríamos para a saída eu noto uma leve fumaça no meio do horizonte escuro quando um raio revela a silhueta de uma figura pequena carregando sua arma de escolha: A motosserra. Ela sorria fazendo com que seus dentes brilhantes e pontiagudos aparecessem para nós como se apenas seu sorriso pairasse no ar depois da luz partir. Eu agarro o braço de Dimitri ao passo que deslizo quando tento mudar o sentido da fuga, mas ele me apoia com um abraço me fazendo recuperar o equilíbrio. 

― Dimitri, prega fogo nela!! ― Mas, como nas histórias, a escuridão a protegia. De fato, já estávamos mortos. 


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Notas finais do capítulo

Olá se vc leu até aqui você deve ter gostado! Por fvor deixe seu comentário para que eu tenha um feedback da história, agradeço desde já!



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