Acordo num salto e ouço a campainha tocar. Quando dou por mim, Haymitch está rindo do meu lado.

– O que foi? - indago.

Já está um pouco escuro. Devem ser os garotos chamando para jantar, penso.

– Você levou um susto – ele comenta e percebo que está prendendo o riso.

Franzo o cenho e afasto uma madeixa do meu rosto. Sinto sua mão passear pela minha cintura e então ele me beija.

A campainha toca novamente.

Haymitch bufa e se levanta, puxando o lençol consigo. Protesto e quando tento puxá-lo de volta, Haymitch acaba sendo mais rápido do que eu. Solto um muxoxo e me agarro a um travesseiro enquanto ele se enrola e sai do quarto.

– O que é? - resmunga do corredor. Há um momento em que mal ouço a voz do lado de fora. Está abafado para ouvir daqui. - Tudo bem! Chegamos daqui a pouco!

Passo a mão pelos meus cabelos, tentando deixá-los menos desarrumados, mas sei que é em vão.

Haymitch volta para o quarto e quando senta novamente na cama, solta o lençol que o cobria, revelando seu corpo nu.

– Está com fome? - pergunta. Balanço a cabeça afirmativamente em resposta. Haymitch se inclina um pouco e passa a distribuir alguns beijos pelo meu pescoço. Fecho os olhos e me arrepio com seu toque. Ele afasta o travesseiro que até então eu abraçava e me puxa, fazendo-me sentar no seu colo. Nossos lábios se encontram e sinto suas mãos explorarem o meu corpo tão delicadamente que posso me sentir um pouco mais leve.

– É melhor a gente ir – sussurro quando ele volta a beijar o meu pescoço. - Eles vão nos chamar de novo.

– Eu sei – Haymitch murmura.

– Mais tarde a gente volta – digo em seu ouvido e ele geme baixo em resposta.

Saio da cama e convenço-o a tomar um banho rápido antes de descermos. Quando chegamos a porta, Haymitch estende uma mão e, sem hesitar, a seguro. Ele tem mãos largas e quentes. Ainda posso sentir o desconforto entre as minhas pernas, mas isso não é nem um pouco ruim.

– Você está morta? - Haymitch indaga subitamente. - Que mão gelada!

– Cala essa boca – resmungo e ele ri.

Haymitch para subitamente antes de subirmos os degraus que levam a porta de frente da casa de Katniss.

– Espera, espera – ele diz e se vira para me encarar. Haymitch pigarreia e baixa a cabeça, segurando minha outra mão na sua.

– O que foi?

– É... - Haymitch gagueja. - Se os garotos perguntarem alguma coisa sobre...

– Sobre nós?

– É.

– Diremos a verdade – respondo, mas ainda vejo Haymitch um pouco inquieto. - Está nervoso?

– Um pouco – ele diz e isso acaba me fazendo rir um pouco. Me aproximo e selo meus lábios nos dele, então seguimos nosso caminho até eu pressionar o botão da campainha da casa de Katniss.

Em poucos segundos Peeta surge na porta e nos recebe com um grande sorriso. Ele me abraça primeiro.

– Achei que não viriam mais! - ele diz antes de apertar a mão de Haymitch. Então nos convida para entrar.

É quando vejo Katniss vindo do que acredito que seja a cozinha. Quando me vê, leva cerca de três segundos até me reconhecer e então diz o meu nome, correndo para me abraçar em seguida.

– O que aconteceu com você? - ela pergunta ainda me abraçando. Estou lutando para reprimir uma risada. - Você está maravilhosa!

– Digo o mesmo de você, Katniss – digo quando tomamos um pouco de distância. Não me lembro de ter visto Katniss sorrindo tanto quanto agora.

– Vocês estão com fome? - Peeta pergunta e Haymitch diz que sim.

Estamos na sala de jantar, com uma mesa farta de bolo, pães e algumas massas que Peeta preparou. Me pergunto pra que tanta coisa assim se somos apenas quatro, mas, como se lesse meus pensamentos, Katniss diz que não achou necessário tanta comida, mas Peeta insiste em dizer que queria me receber da melhor forma possível.

– Foi muito gentil da sua parte – digo para amenizar a situação. Já estou quase farta com pão de queijo e Haymitch não para de mastigar do meu lado.

– Quando você chegou, Effie? – Katniss pergunta.

– Cheguei ontem – digo.

– E parece que o Haymitch estava querendo você só para ele, não é? - Peeta intervém e Haymitch se engasga. Acabo rindo com a situação. - Acho que se eu não tivesse passado lá mais cedo, vocês nem teriam vindo.

– Ah, Peeta, teríamos vindo, sim – tento me defender.

– Eu sempre venho para jantar – Haymitch resmunga. - Vocês sabem muito bem disso.

– Tudo bem, Haymitch, calma! Só estávamos brincando – Peeta diz em meio a risos. Tomo um gole de leite e quando olho para Katniss, seu olhar está preso em mim, mas não em meus olhos. Mesmo assim, não consigo identificar, pois ela logo desvia quando percebo. Após um pigarro ela recolhe seu prato.

– Vocês já terminaram?

Peeta balança a cabeça e entrega seu prato. Katniss volta a olhar para mim.

– Você pode me ajudar, Effie?

– Claro – digo e a acompanho, com meu prato nas mãos. Peeta e Haymitch continuam à mesa, visto que este ainda não terminou seu jantar.

Katniss está lavando a louça e me pede para lhe entregar a minha parte. Pego uma toalha no balcão e enxugo os que ela acabara de lavar.

– Então, Effie – ela começa assim que lava o último prato. Ainda estou terminando de enxugar o restante. - Não tem mais nada para me contar?

Ela está encostada no balcão, com os braços cruzados. Uma sobrancelha está levantada.

– Como assim, Katniss? - indago e volto a desviar o olhar para a louça. Enxugo minhas mãos e volto a fitá-la.

– O Haymitch mudou bastante, você não acha? - seu tom de voz indica que ela está querendo chegar a algum lugar, mas ainda está rodeando.

– Claro – confirmo. - Ele não é mais aquele brutamontes que trabalhava comigo.

– Então deve estar sendo bem legal ficar na casa dele, não é?

Franzo o cenho.

– Está - respondo. - Por quê?

– Nada demais – Katniss diz e sorri. - É que dá pra perceber, sabe? - ela prossegue e, percebendo que ainda não entendi, ela aponta para o próprio pescoço. - Você está com uma marquinha de chupão bem aqui.

– O quê?! - acabo falando alto demais e nós duas olhamos para a porta, mas provavelmente nenhum dos dois ouviu.

Tento cobrir o pescoço com as mãos, mas isso só faz Katniss rir ainda mais. Sinto minha face corar fortemente, mas acabo cedendo e começo a rir também.

Levamos algum tempo até nos controlarmos.

– Então, Effie, como é que foi?

Acabo contando para Katniss tudo o que aconteceu desde que Haymitch foi ao meu apartamento até hoje. Ela está cobrindo a boca com as mãos quando termino de contar tudo.

– Vocês são rápidos! - é o que ela diz.

– Talvez nem tanto. Perdemos muito tempo, Kat.

– Mas Effie... Ele nunca te contou sobre o resgate? Nunca mesmo?

Balanço a cabeça negativamente.

– Mas você sabe que foi ele, não sabe? Foi ele quem tirou você de lá.

– De certa forma, eu sei – digo, mas o desconforto no estômago só me diz que eu ainda precisava de uma confirmação sobre o ocorrido. E pelo visto Katniss sabe de tudo. - Mas queria que ele me dissesse.

– Bom... Agora você sabe.

Katniss sorri e eu a acompanho. Na entrada da cozinha, vejo Haymitch e Peeta passando e vindo até nós.

– É... - Peeta começa e hesita. - Effie, o Haymitch me contou tudo.

– Effie também me contou – Katniss diz.

– Está vendo? Mulheres quando estão juntas só sabem fofocar – Haymitch diz para Peeta que ri do seu comentário.

– Se for assim, vocês também estavam fofocando – retruco. - Estavam falando do mesmo assunto.

– Um ótimo assunto – Peeta acrescenta. - Estou feliz por vocês.

– Obrigado, garoto.

– Ainda bem que a Effie é muito paciente – Katniss diz. - Para aguentar você...

– Realmente - concordo. - É preciso ter muita paciência para aguentar esse aí.

– Ei! - Haymitch protesta. - Chegou ontem e já está assim?

– Haymitch, eu o conheço há anos. Trabalhamos juntos, esqueceu?

Vejo-o revirar os olhos e vir até mim. Ele me afasta devagar do balcão e se encosta exatamente onde eu estava, servindo, agora, de apoio para mim. Seus braços me envolvem pela cintura agora.

– Acho que agora a Effie põe o Haymitch nos eixos – Katniss comenta, o que nos faz rir.

– Eu sempre estive nos eixos – Haymitch tenta se defender, mas sabe que ninguém o leva a sério, então voltamos a rir.

Ficamos por mais alguns instantes, tentando colocar todos os assuntos em dia. Depois voltamos para a casa de Haymitch. A brisa noturna é fria e confortável, o que acaba me arrepiando um pouco enquanto voltamos.

Haymitch fecha a porta e coloca a chave numa mesa próxima.

– Haymitch, posso falar com você?

Ele para no meio do caminho e me fita um pouco confuso.

– Claro – ele diz e, lentamente, vem na minha direção. - O que foi?

– Vem cá - digo e o encaminho até o sofá, onde sentamos.

Passo a língua nos lábios e me lembro do que Katniss me disse sobre o resgate.

Decido ser direta.

– Por que você nunca me contou sobre o meu resgate? - pergunto e percebo-o suspirar. - Até hoje você não me contou nada... E eu sei que foi você.

– Katniss te contou? - ele me interrompe e eu confirmo com a cabeça.

– Contou. Mas, de alguma forma, eu já sabia disso. Eu só... queria que você tivesse me contado. Não ela.

– Não queria que você ficasse comigo por gratidão.

– Você acha que eu estou com você por gratidão? - indago. Pinho uma mão no seu rosto e faço-o me fitar. - Eu gosto de você, Haymitch. De verdade.

– Eu também gosto de você.

– Acho que eu percebi quando você foi parar no meu apartamento – digo e ele ri. Acaricio um pouco o seu rosto e me aproximo para beijá-lo. Ele me retribui imediatamente e me puxa para o seu colo. Suas mãos quentes me apertam nas coxas e intensifico o beijo, segurando seus cabelos.

Haymitch se afasta um pouco e leva os lábios até meu ouvido.

– Você quer subir? - sussurra e eu aceno com a cabeça num sim.

Ele me leva pelas escadas e, ao chegar no seu quarto, acabamos fazendo amor novamente.

Acordo no meio da noite ainda sentindo o corpo de Haymitch próximo ao meu. Seu braço ainda está me envolvendo um pouco enquanto ele dorme profundamente.

Sei que está dormindo porque ele parece uma pedra.

Respiro fundo e, lentamente, afasto o seu braço para que eu possa me levantar sem que ele acorde com o movimento. E quando me levanto, pego sua camisa jogada no chão e a visto, caminhando, em seguida, em direção a janela do quarto.

Me encosto e sinto a brisa noturna brincar com os meus cabelos. Então me viro e observo Haymitch ainda na cama, percebendo como tudo aconteceu tão rápido. Mordo o lábio e começo a me lembrar de tudo que ocorreu aqui.

– Effie? - soa a voz rouca de Haymitch, trazendo-me de volta a realidade.

– Que susto, Haymitch! - reclamo. - Achei que estivesse dormindo.

Ele se vira na cama e me encara com seus olhos inchados de sono. Mas, mesmo assim, ele ainda traz uma expressão brincalhona no olhar.

– Por que está com a minha camisa?

– Estou com frio.

– Não estaria se tivesse ficado na cama – ele diz e isso acaba me arrancando uma breve risada. Ele me acompanha e, em seguida, se levanta, envolto no lençol. Me viro para observar lá fora pela janela e ele me abraça por trás, deixando o lençol também me cobrir.

Então ele me abraça, depositando um leve beijo no meu pescoço.

– Você vai ficar, não vai? - ele pergunta.

– Não tenho razão para não ficar.