Colorful escrita por Isabelle


Capítulo 24
Capítulo 23 - Sally


Notas iniciais do capítulo

Não volte pra casa meu amor que aqui é triste
Não volte pro mundo onde você não existe
Não volte mais
Não olhe pra trás
Mas não se esqueça de mim não
— A Banda Mais Bonita da Cidade



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Não tinha como descrever. Não tinha como não sentir. Não tinha como não se desesperar.

Os olhos dela estavam mortos. Ela estava morta. Seu corpo estava inerte, sua respiração calma e lenta. Seu coração palpitava forte, profundamente, batidas rítmicas, que se você prestasse bem atenção faziam eco naquele espaço branco e sem graça que era a imensidão do hospital. Os médicos transitavam de uma sala para a outra; os pacientes que estavam impacientes, tomavam lugar naqueles assentos, como Sally, contanto, a única diferença é que nenhum deles tinha a pele fria como a de um morto, nem estava prestes a engasgar com a própria bile.

Will e Cely souberam de primeira ao tocar as suas mãos que estavam gélidas como de um morto, e logo após notaram os olhos que a levava para um transe hipnótico. Eles ponderavam a ideia de chamar um psicólogo, mas Cely sabia que de nada adiantaria. Tudo o que eles precisavam era manter os olhos nela. Não deixar com que ela sumisse de vista. Ela precisava daquele momento de reflexão consigo mesma. Daquela profunda dor na alma. Ninguém conseguiria a barrar de sentir aquilo, e por mais que eles quisessem ajudá-la, era uma dor necessária.

Ninguém a entendia. Ninguém sabia o que passava naquela mente profunda. Ninguém nunca saberia o que ela via toda noite quando fechava os olhos ao tentar dormir. Nenhum deles, por mais próximos que fossem, nunca saberiam tudo que ela já havia sofrido. Tudo que já havia bagunçado sua vida, e as dos outros.

Ela não queria que nada daquilo estivesse acontecendo. Mas, as únicas cenas que viam na sua cabeça, era em Noah ter levado o tiro, do assassino ameaçando-a, dos olhos de Noah se fechando, enquanto ele balbuciava algo para ela, já sem consciência. Da ambulância, dos relances de cores e luz, e por fim do enfermeiro a empurrando de leve, impedindo-a de acompanhá-lo para a área de cirurgia.

Tiro na parte entre o torax e o abdômen, alguns centímetros para cima, e uma costela quebraria, mas do mesmo jeito, o lugar em que a bala entrara traria complicações para Noah. Não tinha como saber. Duas horas sentadas ali com apenas uma notícia, “se ele tiver sorte, ele pode sobreviver.” Era uma cirurgia de risco. Tudo poderia acontecer. E não saber de nada, era como tomar um corrosivo, estava a matando por dentro.

Ela tinha feito aquilo com ele, era tudo sua culpa. Ela não conseguiria nunca mais viver se tivesse perdido Noah, se tivesse que viver sabendo que tirara a vida dele. Ela jurava para si mesmo que se o tivesse perdido nada mais faria sentido. Ela não aguentaria. Era a primeira pessoa que em anos, se preocupara de verdade com ela. Obvio que ela tinha as amigas, mas nenhuma delas ocupava aquele lugar protetor que ela tivera uma vez na vida muito atrás, e depois de anos, conseguira de novo ter com Noah. E, agora, se ele se fosse, tudo estaria perdido para ela.

Will e Cely se levantaram, e Will se inclinou para perto de Sally. As olheiras por baixo dos seus olhos eram tão visíveis, os lindos olhos azuis, agora decorados por uma moldura profunda de cansaço. Os cabelos todos desnorteados em uma bela tempestade, e o rosto fino, e frente ao seu, fazendo que, pela primeira vez em mês, ela tivesse uma inspiração momentânea para um desenho.

Ele tentou sorrir, mas não conseguia. Estava tentando dizer alguma coisa, mas não conseguia; estava muito abatido, muito desesperado. Então, Cely também se inclinou, sutilmente, também revelando uma beleza pálida até demais para sua pele mais bronzeada. Os olhos estavam um desastre também, mas bem mais equilibrados. Como se ela já estivesse normalizada com aquela situação.

― Sally, vamos até a praça de alimentação, quer vir com a gente? ― Ela perguntou com a voz baixa.

Sally apenas movimentou a cabeça de um lado para o outro, sem nem ao menos fitar os olhos de ambos. Sabia que também estavam preocupados com ela, mas não sabiam o quanto ela estava despedaçada por dentro. Como queria gritar, chorar, se esconder daquele mundo perverso que não gostava de a abraçar. Ela estava sofrendo por dentro, mas por fora, continuava com suas feições perfeitas. O sorriso não esboçava, nem fazia nenhuma feição comprometedora, apenas olhava reto, sem se preocupar com o que estava a frente. O objetivo era não manter o foco.

― Não comeu há horas, precisa se alimentar, senão vai desmaiar. ― Will argumentou, mas Sally apenas deu de ombros.

Eles soltaram um suspiro em uníssono, e Will passou a mão no seu cabelo desfeito. Ela tinha o arrumado com tanta precisão, e em menos de segundos ele fora arruinado. O vestido que comprara há somente três dias, estava imerso em sangue. O sangue de Noah. O sangue que ela tentou regular com a barra de vestido, até que a ambulância chegasse, o que demorou.

Ela lembrava das lágrimas queimando, e ela sabia que aqueles sintomas que agora sentia eram os mesmos que havia sentido anos antes. Naquele dia brilhoso. Naquela manhã e tarde ensolarada. Naquela noite de perdas.

― Você vai ficar bem? ― Cely abaixou-se e tentou focar em seus olhos, mas eles estavam longes, desfocados.

Ela assentiu com a cabeça. Não conseguia falar. Quando falava, sabia que seus olhos deixariam as lágrimas escapar. Então ficava em silencio, fazendo gestos com a cabeça, sabia que não doeria menos, mas preferia.

― Tudo bem então. ― Cely disse, e enroscou as mãos nas de Will, fazendo com que as gotículas nos olhos de Sally quase transbordassem.

Era para ser a noite deles. Ela sabia disso, quando ele começara a dizer aquelas coisas no terraço do prédio. Antes disso, tinha ficado sufocada em ciúmes, ao vê-lo dançar com Camile daquela forma. Tudo bem, fora ela quem o havia arrumado, mas jurava que ele não ficava com ninguém por dó, contanto, na verdade, ele queria mesmo era ter ficado com ela. Mas no momento em que o tinha feito, tinha sido atingido, e agora estavam ali.

Esfregou as palmas das mãos uma na outra, e passou as no cabelo. Mordeu o canto do lábio. Não lembraria daquilo. Tinha prometido esquecer daquilo. Nunca desenterraria. Não eram boas memórias. Elas a atormentavam por anos, mas agora Sally tinha prometido em esquecer. Não queria lembrar das cenas, do silencio total, daquele aperto no coração, mas já era tarde demais. As imagens flutuavam do ar, de um passado inacabado, para dentro de sua mente. Berrando para ela. Gritando que ela deveria se recordar, e foi que ela fizera.

As mãos estavam frias, e ela usava um casaquinho. O sol brilhava forte, contudo o frio a rodeava, prendendo-se a cada célula sua, fazendo com que ar gelido a dominasse, e que ela tivesse que abraçar o próprio corpo mais a blusa, porque Nate, não havia trago uma.

Ele andava praticamente sem camisa naquela mata segurando a mala com as roupas de cama, e outras roupas, e parecia não ligar, só estava focado na maratona que tinha planejado para os dois há meses, mas Sarah tinha outros planos em mente. Queria apenas deitar na cabana, e ficar la conversando. Depois sair para tomar um banho no lago, ou algo assim. Não queria ficar correndo. Fora difícil o bastante convencer a mãe a tomar conta de Ellen no seu lugar, e quando finalmente o fizera, não fora para ficar correndo no mato.

A cabana estava toda colorida, por conta da pintura daquela vez, mas já um pouco desbotada. Eles voltaram várias vezes depois daquela ali, mas quando as provas e trabalhos na faculdade de Nate, apareceram, e ele acabou ficando impossibilitado de os levar ali. E alguma barreira começara a crescer entre os dois. Estavam mais afastados. A faculdade de Nate estava fazendo isso, e ele não parecia preocupado em quebrá-la.

Ao adentrar a pequena cabana, a primeira coisa com que você esbarrava era os alimentos duráveis, que estavam em uma caixa, e que por algum milagre não haviam sido comidos pelos animais, como havia sido da última vez. O colchão velho estava jogado ao chão madeirado, e havia resquícios de animais por toda a roupa de cama.

Ela se sentia tão abrigada ali. Era seu lugar favorito no mundo, mas ultimamente com Nate afastado, uma bolha havia se expandindo no seu coração, fazendo a insegurança tomar conta. Tinha medo dele ter encontrado alguém na faculdade, tinha medo de perdê-lo, mas não poderia dizer aquilo em voz alta. Pareceria muito grudenta e possessiva, e ela odiava ser assim.

Esfregou os braços sobre si mesma, jogou a bolsa que continha seu dinheiro, e as camisinhas; e trocou a roupa de cama do colchão. Nate estava ao telefone do lado de fora da cabana. Ele tinha os braços mais fortes, e delineados. O maxilar firme, acompanhado de um sorriso sacana, e falava algo que Sarah não conseguia escutar. Ela se virou, se recusando a deixar aqueles pensamentos na cabeça, e terminou de arrumar a “cama”. Ele não podia tê-la trago ali para terminar. Bem ali. Aquele era o lugar dos dois.

Se encolheu na cama, com o edredom por cima, deixou uma janela aberta, para o frio ainda ter um lugar ali naquele meio, enquanto ela se protegia. Contudo, o que ela queria era que Nate desligasse aquele telefone, e deitasse ali com ela, mas a conversa pelo telefone parecia estar muito mais interessante, do que ela poderia ser.

Após minutos fitando o telhado, ela escutou os passos dele vindo em sua direção. Ela não se mexeu, esperou que ele falasse alguma coisa, mas a única coisa que ele fez, foi andar até a malinha, tirar uma garrafinha de água que estava enrolada em uma toalha, e tomar um gole.

― Você vai? ― Ele perguntou, trocando o peso de uma perna para a outra. Ele não mantinha os olhos nela.

― Não, achei que a gente… ― Ela não terminou.

― Tudo bem, vou fazer uma caminhada, e depois a gente tem que conversar, tudo bem? ― Ele nem ao menos esperou a resposta, apenas saira caminhando. Deixando ela ali. Intacta. Quebrada. Sem saber o que fazer.

Esperou o momento certo, e começara a voltar pela trilha, pegara alguma comida, e a mala com todas as suas coisas, e apenas uma muda de roupa de Nate. Sentiu as veias sendo inundadas de ódio, e os olhos queimarem com as lágrimas pesadas. Seguiu em frente em silencio. Com a cabeça baixa. Com o coração pesado.

Depois, a gente tem que conversar”, o que ele quis dizer com aquilo? Aquela frase, quanto mais ela andava, mais ecoava em sua mente. Ela sentia o tom da sua voz ao dizer que não estava funcionando mais, conseguia visualizar a virada da cabeça, e os olhos focados nos seus. Ela não aguentaria aquilo, então se fosse para terminar que eles terminassem assim.

Há semanas estava fazendo isso com ela. Fingindo não ouvir para não precisar dar respostas exatas. Evitando-a, inventando desculpas para não precisar a ver. Aquilo poderia estar passando despercebido por ele, mas estava matando Sarah. Enquanto subia a trilha, se aproximando da estrada, conseguindo ver de relance o carro dele, ela pensava nas palavras que poderiam sair na sua boca ao terminar. Ela não queria imaginar. Preferia sair dali o mais rapido possível.

― Sarah? ― A voz dele rompeu seus pensamentos, e ela teve que apressar o passo. ― Sarah? ― Ele continuou gritando, enquanto ela sentia ele correndo atrás dela.

Seria em vão ela sabia. Ele corria muito mais rápido. Estava acostumado com isso há anos, enquanto ela, odiava correr. E mesmo tentando fazer o seu melhor, em pouco segundos as mãos dele estavam sufocando seus braços. Ela tentou se debater, mas ele a segurava firme, não permitindo que ela avançasse. Ela queria empurrá-lo e sair correndo o mais rápido possível, mas seria impossível.

― O que? O que você quer? ― Ela disse com as lágrimas pesadas nos olhos.

― Sarah, o que tá acontecendo? ― Os olhos dele, tão inocentes, delineados, bem focados, transmitiam aquele sentimento de paz com que ela estava tão acostumada, contudo, ela ainda permanecia com raiva.

― Nada, você quer fazer o favor de me soltar? ― Ela gritou. ― Quero ir pra casa.

― Sarah, você quer, por favor, fazer o favor de conversar comigo? ― Ele pressionou os dedos mais fortes, estava machucando, as lágrimas se acumulavam nos olhos dela.

― Você está me machucando. ― Ela sussurrou, chorando mais do que o normal.

Os olhos dela se focaram nos dela, e ele não a soltou, ele só ficava ali, a encarando. Ela não estava bem com aquilo. Os dedos dele começavam a machucar sério. Os olhos dele não transmitiam aquela sensação boa. Aquela segurança. Não. Agora, eles estavam gélidos, e transmitiam terror. Mas mesmo assim, ela não se deixou abalar. Apenas olhou para ele com mais força. Engolindo o choro, e conseguindo sorrateiramente suspender a mão, e lhe dar um tapa na cara bem em cheio, para que assim, conseguisse correr.

✿ ✿ ✿

Os pensamentos de Sally estavam a corroendo, quando Cely correu até ela, e a abraçou. Subitamente, a linha de pensamentos se desfez, deixando um Sally abalada que não conseguia falar, mas sim apenas chorar.

Will tinha encontrado um amigo que tinha acabado de se tornar pai, e ficara conversando com ele. O que dera privacidade para Cely e Sally conversarem. Ela queria poder desabafar com alguém. Contar tudo que houve aquele dia, mas não conseguia. Não era a hora ainda. Ela tinha que guardar para si mesma aqueles pensamentos obscuros. O rosto maligno. As cenas que lhe embrulharam o estômago. Sufocou a bile na garganta, e saiu correndo para o banheiro, onde conseguiu vomitar tudo aquilo.

Cely a seguira, e mesmo que ela já tivesse sido aquela garota, a que esconde segredos, Will fora uma grande parte do processo. Poder contar tudo a ele, ajudara a tirar um peso de cima. Então, ela acreditava que se Sally se abrisse com ela, algo melhoraria. O único problema é que ela não sabia que Sally nunca poderia desabafar aquilo. Era pressão demais. Era tudo mais complicado do que eles imaginavam.

Os olhos de Sally estavam pesados por conta das lágrimas. Ela se agachou no box do banheiro, e se dispor a ficar ali, sozinha, mesmo que do outro lado da porta, estivesse Cely, faminta por respostas. Ela passou os dedos lentamente pelos seus braços. Conseguia sentir a pressão dos dedos dele claramente. Conseguia também sentir seus beijos, e a dificuldade de respirar naquele carro.

Ela continuara correndo dele, tão depressa, tão atormentada, que quando ele pulara em cima dela, a derrubando no chão, ela sentiu o peso do seu corpo em seu braço. Tinha certeza que tinha quebrado ou deslocado. Estava doendo demais. As lágrimas a cercavam, e drenavam ambas as dores.

Ele olhou para os olhos dela, e a ajudou a se sentar. Analisou seu braço e viu que só tinha machucado um pouco, nada muito grave, e se desculpou. Com olhos puros. Sem maldade. Pegou-a no colo, colocou-a no carro, lentamente, e de leve deu um beijo em sua testa.

Sarah ainda estava aterrorizada. Não o conhecia mais. Não sabia mais quem era aquela pessoa com quem estava dentro do carro, mas mesmo assim. Manteve seu olhar para frente. Em linha reta. Para a estrada.

― Eles me ligaram há duas semanas. ― Ele começou dizendo, fracamente, com a voz falhada. ― E eu jurei que ia conseguir guardar segredo, até a gente poder vir aqui, e passar uma noite como aquela primeira. ― A voz estava imersa em dor.

Ela mudou os olhos que acompanhavam a faixa amarela da estrada, para os olhos dele. O carro foi parando no acostamento devagar, sem deixar marcas, e isso não a assustava. Somente a deixava ressabiada, com os olhos focado nele. Em qualquer movimento que ele pudesse fazer.

― E lá, você começou a fugir de mim, me desculpa, não foi minha intenção te machucar daquele jeito, Sarah, eu nunca faria aquilo. Eu te amo demais, eu só, precisava ficar afastado porque senão eu ia contar antes da hora.

― Contar o que? ― Ela sussurrou.

― Contar que… ― Ele passou a mão nos cabelos loiros, soltou um sorriso de canto de lábio, e a focou com aqueles olhos azuis. ― Ano que vem, vai ter que me aguentar morando com você.

― Você… você, ― ela ainda estava tremendo. ― Você foi aceito?

― Sim, direito, vou poder eliminar todas as matérias deste primeiro ano. ― Ele disse, mantendo distancia, não querendo assustar.

Sarah soltou um sorriso que estava preso, o sorriso que costumava ter quando estava junto dele, e pulou para o seu colo. Os lábios dos dois se colaram em um só, e eles passaram muito tempo naquele carro, com os vidros embaçado, com a respiração inconstante, com o corpo grudado ao dele. E ficaram ali, enquanto a chuva rala cruzava o céu e a terra. Enquanto tudo. Tudo no mundo de ambos estava bem.

✿ ✿ ✿

Ela não escutava mais a voz, nem a respiração de Cely, mesmo assim, não queria sair dali. Estava protegida do mundo, mas não de seus pensamentos. Precisava de férias deles. Mas não conseguiria. Nunca. Era como ela tentando dormir, mas sempre sendo despertada pelas imagens que foram resultadas de um passado macabro. De se apegar as pessoas, e acabar sendo machucada.

Se levantou daquele chão imundo, e forçou a porta para abrir. O banheiro vazio, era quase tão mórbido quanto aquelas palavras: “Você é a próxima, morena”. Ela era a próxima fazia anos. Fugia dele fazia anos. Não achava que ele começaria a fazer aquilo com famílias de novo. Família que ela reconhecia os nomes de festas de fim de semana. Famílias que ela nem tinham ideia que ainda significavam alguma coisa na vida dele.

Pegou um pouco de sabão naquelas saboneteiras que demoram a sair, e esfregou as mãos até uma espessa camada de sabão e depois abriu a torneira, e deixou a água escorrer por suas mãos até que as gotículas de sabão escorressem pelo ralo. Passou a mão úmida nos cabelos e os soltou, fazendo um coque mal estruturado, com nada mais que seu próprio cabelo.

Os passos de Cely invadiam o banheiro silenciosamente, e os olhos de Sally não queriam a ver. Ela não se sentia segura para se deixar levar por ninguém.

― Sally, temos novidades do Noah. ― Ela disse, fracamente, como se sua voz estivesse mais firme, algo fosse romper. ― Trouxe essa muda de roupa para você tirar esse vestido, e depois a gente conversa, tudo bem?

Sally assentiu, ainda não a olhando, e pegou a roupa. Olhares dizem muito sobre sentimentos. Você pode ler em um olhar tudo o que uma pessoa está sentindo, e ela não poderia olhar. Ela saberia o que aconteceria. Saberia de respostas, sem querer destas repostas. Nem sempre a verdade é a melhor opção.

Entrou no banheiro novamente, e a colocou. Consistia numa blusa verde larga que caia no ombro, e uma calça jeans. Ficaram ambos meio largo, mas ela não ligava, fora um alivio tirar aquela poça de sangue de si, e colocar algo mais leve.

Saira do banheiro, ainda não tão pronta para receber respostar. O médico que ela vira correndo para a sala de Noah, estava conversando com Cely e Will, além de toda a família de Noah, que assentiam apreensivos a tudo que ele dizia. Ela não sabia quando eles haviam chegado, mas senta-se pior que antes, ao ver os olhos da mãe dele. Os passos dela pareciam infinitos. Parecia que ela andava numa passarela sem fim. Onde tudo ecoava em sua mente e a crucificava.

― Ei, Doutor Carvalho, essa é a Sally, é a outra amiga do Noah. ― Will disse.

― Você é a mocinha que nos ligou, não foi? ― Ele disse.

Ela assentiu levemente, tentando dar um sorriso, mas sem exito.

― Como estava dizendo para todos, Noah foi muito forte em toda a cirurgia e está pronto para receber alguém. Ele não está consciente ainda, sedamos ele, e ele não acordou ainda, mas assim que estiver avisaremos. ― Ele passou as mãos uma na outra. ― Temos a política que só a família pode entrar no quarto, mas tenho certeza que você está quase tão desesperada quanto os outros, já que foi você que presenciou toda a cena. Então, entramos em um acordo, e essa noite, você poderá passar com ele.

Sally estava olhando para o médico, e sentiu uma súbita vontade de sorrir. Soltou um suspiro breve. Aquele suspiro que estava a segurando. Sufocando-a. E envolveu Celeste em um abraço. As duas se abraçaram pesadamente, e ficaram ali, até a hora de Sally poder entrar no quarto.

Caminhar por aquele corredor parecia mais infinito, do que caminhar para o médico. Sentia o sapato estalando no chão, compassadamente com as batidas de seu coração, que aumentara muito quando ela estava parada enfrente a porta do quarto.

Ao entrar no quarto a primeira coisa que ela visualizara fora a janela que estava coberta por uma cortina, e deixava somente uma penumbra da lua lá fora. Havia um sofá meio velho, que cheirava a mofo, e uma cadeira também velha ao lado da maca. Uma minigeladeira tomava lugar perto do lixo, e ela não conseguia focar os olhos em Noah, mas, mesmo assim, o fez.

Ele estava deitado, respirando normalmente, com ajuda de aparelho já que houve complicações com o pulmão. O soro pingava aceleradamente, e o medico passara ao seu lado para diminuir aquela frequência. Ela se aproximou dele, e pegou sua mão que estava fria por causa do ar-condicionado. Os cabelos ruivos, as feições, a calma dele, só fazia ela ter vontade de beijá-lo. De pedir desculpas, por ter feito aquilo com ele. Queria que ele abrisse os olhos, cinzas, transparentes.

― Vou deixá-los a sós. ― O Doutor Carvalho disse. ― Mas antes, toda vez, que o soro acabar, você aperte este botão que está aqui em cima, tudo bem?

― Tudo bem. ― Ela usara a voz, pela primeira vez ao dia.

Os lábios dela encontram a testa de Noah, e depois ela se sentou ao seu lado, na cadeira velha, ainda segurando suas mãos. Ela soltou um suspiro bem longo, e soltou um sorriso fraco.

― Noah, preciso te contar uma coisa, e acho que esta é a maneira mais fácil de eu contar. Sei que você não vai ouvir nada, mas, mesmo assim, é a única forma que eu vou conseguir dizer. ― Ela apertou as mãos dele, e segurou as lágrimas com muita determinação.


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