Um Toque do Destino escrita por Ninna Leite


Capítulo 12
Capítulo 11




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/584223/chapter/12

   Os minutos que pareciam infinitos acabaram sendo consumidos pela nossa interação. As idiotices involuntárias de Marvel acabavam diminuindo o clima de tensão, pelo menos por alguns segundos. Madge e Cato realmente pareciam ter escolhido o momento mais importuno para resolver qualquer que fosse o problema deles.  

   Olhei vastamente para meu quarto; nunca havia o visto tão cheio, tanto de pessoas quanto de vida. Um sorriso brotou no meu rosto. Eu sabia que todo nosso plano parecia ter ido por água abaixo, mas eu não me importava; precisava aproveitar aquele pequeno momento de felicidade.

— Ei, gente. - exclamou Glimmer, se desvencilhando de Marvel atrapalhadamente. - Por que a gente não sai pra beber?

— Glimmer, você ta vendo algum clima aqui pra beber? - perguntou Marvel, sentindo prazer em debochar dela.

— É justamente isso. - exclamou ela, como se Marvel tivesse concordado com sua ideia. - A gente precisa se divertir.

   Os olhares trocados entre nós foram meio confusos de princípio; uns pareciam concordar com aquela ideia jogada ao vento.

— Eu concordo. - disse Finnick, abraçando-a. - Já que a Prim não está aqui, vamos acabar perdendo nosso tempo.

   Eu queria me divertir, desesperadamente. Tudo o que eu estava recebendo naqueles dias eram doses intermináveis de preocupação. Ainda bem que, pelo que pude concluir, tudo nos levava a uma noite de bebida e diversão.

— Tudo bem, - concordei por fim, recebendo um olhar curioso de Annie. - Pra onde nós vamos?

   Minha pergunta pareceu deixar Glimmer em êxtase, assim como Finnick. Clove sorriu para mim, como se tivesse esperando por uma oportunidade de sair conosco; talvez ela apenas tivesse desejando aquilo.

   Antes mesmo que alguém pudesse responder, um estrondo foi ouvido. Madge passou rapidamente pela porta, com uma aparência bem mais leve, acompanhada por Cato.

— Nós estamos de saída? - perguntou o loiro, timidamente.

   Johanna fitou-o enraivecida mente.

— O casalzinho já lavou a roupa suja por acaso?

   Os dois coraram; Clove olhou instintivamente para a janela.

— Nem tenta começar com as gracinhas, Johanna. - disse Madge, abraçando-a. - Hoje nós já temos alguém falando bobagens exclusivamente.

   Glimmer sorriu e pendurou os braços no pescoço de Madge.

— Já to bem. - exclamou Glimmer, bobamente. - Ta vendo? - Completou abrindo um sorriso enorme.

   O sorriso de Glimmer contagiou a todos, e por um minuto esquecemos completamente qual era o significado da vida; não que soubéssemos de fato...

— Então - começou Peeta. -, como íamos dizendo, resolvemos sair pra beber.

— Gente, só um minutinho. - pediu Annie, um tanto alto demais; ela me arrastou para perto da porta, parecendo à beira de um colapso.

— O que houve? - perguntei, preocupada.

— Katniss, eu não quero ser chata, juro. Mas você realmente acha que a gente vai passar de ano se continuar nessa?

   Não sei se foi porque estava feliz com a volta da Clove, ou se a pergunta de Annie fosse a última coisa que a imaginaria dizer, mas eu não pude conter meu riso.

— Annie, é sério que você ta preocupada com isso?

— Ué, eu sempre estive. - respondeu, abaixando a cabeça e corando de leve.

   Olhei para o quarto, apenas para garantir que ninguém estivesse prestando atenção em nós.

— Olha só, eu te garanto que a gente vai conseguir. - afirmei, puxando-a para um abraço. - A gente não pode mais se privar desses momentos, Annie.

— Eu sei... - ela havia começado a chorar.

   A cena chegou a ser cômica.

— E agora a Clove ta com a gente também...

   Ela parou para olhar para Clove, que estava aparentemente tendo uma conversa bem animada com Glimmer; ela olhou em nossa direção e sorriu. Annie acenou alegremente.

— Ta vendo? Tudo ta certo.

   Eu limpei as lágrimas silenciosas que escorriam pelo rosto de Annie, me perguntando se era realmente só aquilo que a preocupava. Ela me parecia mais tensa e mais avoada do que o normal.

— Sim, tudo certo. - concordou ela, se recompondo.

   Puxei Annie pela mão e voltamos para o centro do quarto. O clima continuava o mesmo, era até difícil acreditar que há algumas semanas atrás eu não tinha nada daquilo.

— Já decidimos. - gritou Marvel, enquanto Glimmer subia em suas costas. - Nós vamos esperar anoitecer e vamos passar no posto e levar bebidas pra praia.

— Que ideia brilhante... - comentou Peeta ironicamente. - Até parece que nunca fizemos isso antes.

   Johanna se levantou da cama e deu um tapa na cabeça de Peeta.

— Nós nunca fizemos isso antes mesmo. - afirmou ela. - Pelo menos não com as mesmas pessoas que tão aqui hoje. - completou, sorrindo para mim.

   Estava decidido, íamos sair. Logo demos conta de colocar uma música no celular de alguém para começarmos a pré. Johanna se voluntariou para ser a "mãe da festa" e garantir que todos fossem deixados em casa no final da noite. Se tudo desse errado todos dormiriam em minha casa e seguiríamos juntos para o colégio no dia seguinte.

   Glimmer tirou um cantil prateado da mochila, com um sorriso um tanto safado; ela não tardou a virar a bebida e fazer uma careta, provavelmente devido a queimação do alcool.

— Alguém aceita? - perguntou ela, com a voz falhando.

   Johanna se prontificou de tirar o objeto de suas mãos.

— Olha só, você vai ser intimada a não colocar na boca nem mais uma gota de álcool. - ameaçou ela, empurrando de leve a loira. - Hoje sou eu quem cuido de você.

— Maravilha. - Glimmer resmungou, antes de se jogar bruscamente no chão.

— Ei, Glimm... - chamou Marvel, levantando-a do chão. -, ela ta certa. Se você continuar bebendo nem vai aproveitar com a...

   Glimmer foi rápida e precisamente em direção à boca de Marvel. Não sei para quem foi um choquei maior. Marvel definitivamente não esperava por aquilo; sua expressão de incredulidade tornou o momento um pouco engraçado.

— Então talvez eu deva começar por agora mesmo. - finalizou ela, passando o dedo pelos lábios de Marvel.

— Okay... - Johanna teve coragem e força o suficiente para quebrar o gelo. -, mas continuo achando melhor você não beber.

   Glimmer se levantou, desajeitadamente, puxou Marvel pela mão e o jogou na cama. Novamente estávamos presenciando um beijo entre os dois, mas dessa vez Marvel correspondia loucamente.

— Arrumem um quarto. - gritou Johanna, pegando uma almofada e atirando em direção aos dois.

   Glimmer se desvencilhou de Marvel e pulou em cima de Johanna.

— Não sei se você percebeu, mas já estamos em um.

— Você saber disso já é um puta progresso. - observou Madge.

   Glimmer terminou com mais duas almofadas sendo jogadas em sua direção; tudo parecia compeltamente dentro do normal. A hora de saída ia se aproximando cada vez mais, e eu precisava ter certeza de que a casa estaria vazia bem antes de meu pai e Effie chegarem.

— Vamos logo, Finnick. - reclamou Johanna para o garoto que estava parado na frente do espelho, ajeitando o cabelo. - Ta parecendo uma garotinha assim.

— Não te contaram? - perguntou ele, teatralmente. - To jogando no outro time agora.

— Eu seria o primeiro a te pegar. - brincou Cato.

   Me estiquei até minha mesa de cabeceira, onde meu celular estava carregando; digitei uma mensagem para meu pai, dizendo que iria comemorar o aniversário de um amigo do colégio. Eu não gostava de mentir para ele, mas nas devidas cirusntâncias seria muito mais fácil tentar explicar depois. Ele sempre foi o tipo de pessoa que sabia de tudo da minha vida; aquilo parecia não ser mais possível.

   Nós deixamos minha casa às seis e meia. Não foi uma tarefa tão fácil, não quando Glimmer e Finnick já estavam bêbados.

— Eu sei andar sozinha. - resmungou Glimmer, enquanto Madge insistia ajudá-la a descer as escadas.

   Madge apenas a ignorou e continuou ajudando.

— E eu continuo achando que é mais divertido sair pela janela. - disse Finnick, olhando novamente para a escada, provavelmente considerando se subiria para tentar se aventurar ou não.

   Finalmente conseguimos colocar todos para fora. Tranquei a porta e olhei para o grupo, esperançosa.

— Então, vamos ou não?

   Fui acompanhada por gritos de animação. Logo em seguida sinalizei para todos fazerem silêncio; a última coisa que iríamos querer seria um monte de vizinho reclamando do braulho.

   Seguimos andando pela rua principal, à caminho do posto de gasolina que possuía uma loja bem barata para se comprar bebida álcoolica, mesmo sem identidade. Não era o certo, mas era simplesmente o que acontecia; provavelmente o maior lucro que eles obtiam com essas bebidas era devido aos jovens.

— Ei, esperem aí. - pediu Peeta, parando subtamente no meio da rua; Glimmer esbarrou nele e quase caiu no chão. - Desculpa, Glimm.

— O que foi? - perguntei, um tanto agressiva demais.

   Não havia me esquecido do episódio da última festa. Meus sentimentos em relação ao Peeta estavam extremamente confusos. Eu não sabia se confiava nele ou se aceitava logo que ele apenas queria me usar; eu já não sabia mais quem ele era de qualquer jeito.

— Calma... - pediu ele, sem perder o tom de divertimento. - Eu to vendo aqui que ta rolando um luau na praia.

— É pra lá que nós vamos. - gritou Glimmer, abraçando bruscamente Peeta.

— Nós vamos simplesmente invadir um luau alheio? - perguntou Clove, chocada.

— Óbvio. - concordou Johanna, passando a mão na cabeça da Clove.

   Parecia uma ótima ideia, afinal, o que seria melhor do que invadir uma festa e beber de graça? Peeta nos informou exatamente onde era o local, e assim seguimos.

   A brisa fria da noite fazia com que eu me arrepiasse um pouco, mas a excitação conseguia me consumir ainda mais. Nós seguimos nosso caminho, acompanhados do divertimento. As ruas que tanto conhecíamos se tornavam diferentes, a cada passo que dávamos era como se estivéssemos descobrindo um novo mundo. A cada minuto que eu passava com eles sentia que estava descobrindo um novo mundo.

   Chegamos na praia em meia hora, mas tivemos que andar um pouco para achar precisamente o local do luau. Nem sempre você tinha acesso à informação exata, principalmente quando você não era convidado para a festa. Logo nossos olhos foram invadidos pela visão de uma tenda enorme no horizonte. Uma música alta ia chegando aos nossos ouvidos, à medida em que nos aproximávamos.

— Era disso que eu tava falando. - gritou Glimmer, enquanto acelerava o passo.

   Nós seguimos correndo atrás dela, sugando ompletamente aquela energia. Johanna empurrou Peeta, num movimento rápido, e ele caiu desajeita mente na areia. Em torno de cinco minutos estávamos no meio da multidão, que dançava freneticamente. A pista de dança ficava ao lado do bar improvisado, e a fraca luz fez com que nos perdêssemos uns dos outros em questão de segundos. Segurei instintivamente a mão da Annie para que pudéssemos avançar.

— Cadê todo mundo? - perguntou ela, gritando, enquanto olhava freneticamente ao redor.

— Eu não sei. - respondi no mesmo tom, imaginando que não seria ouvida facilmente. - Vamos até o bar.

   Fui abrindo espaço, aproveitando para curtir a música durante o caminho. Os corpos suados insistiam em colar em mim, mas aquilo não me incomodava tanto. Continuei me colocando nas pontas do pé, enquanto esticava meu pescoço para analisar melhor o espaço. Avistei de relance duas pessoas familiares, encostadas no balcão, que pareciam estar discutindo vorazmente com o barman. Eram Peeta e Finnick. Apertei o passo e fui em direção aos dois. Definitivamente andar na areia era um saco.

— O que houve? - perguntou Annie, quando os alcançamos.

   Eles se viraram para nós, respirando pesadamente.

— Vocês acreditam que o open bar é só pra mulher? - indagou Finnick, chocado.

— Isso é bem normal, né... - comentei, rindo da expressão de incredulidade dele.

— Mas eu quero beber. - resmungou Finnick, batendo com o punho na estrutura de ferro.

   Olhei para trás, na esperança de achar alguém mais adequado para o que tinha em mente. Me coloquei novamente nas pontas dos pés na tentativa de ter uma visão mais ampla, mas não obtive sucesso; teria que usar a Annie mesmo.

— Vem comigo. - Puxei Annie pelo braço e a carreguei até o outro lado do balcão.

   Havia dois caras, um pouco bonitos, abrindo as latas de skol beats que estavam submersas no gelo, em um recipiente de isopôr. Eles eram bastantes ágeis com os movimentos. Me fez imaginar se seriam ágeis com outras coisas também. Expulsei aquele pensamento da cabeça e me aproximei euforicamente deles. Annie apertou minha mão, como se quisesse voltar.

— Pode me ver quatro, por favor? - pedi ao cara mais alto, de cabelos ruivos.

   Ele me olhou de cima a baixo e deu um sorriso.

— Pra você posso ver muito mais. - respondeu ele, piscando o olho. - Qualquer coisa me procura aqui atrás do balcão. - completou ele, me entregando as quatro latas.

   Parece que uma chama se ascendeu em mim ao ouvir aquela frase. Fazia muito tempo que não me sentia desejada por uma pessoa completamente aleatória. Aquele elogio caiu bem no momento.

— Vamos, Kat. - chamou-me Annie, que permanecia olhando para um garoto com olhar de repreensão.

   Dei um gole longo na bebida, sentindo imediatamente uma quentura tomar conta do meu corpo. Olhei ao redor, tentando me situar. Estávamos no meio da pista de dança novamente, sendo que nossa única missão era levar as bebidas para Finnick e Peeta, que estavam basicamente ao nosso lado antes de eu ter partido rumo ao nada.

— Por aqui, Kat. - disse Annie, me puxando pela mão.

   Eu havia tomado a pior decisão possível: deixara Annie guiar a gente. Parecia que estávamos perdidas, e o álcool, que antes pertenceria a nós quatro, fora inteiramente consumido por mim. Com o passar do tempo, e após ter visto três expressões diferentes de desespero da Annie, decidi que devíamos nos divertir, independente de estarmos perdidas.

— Ah, Annie, eu quero dançar. - exclamei, agitadamente, enquanto jogava meus braços pro alto e tentava, falhada mente, entrar no ritmo da música.

   Ela deu mais uma olhada pela festa, bufou e concordou com a cabeça.

— Tudo bem. - concordou ela, começando a mexer o corpo de uma maneira mais suave.

   Eu não ligava se os meus sapatos estavam completamente inundados de areia, ou se eu estava dançando de uma maneira ridícula; estava me divertindo, e era isso que importava. Continuamos assim, ao som de "Stay High", "The Hum", "How We Party", e outras músicas eletrônicas.

— Katniss. - Ouvi meu nome ser gritado ao longe; tentei recuperar os sentidos para achar de onde estavam me chamando.

   Avistei Madge ao longe, cambaleando enquanto tentava passar pelas pessoas. Seu rosto estava levemente corado e seus cabelos, que antes estavam arrumados, pareciam ter acabado de sair de uma batalha grega. Numa fração de segundos um garoto tentou agarrá-la à força, mas, antes mesmo que meu cérebro processasse o que estava acontecendo, ela se livrou, jogando cerveja na cabeça dele.

— E é assim que se livra de um babaca. - exclamei, abraçando-a.

   Ela correspondeu, exageradamente; Annie devia ser a única pessoa sóbria naquele ambiente. Nós saímos do fervo e seguimos para um canto isolado daquela área; bom, nem tanto. Era impossível achar um lugar pacífico, sem nenhum casal se comendo na areia; acabamos ficando perto de um casal mais comportado.

— Gente, eu não to me sentindo muito bem. - disse Madge, se apoiando em suas pernas, se jogando no chão logo em seguida.

— O que houve? - perguntou Annie assustada, se ajoelhando para tentar sustentar Madge. 

   Ela parecia estar com a visão desfocada; estendeu o braço num movimento rápido, como se tentasse agarrar alguma coisa, e se pôs a rir logo em seguida. Se eu não estivesse tão bêbada, acharia a situação um pouco desesperadora.

— Eu não sei... - respondeu ela, enquanto tentava se levantar.

   Annie me lançou o quarto olhar diferente de preocupação da noite, e apenas se jogou na areia ao lado de Madge; resolvi fazer o mesmo. Passei meus braços por cima dos ombros de Madge, que repetiu o movimento em Annie. Ficamos ali por minutos, sentindo a brisa da maré invadir nossos pulmões. O céu estava repleto de estrelas naquela noite.

— Hey. Achei vocês. - gritou Glimmer, há uns metros de distância; ela estava acompanhada de Johanna, que mantinha um olhar de poucos amigos.

— Hey. - gritei quando meu cérebro associou do que se tratava.

   Elas pareciam mais acabadas do que a gente, e foi então que eu decidi pegar o celular para ver há quanto tempo estávamos por lá. O relógio marcava 1:40. Arregalei meus olhos e olhei para a Annie, apenas para ter certeza de que ela continuava ao meu lado.

— Vai dar duas horas da manhã. - exclamei, me ponde de pé em um pulo.

— E a noite ta só começando. - esbravejou Glimmer, dando uma estrela na areia; seu nível alcoolico fez com que ela caísse de bunda.

— A gente ta esse tempo todo aqui?  - perguntei para Johanna, que acabara de levantar Glimmer.

— Claro né. Afinal, por onde você esteve? - perguntou ela, provavelmente sem imaginar que estava grudada na Annie esse tempo todo.

— Eu...

   Tentei começar minha frase, mas numa fração de segundos me atentei a uma coisa; uma coisa que não poderia ter esquecido de maneira alguma.

— Onde está a Clove? - perguntei, olhando em direção ao chão, girando 360 graus; Johanna pareceu ficar confusa com a minha atitude.

— Você não soube? - perguntou ela; meu coração pareceu gelar por um segundo. - Ela ta pegando o Cato. - completou.

   Era como se alguém tivesse me dito que um elefante cor de rosa estava sendo abduzido por um OVNI. Pude imaginar a felicidade que Clove devia estar sentindo no momento. Olhei para Annie de relance, que mantinha a boca aberta, e comecei a sorrir.

— Quer dizer que até a Clove desencalha e você nada, né Joh? - indagou Glimmer.

— O que posso fazer se eu sou da vida? - retrucou Johanna; numa fração de segundos ela puxou Glimmer pelo braço, e tentava levá-la até o mar há qualquer custo.

   Annie se levantou e começou a protestar, dizendo que Glimmer podia acabar se afogando. Ah como era bom ter amigos responsáveis; pelo menos me sentia assim quando passava do limite da bebida. Não tardou para Annie ir atrás das duas, tentando de toda forma possível acabar com aquele desastre em potencial.

   Eu permaneci sentada ao lado de Madge, apenas me divertindo ao contemplar de longe aquela cena. Talvez eu tivesse tão perdida em meus pensamentos que não pude perceber o silêncio absurdo que se instalara em um momento que não deveria. Fui despertada alguns minutos depois, quando Johanna chegou, após ter largado Glimmer nos cuidados de Annie.

— O que houve? - perguntou ela, preocupada, se ajoelhando de frente para Madge.

   Foi então que eu olhei para o lado e percebi que Madge estava chorando; seus olhos estavam completamente inchados e perdidos. Johanna olhou para mim, como se buscasse uma explicação. Ela soube que não obteria uma resposta quando eu mantive o olhar fixo nela, sem deixar palavra alguma sair.

— Não foi nada. - respondeu Madge, passando a mão pelo rosto, na tentativa de disfarçar seu estado.

— Ei, Mads, olha com quem você ta falando. - disse Johanna, levantando seu queixo. - Confia em mim... O que houve?

   Senti um incômodo enorme ao ouvir os soluços silenciosos de Madge. Me senti culpada por não tê-la ouvido antes. Estávamos só nós duas sentadas, lado a lado, e eu não a escutei; talvez ela quisesse conversar comigo, e a única coisa que pude fazer foi deixá-la se sentir invisível.

— Madge, olha... - Levei minha mão à testa, tentando encontrar palavras para começar.

— Gente, ta tudo certo. - interrompeu ela, se levantando. - Eu só bebi demais.

   Johanna se apoiou nos joelhos para se levantar também. Copiei seu movimento e tirei a areia que grudara em meu short. Madge apertou o passo em direção à festa. Nós tentávamos acompanhá-la, pedindo para que ela ficasse e conversasse, mas a loira não dava ouvidos. O som da música já começava a invadir nossos ouvidos novamente, quando Johanna tomou a frente da situação e segurou bruscamente Madge pelo braço esquerdo; a força fez com que ela perdesse o equilíbrio e quase caísse no chão.

— Me solta. - gritou Madge, impulsivamente, como se desconhecesse Johanna.

— Só quando você me falar o que houve! - retrucou Johanna com um grito.

   Na altura do campeonato, todo álcool, que uma hora estivera presente no meu organismo, havia desaparecido. Era como se eu tivesse acabado de ser despertada com um balde de água fria. Johanna olhava de mim para Madge, com a sobrancelha franzida, como se esperasse algum apoio da minha parte.

— Mads, senta aqui. - pedi, enquanto ia calmamente em sua direção. Eu não sabia o que fazer.

   Ela permanecia tentando soltar seu braço do aperto de Johanna. Seus cabelos a impediam de me enxergar, mas continuei indo em sua direção e pedindo calma. Toquei levemente em seu ombro, o que fez com que ela parasse de se debater. Seus olhos encontraram os meus numa fração de segundos, e foi suficiente para que Johanna soltasse seu braço; Madge deixou o peso de seu corpo levá-la até o chão.

   Olhei para Johanna novamente, mas seus olhos me diziam o que eu já sabia que deveria fazer. Nós duas sentamos ao lado de Madge, num movimento quase simultâneo. Ela havia abraçado as pernas e enterrado sua cabeça entre elas. Só conseguíamos ouvir um pequeno barulho que indicava que ela estava chorando. Parei um segundo para contemplar as estrelas, pedindo mentalmente que elas me dessem força. As vezes fazia isso; parava para observar algo criado pela natureza, na esperança de me lembrar o quanto o universo é enorme e o quanto meus problemas são pequenos quando comparados a ele.

— Você sabe que pode conversar com a gente, não é? - ouvi a voz de Johanna em baixo tom.

   Madge apenas olhou para ela e assentiu com a cabeça.

— Não precisa falar agora. - completei, olhando para o horizonte. - Mas a gente vai continuar aqui do seu lado.

   Ela voltou a chorar compulsivamente; nós a acolhemos em um abraço. Olhava constantemente para os lados; a festa parecia ter perdido a importância para nós. Eu pensava frequentemente no motivo de todos estarem aparentemente com problemas, e parecia que ninguém de fato sabia sobre a vida do outro. Com o passar do tempo Madge deitou no colo de Johanna e adormeceu.

— Não me olha assim. - pediu Johanna, quando me viu encarando-a levemente. - Eu não faço ideia do que ta acontecendo. - completou ela, enquanto fazia cafuné na cabeça da loira.

   Eu fiquei alguns minutos em silêncio, reunindo coragem para falar com Johanna; queria saber se eles confiavam mesmo em mim e Annie, se de repente não confiavam o suficiente em nós para contar tudo. Eram devaneios de uma mente alcoolizada, mas na hora não pude perceber isso.

— Olha só... - ia começando, antes de ser interrompida por um grito.

   Annie estava gritando desesperadamente meu nome; pude ouvir a voz de Glimmer se juntar à dela. Um arrepio percorreu meu corpo, da ponta dos pés até meu umbigo. Levantei rapidamente, assim como Johanna, o que ocasionou no despertar de Madge. Minhas pernas demoraram a se fixar na areia; cambaleei um pouco. Pensei que devia somente ter passado muito tempo sentada, e resolvi me despreocupar e focar no que me interessava no momento.

   Pude ver as duas apontando para mim ao longe, porém, não estavam sozinhas. Annie sustentava um outro corpo em seus braços; um corpo que parecia estar frágil demais para se locomover sozinho. Apertei os olhos na tentativa de enxergar quem estava sendo carregada.

— Achamos ela. - gritou Annie, enquanto balançava o braço esquerdo desajeitada mente.

— Já está de manhã? - perguntou Madge, esfregando as mãos na cabeça.

   Ignorei a pergunta de Madge e resolvi ir em direção às três pessoas que, catastrófica mente, tentavam chegar até nós. Johanna me acompanhou, e Madge nos seguiu. Nessa altura o som da festa já havia quase sumido da minha mente; eu sabia que ele estava lá, mas ele não era mais capaz de me atingir.

   Conseguia enxergar melhor. Ao verem que estávamos nos aproximando as garotas desistiram e pararam para nos esperar. Meu coração acelerava na medida em que me aproximava delas; eu sentia que algo estava errado. Do jeito que aquela noite andava, era até de se esperar. Bastou meus olhos encontrarem uma enorme quantidade de cabelo loiro para meu cérebro processar que a garota caída nos braços de Annie era Prim. Eu corri até elas. O peso da areia não importava mais; alcancei-as rapidamente.

— O que houve? - perguntei, me abaixando para levantar a cabeça de Prim.

   Annie olhou desesperada para Glimmer, que mantinha uma expressão de preocupação no lugar do seu costumeiro sorriso.

— Fala logo. - berrei, abaixando a cabeça num movimento rápido. - Foi mal... - murmurei em seguida, passando as mãos no rosto.

— A gente tava na água. - começou ela, logo após Johanna e Madge terem se juntado a nós.

   Annie murmurou algo.

— O que foi? - perguntou Glimmer, perdendo completamente o foco no assunto.

— Eu tava tentando tirar você da água. - corrigiu Annie. Pela sua expressão ela parecia envergonhada por ter interrompido. - Continua. - sinalizou ela.

   Glimmer fez uma pausa e olhou para Annie com um olhar indignado, sacudiu a cabeça e voltou a falar.

— Então, a gente tava na água quando a Prim apareceu do nada. - continuou, parecendo cansada. - A gente nem sabia que era a Prim no início; foi a Annie que reconheceu. Daí a gente começou a gritar o nome dela...

   Eu fui até a areia e me sentei. Segurei Prim em meus braços e retirei seus cabelos dos olhos. Abracei-a fortemente. Me  matava saber que a Prim estava mal; me matava saber que eu não conseguia ajudá-la. Era como se eu tivesse uma necessidade de protegê-la, de abraçá-la para sempre.

— Daí ela se jogou no mar do nada. - interrompeu Annie, como se tivesse esperado para me contar aquilo. - A gente ficou esperando e ela não aparecia.

— Foi quando eu disse pra Annie correr até ela. Nadar, no caso.

   Annie olhou para Prim, que continuava em meus braços.

— Conseguimos tirar ela de lá, mas do nada ela começou a berrar. quando voltamos para a areia ela deitou e dormiu.

— Ela ta completamente chapada. - acrescentou Glimmer. - Eu não sei o que é, só sei que ta.

   O olhar de incredulidade reinava no rosto de Johanna. Ela gritava palavras soltas, de grande maioria ofensivas. Eu permanecia em estado de choque; era como se minha mente tivesse atordoada. Me encontrava sem vontade de levantar; sem vontade de largar a Prim.

— Chega dessa palhaçada. - berrou Johanna. A princípio achei que ela de alguma maneira me atacaria, mas minha teoria foi derrubada ao vê-la tirar Prim de meus braços.

— O que você ta fazendo? Ta maluca? - perguntei, em mesmo tom.

— Tentando acordar essa garota. - retrucou ela, enquanto sacudia Prim bruscamente.

   Prim abriu os olhos antes mesmo que eu pudesse protestar. Era como se ela tivesse acabado de acordar de um coma. Olhou lentamente para todos, aparentando estar muito confusa.  

— Cadê a festa? - perguntou ela, prontamente.

   Não sabia se sentia alívio por ver que ela não teria problemas graves ou se ficava abismada pela percepção de prioridades dela. O vento gelado da noite voltou a incomodar meu rosto e o cheiro da maresia começava a me irritar.

— Sua idiota. - berrou Johanna, empurrando a loira no chão, que a contemplou com um olhar de incredulidade. - Vou te mostrar onde ta a festa... - resmungou ela, saindo as costas enquanto seguia em direção ao show de luzes.

   Olhei para Prim por alguns segundos; ela virou o rosto para outra direção quando percebeu.

— É melhor a gente ir atrás da Johanna. - sugeriu Madge, olhando para Glimmer.

— Eu vou com vocês. - anunciou Prim, enquanto tentava encontrar forças para se levantar; ela tirou a areia do corpo e esboçou um sorriso bobo no rosto.

   Só conseguia olhar incredulamente para ela. A cabeça de Prim era um mistério para mim. Não sabia o que ela estava sentindo, ou porque agia daquela maneira, muito menos pelo que ela passava para manter aquela postura.

   Não sei se ela achou que eu tentaria impedi-la, talvez fosse até mesmo o que ela queria, somente me irritar. Annie mantinha seus olhos fixos em mim, esperando meu próximo movimento. Me levantei sem ao menos encostar as mãos no chão.

   Minha cabeça já estava repleta de problemas novamente; não conseguia deixar de pensar em teorias que explicassem o comportamento incomum de Madge. Não tinha mais o interesse de tentar novamente cuidar de Prim sem obter nenhum retorno.

— Vamos todas então. - sugeri, mais como uma ordem, pois em seguida saí andando, sem ao menos esperar pela Annie.

   Não tardou para que o som dos passos desleixados arrastando na areia chegassem aos meus ouvidos. Annie acelerou e me alcançou. Ela segurou minha mão; sorri para ela e continuamos seguindo até o que sobrara da festa.

   Prim e Glimmer começaram a fazer um estardalhaço atrás de nós. A batida de "abusadamente" já podia ser ouvida, o que fez com que as duas malucas que ainda encontravam energia às três da manhã saíssem correndo e nos ultrapassassem. Olhei para trás e percebi que Madge estava andando mais rápido para nos alcançar; apertei a mão de Annie, que me olhou, confusa, e esperei por ela.

— Não ta no pique das malucas ainda? - perguntei, tentando mudar o clima.

— Talvez daqui uns dez minutos. - respondeu ela, sorrindo fracamente. Era óbvio que ela tentaria melhorar; conhecia Madge há mais tempo do que qualquer um, apesar de ter esquecido na época.

   Já havíamos perdido Prim e Glimmer de vista, mais aquilo não me preocupava mais. Fomos nos intrometendo naquele mar de gente, mais especificamente naquele mar de mulher rebolando a bunda no chão, apesar de ser uma atividade extremamente difícil de ser executada na areia. Olhei ao redor na esperança de achar Clove; minha vontade era pegar ela e Annie pelo braço e deixar aquele lugar. A luz fraca não me permitia enxergar muito. Continuei segurando na mão de Annie, que por sua vez segurava na de Madge. Dava para perceber que já não havia nenhum jovem sóbrio restando para contar sua história, talvez não lembrem nem dos próprios nomes.

   Estava abrindo caminho entre a multidão, quando esbarrei em uma pessoa um tanto conhecida. Seus cabelos ruivos caíam nos olhos por causa do suor; mas era algo que o deixava extremamente sexy. Ele percebeu minha presença e sorriu.

— Hey, achei que tinha ido embora. - gritou ele, perto do meu ouvido.

— Olha quem fala... - falei no mesmo tom. - Se eu tivesse ido atrás do balcão te procurar me sentiria enganada.

   Ele pareceu pensar um pouco, talvez para me dar uma resposta que me fizesse sentir aquele tesão absurdo.

— A gente se encontraria em qualquer lugar. - disse ele, desta vez com um tom mais suave. - O destino faz isso as vezes...

   Eu estava me sentindo completamente desejada. Não queria saber de Peeta, ou pensar se podia confiar nele ou não. Só queria sentir a boca daquele garoto roçar na minha; a experiência seria muito mais interessante para mim se estivesse bêbada, mas, como não era minha realidade, teria que aproveitar da maneira que podia.

— Então vamos ver como o destino lida com isso. - disse, soltando a mão de Annie e levando-a até a nuca rígida dele.

   Seu beijo foi um dos melhores que experimentei, pelo menos dos que eu me lembre. Suas mãos deslizavam rapidamente por debaixo da minha blusa; meu corpo se arrepiou por inteiro. Minha vontade era de levá-lo para o canto mais isolado da praia e dar pra ele até o amanhecer.

   Annie chamou meu nome pelo menos umas três vezes, mas eu não queria dar ouvidos. Não entendia porque eu sempre devia fazer o que era esperado pelos outros; naquele momento só queria ter uma breve sensação de liberdade. Alguns segundos depois vi que Madge e Annie haviam sumido. Ele parou de me beijar, apoiou a mochila na areia e tirou de lá uma garrafa de tequila.

— Nunca diga que não te dei algo. - gritou ele, levantando a garrafa.

— Não acredito. - exclamei, com os olhos brilhando de felicidade; ficar bêbada novamente era o que eu mais queria.

   Me ajoelhei, rapidamente, e deixei que ele virasse aquele líquido ardente na minha garganta. Era a melhor sensação possível. Eu não era tão adepta a cerveja, sempre preferi os destilados, mas não significava que eu fosse forte para isso. Passaram-se dez minutos e lá estava eu, o desequilíbrio em pessoa.

— O que você acha de sair um pouco daqui? - perguntou ele, entre beijos, com a respiração ofegante, enquanto sustentava as mãos entrelaçadas na minha bunda.

   Assenti com um sorriso, e ele me guiou por entre as pessoas. Não encontrei nenhum rosto familiar pelo caminho, pelo menos nenhum que eu pudesse distinguir, devido à quantidade absurda de álcool que havia se instalado repentinamente no meu organismo. Encontramos um canto um pouco isolado, perto da festa mesmo. Eu só queria tirar a roupa e sentir o que ele tinha pra me oferecer naquele momento. Era como se eu estivesse desesperada por aquilo, desesperada para provar para mim mesma que eu poderia conseguir alguém muito melhor que o Peeta.

— Ta tudo bem? - perguntou ele após ter deitado seu corpo sobre o meu.

   Assenti levemente com a cabeça. Não sei porque, mas meu corpo começou a tremer. Tentei me convencer de que era somente o frio, e não o nervoso por estar prestes a transar com um cara que mal conhecia. Afastei aquele pensamento da minha cabeça e voltei meu foco para seus beijos. Estava tudo perfeito, mas por um momento o empurrei involuntariamente.

— O que foi? Não quer mais? - perguntou ele, enquanto acariciava meu rosto.

   Parei para pensar; É claro que está tudo bem. Confirmei com a cabeça e voltei a beijá-lo em seguida. Ele sorriu. Continuamos com os movimentos, até que o calor foi aumentando e a necessidade de tirar a roupa também.

— Katniss. - ouvi meu nome sendo gritado de longe.

   Levantei rapidamente, deixando o cara que me acompanhava confuso. Cerrei os olhos para analisar melhor quem estava a minha espera, e tudo que pude processar foi o Peeta parado ao longe, de braços cruzados.

— O pessoal tava te procurando. - informou ele, com a cara amarrada. - Temos que ir.

   Tentei raciocinar por um segundo. Olhei de Peeta para o cara incrível que havia acabado de conhecer. Meus instintos fizeram com que eu lembrasse que teria aula no dia seguinte, e que mal ou bem eu era uma pessoa responsável. Me abaixei e dei um último beijo no garoto, enfiando minha mão no bolso traseiro de sua calça.

— Posso deixar meu número? - perguntei, após ter pego seu celular.

   Ele apenas sorriu, desbloqueou o telefone e me devolveu para que eu anotasse. Me levantei singelamente e fui ao encontro de Peeta, que fez questão de não olhar em meus olhos. Por um instante pensei que no fundo eu não tinha significado nada para aquele cara, que havia sido somente mais uma qualquer perdida na noite; mas ouvi sua voz ao longe, em sgeuida.

— Nem pense em me esquecer. - gritou ele.

   Apenas olhei para trás e esbocei um sorriso.

   O resto do caminho foi uma mistura de sentimentos. Peeta permitiu que eu me apoiasse nele, talvez porque ele concluiu que era a única maneira de me tirar de lá. Eu não ligava para o modo que ele me olhava; pensava que ele merecia. Continuei andando, na esperança de chegar logo até onde o resto do pessoal estava nos esperando. Foi um alívio ver a imagem de meus amigos bêbados, sentados no quiosque perto do posto 2 da nossa pequena praia. Era um local bem tranquilo e verde, relativamente perto de onde estava rolando a festa. Para falar a verdade eu não sabia dizer se a algazarra, a qual não havíamos sido convidados, ainda rolava ou não.

— Katniss! - berrou Glimmer ao me ver.

   Marvel a segurou em um movimento rápido; ele parecia cansado daquela situação.

— Posso saber onde a senhorita estava que ninguém te encontrou? - perguntou Johanna, assim que nos aproximamos.

— Segredo... - surrurrei, me afastando de Peeta bruscamente, que somente revirou os olhos. - E o que aconteceu com essa daí?

   Prim estava deitada em um banco, com o rosto sendo completamente coberto pelos seus fios loiros acastanhados.

— Ela falou que tava cansada demais e apagou. - respondeu Finnick, bufando.

   Uma grande quantidade de pessoas passava por nós, com frequencia, na medida em que iam deixando a festa. Peguei meu celular para checar as horas, mas apenas obtive a surpresa de ver que ele precisava urgentemente de um carregador para poder voltar a vida, da mesma maneira que eu precisava dormir para voltar a raciocinar bem. 

— Ei... - chamei Marvel, que parecia a única pessoa sóbria naquele momento. -, que horas são?

   Não sabia por qual motivo ele estava me olhando com uma cara abobalhada. Talvez eu esteja bêbada demais, pensei. Ele pareceu notar.

— Ah, desculpa. - pediu ele, abaixando o olhar enquanto corava. - É só que o seu batom ta mó borrado.

   Eu abri a boca nitidamente, pensando no que iria responder. Aquela pergunta foi tão inocente, mas tão necessária para criar a relação de amizade mais verdadeira como a que tenho com o Marvel. Fui interrmopida antes mesmo de pensar em uma mentira absurda, afinal, não queria que o lance que tive com aquele cara fosse rodando de boca em boca; principalmente na boca dos meus amigos bêbados. Gloss estava passando, com um grupo de duas mulheres e alguns caras fortões que costumo ver no colégio quando uso meu tempo vazio para analisar as pessoas.

   Ele nos encarou furtivamente, voltou sua atenção para seus amigos e sorriu.

— Já vai tarde. - resmungou Finnick, após Gloss ter dado alguns passos. Ele talvez não contasse com o fato de que o loiro brutamontes iria escutar.

— Disse alguma coisa, seu merda? - perguntou Gloss, recuando em nossa direção, sendo seguido pelo seu bonde.

   Finnick se levantou, tendo o apoio de Cato e Peeta; esse ato fez com que Gloss perdesse um pouco da postura. Ela ia falar algo, talvez até mesmo começar uma discussão, visto que não estava sóbrio, mas o pior aconteceu; seus olhos foram direto para o banco em que Prim estava.

— O que aconteceu? - perguntou ele, acalmando o tom de voz.

— Nada que te interesse. - uma voz surgiu de longe, e todos olhamos em direção a ela; era Rory, parado perto de um menino que parecia ter a idade dele.

   Rory caminhou até nós, e eu pude ver a expressão de ódio tomar conta do rosto de Gloss gradativamente; era como se eles fossem arquinimgos, como se o destino de um fosse acabar com o outro, assim como Harry e Voldemort, um não poderá viver enquanto o outro estiver vivo.

— A culpa é sua. - gritou Gloss, enquanto Rory se aproximava. - Você que fica enchendo a cabeça dela de merda.

   Rory parecia tentar manter a calma. Ele olhou singilamente para Prim.

— Eu só tento proteger ela de você. - retrucou ele, dando um empurrão no peito de Gloss, que muito mal se mexeu.

— Encosta em mim de novo e juro que acabo com você. - disse Gloss, ameaçadoramente.

   Peeta e Finnick trocaram olhares, como se não soubessem se era melhor interver logo ou não. Cato apenas se sentou novamente. Já eu não entendia muito bem aquela história. Não sabia se realmente Rory fazia mal à Prim ou não, muito menos qual era a relação dela com Gloss; só sabia que estava cansada daquela situação, e que tinha que intervir de alguma forma.

— Eu não tenho medo de você. - gritou Rory, mudando seu estado aleatóriamente. - A Prim tem medo, mas eu não tenho. Se dependesse de mim você nem estaria mais aqui.

   Foi o suficiente para Gloss agarrar Rory pelo pescoço e derrubá-lo no chão. Todos se levantaram de imediato. A confusão fez com que Prim despertasse rapidamente; seus olhos circulavam pelo ambiente com a urgencia de quem queria entender o que estava acontecendo. Os parafusos de seu cérebr foram se ajustando e ela associou que eram Gloss e Rory quase se matando no chão do calçadão.

— O que vocês tão fazendo? - berrou ela, se jogando na direção dos dois, na tentativa falha de apartar a briga.

   Seus movimentos eram inúteis, pois nada parecia impedir a ira dos dois que sempre tiveram vontade de fazer o que mais queriam. Eu estava congelada, assim como meus amigos. Não havia uma alma sóbria naquele local, e talvez esse tenha sido o fator para deixar a situação se agravar. Prim puxou Gloss pelo braço, temendo que o rosto de Rory pudesse ficar em pior estado; o garoto tinha a testa cortada, provavelmtente pelo anel que Gloss usava no dedo indicador, e sangue escorrendo pelo nariz.

— Gloss me escuta. - implorou Prim; o movimento fez com que Gloss cessasse a agressão e olhasse para ela, mas não sem antes dar um último chute no abdome de Rory, que gemeu de dor.

— É com esse merda que você quer ficar? - gritou Gloss. - Com um moleque que não aguenta uma surra?

   Prim não tinha palavras; sua boca abria levemente e fechava na medida em que olhava de Gloss para Rory. Ninguém imaginou que a noite poderia terminar daquele jeito; num completo desastre. Glimmer continuava animada, e parecia achar graça na situação.

— Tudo pra você se resume a isso né? - Rory se levantou, cuspindo uma leve dose de sangue no chão. - Ou você acha que eu não sei que você bate nela? Seu covarde de merda.

   Dizem que o mundo não para de funcionar só por sua causa. Você pode estar no seu pior momento, mas as coisas lá fora continuam funcionando normalmente; minha mãe costumava me falar isso. Eu sempre aceitei esse pensamento como uma verdade, afinal de contas, fazia total e completa lógica. Mas naquele momento eu pude comprovar que estava errada. O mundo parou; não só para mim, mas para todos que estavam à minha volta também. Um zunido tomou conta de meu ouvido, acompanhado de um nó no estômago. Era como se tudo tivesse em câmera lenta. Pude ver Johanna tirando bruscamente os braços de Glosso do ombro de Prim, enquando a loira gritava com Rory algo parecido com almejo; pode ter sido odeio, não sei precisamente.

 Eu pus meus pés para funcionar e fui lentamente em direção à Prim. Ela estava virada para Rory quando encostei em sua mão esquerda. Seu olhar encontrou o meu de uma maneira que nunca havia acontecido. Era como se a gente pudesse se conectar imediatamente por ele. Eu consegui criar forças para ainda formular uma frase.

— É verdade?

   Ela confirmou levemente com a cabeça. Meus braços perderam a força e acabei soltando sua mão involuntariamente. Lágrimas começaram a se formar nos olhos de Prim, mas, assim que percebeu, ela deu um jeito de segurá-las. Meu foco foi para Gloss; ele estava parado, discutindo com Finnick. Percebi que uma zona havia se instaurado. Alguns amigos de Gloss se aproximaram, enquanto Rory, Peeta e Cato tentavam comprar briga com eles. De repente Gloss deu uma cabeçada em Finnick, que caiu no chão.

— Foda-se o que vocês pensam. - gritou Gloss. - Não é como se ela fosse a santa da história. Anda, fala pra eles que a culpa é sua também. - ele foi em direção à Prim e a segurou pelo braço.

— Me solta porra. - gritava Prim, enquanto batia no antebraço de Gloss.

   Peete ineterveu a situação, empurrando Gloss fortemente.

— Ela mandou soltar. - disse Peeta ameaçadoramente.

   Os dois se encararam por alguns segundos, enquanto nós observávamos. Johanna se juntou à Peeta e segurou na mão de Prim.

— Tudo bem. - disse Gloss por final. - Eu já tava indo mesmo.

   Ele acenou com a cabeça e seus amigos o seguiram. Entretanto isso não deixou o clima mais tranquilo. Rory se jogou no chão e permaneceu sentado. Todos estavam em choque. Eu olhava para Prim e não conseguia imaginá-la passando por isso. O que eu mais desejava era entendê-la. Entender porque ela estava com o Gloss, porque não havia contado para ninguém, ou porque ela permanecia calada.

— Prim... - chamei, sem saber muito bem o que falaria em seguida.

   Ela me encarou com uma expressão indecifrável.

— Podem falar. - gritou ela, de repente, se pondo de pé. - Falem que eu sou uma estúpida. Que tudo isso é culpa minha e que eu só to nessa situação porque quero.

   Ela explodiu em questão de segundos; sua expressão agora definia muito bem o que ela devia estar sentindo; raiva, insegurança e exaustão.

— Se acalma... - pediu Annie tocando no braço de Prim; ela recuou com um movimento brusco.

— É isso o que todo mundo fala. - continuou esbravejando. - Não vai ser diferente com vocês.

— Você acha que a gente é tão estúpido assim? - perguntou Marvel, se pronunciando pela primeira vez desde a chegada de Gloss. 

   Prim pareceu se acalmar por um momento, até que seu olhar recaiu sob o de Clove.

— O que ela ta fazendo aqui? - perguntou Prim com urgência.

— Eu...

   Clove ficou em choque; não sabia o que fazer. Quando nos reunimos para discutir qual seria o problema de Prim foi diferente, eram especulações; ninguém estava preparado para encarar a realidade.

   Prim começou a gritar desenfreadamente; era uma reação que ninguém esperava, portanto não sabíamos o que fazer. A raiva ia crescendo dentro de mim na medida em que eu imaginava aquele homem encostando a mão nela.

— Vai falar disso pra todo mundo, não é? Bem a sua cara mesmo. Mas quer saber, foda-se. Eu não preciso disso. Eu não preciso de ninguém.

— Para com essa porra. - gritou Johanna enquanto se aproximava de Prim. - Por que você é tão idiota? Eu sempre te falei pra largar esse cara e você nunca me escutou.

   Aquilo pareceu atingir Prim por determinado tempo; mas sua ira voltou rapidamente, como se ela tivesse apenas esperando um momento para explodir.

— Você tem que entender que não manda em mim. Eu não falei nada porque eu não preciso de vocês. Eu posso me virar muito bem sozinha e eu quero que vocês sumam logo da porra da minha vida, ou eu juro que...

   Sua frase foi interrompida por mim. Quando me dei conta já havia posto minhas pernas para funcionarem, o que acarretou no nosso encontro. Eu abracei Prim fortemente antes que ela pudesse falar mais besteira. No momento em que sua cabeça encontou em meu ombro eu senti o peso que ela carregava. Suas lágrimas corriam com urgência e os sons que o sofrimento dela emitiam fez com que eu desabasse também. Em questão de segundos eu também estava chorando; pela dor dela, pela falta de noção do destino em não ter me colocado na vida dela antes que essa merda toda acontecesse, e principalmente por saber, no fundo do meu coração, que eu nada poderia faazer para tirar aquela dor de dentro dela.

— Vamos pra casa. - sussurei, afagando seus fios loiros por entre meus deddos.

   Ela concordou, balançando levemente a cabeça.

— To chamando o uber. - avisou Annie.

   Nós ficamos esperando sentados no meio fio, perto de um quiosque. Annie, Prim e eu voltaríamos de uber para casa e o resto do pessoal voltaria a pé; eles iriam dormir no Peeta, por ser mais próximo de onde estávamos. Quando o carro chegou, Johanna foi se despedir novamente de mim, e pediu que eu avisasse quando chegássemos.

   Aquela noite foi um turbilhão de emoções. Eu pensava em como nossa vida podia mudar em questão de horas;não ligava mais para minha situação com Peeta, ou para o cara que havia conhceido. Só queria chegar em casa em segurança. Só queria poder me jogar em minha cama e acordar no dia seguinte descobrindo que tudo aquilo não havia passado de um sonho.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Um Toque do Destino" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.