Spirit Bound - o Recomeço escrita por Bia Kishi


Capítulo 24
Capítulo 24 - A Garota dos Cabelos Negros


Notas iniciais do capítulo

Se meu humor estivesse um pouco melhor, talvez eu tivesse me virado e reclamado, ou até xingado e praguejado por ela aparecer assim como se meu quarto fosse uma estação de metrô, mas eu estava em um estado de letargia tão grande que tudo que eu fiz foi soltar um “Hunf” mal educado e me virar para o lado, puxando a colcha em cima de mim.



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Desviei meus olhos de Stan e olhei a bandeja de café sobre a cama – era sem dúvida muito apetitosa, cheia de todo o tipo de porcarias que uma garota pode gostar. Então porque eu ainda queria olhar para Stan?

            Acho que esta era uma daquelas perguntas sem resposta.

            Stan se levantou e pigarreou mais uma vez, aumentando o espaço entre nós dois. Seus olhos percorreram o roupão de uma maneira que eu nunca o tinha visto me olhar.

-           Vou te esperar lá em baixo Hathaway, e faça o favor de não demorar!

Stan terminou a frase já com a mão na maçaneta da porta, eu nem tive tempo de pensar em nada – a porta se fechou atrás dele.

Sozinha no quarto, eu pensei em várias coisas. Pensei em mim, pensei em meus sentimentos em relação á amizade de Lissa e Adrian – e porque eu estava sendo tão egoísta e histérica com isso.

Pensei em meus sentimentos em relação á minha pseudoamizade com Stan – e novamente porque eu estava sendo tão histérica com isso.

Pensei em Dimitri. Por mais que eu quisesse fingir que tudo estava bem, agora que eu estava em de volta, em segurança, com meus amigos; a verdade era que sem Dimitri perto de mim, eu me sentia como uma metade. E isso não era bom.

Sentei na cama me sentindo o ser mais ridículo e dependente do mundo, e liguei a televisão. Eu estava tão nervosa que nenhum canal fazia o menor sentido – e isso nem era porque eles estavam falando em russo – tudo que eu queria era ver algo que me tirasse da minha confusão mental.

-           Hey Rose, você não vai encontrar o que procura aí.

      A voz gelou minha espinha até a medula.

Eu nem mesmo precisei me virar para saber de onde – e de quem – vinha a voz. Era a garota. A mesma garota morena que veio até meu quarto um pouco mais cedo.

Se meu humor estivesse um pouco melhor, talvez eu tivesse me virado e reclamado, ou até xingado e praguejado por ela aparecer assim como se meu quarto fosse uma estação de metrô, mas eu estava em um estado de letargia tão grande que tudo que eu fiz foi soltar um “Hunf” mal educado e me virar para o lado, puxando a colcha em cima de mim.

-           Hey Rose, vamos! – ela me sacudiu.

Eu soltei outro resmungo e cobri minha cabeça com a colcha, impedindo que ela me visse.

-           Rose! Rose! Rose! – ela me sacudiu com mais força.

-           Hey garota, não me irrite! Eu nem sei seu nome, nem sei quem você e nem sei o que você quer comigo. Minha vida está uma complicação só e tudo que eu não preciso é um fantasminha pré-adolescente me irritando – eu praguejei, abaixando a colcha e olhando para ela de canto de olho.

            Ela colocou as mãos na cintura e apertou os olhos – exatamente como eu faria, se estivesse com raiva.

-           Não sou um fantasminha pré-adolescente! E eu pretendia te ajudar, agora não sei mais se você merece.

            Eu me sentei na cama.

-           E como é que você pretendia me ajudar, fantasminha pré-adolescente? – eu falei só para irritá-la mais.

-            Hunnnnnnnnf!!! Eu já disse, não sou um fantasma!

Ela estava irritada, o que era ótimo – as pessoas, em geral, funcionam melhor quando estão irritadas.

            De repente, ela se sentou ao meu lado na cama e seu rosto ficou sério. Seus olhos se perderam no chão e uma pequena lágrima brilhou ainda mais em seu rosto iluminado.

-           Ele está tão triste. Eu não gosto de vê-lo triste. Não é bom. Sabe Rose – ela continuou – quando ele fica triste eu sinto que se afasta ainda mais do que é. Sinto como se ele se aproximasse mais do que não quer ser, do que não é.

      Outro arrepio.

-           De quem você está falando?

-           Do moço bonito.

Eu engoli em seco.

-           Que moço?

Segurei a garota pelos ombros e a fiz me olhar nos olhos. Nesse momento eu nem sabia mais se queria ou não saber de quem ela falava, porque no fundo, eu temia já saber.

-           Eu não sei quem ele é Rose, só sei que posso encontra-lo quando vou ver a minha mãe. Sabe Rose, ele pensa tanto em você, sofre tanto por estar longe. É tão triste. Ele parece um daqueles mocinhos de filmes de cowboy.

      Okay, agora eu estava mesmo apavorada.

-           Por favor, me diga que sua mãe está viva.

Ela não respondeu. E a não-resposta, respondeu á todas as minhas perguntas. O moço bonito á que ela se referia só podia ser um. Dimitri.

Minhas mãos escorregaram como se estivessem sem vida. A garota as segurou entre as suas.

-           Me ajude Rose. Eu preciso ajuda-lo, mas preciso de você para isso.

Encarei os olhos negros da garota – ela não fazia idéia de como eu queria isto. De como eu precisava disto.

-           Como? Eu não sei como. Eu estou tentando. Eu estou tentando muito, mas eu não sei como!

-           Ivan sabe.

-           Você conhece Ivan também?

-           Sim. Ivan é como eu.

-           Um fantasma?

-           Ai Rose, pelo amor de Deus! Eu já disse que não sou um fantasma!

-           Ah é? Então quem é você?

      Os olhinhos dela se perderam novamente.

-           Eu me chamo Anita. Tenho doze anos e não conheço ninguém de verdade. Eu estou presa em algum lugar Rose. Eu só vejo um quarto escuro, e sei que não consigo sair. Eu não sei onde estou Rose e eu só não enlouqueci ainda porque posso fazer isto – ela apontou para a própria projeção luminosa.

            Eu engoli em seco.

-           Anita? Anita? Anita? – eu repetia enquanto sacudia os ombros da menina – tem certeza? Tem certeza que se chama Anita?

            Ela revirou os olhos.

-           É claro que tenho não é, Rose! Quem não teria certeza do próprio nome?

            A revelação foi como um soco na boca do meu estômago.

-           Então você é... Você é... – a frase não queria terminar.

-           Sua prima? Sim eu sou.

-           Esse tal tio que você diz. Ele... Ele...

-           É o seu pai? – ela completou a frase para mim – sim ele é.

-           Mas porque diabos ele não contou nada para Stan? Ele se culpa por você ter sumido até hoje! Não é justo! Não é justo!

Eu me levantei em um rompante de ódio e comecei a andar pelo quarto tagarelando sem parar, enquanto Anita revirava os olhos para mim.

-           É claro, o que mais eu podia esperar do chefão do submundo? Safado! Canalha! Enganando Stan desta maneira! – cerrei minhas mãos em punho - Eu vou... Eu vou...

Anita se levantou calmamente e caminhou a te mim. Seu toque era suave e fazia minha pele formigar. Lentamente ela segurou minhas mãos entre as suas e eu senti o ódio se dissipar um pouco – alguém poderia explicar á estes usuários do espírito que ficar com raiva às vezes é bom?

-           Rose, tenha calma. Em primeiro lugar, meu tio não sabe onde eu estou. Eu o visito como visito você, apenas. Ele pode me ver porque é um Moroi poderoso, as outras pessoas não podem. Meu pai não poderia. Foi por isso que ele não disse nada. Eu só encontrei meu tio porque minha mãe me ajudou. Ela me mostrou a direção.

-           Mas não é justo! Não é justo manter um segredo destes. Seu pai... Seu pai... – as lágrimas que começaram a descer dos olhos de Anita me fizeram parar a frase no meio.

-           Eu queria abraça-lo, Rose. Queria sentir como é abraçar alguém de verdade.

      Eu a abracei.

            Enquanto meus braços envolviam o corpo pequeno de Anita, as lágrimas desciam ainda mais rápidas dos seus olhos.

-           Eu vou te ajudar – eu disse á ela – eu vou encontrar você. Vou encontrá-la, eu sei que vou! Eu só preciso de uma direção.

            Anita desencostou o rosto do meu peito e limpou as lágrimas com as costas da mão.

-           O moço bonito Rose. Ele sabe onde eu estou.

            Eu engasguei.

-           Co... Como assim, ele sabe?

-           Eu ouço a voz dele Rose. Quando estou no meu corpo, no lugar escuro. Eu ouço a voz dele.

 

***

 

            Depois de deixa-la em frente ao hotel, algo me fez ir á um lugar que eu não visitava muito. Estacionei o Bentley em frente o casebre e desci, me protegendo dos primeiros raios de luz da manhã – apesar de o inverno Siberiano ser de grande ajuda para um Strigoi, luz era sempre um problema.

            Entrei sacudindo os flocos de neve de cima do meu casaco de couro.

-           Belikov, eu não pensei que viesse – disse-me o Strigoi moreno.

-           Não fui informado de que deveria avisar quando viesse – eu lhe respondi.

Igor pigarreou e tossiu e se desculpou – comportamento típico. Eu apenas lhe acenei com a cabeça, quando ele me perguntou se eu veria a menina.

Desci as escadas até o porão. Pela fresta da porta eu a vi. Ela estava sentada no chão, ao lado do colchão em que dormia. Seu rosto estava encostado sobre os joelhos e ela parecia não estar ali. Nenhum único movimento. Nem mesmo de respirar. Eu a observei por um longo tempo. 

            Sempre quis entender porque Galina a considerava um presente – nunca descobri. Para mim a frágil garota era apenas mais um Moroi como todos os outros e além de seu sangue saboroso, não tinha valor algum. Apesar disso, algo em mim fazia com que a protegesse. Algo em mim havia feito com que eu a roubasse de Galina, pouco antes de Rose me encontrar. Algo ainda me intrigava em relação aquela pequena garota dos cabelos negros e eu precisava descobrir o que.


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