Forgotten escrita por Lolis


Capítulo 2
I. segurança


Notas iniciais do capítulo

Só pq teve uns reviews fofos demais tá aí ó



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se·gu·ran·ça

(segurar + -ança)

A palavra mais ambígua da minha vida sempre foi segurança. Em algum ponto, acho eu, entre meus dezenove e vinte e cinco anos, eu poderia listar todas as coisas que me lembravam segurança: Primeiro, eu poderia pensar em minha casa, a mansão senhorial dos Malfoy com suas lareiras e luxo – uma última lembrança de infância – e também meu dormitório em Hogwarts, com o barulho das meninas. Lembraria, sem dúvidas do cheiro de Sirius. Mas o primeiro a surgir em minha mente, com certeza, seria King Cross.

Foi ali, quando minha mãe deu-me um último abraço e meu pai disse bem claramente “Seja uma Malfoy”, como se eu precisasse me lembrar que, mesmo ali, sem crenças deturpadas e palavras rudes, eu não me lembrasse do nome que carregava. Olhar para meus cabelos, meu rosto, minha pele era como um tapa que me alertava quem eu era.

Mas quem eu queria ser?

De qualquer forma, lembro-me de caminhar satisfeita por dentre a fumaça cinzenta e pesada em que gatos e corujas guinchavam – a minha, Infinitum, firmemente presa ao malão – eu sabia que, ao menos, podia tentar libertar-me das algemas que me prendiam ao chão. Eu poderia voar – Lucius não poderia ficar vigiando-me o dia todo, nem relataria tudo aos meus pais se eu pudesse convencê-lo.

Ele não podia arrastar-me com ele – eu precisava fazer minha própria reputação. Além do mais, eles estavam atolados até o pescoço em magia negra e, muito provavelmente, alguns já possuíssem a Marca Negra. Ele não podia expor-me a segredos tão obscuros até que estivesse certo de que estávamos do mesmo lado.

Eu não tinha certeza se um dia estaríamos. Aquilo me assustava: as marcas e segredos, as conversas baixas em grupinhos, os encontros às escuras. Eu sabia que o senhor deles havia pedido a Lucius que se casasse assim que possível para garantir uma descendência – eu ouvira meus pais falando sobre isso – e logo um contrato seria firmado com uma boa moça de bom sangue.

Quanto tempo demoraria até que ele, que parecia ser o dono de mim, mesmo que eu nunca o tivesse visto, pedisse aos meus pais que me casasse com um dos seus seguidores?

Eu era uma Malfoy, para todos os efeitos.

Acabei encontrando uma cabine aparentemente vazia quase no meio do trem. Arrastei meu malão desajeitadamente, com uma ajuda do meu pai para colocá-lo no lugar correto e dei um último aceno à minha família. Meu sangue.

Não sei quanto tempo custou-me ali, sozinha, perdida em mim mesma, as mãos presas a um livro de poções – minha matéria predileta, e aquela que me faria ganhar glórias e pontos à minha Casa – até que os conheci.

As primeiras pessoas que amei em Hogwarts.

A porta da cabine foi aberta com delicadeza e, por entre a pequena abertura, dois primeiranistas se esgueiraram com certa fluidez entre si. Como se conversassem entre gestos, eram parecidíssimos.

Mais tarde, aquele olhar me seria a mais agridoce das lembranças. Eu me lembraria de ambos – os irmãos que escolhi – até que a Guerra viesse para ceifá-los. Os gloriosos e perfeitos gêmeos Price, com suas semelhanças e diferenças. Nasceram juntos e anos e anos depois morreriam juntos. Como dói lembrar-se deles, mas deixemos a dor de lado. Há muito o que dizer sobre ambos.

Annabelle e Andrew Price foram meus melhores amigos. Juntos, podíamos explorar toda Hogwarts e colocá-la na palma das nossas mãos. Éramos terríveis juntos. Mais tarde, no entanto, haveria um grupo capaz de superar um nosso – e que recebeu um nome à altura.

Nós ficamos ali horas e horas, brincando e conversando como fazem crianças – tão doces e tão ingênuas. Éramos tão diferentes em personalidade quanto em aparência – enquanto os gêmeos tinham cabelos escuros e olhos muito negros, eu era mais delicada e mais aristocrática. Isso não me impediu de conhecer o mundo que eles podiam apresentar-me.

Eu era apenas uma menininha de sonhos e liberdade, e, embora ainda não soubesse até onde eu iria por ela, eu estava fascinada com o mundo onde os Price viviam. Eram filhos de uma bruxa e de um trouxa. Viviam intercalados entre duas vidas, entre duas realidades expostas que se contrapunham em suas personalidades destoantes do resto de nós. Eu, desesperadamente, queria tocar tudo àquilo que podiam mostrar-me.

E eles queriam que eu o fizesse.

Com eles – meus amigos – eu saí da minha zona de segurança privilegiada que meu sangue garantia-me. Eles, no entanto, eram sempre alvos do tipo de gente que eu deveria ser. E eu não podia deixar que isso acontecesse. Não quando eles queriam quebrar minhas correntes.

Annie sempre cantava a mesma música trouxa quando estávamos a sós.

“Blackbird singing in the dead of night”¹

Alguns anos depois, entendi que eu era o pássaro negro. Que eu deveria pegar minhas asas quebradas e aprender a voar.

De qualquer forma, foi na mesma noite que eu o conheci. Tinha um sobrenome que agradaria aos meus pais, e um nome tradicional à sua família. Aquele que, mil vidas depois, tornar-se-ia o pai da minha filha, embora eu nunca fosse pensar nisso nos primeiros anos de Hogwarts.

Eu fui primeiro. Lara Malfoy, a voz de Dumbledore ecoou pelas quatro mesas. Tão grande e tão maravilhosa era Hogwarts quanto um sonho – o infinito parecia abrir-se sob minha cabeça, com suas estrelas brilhando como se quisessem ver a nós, novatos, indo para nossos destinos.

Foi a noite mais terrível e mais magnífica de toda a minha vida. A excitação e o medo. Meus pais queriam que eu pertencesse à Slytherin, mas os Price diziam que queriam Gryffindor, embora seu pai houvesse sido Ravenclaw. Eles faziam suas próprias escolhas – porque eu não tinha o direito de fazê-las também?

O chapéu era grande demais para a pequena Lara de onze anos.

“Mas que mente confusa! Tão jovem e tão perdida em seus próprios pensamentos... Enlouquecerá cedo demais assim... E eu poderia enviá-la à Ravenclaw, mas não haverá grandiosidade para você lá, pequena Malfoy. Irá me odiar por uns bons anos por isso, mas seu lugar não é na Slytherin. GRYFFINDOR!”

Nunca vou esquecer-me de como meus pulmões queimaram. Doíam, se comprimiam, enquanto meus olhos se enchiam de lágrimas. Ah, Merlin, eu apenas conseguia pensar no que meus pais fariam. Se não houvesse ao menos um pouquinho do meu orgulho Malfoy a manter, eu choraria ali mesmo.

Mas levantei a cabeça e andei com graciosidade até a Gryffindor. Eu era corajosa, então? Podia enfrentar a todos eles. Não importava se Lucius crispava os lábios em desprezo, ou se meia Hogwarts podia estar chocada por haver uma Malfoy na casa dos leões.

Naquela época, tudo pareceu terrível. Hoje parece apenas bobo que eu tenha preocupado com um emblema costurado aos meus uniformes. Haveriam problemas maiores para enfrentar.

Annie ficou ali comigo, apertando minha mão gentilmente – mas Andrew pertencia à Ravenclaw. Parecíamos separados, mas ainda haveria muitas oportunidades em que seríamos um trio inseparável e indestrutível.

Naquela noite, no entanto, esperei que Annie e todas as outras meninas dormisse à sono alto para que eu pudesse escapulir sozinha ao Salão Comunal. Havia muito vermelho ali, mas nenhuma cor fria – azul, verde, cinza – com as quais eu fora criada. Tão diferente de casa.

Não foi Annie ou Andrew ou meu irmão quem secou minhas lágrimas e repetiu está tudo bem, está tudo bem. Eu conheci Sirius Black – um ano mais velho, e já tão bonito e tão mais alto que eu – naquela noite. Embora tivesse bons amigos, descobri, às vezes sentia-se solitário. Como eu, era uma ovelha entre lobos – conhecia a dor bem demais. Ensinou-me a escondê-la e aceitá-la.

Às vezes acho que isso fez com que crescêssemos rápido demais.

– Meus pais eram terríveis.

– Minha mãe era gentil. Gostava de levar-me à casa dos meus avós e de ensinar-me tudo que pudesse.

– Meu irmão... Tenho medo do que ele irá fazer.

– Tenho medo do que o meu está fazendo.

Estávamos prestes a enlouquecer juntos.


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Notas finais do capítulo

¹ - Blackbird, The Beatles. Acho que descreve bem a Lara em como ela é.
Ademais, me foquei bastante nos amigos dela aqui, e um pouco sobre Sirius. O próximo é todinho do Sirius praticamente, mas só chega com reviews, ok? Ok!
Beijos SZ