Goddess of Revenge escrita por Bárbara Brizola


Capítulo 2
Capítulo 2: O Baile


Notas iniciais do capítulo

Meu povo e minha pova estamos de volta!
Obrigada de verdade a todo que comentaram no primeiro capitulo! Vocês são incríveis! Aos fantasminhas: Não se acanhem, mamain ama vocês!

Preciso dedicar um chamego especial as minhas divas lindas Little Fairy, Julia1234, S Laufeyson, NickyWingates e Cabot que fizeram recomendações lindas!!! Vocês não fazem ideia o quanto significa para mim ter pessoas como vocês como leitoras. Obrigada de verdade por fazerem parte disso! Dedico o capitulo a vocês.

Uma mordida na nádega de direita das minhas gatas lindas que recomendaram GOM. Mandei uma mensagem a vocês, mas uma mordidinha a mais não faz mal.

Quem ainda não chegou no grupo do face, venha!!
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Divirtam-se!!!



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Meus olhos se arregalaram repentinamente me tirando do sono perturbado, enquanto mordia a boca para reprimir um grito. Eu tremia tanto que tenho certeza de que foi isso que o acordou. Tenho certeza apenas agora, porque quando as crises vinham, eu não tinha muita consciência de nada ao redor. Mais de uma vez as tive e sequer era capaz de lembrar depois. Mas dessa vez me lembrava bem do menino agonizando no chão, esperando que eu soltasse sua alma do corpo para que a Morte pudesse vir busca-lo. O cheiro de podridão e morte me rodeando, enquanto eu tentava mirar sem sucesso. As vozes dos meus pais dizendo que era o certo, fazendo eco ao som difuso de tiros. E aos gritos incoerentes de Loki se sobrepondo a tudo. A certeza de que ele estava morto. O deus ou o menino? Terror. Puro e simples.

E a calma repentina quando ele abriu os olhos, ao mesmo tempo em que pousava a mão de dedos longos sobre a lateral do meu rosto. Afastando o pânico. Trazendo a realidade de volta. Engasguei com o choro preso na garganta o que o fez franzir as sobrancelhas numa expressão que eu era incapaz de decifrar.

– Volte a dormir. – Mandou num tom baixo e arrastado. – Não era real.

– Eu sei. – Resmunguei embora ainda tremesse. O Terror Noturno me abandonava por meses completos, mas por vezes me torturava todas as noites. Essa era primeira crise, depois de quase um mês. Um péssimo começo para o dia do meu aniversário.

Em compensação, mal tive tempo de pensar nisso. Jinggles ao ouvir nossa conversa decidiu que era uma ótima ideia subir na cama e ver qual era o assunto. Claro que o rosto de Loki seria um ótimo lugar para sentar, se ele não tivesse percebido a intenção do gato gordo e o empurrado de lado fazendo uma careta.

– Que bela visão para começar o dia. – Zombou com desagrado me fazendo rir, embora deixasse o animal deitar entre nós. O primeiro sol já estava nascendo colocando uma claridade muito suave no quarto. Eu não conseguiria voltar a dormir.

Acabamos ficando ali em silêncio por pelo menos mais uma hora, vendo aquela bola de pelos ronronante apreciando enquanto eu deslizava a mão pela barriga dele. Depois disso, quando todos os sóis tinham nascido, fui tomar um banho, enquanto o moreno comia alguma coisa que as serviçais haviam trazido, depois de ele mandar uma ilusão sua as cozinhas. Loki jamais pisava lá pessoalmente.

O deus estava no banho quando as serviçais retornaram para levar as sobras de volta à cozinha e arrumar o aposento. Estavam animadas com o baile. Algumas delas serviriam aquela noite e para elas era como uma grande honra. Por isso mal se continham me perguntando se eu estava animada, o que vestiria e se já tinha visto a decoração do grande salão. Eu as respondia de maneira aérea, embora sorrisse. As mulheres não pareceram notar. Tanto que se atreveram a me parabenizar antes de saírem.

Passei as próximas horas ainda perdida em pensamentos. Estava sentada no largo peitoril de uma das janelas do quarto, sentindo a maresia que o vento trazia, com Loki deitado apoiando a cabeça sobre minha coxa enquanto lia um livro grosso. Era quase um dia normal. Ele jamais me parabenizaria, o que fazia de mim a mais grata das criaturas.

Eu corria o arco do violino por sobre as cordas, produzindo um som baixo e um pouco mais agudo do que deveria. Às vezes o largava ao lado, deixando meus olhos passearem pela profusão opulenta de construções asgardianas além dos jardins, enquanto acariciava os cabelos do deus. Eu não conseguia me concentrar muito tempo em nada. Ele por fim, ergueu os olhos para mim.

– Já está tudo resolvido. Pare de se preocupar. – Mandou com a voz carregada de impaciência.

– Eu vou me controlar. – Resmunguei a contragosto. Ele voltou os olhos ao livro sem me responder novamente. – Durante o baile?

– Sim. – Confirmou sem maiores explicações, ainda lendo as palavras em rúnico. Esse era o único dia do ano em que eu conseguia ficar mais tempo com a minha família. Hoje eu iria a Midgard, e poderia ficar boa parte da madrugada com Tony e Pepper. E esse era o motivo de tanta ansiedade.

Frigga bateu à porta, pouco depois do almoço acabar. Ainda não tínhamos fome e se quiséssemos comer alguém nos serviria no quarto mesmo. Poderíamos morar apenas ali se quiséssemos. Era maior que meu apartamento. Mas a rainha não parecia gostar da nossa ausência às refeições.

– Não vão comer nada? – Questionou, parada com uma das mãos apoiada a maçaneta. O vestido lilás ainda não era o daquela noite. - Vocês pretendem passar o dia entocados aqui? – Reclamou num tom severo. Loki ergueu os olhos para mim que o encarei em resposta por breves segundos antes que ele respondesse à mãe.

– Esse é o plano. – Concluiu com um sorriso cínico que a fez estreitar os olhos, reprimindo uma risada.

– Então comecem a pensar em alguma outra coisa. – Pediu, caminhando até nós. – Pode vir comigo Liana? – Perguntou, acariciando uma orelha do gato folgado. Ele sequer abriu os olhos, aquele preguiçoso. Assenti largando o violino ao lado e quando pensei em alcançar uma almofada a Loki, uma delas desapareceu de cima de uma poltrona reaparecendo embaixo de sua cabeça. Muito prático.

Seguindo Frigga pelos corredores pude enfim notar que a agitação era ainda maior do que eu esperava. Era sempre assim. O Dia de Frigga era um grande, grande evento. E eu adoraria passar despercebida, mas não tinha conseguido nos últimos anos e certamente hoje não seria diferente. O mínimo que poderia fazer era sustentar uma aparência e segurança que convencesse a todos que eu não era frágil e não podia ser intimidada. Principalmente a Odin.

Loki gostava dos holofotes que a posição de príncipe lhe dava. E, quando não podia escapar, eu gostava de me manter a altura de estar sob os holofotes ao lado de um príncipe. Gostava de ver a diversão nos olhos dele quando notava a inveja das mulheres e os olhares de cobiça dos homens. Ele gostava de ser invejado. E eu gostava que ele o fosse.

Por isso quando chegamos ao atelier real e Frigga me mostrou o vestido que havia mandado as criadas preparem para mim, fiquei realmente satisfeita. Era de um tom escuro de verde, com um decote suave o bastante para disfarçar que eu não tinha seios grandes, mas o corte ainda seria capaz de valorizar minhas curvas, desviando a atenção para uma fenda na perna. Muito pouco asgardiano. A deusa sorriu ao perceber que eu havia aprovado

– É fantástico! – Afirmei, deslizando as mãos pelas pedras bordadas.

– Que bom que gostou. Era o mínimo que eu poderia fazer. – A mulher falou com doçura, quase como se pedisse desculpas por minha presença hoje ser obrigatória.

– Obrigada de verdade! – Agradeci admirando o trabalho. O manequim reproduzia minhas medidas com perfeição de forma que as provas eram dispensáveis. Certamente me vestiria perfeitamente.

– Lia? – Ouvi a voz de Jane vir abafada de trás de um biombo. – Vai ficar aqui se arrumando? – Perguntou espiando. Tinha a cabeça cheia de grampos e pelo ombro nu deduzi que a estavam vestindo. Era meio cedo para isso, não? Olhei para Frigga que falava com duas serviçais. Aparentemente ela também iria se arrumar. Suspirei resignada.

– Vou sim. – Confirmei.

O resto da tarde foi extremamente agradável, para minha surpresa. Frigga se divertiu por horas testando penteados complexos em nossos cabelos, sem deixar que as serviçais sequer tentassem. Ela costumava dizer que sempre havia desejado pelo menos uma menina além dos meninos e a vida lhe presenteara tardiamente com duas. Eu jamais poderia definir o quanto era grata por essa consideração. Nos tratava com igual carinho, mas eu era capaz de sentir que tínhamos um elo muito especial. Não apenas pelo meu Toque do Destino ou pela Benção que ela jamais retirara.

Quando o último sol começava a declinar no céu, finalmente saímos do atelier. Agora precisávamos achar nossos respectivos acompanhantes, por isso cada uma seguiu para seu próprio quarto.

Loki não estava. Encontrei apenas Jinggles que havia embolado as cobertas da cama e deitava no meio daquele ninho. No chão diante da cama uma caixa fina de veludo. Sorrir foi inevitável. Peguei-a e sentei ao lado do gato que tinha os olhos verdes postos com curiosidade no objeto. O abri depois de permitir que ele desse alguns tapinhas, curioso.

Um colar de ouro com uma serpente de olhos de esmeralda passearia no meu pescoço com suas curvas e ondulações. Era lindo. Fui até diante do espelho grande do banheiro e o prendi ao pescoço me avaliando por alguns segundos. O rabo de cavalo baixo e lateral que Frigga havia feito, permitia que a joia ficasse bem visível. Eu parecia bem o bastante para estar ao lado de um príncipe. Apenas me restava achar ele.

Saí do quarto deixando os olhos acusadores de Jinggles para trás. Ele não era um grande fã de ficar sozinho fechado. Por fim adentrei o salão lateral ao principal. Loki estava ao lado de Thor e Jane e parecia rir de algo que deixava a garota sem jeito.

Os olhos verdes me encontraram por cima do ombro da cientista, me olhando dos pés a cabeça. Corar foi inevitável, assim como sorrir, quando ele se afastou dos dois vindo em minha direção com passos largos e firmes. Usava a armadura completa ao invés da habitual cota longa de couro, com todas as insígnias redondas no peito, uma honra restituída por Frigga. Cobrindo os cabelos pretos muito bem penteados, o elmo chifrado. Poderia estar pronto para uma guerra, mas era apenas um baile. Thor e Odin também vestiam suas armaduras completas, embora dispensassem os elmos.

– Obrigada. – Foi a primeira coisa que disse a ele, tocando meu colar. Ele me ofereceu um sorriso mínimo.

– Estávamos esperando por você. Odin já estava impaciente. – Comentou.

– E naturalmente você estava preocupado com a opinião dele. – Debochei. Ele estreitou os olhos de um jeito irônico, inclinando a cabeça levemente de lado com um ar falsamente inocente.

– Você esperava algo diferente de mim?

– Jamais! – Afirmei rindo antes de o beijar brevemente.

Thor e Jane seguiram para o salão principal. O loiro foi anunciado como Sua Alteza Real, Príncipe Herdeiro e Futuro Soberano dos Nove Reinos, Protetor de Asgard e Vingador de Midgard. Vi pelo canto dos olhos Loki bufar irritado, projetando o maxilar para frente tentando reprimir a própria frustração. Para seu alívio o destaque da noite não seria o irmão. As atenções éramos eu e, principalmente, Frigga. Maravilha.

Loki segurou minha mão na altura de seu ombro. Fomos para perto da porta. Havia toda uma formalidade que me desagradava profundamente. Precisávamos ser anunciados. A voz de um homem, talvez um dos conselheiros, falou retumbante. Eu engoli em seco encarando meus pés. O moreno me olhou de lado reprimindo um sorriso. Ficava tão nervosa com aquele tipo de coisa que sequer ouvi quando começaram a nos anunciar.

–... eza Real, príncipe Loki, Protetor de Asgard e dos Nove Reinos, acompanhado por Lady Liana de Midgard. – Concluiu. Eu era lady hoje. Hilário. Loki me conduziu adentrando o salão, com uma elegância e naturalidade impressionantes, a despeito de seu título infinitamente menor. Escondia muito bem o que achava de verdade daquilo. Eu firmei minha postura e assim como ele, ergui a cabeça com superioridade, enquanto avançávamos pelo salão.

Haviam tantas pessoas naquele lugar que se nos separássemos dificilmente eu o acharia de novo. Apesar disso ainda havia muito conforto e espaço para todos. As pessoas faziam breves reverências a Loki conforme ele passava. Eu ouvia algumas felicitações, pouco empolgadas, mas educadas.

Thor estava parado na metade da escadaria que levava ao trono com Jane, aguardando no início. Loki me acompanhou até o lado da mulher e subiu as escadas parando alguns degraus abaixo do irmão. Uma hierarquia clara.

Eu ainda olhava para ele quando percebi que Odin e Frigga já haviam sido anunciados e passavam em meio ao salão sob aplausos e ovações animadas. Ela, em especial, era muito querida. As pessoas reverenciavam profundamente conforme avançavam. Ao passar diante de nós, o rei reduziu o passo disposto a apreciar minha reverencia, me encarando com aquele único olho muito azul. Eu percebi a rainha o puxando levemente pela mão, que ele sustentava da mesma maneira que Loki havia feito comigo. Jane foi a primeira a reverenciar, inclinando-se e encarando os próprios pés. Eu me mantive ereta por um segundo a mais. O reverenciei lentamente, sem abaixar a cabeça ou desviar os olhos dele. Era quase um deboche. Eu não exporia meu pescoço ao rei. Vi os lábios do homem se contraírem em desagrado, quando tornou a apertar o passo. Os irmãos apenas fizeram um breve aceno com a cabeça, antes do homem deixar a esposa na escadaria, acima do filho mais velho, e sentar-se no trono.

Em seguida deixei que meus olhos passeassem pelo salão, enquanto Odin gastava saliva numa homenagem a esposa. Avistei os Três Guerreiros parados próximos a nós. Alis estava ao lado de Hogun e prestavam atenção ao rei. Frandal tinha uma loira e uma morena em cada lado. Eram irmãs se não me falhava a memória, mas eu nunca tinha trocado mais do que uma ou duas palavras com elas. Não pareciam muito atentos ao discurso. Voltagg era o mais próximo da enorme mesa de jantar e tinha um sanduíche bem firme nas mãos, enquanto sua esposa Hildegund estava pendurada no outro braço dele. Uma penca enorme de filhos estava espalhada pelo salão.

Reconheci mais alguns rostos espalhados pelo lugar. Sif parecendo estranhamente desconfortável num vestido longo e roxo, cheio de drapeados. Estava muito bonita, mas parecia preferir a armadura. Encontrei Vidar em sua armadura completa, uma taça de vinho na mão que ele ergueu ao notar que eu o vira. Sorri em resposta antes de encontrar quem eu realmente procurava. Haya e Pharos estavam em armaduras completas, inclusive os bicos afiados, no fundo do salão e se destacavam pelas enormes asas.

Quando eu achei que Odin falaria a noite inteira, ele finalmente calou-se. Aplausos efusivos foram ouvidos e me juntei a eles de maneira automática. Os bardos começaram a tocar suas melodias de flautas, violinos e outros instrumentos. Eu continuava olhando para as harpias, louca que estava para poder falar com eles, que demorei a notar que Loki estava diante de mim, uma mão estendida. Claro, os aniversariantes abrem o baile.

O deus me conduziu até o meio da pista, próximo a Frigga e Odin que já dançavam. Me admirava muito que ainda se entendessem tão bem depois de tudo. Embora tivessem passado semanas sem trocarem mais palavras que o essencial, lentamente as coisas voltaram a como eram antes entre eles.

– Liana? – Loki me chamou naquela sua voz bem pronunciada, tirando-me dos meus devaneios. Aparentemente devia estar falando comigo e eu não respondi.

– Desculpe. – Pedi em alemão. Ele não se deu ao trabalho de responder.

– Em duas horas saímos. – Comandou num tom baixo. Assenti tranquila, antes de apoiar a cabeça no ombro dele. Não era a postura mais adequada para dançar diante da corte, mas era o que eu queria. Ele não se importou, apenas continuou me conduzindo, enquanto eu sentia o cheiro bom da pele dele. Eu gostava de dançar embora não levasse o menor jeito. Minha sorte era que Loki era um ótimo condutor.

Enquanto dançávamos notei pelo canto dos olhos que as mulheres comentavam coisas a meu respeito, era óbvio pela maneira como me olhavam e cochichavam. Algumas pareciam irritadas com a maneira como eu estava pendurada no deus. Pouco importava a elas que ele fosse pouco confiável e um traidor do reino. Loki era um homem bonito e um príncipe. Haviam alpinistas sociais em todos os reinos. Apenas fechei os olhos e sorri.

– Elas não gostam muito de mim. – Ri baixinho.

– E você se importa? – Debochou próximo ao meu ouvido

– Certamente. Não vou nem dormir esta noite. – Falei num tom dissimulado que o fez rir baixo. As pessoas começavam lentamente a ocupar a pista ao nosso redor, enquanto as conversas e risadas tornavam a se erguer pelo salão.

Quando a música se encerrou sendo substituída por outra, ele me acompanhou até a saída da pista. Algumas pessoas vieram me dar os parabéns, mas em sua maioria queriam apenas uma desculpa para bajular o príncipe. Não que ele não gostasse. Dei um jeito de me esquivar e fui encontrar Haya.

A harpia estava parada próxima à parede com seu irmão ao lado. Ambos bebiam vinho e riam de algo por baixo dos bicos afiados. Como eles bebiam com aquilo no rosto era um mistério. Algumas crianças os olhavam de longe com curiosidade. Assim que me viram se abriram num amplo sorriso e fizeram uma reverência.

– Milady. – A mulher cumprimentou com sua voz melodiosa e macia. Era sempre muito formal. Pharos tirou o bico do rosto e o enganchou num suporte perto do ombro. Aquela coisa ainda me parecia muito orgânica. Ele levou minha mão aos lábios me fazendo rir sem jeito. Descartei a formalidade excessiva dos irmãos me jogando num abraço mútuo.

– Como vocês estão? – Questionei animada. – Por que ficaram tanto tempo sem vir?

– As coisas andaram agitadas. – O homem respondeu, enquanto a irmã tirava o bico. Eles moravam em uma das milhares de pequenas terras além dos Nove Reinos principais. Loki conhecia centenas delas, eu conhecia apenas minha casa em Lugar Nenhum.

Haya era a Knyaginya das Harpias em uma dessas terras. Algo próximo a uma rainha em uma sociedade de modos tribais, estritamente matriarcal. Mesmo que Pharos fosse o mais velho, ela era a herdeira. E quando Taneleer a capturou, a sociedade havia colapsado sem uma mulher na linha de sucessão. Por isso Pharos era tão grato a mim quanto a irmã. – Mas parecem estar voltando para o eixos, senhora.

– Sabem que se precisarem de soldados asgardianos, Frigga certamente conseguiria para vocês. – Lembrei-os. Ambos sorriram.

– Sabemos senhora. – Haya confirmou, então trocou um olhar cúmplice com o irmão. – Mas deixemos nossas guerras de fora e a vamos a assuntos mais importantes. – Começou enquanto o homem pegava uma caixa fina de madeira entalhada que trazia num suporte da enorme armadura. – Como seu presente, por exemplo.

Seria mais educado da minha parte abrir o presente quando estivesse sozinha, pelo menos pela etiqueta asgardiana, mas pela maneira como olhavam da caixa para mim eu devia abri-la agora.

Loki chegou cumprimentando as harpias, no momento em que eu a abria, finalmente tendo se livrado dos bajuladores. Dentro havia um comprido punhal de lâmina ondulada e com empunhadura feita de osso, entalhado com gravuras rebuscadas. Parecia muito mortal e por isso mesmo o empurrei, sem precisar dizer uma palavra, com caixa e tudo nas mãos do deus que a fez sumir com um meneio das mãos. Não podíamos portar armas na presença de Odin e por enquanto estávamos conseguindo nos manter dentro das regras. Ou quebra-las com discrição.

– É linda, obrigada de verdade. – Agradeci, enquanto eles riam da nossa reação. Sabiam da proibição. Eu realmente havia gostado da adaga, embora tivesse muita certeza de que Loki se apossaria dela.

– Fico feliz que tenha gostado, senhora. – A mulher afirmou. Seus olhos amarelos encontraram algo atrás da minha cabeça, fazendo com que eu me virasse.

– Certamente a aniversariante não vai negar uma dança ao rei. – Odin falou estendendo a mão. Meus olhos se arregalaram mais pela surpresa do que por medo.

– Certamente vai. – Loki afirmou antes que eu pudesse responder. – Essa dança é minha. – Falou segurando minha mão.

– Você já teve a honra, pode cedê-la ao seu velho pai. – Odin disse com tranquilidade o olhando de cabeça erguida. – Até parece que não quer que eu chegue perto dela.

– Não, não é bem isso... Eu só... – Começou num tom falso de arrependimento, olhando para o chão, para em seguida encarar o homem de maneira incisiva. - Eu não quero. – Afirmou com frieza como se fosse uma conclusão simples. Percebi pelo canto dos olhos que Haya e Pharos, estavam recolocando os bicos sobre o rosto. O velho sorriu e fez menção de falar, quando segurei sua mão com firmeza.

– É apenas uma dança. Que mal pode haver? – Disse com meu sorriso mais artificial. Fiz uma breve reverência para o rei. – Será uma honra. Danço a próxima com você, Loki.

– Uma criança muito educada. – Odin afirmou de uma maneira que me fez desejar arrancar aquele tapa-olho e sair correndo. Loki parecia em dúvida sobre matar o velho ou a mim. – Enquanto isso, por que não tira outra das moças asgardianas para dançar? Alguma com a sua idade? – Incentivou num tom lento e tranquilo, enquanto olhava ao redor as dúzias de mulheres que estavam desacompanhadas. Sabíamos muito bem o que ele estava fazendo. Já havia feito isso antes. – Lady Sigyn, está sozinha. – Disse alto o bastante para chamar a atenção da garota que tomava vinho alguns metros afastada, junto com outras deusas. Ela ofereceu um sorriso tímido, mas não se aproximou. Sábia decisão.

– Desculpe-me Majestade, mas acho que vou desapontar Loki. A verdade é que eu já estava pensando em chamar a dama para uma dança. – Pharos afirmou de uma maneira repentina, tentando se afastar na direção da garota. Odin o segurou pelo braço.

– E deixar sua bela irmã sozinha? Deixe que Loki vá. – Aquilo não soava nem de longe como um pedido. Todos se entreolharam nervosamente e por fim pousaram os olhos no moreno. Ele tinha uma expressão de desafio, os olhos estreitos, maxilar contraído e as mãos fechadas em punhos. Encarou Odin por um segundo a mais antes de se afastar na direção da mulher. O rei ainda esperou que ele estendesse a mão à deusa, que sorriu de maneira absolutamente encantada, antes de largar a taça na mesa e ser guiada para a pista.

O rei me guiou, pousando a mão em minha cintura, mas mantendo uma distância respeitosa entre nós. Eu tentava não olhar para ele, nem para Loki e Sigyn em seu belo vestido de tule azul escuro, delineando as curvas perfeitas, mas era quase impossível. Ela tinha os cabelos num coque elegante na lateral da cabeça e complementava aquilo com joias e uma maquiagem bonita. A deusa costumava me lembrar uma boneca de porcelana, não apenas por aparência, mas por seu comportamento extremamente polido e requintado. Às vezes eu desejava quebrar porcelana. Principalmente em momentos como aquele, em que ela praticamente flutuava pelo salão guiada por Loki e ria de algum dos comentários ácidos que aparentemente o deus tinha feito.

– Liana. – O rei chamou meu nome alto enquanto me guiava pelo salão, trazendo minha atenção de volta a ele. Seu olhar era muito neutro. – Gostaria de parabenizar você por mais um aniversário.

– Humm... obrigada. – Agradeci desconfiada, encontrando os olhos de Loki que me fitava de longe por cima da cabeça de Sigyn. Ela era muito baixinha, algo perto de 1,60 de altura. Me obriguei a encarar o velho novamente. - O que você quer comigo Odin? – Interpelei de maneira direta.

– Majestade. – Ele se apressou em me corrigir.

– Não tem necessidade de me chamar de Majestade. – Rebati com a maior confiança que podia. A barba branca do velho se moveu acompanhando o sorriso dele.

– Tão atrevida quanto ele.

– Obrigada.

– Por quanto tempo vai ser assim? Quanto tempo você tem? – Interpelou com calma. Como será que uma flecha ficaria na testa dele?

– Eu sei que vai sentir a minha falta. – Afirmei com meu melhor sorriso. Ele riu de uma maneira espirituosa que soaria agradável aos ouvidos alheios.

– Certamente Loki e Sigyn são um casal mais adequado. E certamente um casal definitivo depois que você sair do caminho. – O rei falava daquilo como se debatesse política. O que, de certa forma, era o que estava fazendo.

– Uma pena que ainda vá demorar. – Praticamente rosnei. Acho que a flecha ficaria mais bonita no olho. Percebi que a rainha estava em uma conversa com Freya, embora nos olhasse de modo apreensivo. Eu devia estar com cara de que morderia alguém.

– Realmente. – Concordou naquela sua voz grave e firme. Ele parecia estar pronto para falar mais, quando alguém o tocou no ombro.

– Com sua licença, Majestade. Posso ter essa dança? – A cavalaria estava chegando. Vidar tinha a mão estendida na minha direção.

– Claro. – O velho confirmou, oferecendo minha mão ao homem. Ele saiu sem olhar para trás.

– Achei que você fosse arrancar o outro olho dele aqui mesmo. – O deus falou com um sorriso simpático.

– Eu cogitei, mas achei que pudesse estragar a festa. – Afirmei. Sentia minhas mãos tremerem, enquanto ele me conduzia no ritmo da música.

– Acho pouco provável. – Riu de maneira espontânea, me fazendo rodopiar. – Seja lá o que ele te disse seria bom que parasse de tremer antes que Loki venha.

– Eu sei. – Confirmei respirando fundo. Loki e Sigyn continuavam dançando, embora ele tivesse uma expressão fechada olhando em nossa direção. – Ele só queria que Sigyn tivesse chance de chamar alguma atenção.

– Você é inteligente, milady. – Afirmou de maneira elogiosa, embora risse. – E parece ter dado certo? – Foi a minha vez de rir. Loki não tirava os olhos de mim e parecia com fortes tendências assassinas.

– Na verdade não. – Sorri, me sentindo muito mais bem humorada.

– O que na verdade parece um milagre levando em conta que você já pisou nos meus pés, sem notar, pelo menos umas três vezes. – Alfinetou. Eu ri alto, lhe dando um tapinha no ombro. – Vamos interromper a dança antes que eu perca os dedos. – Falou daquele seu jeito bem humorado, me conduzindo com a mão sobre a dele para perto de Loki. – Alteza, podemos trocar os pares?

– Pensei que nunca fosse perguntar. – Retrucou, segurando a minha mão e passando a de Sigyn a Vidar. A garota hesitou por um segundo antes de ir. Fez uma breve reverência a mim.

– Lady Liana, eu a felicito por essa data tão importante. Desejo-lhe tudo de melhor. – Falou num timbre suave e gentil. Eu gostava da garota, era sempre muito educada comigo, embora eu nunca tivesse aberto espaço para que tentasse uma real amizade. Não a queria perto demais. Eu não era cega.

– Obrigada Lady Sigyn. – Respondi com um sorriso fazendo o dela se ampliar.

– Milady? – Vidar chamou novamente. Ela o olhou e dele para Loki.

– Obrigada a dança Alteza, foi uma grande honra. – Declarou com um sorriso tímido. Loki assentiu a olhando levemente de cima, em apreciação pelo comportamento da garota. Levantei ambas as sobrancelhas e troquei um olhar breve com Vidar. Ela lembrava que ele estava esperando?

– Claro que foi. – Atalhei, puxando a mão de Loki para a minha cintura, trazendo sua atenção de volta.

– Alteza, em outra oportunidade podemos repetir? – A mulher pediu em dúvida entre encarar os próprios pés ou os olhos dele. Inclinei minha cabeça levemente de lado, esperando a resposta dele. Eu podia ouvir Vidar abafando uma risada.

– Com prazer. – O príncipe, disse enfim. Ela sorriu e por fim, saiu acompanhando o outro deus de volta a pista. Loki se voltou para mim. Eu tinha as sobrancelhas levantadas. – O que?

– Com prazer?

– O que você esperava que eu dissesse? – Questionou começando a me conduzir, enquanto um sorriso de escárnio brincava nos lábios finos.

– ‘‘Nem em mil anos’’, seria uma resposta razoável. – Bufei. Aquilo o fez rir. Depois franziu as sobrancelhas, me olhando de cima, com uma expressão dissimulada e divertida.

– Não posso fugir de uma dança por tanto tempo assim. – Tentou me convencer.

– Sigyn não quer apenas uma dança. – Resmunguei, reproduzindo o mesmo tipo de passo coreografado que Frigga havia tentado ensinar a mim e a Jane. Em meu favor eu podia dizer que a ouvia rindo dos próprios erros do outro lado do salão.

– E o que ela quer? – O deus perguntou, erguendo uma sobrancelha, ainda mais debochado. Estreitei os olhos para ele. Loki fez uma expressão artificialmente surpresa, olhando para a mulher. Sigyn sorria docemente enquanto dançava com Vidar, mas ao perceber que era observada ampliou o sorriso tentando voltar a atenção ao par. – Jura?

– Ridículo. – Aquilo o fez rir. Dançamos em silêncio por mais algum tempo. O aroma da comida disposta em travessas começava a me interessar.

– O que Odin queria? – Perguntou lembrando-se.

– Deixar a garota zumbir em volta de você. E me infernizar. – Falei, apoiando o rosto no ombro dele, como havia feito mais cedo.

– Se não fosse uma mortal tão teimosa, eu teria evitado tudo isso.

– Claro. E você e Odin estariam embolados no chão tentando arrancar os olhos um do outro. – Rebati.

– Eu estaria na vantagem. – Disse com espontaneidade me fazendo rir. Silenciamos por mais alguns segundos. – Não torne a me contradizer. – Mandou de um jeito firme. Suspirei, assentindo de leve. Era mais simples assim.

A música lentamente parou. Nos viramos em busca do motivo. Frigga estava no centro do salão, enquanto as pessoas se afastavam lhe dando espaço. Correu os olhos pelo lugar e finalmente nos viu.

– Desculpem interromper a dança de todos vocês, mas eu precisava dar a devida atenção à outra aniversariante. Lady Liana, poderia vir aqui? – Pediu.

Soltei a mão de Loki e caminhei para perto da rainha. Fiz uma breve reverência como era de se esperar ao ser chamada diretamente a presença dela. Encarei meus pés. Eu devia estar escarlate.

– Querida, você sabe o carinho que tenho por você. – Falava num tom alto, para que todos ouvissem. – Eu gostaria de lhe entregar o presente, mas é grande demais, por isso gostaria que você e Loki fossem até os estábulos, onde vai poder ver. – Ela estava arrumando um jeito muito escancarado para que deixássemos a festa. Era óbvio que eu ganharia um cavalo e ninguém estranharia se decidisse experimentar a montaria e não retornasse. Estranho seria se simplesmente sumíssemos. Odin notaria.

A abracei por puro impulso. Algumas pessoas cochicharam a respeito da minha liberdade com a rainha. Ela não se importou. Tudo que eu tinha lhe dado era um enfeite de cabelos que fiz Pepper comprar na Tiffany’s e Heimdall traficar para dentro de Asgard. E que por sinal ela usava decorando o complicado penteado. E ela, como sempre, me presentearia e ainda me daria algumas horas de liberdade.

– Obrigada. – Sussurrei ainda abraçada a ela.

– Vão antes que Odin arranje uma desculpa para segurar vocês até o final. – Instruiu num tom baixo. Ela não precisava falar duas vezes. Olhei na direção de Loki e ele prontamente, veio até nós. Não trocamos mais do que duas palavras antes de sairmos pelo portão principal, com pessoas reverenciando o moreno no caminho. A música reiniciou quase imediatamente a nossa saída.

Atravessamos em silêncio os portões que levavam aos jardins. As luas iluminavam o caminho, naquela noite quente. O cheiro adocicado e enjoativo das peras-melancias chegava até nós passando por sobre o lago.

A cidade estava agitada. Nem todos tinham status social para serem chamados a um baile no palácio. Passamos por tabernas abertas por onde ouvíamos a cantoria de alguns festeiros.

Não demoramos a chegar onde Heimdall fazia sua vigília. O homem sequer nos olhou, apenas abriu a passagem pela Bifrost. Tinha instruções de Frigga. Loki passou a mão pela minha cintura, antes de atravessarmos.

O cheiro de maresia e o som de AC/DC chegaram até nós de maneira brusca, enquanto o moreno me impedia de cambalear. Estávamos na areia da praia que ficava em frente a minha casa. Eu podia ver as luzes acessas ao longe. Me soltei dos braços de Loki, puxei o vestido longo na metade das coxas e corri. Ele não tinha pressa.

Todo ano me esperavam aqui. Era mais afastada da cidade e não chamaria tanta atenção da S.H.I.E.L.D.. Não haviam muros que a isolassem da praia com exceção de um murinho de arbustos que contornei as pressas. Abri a porta de correr que levava a sala e me deparei com Tony e Pepper sentados em um sofá vendo um DVD de show.

– Oh alteza, que surpresa! Quer que eu ajoelhe? – Tony questionou com uma expressão falsamente impressionada, pondo-se de pé ao lado da ruiva. Aquilo me fez rir antes de abraçá-los. Eles sorriam tanto quanto eu.

– Você deveria. – A voz de Loki se fez ouvir, um pouco atrás de mim.

– E trouxe a rena! – Meu irmão ironizou. O deus revirou os olhos, impaciente. Correu o olhar pela sala e sentou-se numa poltrona de espaldar alto com certa indiferença. Ele não era exatamente um fã de Midgard e muito menos de Tony, mas costumava me acompanhar mesmo assim.

Pepper se aproximou dele, lhe oferecendo um copo de whisky. O deus olhou da bebida para ela e levantou uma sobrancelha. A ruiva levantou a própria em resposta com um meio sorriso. O moreno acabou aceitando sem questionar mais. Na verdade eles se davam razoavelmente bem. Pepper tinha essa habilidade incrível de se relacionar. Enquanto isso, meu irmão tagarelava alguma coisa sobre eu estar vestida como uma personagem de Game of Thrones. De acordo com ele nesse caso não era bom eu ser uma Stark.

– Ok, só Schroeder então. Podemos pedir pizza? – Falei o interrompendo sem muito tato.

– Jarvis? – Ele chamou.

– O de sempre senhorita?

– Por favor. – Confirmei, me sentando no sofá, enquanto tirava as sandálias altas dos pés e colocava as pernas sobre as de Pepper. Para minha surpresa de alguma maneira que eu não conseguia entender ela havia engatado uma conversa sobre arquitetura renascentista e arquitetura asgardiana com Loki. Eu e Tony nos entreolhamos pasmos, antes de nos perdemos em qualquer bobagem.

Aquela era a melhor parte da noite sem dúvida nenhuma. A melhor parte do ano, eu diria. Eu finalmente estava longe dos olhares avaliadores e das inconveniências da corte. Eu finalmente estava em casa.


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Notas finais do capítulo

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