Vida em Erebor escrita por Vindalf


Capítulo 35
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Notas iniciais do capítulo

O tratamento faz Anna avaliar suas opções



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O treinamento faz Anna avaliar suas opções

O inverno estava bem avançado quando Lord Elrond declarou um avanço extraordinário no aprendizado de Anna. Ela dominava a maior parte das ervas e suas propriedades, usava sua mágica para localizá-las na mata e para identificar a doença.

Certa vez, sob a supervisão de Lord Elrond e com a escolta de Eldrin e dos gêmeos, Anna viajou a uma vila de homens nas proximidades de Bree para pôr em prática seus conhecimentos. Foi apresentada como Erulissë e autorizada a praticar sua medicina, pois havia uma epidemia de gripe no local. Entre ida e volta, após uma semana, estavam de volta a Rivendell. E não era sem tempo. Darin estava quase doente pela separação prolongada da mãe.

Assim que a viu, o menino desatou num berreiro sem fim e jogou-se em seu colo. Anna o consolou, mas queria chorar com ele, de tantas saudades.

Arwen relatou, penalizada:

— Ele ficou tão desolado que eu estava a ponto de diluir um pouco de miruvor para ele.

Elrond comentou:

— Talvez não adiantasse muito.

A elfa se justificou:

— Eu me vi sem alternativa: cânticos, músicas, jogos — nada funcionava. Na verdade, nem Estel conseguiu acalmá-lo.

Embalando Darin nos braços, Anna sussurrava:

— Mamãe está aqui, meu amor. Também senti muita saudade, filhinho. Lamento ter demorado tanto. Não vou mais sair tão cedo.

Elrond comentou:

— Talvez deva repensar sua ida a Erebor. Darin pode ficar estressado.

— Não vou poder levá-lo. Mas eu vou até lá. Continuarei treinando como um falcão. Se eu treinar bem, talvez possa ir e voltar em apenas três dias.

O Senhor de Imladris reforçou:

— Ainda não gosto da ideia de você ir sozinha nesta viagem tão longa. É um risco enorme.

Anna deu de ombros:

— Sei que é arriscado, mas essa é uma coisa que preciso fazer.

Ele suspirou:

— Eu entendo, Erulissë. Mas temos tempo de pensar em tudo isso. Arwen precisa saber que a ida ao vilarejo dos homens foi um sucesso.

A elfa abriu um sorriso.

— Eu imaginei. Ela tem o dom, meu pai: uma verdadeira discípula de Nienna.

Anna indagou, enquanto Darin choramingava:

— Nienna se relaciona à cura, não é?

Elrond aquiesceu:

— Ela é uma poderosa Vala e também representa piedade e compaixão. Embora sua energia tenha o toque de Yavanna, Erulissë, o dom de cura vem de Nienna. Pode-se ver em você.

Anna suspirou:

— Não posso ver poderes dos Valar. Tenho tanto a aprender...

Elrond lembrou:

— Talvez você não precise vê-los. Mas quando você toma a água de Gil-Estel, você resplandece com esses poderes. É uma luz que lembra a todos os eldar que você é uma dádiva, Eldalinossë.

Anna ainda tinha suas dúvidas, mas sentia-se mais tranquila, agora que Darin tinha se acalmado e estava quase dormindo. Ela só sabia que tinha muito a aprender.

Darin ficou tão agarrado a Anna nos dias que se seguiram que ela quase titubeou sobre sua visita a Thorin. Mas adiar a ida seria usar seu filho como desculpa para o fato de que ela ainda não sabia o que faria de sua vida e, portanto, ainda nada tinha a dizer a Thorin.

Elrond sentiu sua angústia e indagou a esse respeito. Anna foi obrigada a abrir seu coração.

— Muito me dói ter que dizer a verdade que a cada dia cresce em meu coração: aproxima-se a hora de minha partida.

O meio-elfo assentiu:

— Previ que isso fosse acontecer.

Ela garantiu:

— Depois de tudo que fez por mim, não quis parecer ingrata ou insensível por partir. Imaginei que fosse me estabelecer aqui. Mas agora vejo que preciso ie embora. E partir de Rivendell sempre me deixa triste. Este lugar é muito especial para mim, bem como seus moradores. É como um segundo lar.

Ele sorriu:

— Fico feliz que pense assim, pois é exatamente como quero que veja Imladris. Aqui você sempre será bem-vinda. Quando chegou, quis acreditar que fosse ficar, mas agora vejo que não é o caso.

— Disse que previa minha partida — lembrou Anna. — Como?

O meio-elfo esclareceu:

— Quando a levei à vila de homens, quis testar mais que suas habilidades de curadora. Lá tive a certeza de que esta é sua vocação e que não poderia exercê-la se ficasse aqui, pois nossa raça dificilmente necessita de serviços desse tipo.

Anna concordou:

— Minha energia também me pede voos para fora deste vale. Tenho sua bênção, então?

— É claro. Alámenë (vá com nossa bênção). Pretende voltar a Erebor e ficar com seu marido?

A reação dela foi suspirar, aflita:

— Esta é a maior fonte de minha angústia, meu caro Lord Elrond. Pois minha decisão de não mais morar em Erebor não mudou. Tenho meu filho para sustentar e como vou conseguir viver sozinha é algo que me assusta. Não acho que deva aceitar a oferta de Saruman, por mais generosa e honrosa que seja. Por outro lado, começo a pensar que talvez eu seja obrigada a repensar minha decisão devido à mera

impraticabilidade dela. Não quero parecer inflexível, mas eu vejo que estou ficando sem opções.

Elrond procurou tranquilizá-la:

— Erulissë, fique tranquila. Os Valar não vão desampará-la, e você tem família. Você e seu filho são família para os eldar e para os nogothrim. Nossas portas sempre estarão abertas para o que precisarem. Precisa confiar na sua luz. Ela a guiará na sua jornada.

Algo nas palavras de Elrond despertou palavras quase esquecidas.

"Você e o bebê sempre serão bem-vindos. Vocês são família."

Eram as palavras que Anna precisava ouvir, as palavras exatas que ela mais queria ouvir. E então ela se deu conta que ela já tinha ouvido.

Bilbo.

"Se Thorin se mostrar teimoso demais, sabe, então, bem... você e o bebê podem vir morar comigo em Bag End. A qualquer hora. Vocês são família, e eu sempre terei minha porta aberta para vocês, pelo tempo que quiserem."

Anna abriu um sorriso e disse baixinho, em Khuzdul:

— Mahal o abençoe, Mestre Baggins...

O Senhor de Rivendell franziu o cenho, sem entender do que ela falava. Anna estava tão excitada que misturou várias línguas enquanto explicava seu plano a seu anfitrião.

Afinal de contas, preparativos precisavam ser feitos.

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A partir do momento que Anna tomou uma decisão, tudo pareceu fluir de maneira mais fácil. As lições pareceram ser mais simples, mesmo sendo as mais complicadas.

Outras coisas também foram encaminhadas com mais tranquilidade, como a ida de Anna até Erebor. A moça garantiu que não se demoraria além de estritamente necessário, para não estressar Darin.

A verdade era que Anna tinha agora mais esperança no futuro. Ela construía cenários em sua cabeça: trocaria de peles para visitar Thorin em Erebor com a maior frequência que pudesse. Se Bilbo não pudesse tê-los em Bag End, ela tentaria se realocar para mais perto da Montanha Solitária. Ela poderia adotar seu nome élfico e Darin poderia usar o nome de Belethien, que queria dizer "homem forte" — Authiel o chamava assim quando ele se comportava com teimosia típica do povo de seu pai. Mas quando Darin mostrava seus poderes, ela o chamava Belthil – "força divina".

Anna mal podia esperar para falar com Thorin.

Na véspera de partir, Anna foi chamada por Lord Elrond. Ele queria falar de seu treinamento, como faziam regularmente. Mas não era só isso que ele queria falar.

— Você está quase pronta a exercer o ofício — declarou Lord Elrond. — Aproxima-se a hora de partir. Por isso pedi a Eldrin que fosse ao Shire. Ele tentará entrar em contato com Bilbo Baggins e Gandalf. Você pode escrever uma carta a nosso amigo hobbit.

Anna indagou:

— E conseguirão achar o Istari? Ele pode ser bem escorregadio.

— Eu o tenho deixado a par dos acontecimentos. Ele insistiu em levá-la até o Shire quando chegasse a hora e, bem, está chegando a hora.

— Entendo.

— Agora, sobre sua viagem a Erebor, devo insistir para que leve um frasco de miruvor. Pelo que disse, basta mantê-lo junto a seu corpo durante a transformação para que não se perca, estou certo?

— É isso mesmo.

— Vou providenciar para que possa levá-lo amarrado a seu pescoço. Assim não haverá problema.

— Obrigada.

Elrond a encarou gravemente e disse, com uma trepidação totalmente atípica no elfo:

— Você é família, Erulissë, e nós sempre a apoiaremos. Mas escute alguém que vive longe de seu parceiro: a distância pode ser cruel e nos fazer esquecer nossa verdadeira natureza. Tolmennorne é seu marido, ele a ama muito, e é um bom homem. Sei que tem grande amor por ele. Você também honraria seu ofício curando o povo nogothrim em Erebor.

Anna suspirou fundo antes de responder:

— É por amar meu marido que não pretendia deixá-lo saber que eu ainda estou viva. Mas agora vejo que foi uma decisão baseada no medo. Eu preciso levar em conta a felicidade de meu filho e de meu marido. Não posso viver em Erebor, mas não posso viver sem Thorin em minha vida.

O Senhor de Rivendell ergueu uma sobrancelha e declarou, constatando:

— Você tem um plano.

Anna sorriu:

— Não é exatamente um grande plano, mas pretendo visitar Thorin regularmente, em segredo. Mudarei de identidade, se for preciso.

— Se Rivendell é longe da Montanha Solitária, o Shire fica ainda mais distante — lembrou Elrond.

Anna deu de ombros e ressaltou:

— Eu disse que não era um grande plano. Nem sei se Thorin vai concordar. Confesso estar contando com a alegria dele ao me ver para fazê-lo concordar. Caso contrário, não sei o que fazer.

Elrond recomendou:

— Confie em sua luz, pois ela vem dos Valar. Eles não vão desampará-la.

Anna recebeu aquelas palavras como bálsamo que eram para sua alma agitada. Aquela era uma atitude quase budista, pensou. Talvez fosse disso que ela precisava naquele momento: algo zen.

E se a leveza fosse suficiente, poderia ajudá-la em seu voo rumo a Erebor.

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Animada com os rumos que sua vida se encaminhava, Anna levantou voo na pele de um falcão peregrino assim que Darin dormiu, numa tarde fria de inverno. A excitação a impulsionava mais que a força das próprias asas. A noite se aproximou rapidamente, ainda mais para quem se movimentava rumo leste.

Era noite cerrada quando Anna chegou à Montanha Solitária. Estava exausta e nervosa: não era um bom estado de espírito para ver seu marido depois de tanto tempo. Fez uso do frasco de miruvor e, renovada, transformou-se num passarinho.

Após breve busca, achou o que procurava: a janela do quarto do rei, a que dava para a sacada. Felizmente, havia uma brecha.

Anna pousou e suavemente se transformou. Entrou no aposento sem fazer barulho. Seus ouvidos ecoavam as batidas aceleradas de seu coração emocionado ao ver-se em seu antigo quarto.

À primeira vista, nada mudara: os móveis, as paredes, a lareira acesa. Então Anna notou um quadro que não estava lá antes. Era uma grande gravura feita a mão, um retrato seu, desenhado com detalhes e precisão. Ela se lembrou daquele desenho. Ori o fizera durante a viagem a Erebor.

Um ruído a alertou. Da cama, um suspiro suave a fez ter certeza de que a cama era ocupada.

Seu marido dormia.

Ela se aproximou da cama, emocionada. Ouviu-o fazer outro ruído e chegou ainda mais perto. Viu-o na cama e então os olhos azuis que tanto amava se abriram, olhando diretamente para ela como se ele soubesse que ela estava ali. Anna sentiu o coração perder o ritmo, suas pernas fraquejaram.

Em todo o tempo que ficou separada de seu amor, por mais que sofresse, Anna não tinha sentido tanta saudade como a que bateu ao vê-lo a encarando, pálido, inseguro. A visão de Thorin provocou em Anna um turbilhão de emoções tão intensas e profundas que ela tinha dificuldades em separá-las.

Apesar da pouca luz do quarto, ela viu que ele usava sua camisa de dormir. Os olhos azuis estavam arregalados e brilhavam num misto de confusão e descrença. Thorin tinha o olhar de quem via uma aparição — para ele, ela era exatamente isso: um fantasma.

Cabia a Anna ser gentil nessa hora. Ela tentou manter a voz firme, mas não conseguiu deixar de se emocionar, ao chamar, estendendo a mão para ele:

Ukurduh...

Anna viu Thorin erguer a mão trêmula, incerto, talvez esperando que seus dedos só encontrassem o vazio e a miragem se desfizesse. Contudo, sua mão encontrou a dele, e num impulso ele recolheu a mão, assustado.

Anna usou toda sua delicadeza para pegar a mão dele suavemente e colocar entre as suas, garantindo:

— Meu amor, sou eu mesma. É Anna. Acredite em mim. Não é sonho. Estou aqui, meu amado...

Metade das palavras dela se perderam em lágrimas quentes e frescas, que ela não conseguiu controlar. Mas nada disso importava, pois Thorin se lançou a agarrá-la pela cintura, chamando:

Ghivashel...!

Palavra em Khuzdul

ghivashel = tesouro de todos os tesouros

Palavras em Sindarin

miruvor = tônico restaurador

nogoth = anão

nogothrim = povo anão

Tolmennorne = escudo de carvalho (literalmente)


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