Vida em Erebor escrita por Vindalf


Capítulo 34
Hora da cura


Notas iniciais do capítulo

Anna precisa ser preparada para o treinamento



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Hora da cura

Anna precisa ser preparada para o treinamento

Com a manifestação inequívoca da mágica de Darin e de Anna, Saruman foi obrigado a desistir de seu plano e voltou a Isengard sozinho. Anna passou então a se preparar para começar o treinamento com Lord Elrond.

O Senhor de Rivendell disse que seriam necessários alguns dias antes que ela e Darin estivessem prontos para o treinamento dela. Ela questionou que Darin precisasse de preparação também. Mas Elrond disse ser essencial. Afinal, sendo um treinamento voltado para energia, e sendo a energia dos dois semelhante, o pequeno terminaria sendo afetado.

Então, por uns poucos dias, Anna passou curtindo seu tempo com Darin. Estel brincou com o pequeno, que gostava de engatinhar atrás do jovem. Anna também esteve com Eldrin na floresta treinando suas transformações, e ganhou um novo nome élfico: Helmahya, troca-peles.

Anna tentava falar com Arwen sobre medicina élfica, como que para adiantar o assunto. Parecia ser fascinante. A elfa era gentil, mas na verdade, falava pouco

À noite, após o jantar, não era incomum que a família de Elrond se reunisse com Anna, num estranho bate-papo. Anna notou que elfos não eram de jogar conversa fora, então a coisa toda era um exercício de mistério, como se eles falassem de um segredo que só eles conheciam.

Outra coisa lhe chamara atenção: Anna mal se dera conta, porém, que havia dias que ela só falava na língua dos elfos. Ela genuinamente não percebera quando começara a falar em outra língua. Fazia sentido, porém, já que seu aprendizado seria naquela linguagem.

Tudo podia parecer tranquilo, mas para Anna era pura agonia. As palavras de Saruman sobre a distância e a dor de Thorin a feriram de maneira profunda. Pois embora não confiasse no mago, ela sentia que as notícias que Saruman dera de Erebor eram verdadeiras. Portanto, Anna sabia que Thorin sentira muito sua morte, como ela previra - e não havia surpresa nisso, uma vez que ela também estava com o coração em frangalhos.

O que Saruman não sabia era que Anna já tinha decidido visitar Thorin. Só não decidira quando, porque não sabia ainda o que fazer de sua vida. E ela precisava saber muito bem o que faria de sua vida, para fazer Thorin entender e aceitar essa decisão.

Pois a única decisão que Anna tomara até o momento tinha sido NÃO viver em Erebor. Mas quanto mais o tempo passava, menos inclinada ela se sentia a morar em Rivendell. Era estranho, porque ela não tinha motivo para não querer viver no vale dos eldar. Eles eram sua família, sempre a trataram com respeito, o lugar ela lindo, ela confiava neles e sentia segura, mas... o que a impedia de viver ali?

Então ela entendeu.

Elfos viviam sempre muito contidos, sempre politicamente corretos. Eles não a deixavam à vontade! Tudo era tão formal, tão altivo. Será que eles nunca se alteravam? Nunca tinham vontade de xingar?

Fã de cultura geek, Anna encontrou um correspondente em outra cultura. Ela percebeu que em Rivendell ela se sentia cercada de Spocks. Seu personagem favorito de Star Trek tinha muitas semelhanças com os eldar: também era altivo, vegetariano, calmo e de orelhas pontudas. Os habitantes de seu planeta, Vulcano, optaram por renunciar às emoções e à violência, pregando a lógica como filosofia de uma vida pacífica.

Os eldar não renunciaram à violência ou às emoções, mas tinham o mesmo modo distante e desapaixonado dos vulcanos. Se Anna já se sentia desconfortável, como se sentiria Darin, com sangue khazâd em suas veias? Criá-lo neste ambiente poderia não ser a melhor opção para ele, e também ainda seria uma constante fonte de atrito com Thorin.

Viver em Rivendell era conviver com o risco constante de revelar demais sobre o futuro a Estel, ou Elrond, ou pior ainda: Saruman. Anna não duvidava que esse tivesse sido um dos motivos pelos quais o mago branco queria levá-la para Isengard.

De qualquer modo, Anna ainda teria tempo para decidir onde morar. No momento, ela tinha que se concentrar em seu treinamento.

No início da tarde de um dia úmido e cinzento, Lord Elrond avisou:

— Faça seus preparativos. Amanhã você começa seu processo de purificação e provavelmente não poderá ficar com seu filho.

Anna ficou alarmada e apressou-se em indagar:

— Ele não pode ir junto? Darin é tão quietinho-

Um gesto do senhor de Rivendell a fez se calar.

— Ele estará a seu lado, sendo igualmente purificado. Ele também precisa da cura. Mas você estará inconsciente.

Ela ficou apreensiva:

— Inconsciente?...

Ele tentou tranquilizá-la:

— É a maneira mais segura de lidar com sua energia. Acredito que, purificando a sua energia, a de Darin sofrerá igual efeito. Authiel estará com ele, e Arwen se ofereceu para ajudar. Vocês terão toda a assistência.

Anna garantiu:

— Tenho total confiança em seus procedimentos. Mas estou curiosa para entender como funciona.

Lord Elrond explicou:

— Hoje a lua será nova, o que ressalta a luz das estrelas. Como sabe, os eldar festejam a luz das estrelas como um reflexo dos Valar nesta terra. É a melhor ocasião para o ritual.

— Entendo.

— Acreditamos que a magia de nosso povo estará especialmente presente nesta noite. Sem essa purificação, sua habilidade de cura fica diminuída, prejudicada ou até mesmo comprometida. Você poderá se purificar sozinha a partir do ritual, mas eu sei que isso levará tempo.

Anna o encarou e disse, com sinceridade:

— Não tenho certeza de ter compreendido.

Elrond explicou:

— O ritual de purificação que posso fazer vai lhe dar instrumentos para realizar sua própria cura. O restante você terá que fazer por si mesma, mas não será rápido.

— Mas como poderei fazer isso sozinha? Eu não sei como fazer isso.

Elrond fez uma pausa e olhou bem dentro dos olhos de Anna antes de explicar - e foi uma das explicações mais claras que ela se lembrava de ter recebido de um elfo:

— Erulissë, você tem um vazio em seu coração. Galadriel me disse que era uma cratera muito grande, mas que o tratamento em Lothlórien ajudara a diminuir esse buraco. Contudo, não há dúvida - é uma aflição da alma. Mais do que isso: é um local através do qual o Mal pode ganhar entrada em seu coração. Por isso eu tenho minhas dúvidas se sua recusa em receber seu treino de Isengard foi sábio. Saruman pode protegê-la.

Anna tinha pronta a reposta mais diplomática possível:

— Não foi possível. Minha mágica não era compatível com o que ele propunha.

— Isso ficou claro. Mas você ainda precisa se curar para fazer seu treinamento, e eu só consigo ajudá-la até determinado ponto. Além disso, você precisa se entender consigo mesma.

Então Anna teve um insight e exclamou:

— Thorin!... Thorin é o vazio em meu coração.

O senhor de Rivendell assentiu, dizendo:

— A sua situação com Thorin Oakenshield a faz sofrer enormemente. Você sente dor, como se estivesse em luto, mas também sente culpa. No momento, a culpa é maior.

Anna já sentia as lágrimas no rosto ao argumentar:

— Meu lugar é ao lado de meu marido. Eu sei disso. Mas temo por minha vida e a de Darin. Thorin não pode deixar Erebor. Não vejo saída para nós. — Ela tentou engolir o soluço, de tanta dor ao ver que não havia solução a não ser viver afastada do seu grande amor. — Mas já tomei a decisão de dizer a ele que estou viva. Poderemos nos ver de vez em quando.

Elrond garantiu:

— Este é o buraco em seu coração. Você precisa curá-lo. Lembre-se: você pode encontrar respostas ou soluções, mas precisa curar seu coração.

Foram palavras que deixaram Anna pensando o resto do dia.

Quando a noite caiu, Anna recebeu um jantar especial, com caldos nutritivos, seguido de uma infusão especial e instruções para deitar-se imediatamente. Ela não teve chance de desobedecer, pois a bebida a deixou grogue e tonta.

Ela praticamente deixou-se cair na cama e permitiu que a inconsciência a cobrisse como um manto denso.

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Anna se sentia pesada quando acordou. A primeira coisa que viu foi Arwen a seu lado. Grogue, Anna tentou se erguer, mas a elfa a impediu:

— Melhor ficar quieta por enquanto. Tome. — Ela ofereceu água. — Vai fazer bem.

Anna obedeceu, sentindo o frescor na garganta como alívio. Em seguida, voltou a dormir.

Da segunda vez que acordou, Anna viu que estava sozinha. Ela se levantou, ainda lenta, mas sentindo-se muito descansada. Cuidou de sua higiene matinal, para em seguida buscar Darin. Ele dormia no bercinho, e Anna sorriu.

Ela não sabia nada do que se tinha passado: quanto tempo dormira, o que acontecera. Mas acordara descansada e leve como há muito não se sentia. O mais curioso é que Anna se sentia como se tivesse tomado uma grande decisão sobre sua vida, embora ela permanecesse a mesma.

— Ma!

Anna olhou para baixo e viu Darin acordado, sorrindo para ela, bracinhos estendidos.

— Você já acordou, seu danadinho? — Ele deu outro gritinho animado e ela o pegou em seus braços. — Aposto que está com fome. Mas primeiro vamos ver como anda essa fralda.

Ao oferecer-lhe o seio, após a troca da fralda, Anna comprovou a tese de que ele tinha mesmo muita fome. Ela já tinha alimentado Darin e os dois brincavam no chão quando Authiel entrou no quarto, pé ante pé.

— Oh, senhora! — Ela estava surpresa. — Desculpe entrar de forma sorrateira. Não pensei que estivesse acordada.

Anna sorriu e disse, quando Darin gritou, reconhecendo a elfa:

— Estamos despertos e animados. Veja, ele quer brincar com você.

Authiel se ofereceu:

— Se quiser se dedicar a outras atividades, posso cuidar dele.

Anna aceitou a oferta para se refrescar rapidamente e refazer as tranças. Normalmente, era um ritual penoso para ela — lembrava-se de suas perdas, de suas tristezas. Naquele momento, porém, ela cumpria o ritual com serenidade e orgulho.

Authiel notou:

— Madame não prefere usar o cabelo solto?

Anna explicou:

— Essas tranças não são meros adornos. Meu marido me explicou que elas contam a história de uma pessoa. Essa trança aqui — ela mostrou — conta a outros que sou uma mulher casada, e a conta foi feita pelo meu marido com o símbolo de sua família. Essa outra conta é de um material diferente e ganhei quando Darin nasceu.

— Então um outro anão que nunca a tenha visto saberá quem você é?

— Sim, com certeza, pois o símbolo dos Durin é sagrado para todo khuzd. E meu filho é descendente do Pai de Todos os Khazâd. Eles saberão exatamente quem nós somos.

— Mas se quer se esconder, não deveria disfarçar estes objetos?

— São a herança do povo da minha família e presentes de meu amado. Eu os uso com orgulho.

Uma voz diferente se ouviu:

— São palavras que vão alegrar meu pai, Erulissë. — Lady Arwen caminhou graciosamente até o grupo. — Vejo que está bem melhor.

Anna confirmou:

— Eu me sinto bem, obrigada. Seja lá o que tenham feito, funcionou.

Ela sorriu suavemente, os grandes olhos azuis brilhando:

— Sua cura é seu mérito. Venha. Meu pai quer supervisionar sua refeição.

Anna agasalhou Darin, pois o dia estava ensolarado e gelado, e depois saíram até um dos salões. Lord Elrond os esperava com um sorriso.

— Vejo que estão em boa saúde. Excelente!

Anna garantiu:

— Seu tratamento parece ter dado ótimos resultados.

— Isso é muito bom. Depois espero que me diga o que aconteceu.

— Como assim? O tratamento...

Elrond explicou:

— Só o que fizemos foi favorecer a interação de seu espírito com sua magia. A beberagem é sagrada, para deixar seu espírito solto e livre para buscar a própria cura em sonhos. Havia desequilíbrio dentro de você, mas parece ter melhorado. Imaginei que tivesse vivências incríveis para relatar.

Anna estava desapontada.

— Mas eu não me lembro de nada!... Eu apenas dormi e depois acordei. Isso é tão frustrante!

— Bem, talvez você se lembre mais tarde — sugeriu ele. — Ou pode nem ser importante que você se lembre dos caminhos de seu espírito. Seja como for, sua luz mudou de cor e indica estar pronta a começar. Vamos, primeiro, à refeição.

A partir dali, Anna entrava em um novo mundo. Havia novas refeições, novas reflexões, aprendizado intenso e mudanças profundas trazidas pela estação mais fria do ano.

Nada mais seria o mesmo.

Palavras em Sindarin

Erulissë = presente, graça (significado de Anna)

helmahya = troca-pele

Palavras em Khuzdul

khuzd = anão

khazâd = povo anão, anões


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