Vida em Erebor escrita por Vindalf


Capítulo 20
Um parto difícil


Notas iniciais do capítulo

Mais ajuda é convocada



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Um parto difícil

Mais ajuda é convocada

— Ah, Thorin, meu rapaz — saudou Gandalf, ao lado de Radagast. — Estamos aqui imaginando se metade dos rumores que ouvimos são verdade.

— Sim, Anna está tendo nosso filho — O recém-ungido Rei Sob a Montanha parecia aflito. — É cedo demais, Gandalf!

O mago disse:

— Fique calmo, Thorin. Os Valar sabem o que estão fazendo.

Radagast parecia entusiasmado:

— Ah, neve e flores! Sempre nos surpreendem!

Thorin indagou:

— Vocês viram o rei élfico?

Como se tivesse ouvido o chamado, Thranduil aproximou-se por trás, acompanhado do filho.

— Rei Thorin — saudou. — Que notícias traz da Consorte?

— O bebê está chegando. Sua protegida se ofereceu para ajudar, e aceitei sem consultá-lo. Desculpe-me pela ousadia.

Gandalf acompanhava o diálogo com interesse. Thranduil inclinou a cabeça graciosamente:

— Tauriel ofereceu seus serviços de boa vontade. Fico feliz em poder ajudar.

Thorin disse:

— Agradeço muito. Agora peço perdão em deixá-los, mas devo ficar com minha mulher.

— É claro — disse Gandalf. — Se precisar de qualquer coisa, estamos aqui.

— Obrigado.

Radagast comentou:

— Eu sabia! A neve florida sempre nos traz acontecimentos marcantes! Ainda mais na lua cheia.

Thorin ia saindo, quando algo adormecido despertou em sua mente. As palavras de Radagast o fizeram se lembrar de uma frase ouvida há meses atrás, um presságio...

"quando a neve florida ficar rubra de sangue"

Os presságios de Óin...

Thorin empalideceu e arregalou os olhos, antes de balbuciar suas desculpas e sair correndo de volta à ala real.

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"É ridículo, Anna", dizia para si mesma. "Não houve um Julio César na Terra Média, então não tem como ter uma cesariana."

Agora Dís estava num lado de Anna, Hila do outro e a parteira ao pé da cama. A criada secava o suor do rosto de Anna, e Dis sentia as unhas de Anna se cravando em sua pele a cada contração. Tauriel ajeitava a água no fogo e o bercinho com roupas limpas.

— Está indo muito bem, madame — disse a parteira. — Tudo está indo bem.

Anna indagou, arfando:

— Não está demorando...?

— Eu sei que parece muito tempo, mas está dentro do esperado. Respire.

Dís ajudou:

— Respirar faz diferença. Lembre-se também que a dor vai acabar em breve. Portanto, ajude seu filho a vir ao mundo.

Anna gostaria de responder, mas a contração que a atingiu terminou sendo apenas o gatilho para outro urro.

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O filho de Thráin percorreu os corredores do seu reino com o semblante agoniado e uma dor no peito. Pensamentos sombrios lhe rondavam a mente, impedindo-o de reparar no mundo à sua volta. Ele mal podia esperar para chegar à ala real.

As palavras de Óin meses atrás voltaram a assombrá-lo. O presságio falava em neve florida rubra de sangue, e outras coisas como morte. Thorin não quisera prestar atenção aos maus presságios, e agora o terror ameaçava dilacerar o coração.

Ele tivera todos esses meses de felicidade ao lado de Anna. Será que nada era permanente em sua vida? Teria ele ofendido os deuses tanto que ele sempre deveria perder tudo que tinha, sem direito a felicidade? E o preço, desta vez, seria a mulher que amava e o filho que ela carregava?

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Kíli se impacientou:

— Já faz mais de uma hora! Por que não tiram logo o bebê?

Fíli ralhou:

— Quer matar nossa tia? Essas coisas demoram!

Nori disse:

— Eu me lembro quando Ori nasceu. Demorou quase um dia inteiro.

Dori concordou:

— Mahal ajude nossa rainha.

— Como será que ela está? — indagou Bofur.

Balin suspirou:

— Vamos rezar que para que tudo dê certo.

Nesse momento, duas ações simultâneas aconteceram: a porta se abriu para Tauriel, que deixou o quarto no exato momento em que Thorin aparecia no recinto, com uma expressão preocupada. Da maneira reservada dos elfos, Tauriel anunciou:

— Acabou. O bebê nasceu.

Thorin se aproximou, coração ameaçando sair pela boca.

— Está... vivo...?

A elfa respondeu:

— A criança está com boa saúde. Sua Majestade pode entrar agora.

O som de um choro de criança enfatizou a afirmação, e os homens sorriram, satisfeitos. Thorin se adiantou para passar, mas deteve-se e quis saber:

— E o que é?

— Anna deu a luz a um menino.

Gritos de celebração irromperam na companhia, e Thorin recebeu tapinhas nas costas, antes de entrar no quarto rapidamente. Os amigos celebravam o acontecimento quando o esperto Ori notou o semblante tenso da elfa ruiva.

— Tem algo errado — deduziu ele. — Não tem?

Tauriel encarou o jovem anão e assentiu. — Anna está muito fraca.

— Ela está morrendo? — perguntou Fíli, alarmado.

— Não sabemos — respondeu a elfa. — Mestre curador, deve vê-la assim que puder.

Kíli urgiu:

— Vamos entrar logo!

Uma voz feminina conhecida interrompeu:

— Ninguém vai entrar lá agora. — Dís saiu, com Hila e a parteira. — Vamos dar uma chance à nova família para se conhecer.

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Anna estava só no quarto, apoiada em almofadas, a pele ainda úmida após a limpeza feita por Hila e Tauriel. A criança estava adormecida em seus braços e Anna a encarava com curiosidade, exausta, maravilhada com o tufo farto de cabelo preto, tocando os dedinhos, tentando observar o que parecia com Thorin, ou talvez Dís ou os meninos.

— Filho...

Embora o parto tenha demorado horas (e cada hora parecia estender-se por dias), Anna sentia que todo o processo tinha sido muito rápido. Ela ainda não se acostumara ao fato de que a gravidez tinha terminado e ela segurava seu filho.

A porta abriu-se e Thorin entrou, silenciosamente. Anna disse:

— Olha só, filhinho: o papai veio conhecer você.

Thorin sentou-se na cama, olhos fixos no bebê. Ele indagou:

— Como se sente, ghivashel?

Anna sorriu:

— Eu me sinto como se tivesse primeiro sido atropelada por um trem e em seguida, ganhado na loteria.

Thorin franziu o cenho:

— Como?

Anna se deu conta do que dissera e explicou:

— Desculpe, é o cansaço falando. Estou exausta, mas muito feliz.

Thorin olhou para a criança, com um pequeno sorriso triste.

— Ele me faz lembrar meu irmão...

Anna sentiu os olhos pesando, mas ergueu o olhar para observar a expressão de profunda alegria no rosto do marido.

— Quer homenagear seu irmão? Podemos dar a ele o nome de Frerín, se preferir.

— Não — preferiu Thorin. — Muitas lembranças. Ele deve ter seu nome próprio.

— Ficamos com Tharin, então? Ou quem sabe Darin? Acho que combina mais com ele.

Thorin considerou e notou que o nome continha a raiz da palavra em Khuzdul arcaico para "milagre". Ele disse isso a Anna. Ela sorriu:

— Oh, que lindo, nosso pequeno milagre. Viu como ele é grande? A parteira disse que ele está todo formado.

Thorin não tinha parado de sorrir:

— Ele é perfeito...

Naquele momento, o bebê mexeu a cabeça, fazendo uma careta como se alguma coisa o incomodasse. Abriu a boquinha rosa, mas não chorou. Então ele abriu os olhos azuis, e Anna disse:

— Olá, meu filho. Vem dizer oi pro papai.

Thorin encostou um dedo na mão do bebê, que imediatamente fechou os dedinhos e capturou o dedo do pai. O Rei Sob a Montanha ficou maravilhado.

— Acho que ele gostou de você.

Thorin estava hipnotizado.

— Esse é o dia mais feliz de minha vida...

Anna disse:

— Quer pegá-lo?

Ela o passou ao marido, que pegou a trouxinha em seus braços, apoiando a nuca numa mão e o corpo com a outra. Thorin inclinou-se para beijar a testa dele, e o gesto fez o bebê parar de se mexer, encarando o pai de maneira solene com os dois olhos azuis totalmente em foco.

Thorin soltou um som abafado, uma mistura de surpresa, adoração e fascinação. Uma lágrima escapou dos olhos azuis, e Thorin nem notou, fascinado com o filho. Fazia tempo que Anna não via tanta emoção no rosto de Thorin, assim aberta e franca, pensou ela, cansada.

Darin abriu a boca e parecia que ia chorar, mas ao invés disso, ele abocanhou o quanto pôde do nariz de Thorin, surpreendendo seus pais.

— Thorin, ele gostou mesmo de você... — riu-se Anna.

O rei riu-se ao sentir o molhadinho na ponta do nariz. Ao notar que ali não tinha o que queria, o bebê soltou um choro alto de frustração. Thorin sugeriu:

— Acho que ele está com fome.

Anna riu-se:

— Oh, você acha? Vamos, deixe-me alimentá-lo.

Thorin obedeceu, mas estava preocupado:

Âzyungâl, está forte o bastante para amamentar?

Anna pegou o bebê (que ainda chorava) e o pôs em seus braços, dizendo:

— Daqui para frente terei que ser, meu amor... Nosso filho precisa comer.

Ela puxou um seio para fora do vestido e ajeitou Darin, que reclamava muito. Com ajuda, o bebê achou o que queria e sugou com vontade, fazendo Anna suspirar.

— Machucou? — preocupou-se Thorin.

— Não, foi só... inesperado.

Anna sempre ouvira falar do forte vínculo que mães formavam com seus filhos ao amamentá-los, mas não imaginara a intensidade dele até experimentar por si mesma. Naquele momento, até sua grande devoção a Thorin ficava em segundo lugar. Ela encarava o bebê com afeição inenarrável, acariciando-o na cabeça cheia de cabelos.

Sem que Anna percebesse, intensas emoções também inundavam Thorin Oakenshield. Ver sua mulher amamentando seu filho pela primeira vez era uma cena que ele jamais imaginara testemunhar em sua vida. Ele pensou em todos os anos e humilhações do exílio, os sacrifícios feitos pelo bem de seu povo... Agora ele estava de volta em seu trono, em sua terra natal, com uma família que o amava. Thorin Oakenshield nunca sentira tamanha felicidade.

Quando Darin terminou de mamar, Anna pediu que Thorin o levasse para conhecer a companhia e sua família.

— Vou aproveitar e descansar — disse ela, entregando o filho ao pai. — Sinto-me tão cansada...

Thorin beijou sua testa com cuidado.

— Descanse, ghivashel. — Thorin viu os olhos de Anna se fechando e ela ficou imóvel, o peito subindo e descendo no sono profundo. Ele se preocupou com a palidez de Anna, o coração apertado.

Olhou para baixo. Darin estava quieto, encarando o pai em silêncio.

— Vamos, filho — cochichou Thorin. — Venha ser paparicado por seus primos.

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Na sala íntima onde a família e amigos estavam reunidos, era grande a expectativa. Kíli e Fíli enchiam a mãe de perguntas:

— Meu primo está bem?

— Deve ser muito pequeno! Minha tia é miúda!

Pacientemente, Dís respondeu:

— Ele é um pouco miúdo para uma criança khuzd, mas veio ao mundo com um bom par de pulmões.

— Do que vão chamá-lo?

— O nome externo não foi decidido.

— Nome externo? — repetiu Tauriel.

Hila respondeu:

— É o nome que os khazâd usam diante de outras raças. Há outro, que não revelamos aos de fora. É um nome sagrado.

Tauriel sorriu para ela.

— Obrigada por me contar. Entendo que isso seja sagrado, e prometo não revelar a ninguém.

Bifur fez gestos ["Para um elfo, ela parece ser boa gente"]. Bofur respondeu, dando de ombros:

— É o que parece.

Dwalin indagou:

— Já que o menino nasceu saudável e forte, será que Thorin vai querer mudar o contrato e torná-lo herdeiro?

Balin respondeu:

— Anna não permitiria. Ela foi bem clara quanto a isso.

— Mas é a lei!

— A lei também é clara em proibir outros que não de nossa raça no trono de um reino khuzd — lembrou Balin. — Anna foi sensata em evitar ameaças ao trono. Concordo com ela.

Como parte interessada na discussão, Dís e os filhos se calaram. Na verdade, eles tinham discutido o assunto com Thorin na ausência de Anna e tinham chegado à mesma conclusão: Fíli seria o herdeiro, e seu filho depois dele. Thorin concordara, enxergando a sensatez de sua ghivasha.

Na verdade, Dís estava intrigada com outra coisa:

— Óin, me responda: por que o bebê está totalmente formado? A gravidez foi curta demais.

O velho curador deu de ombros:

— Estou tão surpreso quanto a princesa. O máximo que posso supor é que o lado do pai tenha acelerado o crescimento do bebê.

Dís ia dar seu palpite quando a porta se abriu e Thorin entrou, seu primogênito nos braços, dando fim a todas as conversas. Todos se ergueram, ansiosos. Balin abriu um sorriso, seguido por Dwalin.

À primeira vista, era apenas uma trouxinha de roupas nos braços de Thorin. Então o bebê fez um dos típicos barulhinhos de recém-nascido e Kíli se aproximou:

— Bem-vindo, filho de meu tio.

Fíli olhou:

— Estou tão feliz por você e Anna, Thorin.

Thorin sorriu:

— Obrigado. Quero apresentar a todos Darin, filho de Thorin!

Dwalin comentou:

— Gosto desse nome: Darin.

Dís sorriu:

— É um nome lindo.

Thorin virou-se para o curador.

— Óin, meu amigo, você fez tanto por Anna e o bebê, e sou muito grato. Mas peço que veja Anna. Ela parece tão fraca...

— É claro, Thorin. E parabéns.

Tauriel indagou:

— Mestre curador, posso ir com o senhor? Se o rei não se importar.

Hila adiantou-se:

— Também posso ajudar.

Enquanto eles entravam no quarto, Dís pegou o sobrinho no colo. Os demais se aglomeraram.

— Que pequenino!

— Vejam, que olhos azuis!

— Ah, um verdadeiro Durin!...

— Eu acho que ele sorriu para mim!

— Ele tem o narigão de Kíli.

— Eu não tenho narigão!

— Acho que ele vai ser dos quietinhos.

— Vejam como ele olha tudo!

— E é corajoso também: olhou para Nori e não chorou!

Risos altos.

— Nem Bifur!

— [Khuzdul!]

Risos ainda mais altos.

— Shh! Deixem Lady Anna descansar.

Como se concordasse, Darin abriu a boca naquele momento e abriu o berreiro como nunca antes. Os anões se maravilharam com a força do choro, dizendo ser um bom sinal.

Thorin olhou instintivamente para a porta do quarto, seu pensamento voltado para a esposa. Tentou se convencer que estava se preocupando à toa. Anna era frágil, mas se recuperava muito bem. Tinha passado por coisas bem piores. Ia dar tudo certo.

Não ia?

Palavras em Khuzdul

ghivasha = tesouro

ghivashel = tesouro de todos os tesouros

khuzd = anão

khazâd = anões, povo dos anões

âzyungâl = amada


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