Diário de Uma Semideusa escrita por Lúcia B Wolf


Capítulo 8
Coisa de Bruxo




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– Você é minha irmã! - Lee me sacudia pelos ombros, com um sorriso tão grande que dava pra ver até de costas. - Minha irmã!

Os estudantes à nossa volta explodiram em aplausos, enquanto minha ficha caía. Apolo acabara de me reconhecer como sua filha!

– AAAH! - Exclamei, e agarrei Lee pelo pescoço em um abraço apertado. - Meu irmão!

Mais dois filhos de Apolo estavam presentes, e ambos se juntaram a nós num só abraço.

.

Quando passei pelo quadro da Mulher Gorda mais tarde naquele dia, Liz estava conversando com suas amigas do segundo ano e Emily descia cantarolando as escadas dos dormitórios.

– Apareceu a margarida! - Disse ela ao me ver, abrindo os braços. - Tô sabendo que cê foi reconhecida! Parabéns! - Emily abraçou-me, dando tapinhas nas minhas costas. - Ah, eu tinha uma parada pra te falar…

– Reconhecida? - Perguntou Liz, se aproximando de nós. - Quer dizer que você sabe quem é o seu pai?

– Sei! Finalmente!

– É Apolo, bicho!

Liz sorriu e me parabenizou.

– E então, como vai ser agora? Você pode vê-lo ou conversar com ele? - Perguntou ela, com os olhos verdes brilhando. Encolhi os ombros.

– Não sei não… Posso? - Perguntei à Emily. Ela sorriu e fez um movimento com a mão, como se abanasse o ar.

– É claro que pode conversar com ele! Ele tá bem aqui - ela apontou para o lado esquerdo de meu peito. Para o meu coração, melhor dizendo. De qualquer forma aquilo não fazia o menor sentido, e Liz e eu caímos na risada.

Vi as amigas de Liz acotovelarem umas as outras e darem risinhos abafados. Virei-me para onde elas olhavam a tempo de ver os Reed entrando na sala comunal. John ria à gargalhadas enquanto vinha até nós e gritava um “oi” animado. Finn nos cumprimentou com um beijo na bochecha, e foi a primeira vez que vi de perto o famoso furinho no queixo de que as meninas tanto falavam.

John me puxou pelo braço.

– Amanhã tá de pé, né? - Ele falou num cochicho bem perto da minha orelha. Assenti, sentindo minhas bochechas queimarem. - Ótimo. Até amanhã, ruiva.

Ele beijou minha mão e seguiu Finn até as escadas dos dormitórios.

– Ahh, eu sabia que tava esquecendo de alguma coisa! - Disse Emily, quando juntei-me a elas. - Vamos jogar caça à bandeira amanhã. Você vem, né?

– Claro - respondi, ainda com a cabeça nas nuvens.

– Mas e o jogo de quadribol? - Perguntou Liz.

– Vou também, ué. Ahhh espera aí - foi então que a ficha caiu. - É na mesma hora?

– Os coroas proibiram a gente de jogar à noite, lembra? - Emily se justificou.

Levei a mão à testa.

– Droga, tinha esquecido.

– É claro que ela vai assistir ao jogo de quadribol - disse Liz com rispidez. Emily virou-se para ela, com as sobrancelhas franzidas.

– Fecha essa matraca, purgante!

– Não vai dar, Emily - falei, antes que Liz pudesse responder. - Eu já disse ao John que estaria lá.

– Pô - ela resmungou mais para si mesma do que para nós, - eu devia ter falado antes.

***

No jantar daquela noite, Lee me levou até a mesa de meu pai.

– Pessoal - disse ele, - conheçam nossa mais nova irmã, Cecília Guérisser!

As cinco pessoas sentadas à mesa abriram espaço para que eu e Lee nos juntássemos a elas, enquanto me davam as boas-vindas. A maioria, eu percebi, usava nas vestes o texugo da Lufa-Lufa, inclusive Lee.

Era engraçado olhar para aquelas pessoas e pensar que eles eram meus irmãos de verdade. Principalmente porque não se pareciam muito comigo. Tinham a pele bronzeada e reflexos loiros nos cabelos, como se passassem muito tempo ao sol. Por outro lado, nenhum deles era muito mais alto que eu - com exceção de Lee, claro. Ele era o único alto da mesa de Apolo.

– Acho que você vai gostar da vista - disse ele, com um sorrisinho.

– Ah é? Por quê?

Olhei em volta. Estávamos em frente à mesa dos professores; atrás de nós, Emily sentava-se com os outros filhos de Deméter. Todos usavam colares compridos, coroas de flores ou camisas tingidas por baixo das vestes de Hogwarts. Mas Lee não estava se referindo a nada daquilo.

A mesa de Zeus era logo ao lado da nossa.

Sorri ao ver Logan sentado ali, olhando para o prato de comida à sua frente. Meio segundo depois, ele olhou pra mim. Virei-me para frente como se tivesse sido pega fazendo algo errado. Lee riu.

– Algum de vocês já viu Apolo pessoalmente? - Perguntei, meio desconcertada, numa tentativa de redirecionar a conversa. Eles se entreolharam.

– Deuses não podem mais descer à terra, Cice.

– Ué, desde quando?

– Desde a última Guerra do Olimpo - disse Robert, o único de meus irmãos que estava na Corvinal. Seus cabelos cheios de cachos cor de mel pareciam pertencer a um anjo.

– Que guerra?

Ele franziu a testa.

– A guerra em que Hera faleceu…

Engasguei.

– Hera morreu?

– Você não deve prestar muita atenção nas aulas, não é?

Encolhi os ombros, o que fez com que ele desse uma risadinha antes de assumir uma expressão triste e continuar. – Ela morreu na última Guerra do Olimpo, há uns 18 anos. Foi por causa disso que Zeus decretou que deuses não poderiam mais descer à terra.

– Me pergunto se teremos muitos semideuses novos por aqui nos próximos anos. - Acrescentou Suzane Rogers, a garota que estava com Lee e eu no treinamento.

– Mas o que causou essa Guerra? Como pode uma deusa morrer em pleno Olimpo?

– Ninguém sabe ao certo - respondeu Robert. - Quíron diz que nem mesmo Zeus fala sobre o assunto. De qualquer forma… Você devia prestar mais atenção nas aulas de Mitologia.

***

Sentei-me escorada numa das árvores na orla da lagoa, e observava o céu de sábado distraidamente quando Logan se aproximou.

– Cice.

– Oi, Logan! - Disse, feliz com a perspectiva de que ele viera me procurar.

– Ouvi falar que você foi reconhecida. - Log deu um leve sorriso, enquanto eu ficava de pé.

– Dá pra acreditar que Lee Campbell é meu irmão?! - Eu ri. - Não poderia ter escolhido alguém melhor.

Ele assentiu com um sorriso.

– Eu já desconfiava de que seu pai seria Apolo. Seus cadernos só tinham desenhos.

Dei uma risadinha, meio sem graça.

– Escuta, Log, preciso conversar com voc…

– Olá - John se aproximava de nós, com seu uniforme vermelho e dourado de quadribol e a vassoura na mão. Sua voz era grave. - Espero não estar interrompendo.

– Não, tudo b…

– Reed - e novamente, fui interrompida. Dessa vez pela voz gélida de Logan.

– Dempsey - respondeu John, seco. - Parece que tem alguém te esperando.

John indicou Becky com um movimento de cabeça, que esperava com os braços cruzados no jardim da frente. Tanto ela quanto Logan estavam vestidos para o jogo de caça à bandeira na Floresta Proibida.

– A gente se vê - ele falou para mim antes de nos dar as costas e sair.

– Que frieza, vocês dois.

John deu de ombros. – Ele não é o cara mais amigável do mundo.

– Não fale assim dele. - Soei mais grossa do que pretendia. Forcei um sorriso. - Sabe, é o meu melhor amigo… Deve ser de família, você sabe quem é o pai dele.

O bruxo não pareceu convencido, e deu de ombros mais uma vez.

– Então tá.

– Você não está com ciúmes… Né? - Perguntei, sorrindo.

– O quê? - Ele riu, meio embaraçado. Alguns raios de sol brilharam por entre as folhas da árvore sob a qual estávamos, iluminando as sardas tímidas que ele tinha no nariz. - É claro que não…

Suas bochechas coraram, e eu ri mais uma vez.

– Venha, é melhor a gente ir.

Após darmos alguns passos, John segurou firmemente minhã mão. Mordi o lábio e virei a cabeça para o outro lado, tentando disfarçar o riso que me escapulia. Seguimos pelo caminho aberto em meio a grama, passando pelo corujal até chegarmos ao campo de quadribol.

– Boa sorte - disse, dando um beijinho em sua bochecha.

– Não que eu precise - riu ele, descontraído. Subi as escadas da arquibancada enquanto John foi até o vestiário se encontrar com o restante do time.

Não seria exagero dizer que eu era a única semideusa ali. Por onde passava, as pessoas me olhavam sobressaltadas, alguns cochichavam. Ignorei o máximo que pude até chegar onde Liz sentava-se com alguns segundanistas.

– Escuta - falei quando ela sorriu para mim, - tem alguma coisa no meu rosto?

Liz franziu as sobrancelhas, intrigada.

– Hm… Acho que não…

– Essas pessoas estão me olhando como se eu fosse uma gárgula.

– Ignore eles. Não estão acostumados com semideuses nos jogos de quadribol. Olha só, já vai começar!

Antes que eu pudesse pensar em alguma resposta, os dois times já entravam em campo. Seria Grifinória contra Sonserina. John voava acima dos outros jogadores, com uma braçadeira inconfundível no braço direito.

– Não acredito nisso! John é o capitão?

– Sim! - Liz riu. - Foi recém-nomeado. Justo, pois ele é o melhor do time. Mas o Finn é o melhor apanhador da escola, ele vai pegar o pomo. Você vai ver.

Ri também, esquecendo minhas preocupações anteriores e sentindo um orgulho crescer.

– E é dada a partida! - Disse o narrador do jogo, um rapaz da Corvinal.- Alex Spinnet rebate a goles direto para a Grifinória, John Reed com a goles, passa para Katie, e ela vai marcar… Oh, foi atingida pelo balaço! Sonserina com a goles, la vai Vincent, desvia do balaço com um belo giro… E os apanhadores parecem ter avistado o pomo! - A multidão prendeu a respiração ao ver que Finn e o apanhador da Sonserina mergulhavam juntos em alta velocidade. - E lá vão eles, numa bela descida em direção às arquibancadas! - Um brilho dourado muito veloz ia em direção ao outro extremo da torcida, com os apanhadores logo atrás. Mas com a mesma rapidez com que o pomo aparecera, voltou a sumir. O narrador do jogo soltou um lamento. - Oh não, perderam o pomo de vista! E Katie Bell consegue roubar a goles de Vincent para a Grifinória, passa para Reed, e lá vai ele, passou pelo goleiro e... Ponto para Grifinória!

A multidão vermelha foi à loucura.

Quando o pomo de ouro foi visto mais uma vez, quase uma hora depois, o placar estava 60 a 50 para a Grifinória. Finn e Terency, o apanhador da Sonserina, dispararam atrás dele mais uma vez, mas Finn foi mais rápido. Demonstrando habilidade e agilidade, o bruxo tomou a dianteira num vôo rasante e, enquanto fazia uma curva acentuada, apanhou o pomo. O jogo acabou, e nós ganhamos.

A metade grifinória da multidão invadiu o campo entre gritos de alegria enquanto os jogadores desciam de suas vassouras, comemorando também. Liz e eu gritávamos tanto que minha garganta parecia em brasa. Ainda assim era uma sensação boa.

Os jogadores jogavam seu capitão, John, para o alto enquanto davam vivas. Ele ria, e eu nunca o vira mais feliz. John foi colocado no chão enquanto eu me aproximava, e ao me ver, correu e ergueu-me no ar pela cintura.

– Nós ganhamos! - Ele gritava. - Ganhamos!

Segurei-me em seu pescoço, rindo, e ele passou os braços em volta de mim. E assim, comigo ainda no ar, demos o nosso primeiro beijo.


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