Jogos Vorazes - Peeta Mellark escrita por Nicoly Faustino


Capítulo 37
Parte 37




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Resisto ao impulso de beija-la novamente, pois vejo que sua testa está sangrando.

— Acho que seu machucado está sangrando de novo. Venha, deite-se, é hora de se deitar, de qualquer maneira – digo, enquanto dou um beijo na ponta do seu nariz, que está gelado. Não mais gelado que eu.

Katniss insiste para que eu coloque minha jaqueta, agora que suas meias estão secas. Não tento argumentar muito, pois morrer de frio não seria benefício para ninguém. Ela ainda insiste em ficar de vigia, enquanto durmo um pouco. Brigamos um pouco acerca disso, mas ela está certa, preciso dormir. Aceito com a condição de ela ficar no saco de dormir. Nos ajeitamos, os dois dentro do saco, e percebo que ela está tremendo. Então, eu puxo sua cabeça para meu braço, enquanto coloco o outro braço sobre seu corpo, a aconchegando. Algo aconteceu, pois ela parece tão vulnerável. Depois de um tempo assim, ela parece se acalmar, e deixa seu corpo relaxar em meus braços. Adormeço, sentindo sua respiração junto a minha.

Parece que faz uma eternidade, da horaem que dormi, até agora, a hora que Katniss me acorda. Me sinto bem descansado, sem ter tido pesadelos. Em compensação, Katniss parece até grogue de tanto sono. E mesmo assim, ela demorou para me acordar. Continua teimosa.

— Amanhã, quando estiver seco, vamos encontrar um lugar tão alto nas árvores em que ambos possamos dormir em paz — ela promete, e cai no sono instantaneamente.

Dou risada, porque, não sei subir em arvores, e aposto que ela não se lembra desse detalhe. Fico rindo por um bom tempo, sem saber ao certo o motivo. A constatação de Katniss estar bem, e de que nós dois temos uma grande chance de vencer esses jogos, me pega em cheio, e eu me sinto a pessoa mais feliz do mundo.

– Boa noite docinho – sussurro para Katniss, e dou um beijo em seu rosto.

Já está amanhecendo quando ela acorda. A tempestade continua, e depois de passar a noite em claro, estou com o humor um pouco ruim, devido principalmente, a fome. Quero sair da caverna para procurar comida. Mas Katniss me alerta para o fato de que provavelmente eu não conseguiria enxergar um palmo a frente do meu nariz. E mais uma vez, eu sei que ela está certa.

Passamos o dia, abraçados dentro do saco de dormir, ora cochilando, ora tremendo de frio. As coisas estão claramente entediantes para a audiência. Me pergunto quanto tempo vai demorar, até os idealizadores decidirem nos tirar a força daqui.

— Peeta — Katniss me chama de repente, de uma forma estranhamente doce. — Você disse na entrevista que tinha uma queda por mim desde sempre. Quando o sempre começou?

Isso realmente me deixa surpreso. Mas não passa de uma tática para conseguir comida, digo a mim mesmo.

— Ah, vamos ver – digo, tentando me lembrar daquele dia, que parece estar tão distante agora. - Acho que no primeiro dia na escola. Tínhamos cinco anos. Você usava um vestido de lã vermelho e seu cabelo... estava em duas tranças em vez de uma. Meu pai apontou para você quando estávamos esperando para o alinhamento.

— Seu pai? Por quê? – ela pergunta, confusa.

— Ele disse, “Vê aquela garota? Eu quis casar com a mãe dela, mas ela fugiu de mim com um mineiro de carvão” — conto.

— O quê? Você está brincando! — ela exclama.

— Não, verdade. E eu disse, “Um mineiro de carvão? Por que ela quis um mineiro de carvão se poderia ter você?” E ele disse, “Porque quando ele canta... até os pássaros param para escutar”.

Ela parecia impressionada. Isso era para ser fingimento, mas porque não falar a verdade pelo menos uma vez?

— Isso é verdade. Eles param. Quero dizer, eles paravam.

— Então naquele dia, na reunião musical, a professora perguntou quem sabia a canção do vale. Sua mão subiu logo no ar. Ela te levantou no banco e você cantou para nós. E juro, todos os pássaros do lado de fora da janela ficaram em silêncio — relembro.

— Ah, por favor — ela responde, rindo.

— Não, aconteceu. E logo quando sua música terminou, eu soube – bem como sua mãe – que eu estava perdido — digo, sentindo meu rosto corar. — Então, pelos próximos onze anos, tentei criar coragem para falar com você.

— Sem sucesso — ela acrescenta.

— Sem sucesso. Então, de algum modo, meu nome sendo escolhido na colheita foi uma sorte — digo, sorrindo um pouco sem jeito.

Uma expressão de intensa confusão atravessa o rosto dela. Foi arriscado contar isso, afinal é tudo verdade. Isso pode acabar fazendo ela suspeitar, que eu a ame de verdade também. Não sei se isso seria bom, ou ruim. Mas algo me diz, que seria ruim. Se como uma mentira, já está sendo difícil para ela, imagina se ela souber que é verdade? Quem fica confuso agora sou eu. Deveria ter inventado algo, e não revelar todas essas coisas que guardei só para mim, por tanto tempo. Não vou conseguir o amor de Katniss assim. O máximo que conseguirei, é assusta-la, ou afasta-la. Só que agora sinto que é tarde demais para voltar atrás. Não dá para engolir palavras que já foram ditas.

— Você tem uma... memória fora do comum — ela diz hesitante, depois de um longo silencio.

— Eu me lembro de tudo sobre você — digo, colocando uma mecha solta de cabelo, atrás da sua orelha. — Era você quem não prestava atenção.

— Estou prestando agora – ela responde, sustentando meu olhar.

— Bem, não tenho muita concorrência aqui.

— Você não teve muita concorrência em qualquer lugar.

E dessa vez, ela que se inclina em direção a mim, colando seus lábios nos meus. Posso estar estritamente enganado, mas sinto que há alguma coisa, nem que seja apenas uma faísca, de realidade nesse beijo.


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