A Filha de Ártemis escrita por Karol Mezzomo


Capítulo 12
A missão é cumprida, mas pagamos um grande preço




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/464337/chapter/12

Quando cheguei ao lugar em que as amazonas estavam reunidas, percebi que a maior parte delas já havia terminado de comer, e agora levantavam-se e seguiam as suas casas para dormir.

– Vão passar a noite aqui? – perguntou Bruna quando passava por mim.

Eu queria tanto poder falar á Bruna sobre a missão em que estávamos. Desde o momento em que eu havia chegado naquela aldeia ela só tinha procurado me ajudar. Mas eu também não queria acabar com a fé que ela possuía por minha mãe e muito menos fazer com que ela deixasse de me ver como uma amiga.

– Hum. Sabe aquela missão que você mencionou não querer saber, quando estávamos escolhendo as armaduras? – perguntei cautelosamente.

Bruna balançou a cabeça e eu continuei.

– Temos que concluí-la o quanto antes, por isso acho que seguiremos viagem ainda hoje.

Ela pareceu realmente triste com a notícia.

– É uma pena. Raramente conhecemos pessoas novas aqui. Foi muito bom conhecer vocês.

Nos demos um breve aperto de mãos.

– Também foi legal conhecê-la, obrigado pela dica sobre Éphine, e por acreditar em mim. – agradeci.

Ela sorriu.

– Foi um prazer. Dê um abraço à Percy, Annabeth e Jéssica por mim. – pediu Bruna antes de se despedir e seguir para a sua casa.

Eu sempre achei que fosse legal fazer parte da tribo das amazonas, mas agora que eu parava para pensar deveria tornar-se entediante depois de um tempo, sempre as mesmas pessoas e o mesmo lugar. Desejei um dia poder voltar àquela aldeia. Quem sabe? Se eu sobrevivesse ás próximas tarefas.

Sentei-me ao lado de Percy, Annabeth e Jéssica e observei o fogo.

– Você demorou. – falou Jéssica. – Mas consegui guardar um pouco de comida para você, quase não sobrou nada. – ela estendeu-me um prato com diferentes tipos de carne.

– Obrigado. – comecei a comer rapidamente, afinal se fossemos embora ainda hoje á noite não haveria garantia de uma próxima refeição.

– Está com uma cara séria. Aconteceu alguma coisa? – observou Annabeth.

– Acabei de falar com minha mãe. – contei.

Imediatamente os três largaram a pouca comida que sobrara em seus pratos e aproximaram-se mais de mim.

– E então? – quis saber Percy.

– Ela disse que devemos partir ainda hoje, que não devemos perder tempo, faltam apenas quatro dias e três tarefas para cumprirmos. Não podemos arriscar. E se passarmos dias na estrada?

Percy mordeu o lábio.

– Tem razão. Vou pegar nossas mochilas e então partimos. – disse ele levantando-se.

– Vou ajudá-lo. – falou Annabeth indo atrás de Percy.

Jéssica e eu ficamos em silêncio por um tempo.

– Estamos quase no fim. – falei.

Ela concordou, mas estava séria.

– Está tudo bem? – perguntei franzindo as sobrancelhas.

– Mais ou menos. Tenho uma sensação esquisita, só isso. – ela parou um momento e completou. – Tive um sonho estranho noite passada.

Sonho estranho. Pode parecer normal na concepção dos mortais, mas nós semideuses sabemos que quando temos esse tipo de sonho, não significa nada de bom.

Quer falar sobre isso? – perguntei.

– Não, não tem importância. – respondeu ela.

Nesse momento Annabeth e Percy voltaram com as mochilas, e dentro delas a pouca comida que tínhamos. Colocamos as mochilas nas costas (não havia mais nenhuma amazona sentada ao redor da fogueira o que poupou-nos o trabalho de se despedir) e começamos a seguir para a entrada da aldeia.

Quando estávamos no meio do caminho escutamos a voz de alguém, que parecia estar embaixo de uma árvore, e demos um pulo.

– Se cuidem.

A autora da voz aproximou-se de nós e respiramos aliviados ao ver que era apenas Hipólita.

– Não gosto muito de despedidas, mas sei que o que enfrentarão daqui em diante será cada vez mais perigoso. Não quero perder a oportunidade de me despedir. – falou a Rainha.

– Queremos agradecer por ter nos recebido. – falou Annabeth em nome de todos.

Hipólita olhou para cada um de nós analisando nossas expressões, passou-me pela cabeça o que ela deveria pensar de quatro adolescentes que haviam praticamente atravessado o país sozinhos, enfrentando monstros e mais monstros sem saber o que aconteceria a seguir.

– Adeus. – despediu-se ela.

– Adeus. – repetimos.

Viramos as costas para Hipólita e quando estávamos na entrada da aldeia a Rainha amazona chamou meu nome e eu me virei para olhá-la.

– Boa sorte. – disse ela.

Eu sorri e continuei caminhando ao lado de Percy, Annabeth e Jéssica. Eu não sabia se a sorte nos ajudaria, mas sabia de uma coisa, nós quatro sempre contaríamos um com o outro.

Caminhamos alguns quilômetros tomando o cuidado de seguir na direção oeste até que meus pés começaram a reclamar.

– Acho que é melhor pararmos por aqui já avançamos o bastante por hoje, não adianta nada continuarmos, estamos exaustos e não podemos nos dar ao luxo de ficarmos indispostos amanhã, se algum monstro nos atacar seremos presas fáceis. – disse eu.

Annabeth largou sua mochila no chão.

– Não estamos muito longe da divisa de Nevada com a Califórnia, se arranjarmos uma carona amanhã poderemos chegar ao estado da famosa cidade de Los Angeles em poucas horas. Também acho que não tem problema passarmos aqui o resto da noite.

Percy também largou sua mochila aos pés de uma árvore e se sentou.

– Por mim tudo bem. – disse ele.

Arrumamos um lugar um tanto quanto confortável e nos deitamos para dormir. O único problema era que eu não conseguia pegar no sono, a imagem de meu pai, mostrada por Ártemis, não saia de minha cabeça e sem que eu me desse conta estava rindo com a alegria que seria para mim conhecê-lo.

– No que está pensando? – perguntou Annabeth vendo o sorriso em meu rosto. Percy e Jéssica prestavam atenção à conversa.

– Ártemis mostrou-me lembranças de meu pai quando falei com ela na aldeia amazona. – contei.

O rosto de Annabeth se iluminou.

– Sério? Que legal, e como ele era?

– Muito bonito. Hipólita contou-me que ele me amava muito. – disse eu.

Percy, Annabeth e Jéssica sorriram comigo.

– Que bom que está feliz, isso ajuda a descontrair um pouco. – falou Percy.

– Mas acho melhor dormirmos logo, como Gabrielle disse, não sabemos o que vamos enfrentar amanhã. – disse Jéssica. – Boa noite.

– Boa noite. – repetimos e nos viramos para dormir.

Dormi rapidamente após a nossa conversa e inicialmente sonhei com as imagens que Ártemis havia me mostrado sobre meu pai, até que de repente o sonho mudou e me vi em um lugar escuro com paredes vermelhas. Á minha frente havia uma menina de costas. Ela conversava com alguém que estava envolto pela escuridão de modo que eu só podia escutar sua voz, e foi o som da mesma que me revelou com quem a menina estava conversando.

Reconheci logo a voz áspera de Nêmesis.

– Faltam poucos dias agora. Será o momento perfeito para minha vingança contra o Olimpo, se Cronos estivesse aqui ficaria orgulhoso. – disse a deusa.

Mesmo estando naquele lugar em sonho senti o chão tremer e meu corpo se arrepiar á menção do nome de Cronos.

– A senhora pretende trazer Cronos do Tártaro novamente, quando estiver no poder? – perguntou a menina.

– Sim. Cronos era um verdadeiro senhor, ele tinha bons planos para o mundo, se não fosse Zeus querer tomar posse de tudo estaríamos bem melhor agora. – disse Nêmesis.

A deusa calou-se por um tempo e depois deu uma risada fria e cruel que ecoou por todo lugar e arrepiou os pêlos do meu braço.

– Mas Zeus não perde por esperar, quando ele menos imaginar abrirei a caixa e será a vingança perfeita. Vingar-me-ei também de Ártemis por ter quebrado sua promessa e manchado a lealdade dos deuses. – ela riu novamente e senti meu corpo sendo puxado em sua direção, tentei gritar, mas não saia som algum, tentei correr, mas permaneci no mesmo lugar. Quando achei que seria o fim ouvi Percy chamar meu nome enquanto me sacudia fortemente.

– Gabrielle acorde.

– O que foi? – perguntei protegendo os olhos dos raios do sol que passavam por entre as folhas das árvores.

– Temos que continuar caminhando e ver se encontramos uma carona. – respondeu ele.

Eu me levantei devagar e quase cai, mas Percy segurou-me pelo braço.

– Você está suando. – observou.

– Eu estou bem. – falei.

Percy ficou meio desconfiado, mas não disse nada. Colocamos nossas coisas nas mochilas e antes que começássemos a caminhar Annabeth leu o pergaminho das tarefas.

“10º tarefa: buscar o gado do monstro Gerion.” Não será nada fácil.

– E teve alguma tarefa fácil até agora? – perguntei.

– Essa é diferente, que eu saiba não terá somente Gerion para tentar nos impedir de buscar o gado. – falou Annabeth enquanto guardava o pergaminho.

– Já enfrentamos Gerion uma vez e saímos vitoriosos, não importa quantos outros monstros tiverem, venceremos de novo. – disse Percy envolvendo as mãos de Annabeth nas suas.

Nesse momento escutamos o relinchar de um cavalo e começamos a olhar em volta procurando de onde ele vinha.

– Ali. – disse Jéssica apontando para o céu.

Seguimos a direção que o dedo de Jéssica apontava e vimos quatro cavalos alados vindo em nossa direção, eram os cavalos mais magníficos que eu já havia visto, suas asas projetavam sombras enormes ao nosso redor e seus pêlos brancos e lustrosos brilhavam quase tanto quanto o próprio sol.

Eles pousaram á nossa frente e rasparam a grama com os cascos.

– Eles são... Lindos. – disse Jéssica de boca aberta.

Nenhum de nós puxou arma alguma. Aqueles cavalos não tinham nada de monstruoso, pareciam-se mais com animais divinos.

Percy foi o primeiro a se aproximar, acariciou um dos cavalos e permaneceu de frente para ele olhando em seus olhos. Ele não mexia a boca, mas nós três sabíamos que ele estava conversando com o animal do mesmo jeito que eu era capaz de falar com os lobos e os cervos.

Depois de certo tempo Percy virou-se para nós.

– Está tudo bem, eles vieram nos ajudar. Foram mandados por Hera com a missão de nos levar até Barstow, na Califórnia. – contou ele.

– Parece que não vamos ter que procurar uma carona, afinal. – falou Annabeth com um sorriso.

– Isso não é muito bom. – observei. – Se Hera mandou esse cavalos quer dizer que não temos muito tempo para achar o diário e deter Nêmesis. Seja o que for que está para acontecer não deve demorar muito.

– Então o que estamos esperando? – perguntou Jéssica enquanto corria e montava rapidamente em um dos cavalos. – Falta pouco agora, esses cavalos nos levarão até a Califórnia e quando estivermos lá será uma questão de tempo até chegarmos em Los Angeles. Nós vamos conseguir.

Jéssica tinha razão, lembrei-me da fala de Nêmesis em meu sonho: faltam poucos dias agora...

Annabeth, Percy e eu montamos um em cada cavalo. Os animais não possuíam celas e nem rédeas, mas não eram desconfortáveis. Colocamos as pernas por baixo de suas asas e nos seguramos em suas crinas.

– Será uma viagem um tanto longa, vamos voar alto para que os mortais não nos vejam, e não precisamos conduzir os cavalos eles sabem para onde devem ir. – avisou Percy.

– Vamos lá. – falei.

Não foi preciso dizer duas vezes, as enormes asas dos cavalos se abriram e eles começaram a galopar rapidamente. Senti o vento batendo em meu rosto com força e me inclinei para frente quase deitando sobre o cavalo.

Quando eu menos esperava, com um forte impulso os cavalos ganharam o céu subindo cada vez mais alto. Voamos a cima das nuvens com o sol a nossa frente, minhas mãos apertavam com mais força a crina do cavalo e o vento constante tornou-se um pouco mais frio nas alturas, arrepiando meu corpo, mas a sensação de voar naqueles cavalos compensava o frio. Era como flutuar, eles procuravam fazer o menor movimento possível e suas asas subiam e desciam delicadamente.

Ao meu lado Jéssica não conseguia conter o riso e seus cabelos pareciam dançar com o vento. Ao ver que eu a observava ela gritou para se fazer ouvir acima do barulho do vento.

– Isso é fantástico!

Eu sorri e olhei para baixo. Sobrevoávamos uma cidade e era quase impossível enxergar as pessoas nas calçadas, os carros e as casas pareciam pecinhas de jogo. Os cavalos fizeram uma pequena inclinação para direita e depois continuaram a seguir em linha reta.

Era impossível cansar-se daquela sensação. Estávamos voando à uma hora, mas não nos sentíamos desconfortáveis.

Voávamos agora sobre uma floresta de pinheiros e pelo canto do olho vi Percy aproximando-se de mim, voamos lado a lado.

– Vai me contar porque você estava suando e com uma cara assustada quando lhe acordei essa manhã? – perguntou ele.

Jéssica e Annabeth ouviram a pergunta e aproximaram-se de nós, eu era capaz de sentir o vento produzido pelas asas dos seus cavalos.

– Tive um sonho com Nêmesis. – contei.

– Alguma novidade? – quis saber Annabeth.

– Não. Ela só falou em querer vingar-se do Olimpo e de Ártemis, e disse querer trazer Cronos de volta quando estivesse no poder. – disse eu.

Percy cerrou os dentes e murmurou o nome de Cronos.

– Ela disse que faltava pouco. – completei falando mais para mim do que para meus amigos.

Ninguém mais falou nada até que passado mais uma hora olhei para Jéssica e percebi algo diferente em suas roupas. Foi aí que notei que ela estava sem o casaco do leão de Neméia.

– Jéssica, o que aconteceu com seu casaco? – perguntei.

Ela olhou para o corpo, apertou os olhos com força e bateu a palma da mão na testa.

– Essa não, esqueci o casaco do leão de Neméia no local onde dormimos essa manhã. Eu o havia tirado para usar como travesseiro, pois estava com a cabeça em cima de uma enorme pedra. E acabei deixando-o lá. Droga.

Eu nunca havia ouvido Jéssica pronunciar aquilo, para ela isso devia equivaler a dez palavrões.

– Tudo bem. – falei. – Essas coisas acontecem.

Ela balançou negativamente a cabeça, inconformada.

– Não, você me deu o casaco, eu não podia tê-lo esquecido.

– Jéssica. – eu disse olhando em seus olhos. – Isso não importa, poderia ter acontecido com qualquer um. Vai ficar tudo bem.

Eu não sabia se ela havia concordado, mas não tive tempo de perguntar, naquele momento os quatro cavalos mergulharam bruscamente com as cabeças apontadas para o chão e ouvi a voz de Percy anunciar do cavalo á minha frente.

– Estamos chegando.

Pousamos sobre a grama macia de um enorme campo onde havia centenas de bois pastando, e descemos dos cavalos.

– Acho que termos descido bem no meio de vários bois foi coincidência, não foi? Por favor, digam que foi, ainda não estou pronta para enfrentar mais monstros. – disse Jéssica.

– Eu queria poder dizer que sim. – falei.

Annabeth olhou ao redor.

– Como vamos saber para onde temos que levar esse gado? Pois se eu não me engano o pergaminho dizia “buscar”, certamente ele foi tirado de alguém.

– Os cavalos estão dizendo que os bois estão no lugar certo, devemos apenas matar Gerion e os outros monstros. – contou Percy.

Tirei a tampa de minha caneta e coloquei o arco nas costas, depois puxei minha espada da mochila.

– De quantos monstros estamos falando exatamente? – perguntei.

– Conta-se que Gerion, um monstro de três tórax, dois braços e seis asas; Otro, mascote de Gerion, um cão de duas cabeças e rabo de serpente, e mais um dragão de sete cabeças, guardam o gado. – disse Annabeth.

Engoli em seco.

– Acho que agora entendo sua definição anterior de “difícil”. – disse eu.

Ouvimos um latido ao longe que fez o chão tremer. Os cavalos se assustaram e começaram a relinchar antes de abrirem as asas e desaparecerem nos céus.

– Cavalos medrosos. – falou Annabeth puxando sua faca.

– Otro. – sussurrou Percy destampando a caneta e tendo em mãos sua magnífica espada de bronze.

– Jéssica se esconda atrás daquela árvore. – falei. – Você está sem proteção, não quero que se arrisque.

Ela concordou e correu para onde eu havia apontado.

– Tome cuidado. – pediu ela.

Ao longe enxergamos Otro correndo em nossa direção, acompanhado por Gerion. A poucos metros de nós os monstros pararam e Gerion abriu um largo sorriso.

– Três semideuses, parece que teremos um grande banquete essa noite, não é Otro? – disse o monstro batendo levemente com a palma da mão na cabeça do cachorro.

Otro era um cão preto, alguns centímetros mais alto que a maioria dos cachorros, possuía duas cabeças que babavam loucamente, enormes dentes afiados e um rabo em forma de serpente. Já Gerion era o monstro mais esquisito que eu já havia visto. Ele tinha dois metros de altura, possuía três tórax, seu pescoço era ligado ao tórax central normalmente e os outros dois, um de cada lado, eram separados por centímetros. O braço esquerdo saía do tórax da esquerda, o mesmo acontecendo do lado direito. Os tórax se conectavam formando um tronco com pernas normais, porém robustas, e ele usava uma grande calça jeans. Cada um dos tórax vestia uma camisa de cor diferente, verde, amarela e vermelha e nas costas do tórax do meio saiam seis grandes asas.

– Pelo jeito você voltou logo do mundo inferior. – disse Percy.

– Zeus disse que tinha uma missão para mim aqui Percy Jackson. Na realidade estou muito feliz de ter uma nova oportunidade de arrancar sua cabeça. E dessa vez eu conto com um novo amigo. – disse Gerion.

O mostro riu e um enorme dragão vermelho de sete cabeças pousou ás nossas costas tornando impossível recuarmos.

– Eu fico com Gerion, Percy fica com o dragão e você, Annabeth, que possui uma faca mais curta fica com Otro. – disse eu.

– Sem chance. – retrucou Percy. – Matei Gerion uma vez e vou fazê-lo de novo.

– Não Percy. – falou Annabeth. – Gabrielle tem razão, Gerion é o monstro central da tarefa então só ela pode matá-lo. Nós nos encarregamos dos outros dois.

Percy pareceu não gostar da ideia, mas concordou. Olhei para a árvore certificando-me de que Jéssica estava bem escondida e então me preparei para atacar.

– Hora do show. – falou Gerion dando um comando para Otro nos pegar.

Sem esperar, Annabeth lançou-se á frente de Percy, começando uma luta mortal com Otro e tendo o cuidado de tomar conta de suas duas cabeças e o rabo de serpente. Ao mesmo tempo Percy virou-se e avançou pra o dragão.

Quanto a mim, peguei meu arco e o coloquei á frente do peito transformando-o em um escudo enquanto corria e mantinha a espada apontada para Gerion.

Ataquei seu tórax do meio, mas ele desviou, levantou vôo e pousou atrás de mim. Virei-me cortando o ar com a espada, mas ele segurou minha mão e com a outra mão livre socou meu rosto, jogando-me para longe.

Balançando a cabeça para desfazer-me da visão turva levantei-me e vi Annabeth sendo forçada contra uma árvore pela enorme pata de Otro e Percy desviando-se das labaredas que saiam das sete cabeças do dragão, mas não vi sinal de Gerion. Aproveitando o momento corri para Annabeth, mas no meio do caminho algo me pegou pelas costas e tirou-me do chão.

Era Gerion. Tentei abrir suas mãos que apertavam fortemente meus ombros, mas elas não cediam, subiu cada vez mais alto e então com força jogou-me no chão. Atingi a grama e meu escudo e espada foram parar a metros de distância. Senti uma forte dor no ombro enquanto lutava para levantar e percebi que o havia quebrado. Corri para minha espada e para o escudo e ouvi Gerion voando atrás de mim, no momento em que ele passou joguei-me no chão sentindo apenas o vento de sua passagem sobre mim.

O monstro então deu meia volta e avançou a pé. Ergui a espada e me desviei do soco de Gerion, depois girei e consegui cravar a espada no seu tórax direito perfurando o coração, mas a única coisa que o mostro fez foi rir enquanto me empurrava para longe.

– Ha, ha, ha. Semideusa inútil, eu possuo três corações. Você não tem como me matar.

Ele avançou com a mão fechada em punho para socar meu rosto, mas algo o impediu e atacou-o. Ele foi jogado para longe e eu pude ver o que me salvara.

De início pensei que fosse um dos cavalos alados que tinha resolvido voltar, mas então reparei que o animal possuía apenas as pernas traseiras e a cauda de um cavalo, suas pernas dianteiras, as asas e a cabeça lembravam uma águia gigantesca, com um bico azul cinza-metálico, as penas que cobriam o corpo também eram cinza e os olhos laranja-vivo. As garras das patas dianteiras tinham quinze centímetros de comprimento e um aspecto letal. Eu sabia muito bem que animal ele era. Um Hipogrifo.

O bicho galopou até mim devagar e baixou a cabeça incentivando-me pra que o montasse. Sem perder tempo e com dificuldade por causa do ombro quebrado subi no Hipogrifo e olhando para trás vi Gerion vindo em nossa direção.

– Vamos! – falei.

O animal abriu as asas e levantou vôo com Gerion logo atrás. Começamos uma luta no ar, segurei-me nas penas do Hipogrifo e com o braço direito, que não possuía o ombro quebrado, ergui a espada.

O Hipogrifo voava muito bem e desviava-se com facilidade dos golpes de Gerion. Aproveitei enquanto passávamos voando por cima de Otro que avançava para uma Annabeth desarmada, e mesmo com Gerion voando atrás de nós mergulhei em direção ao cão de duas cabeças. O Hipogrifo descia rapidamente com a cabeça apontada para o chão de modo que eu tive de usar as duas mãos para me segurar e não escorregar por seu pescoço. Quando estávamos próximos a Otro o Hipogrifo atacou-o de cima cravando as poderosas garras no corpo do cão, e o elevando alguns centímetros acima do solo, jogou-o longe. Otro caiu e rolou uns poucos metros, seu corpo sangrava onde o Hipogrifo havia cravado as garras e o enorme cão não se moveu mais. Estava morto.

Annabeth vendo que Otro se fora, correu para ajudar Percy com o dragão. Porém nosso ataque ao cão de duas cabeças havia diminuído minha atenção em Gerion que ainda estava atrás de nós. A velocidade do Hipogrifo também havia diminuído ao levantar Otro, em um acesso de fúria Gerion alcançou-nos facilmente e pulou sobre nós. Sem conseguir conter o peso do mostro o Hipogrifo caiu e nós três rolamos pelo chão.

Na queda Gerion havia me soltado e estava caído a alguns metros de distância. Tentei me levantar, mas meu corpo inteiro doía, não consegui ver onde o Hipogrifo tinha ido parar e nem se ele estava bem, mas com um frio na barriga observei Gerion levantar-se segurando minha espada que havia caído ao seu lado e começando a avançar lentamente para mim.

A cada passo dado ele falava tremendo de fúria.

– Você... Matou... Meu cão. E agora... Eu vou matar... Você.

Gerion ergueu a espada e eu consegui ficar de joelhos. O monstro não esperou chegar perto o bastante para cortar meu pescoço, ele simplesmente lançou a espada como uma lança apontada em minha direção. Não havia como eu desviar, estava muito tonta para usar meus reflexos sobrenaturais e a espada aproximava-se como uma flecha.

Fechei os olhos e esperei sentir a espada atravessando meu corpo, mas ao invés disso escutei a lâmina cravando-se no corpo de alguém á minha frente e o grito abafado da voz de Jéssica.

Fiquei com medo de abrir os olhos, com medo do que eu podia ver, mas eu precisava. Meus medos foram confirmados, á minha frente e de joelhos estava Jéssica, de costas para mim tornando impossível ver sua expressão. Ela havia corrido até mim e se colocado entre mim e a espada, a lâmina então atravessou o seu corpo e permaneceu lá.

O mundo pareceu parar, devagar e sem conseguir manter-se de joelhos Jéssica caiu para trás, deitando-se em meus braços. Seus olhos estavam abertos e pude perceber que ela ainda estava viva, mas não ia aguentar por muito tempo.

– Não. – murmurei entre a cachoeira de lágrimas que escorriam por meu rosto.

Ouvi o Hipogrifo aproximar-se de mim pelas costas e mandei-o ajudar Percy e Annabeth que ainda lutavam com o dragão de sete cabeças. Não sabia dizer se o animal havia entendido, mas sabia que os Hipogrifos tinham fama de serem muito inteligentes. Pude escutá-lo galopando em direção ao dragão.

Á minha frente Gerion ria sem parar.

– Olho por olho, dente por dente, não é filhote de deus? Parece que sua amiguinha ruiva já era.

Jéssica ainda olhava para mim, seus olhos verdes penetrando nos meus, ela já respirava com dificuldade e ao longe eu podia escutar a luta de Percy, Annabeth e o Hipogrifo contra o dragão de sete cabeças.

Segundos antes eu estava paralisada pela dor de ver Jéssica naquele estado, mas o insulto de Gerion trouxe-me de volta. Cada centímetro de meu corpo tremia e dessa vez não era raiva, algo novo crescia dentro de mim como o fogo que queima tudo o que toca, eu queria destruí-lo, dizimá-lo. Esqueci quem eu era, esqueci do mundo por um momento e só conseguia manter uma coisa na cabeça: matar Gerion.

Com cuidado repousei a cabeça de Jéssica na grama, levantei-me, puxei três flechas e coloquei-as no arco juntas, enquanto Gerion ocupava-se rindo.

– Gerion! – gritei para chamar a sua atenção e me surpreendi com o tom da minha própria voz.

O monstro parou de rir e olhou para mim, antes mesmo que ele pudesse ter qualquer tipo de reação eu fechei os olhos e desejei que o veneno presente em minhas flechas penetrasse lentamente pelas veias de Gerion, causando-o muita dor e sofrimento. No mesmo instante a ponta de cada uma das flechas brilhou e eu soube que o veneno seria liberado lentamente na corrente sanguínea do monstro. Com isso na mente eu atirei.

Cada flecha atingiu um dos corações do mostro ao mesmo tempo. Um tiro perfeito.

– E agora Gerion. – disse eu sarcasticamente. – Quantos corações você possui para continuar batendo?

– Maldita semideusa. – falou o monstro em meio ao sangue que escorria de sua boca. O veneno começou a espalhar-se devagar, traçando linhas roxas sobre a pele de Gerion, onde se encontravam as veias, e ele começou a contorcer-se.

Parte de mim queria matá-lo logo para não assistir aquela cena horrível, mas outra parte queria vê-lo sofrer. Gerion começou a mudar de cor e caiu de joelhos, sua respiração ficou arfante e a parte branca de seus olhos atingiu um tom vermelho.

– O que está esperando? Mate-me agora! – disse ele. Dava até para perceber a súplica em sua voz.

– Gabrielle. – ouvi Jéssica murmurar ainda deitada sobre a grama. – Você não é assim. Por favor, não deixe que isso continue.

Eu olhei para ela, não lhe restava muito tempo, a última coisa que eu queria naquele momento era deixar de cumprir um pedido seu.

– Está com sorte hoje Gerion. Ainda há pessoas boas nesse mundo. – falei puxando mais uma flecha. Mirei o pescoço de Gerion e atirei. Em segundos o monstro explodiu como areia levada pelo vento.

Voltei a olhar para Jéssica, ajoelhei-me ao seu lado e deitei sua cabeça em minha coxa.

– Eu sinto muito. – disse eu.

Jéssica ergueu a mão lentamente e acariciou meu rosto.

– Eu devia ter insistido para que me contasse seu sonho, eu sabia que devia significar algo ruim, devia também ter voltado para buscar seu casaco do leão de Neméia. – falei.

– Não. – disse ela tão baixo que precisei me inclinar sobre seu rosto. – Não se culpe. Agradeça a Quíron por mim, por ter proporcionado que eu a conhecesse.

Sua respiração começou a ficar mais difícil, a mão que acariciava meu rosto caiu sobre a grama e com um último suspiro Jéssica deixou-me para sempre.

– Não! – gritei erguendo o rosto para o céu e depois me inclinando, deitei a cabeça sobre seu peito. Eu não podia descrever o que estava sentindo.

Percy e Annabeth aproximaram-se de mim devagar e ajoelharam-se ao meu lado. Annabeth pousou uma mão sobre meu ombro. Olhei para ela e percebi que ela também estava chorando, Percy por outro lado tentava se segurar, mas seus olhos estavam começando a ficar vermelhos. Os dois possuíam vários cortes e arranhões.

– O dragão foi derrotado. E quanto a Jéssica, nós realmente sentimos muito. – falou Annabeth.

Olhei novamente para Jéssica e várias lembranças passaram por minha cabeça, o momento em que ela me abraçou e desejou-me feliz aniversário, quando acordei após a briga com o ciclope e então vi seu rosto, quando ela levou-me ao acampamento, quando ela apoiou-me na luta contra Éphine confiando em mim, e muitas outras lembranças. Eu não podia acreditar que a havia perdido. Ela que aceitou acompanhar-me na missão mesmo sabendo de todos os riscos.

De repente Jéssica começou a brilhar intensamente, uma luz verde, como o verde mais bonito que se pode encontrar na natureza, e então desapareceu deixando um doce aroma silvestre no ar.

Com um aperto no coração lembrei-me de um dos versos da profecia feita antes de partirmos do acampamento:

“Quatro partirão para cumpri-lo, mas só três poderão voltar.”

– Quando as ninfas desaparecem assim é porque sua alma já está em um lugar melhor. Não se preocupe Gabrielle, Jéssica era uma pessoa muito boa e amava a natureza, ela com certeza terá um lugar merecido no Mundo Inferior. – disse Percy tentando confortar-me.

Mas algo dentro de mim queria vingança, eu nunca havia sentido isso antes. Cerrei os dentes e levantei-me jurando a mim mesma que acabaria totalmente com qualquer mostro que cruzasse meu caminho.

Ao me levantar senti uma forte dor no ombro e coloquei a mão sobre ele. Annabeth passou-me um pedaço de Ambrosia e senti a dor diminuindo ao colocá-lo na boca. Daqui a algumas horas meu ombro estaria curado.

– Está se sentindo melhor? – perguntou Annabeth.

Eu não respondi, não tinha vontade de falar com ninguém. Ao longe vi que o Hipogrifo me esperava e caminhei até ele. Ao chegar perto do animal acariciei seu pescoço e vi que ele possuía um colar com um pingente em forma de sol.

– O sol é um dos símbolos de Apolo. – disse Percy vindo até mim. – Deve ter sido ele quem mandou.

– Os deuses estão nos ajudando, isso deve significar que as coisas não estão nada boas, eles devem querer que cheguemos logo ao Hades. – falou Annabeth.

Olhei para o pingente.

– Obrigado tio. – murmurei.

O Hipogrifo tocou levemente meu rosto com a cabeça depois andou alguns passos para trás, empinou-se nas pernas traseiras, abriu as asas e levantou vôo.

Annabeth entregou-me minha espada.

– Tirei algumas coisas da mochila de Jéssica e dividi entre as nossas. – disse ela entregando a cada um de nós nossas respectivas mochilas.

Ficamos em silêncio por alguns minutos até Annabeth comentar.

– Acho melhor descansarmos á sombra daquelas árvores e tomarmos alguns goles de água antes de partirmos.

Percy concordou com a cabeça e os dois começaram a dirigir-se para as árvores, mas pararam ao ouvir minha voz.

– Não. Vamos continuar a caminhar.

– Mas Gabrielle... – começou Annabeth.

Dessa vez eu me virei para encarar os olhos cinza de Annabeth.

– Eu disse que não. Vamos agora! – disse eu quase gritando a última palavra.

Annabeth e Percy se entreolharam.

– Tudo bem. – concordou ela de má vontade.

Eu sei que havia sido grosseira, mas não estava me importando, tudo o que eu queria era vingança.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Nêmesis finalmente conseguiu o que queria. Sua semente foi implantada em Gabrielle, e em pouco tempo a Filha da Lua poderá tornar-se um fantoche, controlada pela deusa. A raiva cresce dentro de Gabrielle, e junto com ela a semente, a semente da VINGANÇA.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A Filha de Ártemis" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.