Eu retornei ligação dias depois. Eu tremia tanto que desligava toda vez que alguém atendia. Eu não sabia o que dizer. Há dois dias eu estava decidida. Eu sabia o que iria falar, já tinha em mente o discurso inteiro, mas agora eu só sabia tremer. Nessa altura do campeonato ele já devia saber que a filha era dele, que foi tudo uma armação. Eu preciso ligar. Vamos, Bia. Vá em frente! Ok. Disquei os números, e dessa vez a demora ao atender foi maior. Instantes depois, uma voz... Ele. Simon.

– Alô? – ele perguntou baixo. – Alô?

– Simon?- eu o ouvi suspirar. – É você?

– Beatriz. Oi. Quanto tempo! – ele tentava expressar tranquilidade, mas eu senti o nervosismo.

– Simon. Preciso dizer antes que eu perca a coragem. Eu... Fui tola, fui burra, fui ingênua. Quantos anos tenho, né? Uns quebradinhos pros 18. Apenas. E a minha imaturidade prevaleceu. Eu tive algo com o Pi sim, mas a Rebeca é sua, eu sou sua. E eu te amo tanto, tanto.

– Para – ele falou me interrompendo. – Para Bia. Chega. Eu já sei de tudo isso. Eu sei que você e o Pi se relacionaram, que a Rebeca é minha, que você me ama... Eu sei. Mas isso não muda o fato de que você foi embora, e ok. Foi bem imaturo mesmo, mas sabe... Pelo menos conversasse comigo, tentasse confiar na minha fidelidade e no meu amor. Passou-se um ano e você acha que pode voltar assim e dizer que me ama? Eu sei agora o que você passou quando fui embora e não dei explicações, mas eu sei o que fazer agora. E eu não vou ficar aqui ouvindo você dizer tudo isso. É um ano. E muita coisa acontece em um ano.

– Monze... Eu... Por favor, eu quero você como final feliz.

– Final feliz? - ele riu – Feliz? Beatriz algo como o que a gente teve não tem fim. Mesmo que futuramente venhamos a ser de outro alguém. Agora, feliz? Ninguém pode ser feliz o tempo todo.

– Eu sou quando estou com você. Eu sou quando lembro dos momentos que tivemos. Eu sou quando olho para a Rebeca e vejo os seus olhos nela. Eu sou quando sonho contigo. Eu sou quando amamento e lembro que você me deu ela. Simon, a minha felicidade vem quando penso ou lembro de ti.

– Beatriz, você também é a minha alegria. Eu amo você. Só que não podemos fazer nada nessa distância toda. – e ele desligou.

Fiquei sentada na poltrona por um tempo, antes de tomar uma decisão. Eu mudaria tudo.

***

Como tudo consegue mudar em tão pouco tempo? Esse é um dos muitos mistérios da vida, afinal, apenas uma escolha pode mudar toda uma trajetória, e apenas um erro é capaz de jogar a felicidade de uma vida toda simplesmente fora. As pessoas são jogadas na vida sem pedir permissão, e então se vêm diante de tantas coisas, e tantos desafios que parece que tudo não passa de um fardo a ser carregado, e quando percebem, estão desejando jamais ter nascido, simplesmente para não sofrerem.

Uma história sempre é composta por meio, começo e fim, e eu quero muito que minha história tenha um final feliz, mas o que fazer quando o meu final feliz não será o final certo se eu não o tiver perto de mim? Há uma semana eu sabia que eu poderia continuar minha vida, eu criaria Rebeca com todo o amor que tenho e a amaria e protegeria com toda minha vida, ajudaria para que quando ela crescesse pudesse fazer escolhas sábias, mas eu não impediria que ela errasse, até porque é apenas errando que você aprende, por mais que pudesse me partir o coração vê-la sofrer enquanto errava.

Então, enquanto pensava sobre tudo isso após uma ligação, eu percebi algo que simplesmente fez lagrimas virem aos olhos. Eu percebi que ao fim disso tudo, eu estaria só, seria novamente apenas eu e o mundo, e eu estaria simplesmente sozinha. Tentei ignorar aquela sensação, até porque pensei que aquilo sumiria, aquela sensação de tristeza como se nada fizesse sentido, mas então meu coração apertou e a dor aqui dentro estava me causando angústia. Então eu levantei e andei até a janela onde pude olhar para o céu e me perguntar o que aconteceria se eu não corresse o risco de ir atrás dele? Será que me aceitaria? Não sabia, e foi essa dúvida -ao mesmo tempo tão angustiante e cruel, mas tão real- que me fez tomar a decisão de arriscar, e agora enquanto escrevo essa carta, estou apenas pedindo para que cuidem de minha pequena, pois sei que podem me chamar de irresponsável, mas o que aconteceria se eu não tentasse? Será que no fim tudo teria valido a pena? Toda dor, angústia e desespero?

Antes de terminar essa carta, quero dizer que teve algo, apenas um detalhe que me fez tomar essa decisão, um detalhe tão pequenininho, mas que me fez ver que se eu continuasse assim eu me afundaria na minha própria solidão. Há quatro dias Luana foi embora, e foi neste momento que percebi que eu não podia deixar minha chance de ser feliz escapar, mais uma vez. O Felipe e ela estavam se despedindo, e foi a forma que eles se olharam que me fez lembrar o Simon, me lembrar de seus olhos, de seu sorriso, e a forma apaixonada como me olhava, e foi assim que soube que jamais poderia viver sem ele, não poderia viver sem esse amor que é tão errado, mas que mesmo assim é um dos mais puros que já existiu, e assim que me despeço de vocês, e espero que torçam por mim, porque essa é minha última tentativa de ser feliz e minha última chance de encontrar aquele que me deu as maiores felicidades que já pude viver.

Espero que entendam, e cuidem de Rebeca, logo voltarei para ela!

***

Amor! Para muitos essa é apenas mais uma palavra entre tantas outras, mas essa palavra é aquela mesma que usamos para dizer que estamos gostando de alguém, essa mesma palavra é aquela que usamos para fazer várias coisas, como se casar, ou simplesmente cometer algumas loucuras e no fim simplesmente falar: fiz isso porque amo, e esse sentimento me faz fazer qualquer loucura em nome daquele que é merecedor dele. Mas as pessoas esquecem que o amor também o motivo de muito sofrimento, afinal, quem ama se entrega e quem se entrega tem grandes chances de sair ferido, como um soldado de guerra; você vai inteiro, mas sai com feridas que apenas o tempo para sarar superficialmente, pois lá dentro sempre existirá uma cicatriz que tempo nenhum será capaz de esconder, e é essa cicatriz que faz você lembrar de que o amor é muito pior que o ódio, pois o amor pode trazer felicidade e também uma dor insuportável, mas o ódio é apenas isso, ódio.
Walkíria olhava para carta, enquanto as lágrimas caíam e simplesmente sorriu.

— Acho que alguém finalmente entendeu o sentido de tudo — falou enxugando com as mãos o seu rosto — Não acredito que ela finalmente foi.

— Pelo jeito agora sim teremos um final feliz, um final que todos estamos esperando a um bom tempo — Felipe disse enquanto ninava a pequena Rebeca, que não entendia nada ainda.

— Uma hora todos têm que olhar o mundo como ele realmente é — Wal disse enquanto pegava a pequena que dormia e levava para o quarto, e foi neste momento que Walkiria sentiu algo que em toda sua vida ela jamais saberia explicar, um sentimento tão diferente de tudo que ela vivenciou durante todos os anos, sentiu como se o ar a faltasse, como se algo a sufocasse a um ponto que ela não conseguia respirar e anos mais tarde a única coisa que ela se lembraria seria que naquele momento ela olhou para o relógio em cima da cabeceira e viu que ele marcava 20h43min.

E então tudo mudou.
[...]