Mantendo O Equilíbrio - Terceira Temporada escrita por Alexis terminando a história


Capítulo 3
Capítulo 2


Notas iniciais do capítulo

Terceira temporada "chega chegando" com tudo!
Segura o coração aí que vem um capítulo TENSO daqueles.



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Pra mim, peixes são os animais que mais se poderia considerar frustrados, só que eles não têm consciência disso. Uma vez li numa revista que peixes são animais fáceis de se prender por eles sofrerem de algumas deficiências de defesa nas células do seu pequeno cérebro. É como funcionar ao contrário dos elefantes, esses conhecidos pela boa memória e, bom, os peixes não a tem bem desenvolvida. Essa limitação faz com que eles esqueçam as coisas rápido, então, presos num aquário, quando eles chegam a se “perguntar” sobre espaço tão limitado ao dar de cara com o vidro, puff, o que eles estavam se perguntando mesmo? “Ah, melhor olhar do outro lado e...”, puff, de novo. Assim eles ficam nesse processo infinito, indo pra lá e pra cá, com e sem propósitos.

Frustrante me sinto por dar crédito a essa reportagem, afinal, peixes são animais e animais não pensam! Tudo bem, eles podem guardar imagens nos seus pequenos sensores da cabeça, assim como os elefantes, mas eles nunca vão ter habilidades de se questionar... Talvez o jornalista queria testar a racionalidade da pessoa e, depois de muito tempo que fui sacar. Senão, eu mal interpretei a reportagem ou não a li direito – e se foi realmente uma pegadinha, foi uma boa pegadinha. Mas... a Dory de “Procurando Nemo” seria o exemplo perfeito de retrato animal para tal caso. Ah, deixa pra lá. Isso não importa agora.

Olho as bolhas subindo e chegando ao topo da água no aquário que tem no corredor da casa de seu Júlio e... tudo é tranquilo pra esses pequeninos. O que pode ser assustador para tão pequenos seres? Não mais que seus alimentadores, que ora e outra devem passar e deixar comida para eles. Ou pessoas que ficam cutucando o vidro – parei. De cutucar o vidro com a unha do dedo indicador, quer dizer.

De todos os belos enfeites da casa, quadros, jarros, cerâmica, esculturas – devo acrescentar que seu Júlio parecia ter a clássica fissuração por anõeszinhos de jardim. Eu nunca entendi o que eles têm de demais... – eu não sei porque parei pra ver esses peixes. E não, não tinha um peixe palhaço. Eles ficavam indo e voltando, tão tranquilos, fazendo umas caretas engraçadas, fluindo naquele molhado, um espaço só deles...

– O que você está fazendo?

Felizmente o corte que Vinícius me deu foi daqueles que não apagam a memória recente. Por muitas vezes quando fico concentrada em algo e alguém interrompe, tenho uma ligeira amnésia do que estava pensando ou fazendo segundos atrás. Ele parecia surpreso de me encontrar sozinha no corredor.

Depois que Iara fez aquela pequena mínima declaração de só grande importância, ela disse que logo todos iam saber, porque era disso que se tratava, pelo menos em parte, esse almoço de intervenção do seu Júlio. Ele queria consertar as coisas sem precisar mover céus e terras de uma guerra antiga, assim precisava de todos aqueles familiares presentes. Acho que ele só me chamou pra manter Vinícius nesse almoço, por saber talvez por Djane, que eu era a favor de resolver esse caos familiar.

Logo que Vini e seu Júlio voltavam do jardim e parecia ser a hora de dar início à “sessão”, eu lembrei de Djane, que tinha saído às pressas da mesa logo que Vini tinha dado um perdido. Assim, saí à procura dela pela casa, perguntando aos empregados se a conheciam e se a tinham visto passar, porque ela só podia estar dentro da casa, vi quando entrou. Uma senhora me informou que ela estava num dos quartos de hóspede e, por sua indicação, consegui chegar lá. Djane estava de costas para a porta, muito perto da janela, uma estátua que respirava com uns poucos espasmos de que havia um choro miúdo e silencioso.

Ao perceber minha presença com os passos que dei no ambiente, ela rapidamente virou para trás para ver quem era e passou uma mão nos olhos, para dar fim às lágrimas ou melhorar sua aparência diante de mim, não sei. Só sei que ela precisava de algumas palavras de conforto, vindas com tranquilidade de quem poderia se certificar de algo. Eu poderia. Com um abraço eu a fiz entender que aquilo estava para acabar, que ela não devia mais chorar, senão de felicidade, que a chance de se tudo vir a melhorar estava tão próxima que ela não poderia fraquejar assim. Bom, eu não deixaria, isso ficou bem claro.

– Não se deixe abalar por medo, se sobreponha sobre ele para poder chegar ao ponto que por muito esperou... que é ter seu filho consciente de tudo, de poder falar, se explicar e ser ouvida. Não vai deixar passar, vai?

Apertei-a com meus braços pra dar uma ênfase. Fico me segurando pra não chorar também. Toda a situação me emociona e, vê-la assim tão frágil, me faz ser segura para que ela seja segura. Mas fica difícil não chorar, viu! – aquela velha história de sentir o que o outro está sentindo por estar muito envolvida emocionalmente. Segura, segura, segura!

– Não, tens razão... Não passei por muito para desistir agora. Muito obrigada, querida, por cada gesto e palavras que tem me oferecido. Você é a benção que eu pedi a Deus como guia e isso eu nunca vou esquecer. Eu... e-eu nem sei como poder agradecer.

Ela quer me ver chorar, é isso. Porque falando desse jeito, voz ainda meio chorosa, eu amoleço rapidinho. Qualé! Fica cada vez mais difícil de segurar... Passamos por tanto, juntas e separadas, e juntas novamente. Tanto que não nos considero mais como figuras independentes da outra, pois sempre ela aparece por meus pensamentos e considerações, da mesma forma como eu devo passar pelos dela, isso fica claro em como ela se comporta comigo.

– Então só vai lá, esquece posteriores agradecimentos. Um passo de cada vez, lembra?

Soltamo-nos com essa esperança. Cada passo, cada tropeço, cada queda e cada levanto foram determinantes para chegar até aqui. E como esperamos por um momento como esses... De fato, estamos numa terra sem certezas e não há como adivinhar o que iria proceder nos próximos momentos, mas, como sempre, ela deixou uma expectativa em mim, estávamos crendo numa possibilidade de fazer as coisas se consertarem, darem certo. Chegamos àquele clássico momento do “agora ou nunca”. E que BURACO no estômago ele deixa!

– Você não vem?

– Er... é, vai indo na frente.

Na minha cabeça o meu trabalho estava se findando, porque era isso não? Eu queria ajudar essa família e, está aí, ajudei. Deveria dar um tempo para eles, me afastar um pouco dessa reunião, pois eu não era da família e nem estava na história. Como sempre, era apenas a intrometida que pisou em campo nos 45 minutos do segundo tempo, só pra dar uma geral. Agora era com eles. E para qualquer resultado, eu estava preparada para os próximo jogos – será que estou usando bem a metáfora de jogo de futebol? Eu não entendo muito coisa além do básico... Me restava esperar então. Mesmo que a ansiedade me cobrisse o estômago e deixasse minhas mãos uma enroscada na outra, deslizando pelo suor da expectativa.

E foi assim que me deparei com o aquário, na esperança de me distrair dessa tensão, e um Vinícius perdido não entendeu o que eu estava ali fazendo. Eu também não entendi o que ele estava fazendo, se devia estar naquela sala, na intervenção. Sou calma em respondê-lo, mesmo ante seu comportamento estranho.

– Er... olhando os peixes. Pareceu algo diferente disso?

– Não, é que... por que está aqui e não na sala?

– Bem, acho que seu Júlio vai tomar a atenção para o caso da família de vocês... e eu pensei em dar um tempo, para que tivessem privacidade, já que não sou da famíl...

– Quem disse que você não é?

Um sorriso bobo cobriu seu rosto antes sério. Desfaço meu cruzamento de braços como se estivesse me desarmando, no entanto, ainda descrente e surpresa por ele vir me dizer isso. Todas as peças necessárias para esclarecimento estavam naquela sala, eu não era uma delas. O convite do seu Júlio era apenas para me conhecer – e ele conheceu no almoço – e para manter o neto na reunião. Também fiz isso.

– Mas...

Meu esforço de contrariedade só o faz insistir na minha presença. E ele parece bem enfático quando suas passadas rápidas no chão parecem ter uma ânsia para ter-me em suas mãos. Uma vez nelas, nosso encontro firme não é bem deste contato, mas sim do que seus olhos em brilho estavam a me dizer. Ele não se importa de ser redundante, de ter que mensurar tudo isso em palavras, pra garantir que não havia mal-entendidos e que havia sim uma necessidade de minha presença naquela sala.

– É agora, Milena, que eu mais preciso de você. Não para ficar do meu lado apenas, mas para que você sinta o valor que quero mostrar a todos que você tem. Me fez caminhar até aqui, não vai me deixar agora, vai?

Acho que isentar-me ou qualquer tentativa do tipo estava fora de questão.

Por muito disfarcei o que tudo isso representava ao nosso relacionamento e, agora, desarmada, sinto as palpitações dessa confirmação. Não que eu não acreditasse no que sentíamos um pelo outro, mas por sentir que o que parecia ter uma passagem lenta dentro de mim, em tempo real era muito rápido. Com cada passo se foi criando mais significação, pedindo mais e mais. Era uma transloucação na verdade. Que, incrivelmente, me fazia me sentir plena. E incapaz de negar um pedido desses eu estava me entregando mais a ele.

– Não.

Um “não” tão firme quanto o nosso relacionamento que estava destrinchando.

Porque com ele falando desse jeito eu ia até ao espaço junto dele, testar a gravidade. Poderia eu perder a gravidade que me prende à terra, mas o espaço não anularia a gravidade que me mantém preso a ele. Por isso não havia necessidade de um beijo desejoso, um singelo já nos era bastante, se o amor que só crescia dava significação suficiente.

Não estávamos indo pra guerra, estávamos indo ver a guerra acabar. Juntos.


~;~



– Então, Filipe, qual é esse outro lado?


Uma vez eu tive que monitorar a lavagem de roupa suja.

Me deram esse papel e agora tenho que cumprir de novo. Nenhuma das vezes eu estava preparada para o que iria ouvir... E nem por todas as surpresas, acho que ninguém estava preparado para o que ouviu de mim.

Quando cheguei à sala, estavam todos nos esperando, silenciosos. Seu Júlio assentiu para que sentássemos no sofá e ele, da poltrona onde estava, deu início à... hã... sessão. Todos estávamos em volta da mesinha retangular de centro, tendo Vini, seu avô, Filipe, Iara, Djane e eu num sentido anti-horário de organização. Mas claro, cada um no seu lugar, mantendo certa distância. Eu e Vini num sofá, Iara e Filipe noutro, Djane e seu Júlio em poltronas singulares. A tensão e expectativa desse silêncio todo ainda cutucava meu estômago. Pior foi a hora que todos, de repente, viraram pra mim depois de uma declaração do patriarca da casa:

– Bom, como todos estão percebendo, essa é uma tentativa de, de fim, por todas as cartas na mesa, pois, por todos esses anos deixamos que desavenças e segredos tenham tomado de conta de nossas vidas e, diante do quadro atual, o melhor que temos é resolver de uma vez por todas isso, se temos em nós os mesmos interesses. Assim, por este mesmo motivo, gostaria que Milena desse a partida.

Sobressaltada, sob o olhar intenso de todos, e de um aperto de Vinícius em minha mão, tento entender o que seu Júlio quer com isso, porque... bom, eu não tenho a mínima noção. Como assim EU?

– Eu? Por que eu?

– Você é um ponto neutro, minha filha. E por tudo que já ouvi falar e vi de você agir, sei que tem discernimento o suficiente para nos ajudar nessa intervenção. Tal como os outros, também errei em deixar tudo isso correr por si mesmo, por não concordar com o que tinha feito, tenho culpa nesse cartório e quero me redimir. Fui negligente demais.

– Mas que posso eu falar?

– Deixe suas impressões. Vinícius está muito envolvido para poder começar a falar... do pouco que você sabe, acredito que qualquer coisa que diga, é um ponto para se iniciar.

Um ponto para se iniciar... um ponto para se iniciar... Um ponto para se iniciar? Que ponto poderia eu mencionar? Evito de olhar para cada rosto da sala e solto minha mão de Vini para poder pensar melhor. Essa espera por uma resposta, da mesma forma que parece matar cada um no recinto, me mata em particular. Ponto neutro... Esse ponto neutro aqui está entrando em curto-circuito. Caramba, nada me vem na cabeça! E tá todo mundo esperando que eu fale algo!

Ok, vamos pensar, Milena. Rebobinar tudo? Como um filme em ação ligado no módulo 20 de aceleramento, pareço visualizar tudo desde o começo até o momento daquela coisa toda na delegacia. Na verdade, até minha última discussão sobre o caso com Vinícius ontem ainda. E desse filme me surge a luz no fim, de uma dúvida que ainda persistia em minha cabeça.

Filipe.

– Hã... e-eu poderia falar do clássico, de “começar pelo começo”, mas não sei se realmente dá pra saber desse começo, então acho que... que... seria melhor tratar do mais intrigante. Quando eu ouvi a discussão de Djane e Filipe na sala do diretor do hospital, ela contou-me a história. Filipe, por outro lado, não quis tocar no assunto, mas vez e outra interferia dizendo que não tinha sido daquele jeito que as coisas tinham acontecido... que a história tinha seu outro lado. Intentando por isso que ele confessou isso ao ter me procurado, o que ocasionou umas... hã... “eventuais tragédias”, chegamos ao ponto de ir à delegacia. O fato é, podem alguns não acreditar, mas eu... sinto que ele foi verdadeiro. Quer dizer, ele estava tentando reaver a relação com o filho... e acho que há muito para se explicar daí. Então, Filipe, qual é esse outro lado?

Acho que todos pensaram que eu indicar Djane. Por isso deixei bem claro a minha escolha, porque do lado dela todos praticamente já sabíamos a versão. E de repente, eu estava voltando àquela sala do diretor novamente, agora com Filipe menos agressivo e mais autopiedoso. Vinícius parecia uma estátua. Que me perdoasse se fosse o caso, mas eu não iria desistir minhas convicções só porque ele não concorda com elas. De qualquer forma, era para o bem dele. Não tardou e Filipe chamou nossa atenção, também descrente de minhas palavras.

– Eu nunca esperaria isso de você, Milena, principalmente de você, sendo eu aquele que te ameaçou e... bom, deixemos isso para trás. O que eu vou contar a vocês é algo de que eu não me orgulho... e tentei por muito tempo esconder. Não, meu filho, não é você.

– Você consegue, estou aqui.

Sussurrou Iara para o pai – que não era pai dela – segurando-o forte pela mão. Antes mesmo de Filipe começar, tenho vontade de me bater por ter esquecido de pegar lenços de papel porque eu sei, sei que eu vou me emocionar, seja de sentimentos bons, seja de sentimentos ruins. Isso até que uma das empregadas de seu Júlio aparece discretamente deixando uma caixinha na mesa de centro e pede dispensa. Ainda sim engulo em seco e abraço Vini, porque acho que ambos precisávamos um do outro agora.


~;~



– Uns anos atrás eu fui casado. Era uma casamento de fachada, como um contrato de interesses financeiros. Foi assim que consegui abrir filiais da minha empresa no interior. Minha mulher se chamava Lígia. Tínhamos algo parecido com um “casamento aberto”, então acabei me envolvendo com muitas mulheres na época. Só que tempos depois Lígia passou a querer fechar nosso relacionamento, levar a coisa a sério... E eu não levei muita fé, não até que ela começou a perseguir umas das mulheres com quem eu tinha saído.


Acho que todos seguraram a respiração pensando em Viviane. Bom, pelo menos eu segurei. E não mais olhava para os outros, só me centro em Filipe, no sofá a minha frente para saber o desenrolar dessa história. Ele, por outro lado, falava olhando para a mesa a sua frente, sem desviar ora alguma. Devia ser vergonha. Nesse quesito, ele devia ter de sobra e pra vender.

– Não, não era Viviane. Viviane foi a única quem eu amei de verdade, e por amá-la, eu a deixei, porque sabia que Lígia estava ficando perigosa e eu não podia parar com os trâmites financeiros que estava cuidando naquela cidadezinha. Eu sei, isso não justifica, mas eu estava uma bagunça, não fazia as coisas direito. Ainda não as faço. Viviane morava aqui... e como eu ficava viajando de um lado pra outro, eu resolvi terminar, para protegê-la do risco que era viver comigo. No dia então, ela me disse que estava grávida.

– Filho, por que não me disse? Por que escondeu tudo isso?

Seu Júlio interviu, sentido. Também né, o próprio filho foi casado e só agora o pai estava sabendo do caso. Segredo em família é um assunto delicado.

– Ora papai, eu sempre lutei pra não ser o perdedor, sabia que vocês me viam pela bagunça que eu era. Eu sabia que Gustavo era seu favorito. Eu tinha que cuidar para minha empresa ter uma boa fama, não estava interessado em nada mais... e mesmo amando Viviane, eu sabia que não era do meu lado que ela devia ficar.

Ressentimento marca o tom de Filipe para com seu pai. Tudo estava tão nu e cru a nossa frente que o bate-boca que surge entre os dois, permanece com eles, sem ninguém mais interromper, apenas assistir. A história é mais antiga e maior do que eu pensava.

– Mas filho... não. Essa competição sempre ficou na sua cabeça. Não havia favoritismo algum entre vocês, era você que não me deixava entrar na sua vida.

– Agora é tarde, papai, o senhor diz isso agora porque meu irmão está morto. Mas isso não importa mais, se não é para isto que viemos. Naquela época eu não estava preparado para ter filhos e com o perigo eminente de Lígia nos rondando, eu fui o covarde que pediu o aborto.

– Seu canalha! Bastardo!

Vinícius levantou-se de vez e, se não fosse por mim, tinha pisado a mesa do centro e avançado no pai. Até o avô dele se levantou de sua poltrona para segurá-lo. Iara do outro lado se meteu na frente defendo aquele homem. Djane era outra que também não sabia o que fazer, para quem olhar ou o que dizer, cada expressão ali era diferente, mas pareciam se tratar da mesma coisa. Incredulidade.

– Pode me bater, me esculachar, me xingar... eu me ofereço a castigo, filho. Acima de tudo, eu amo você.

– Não me chama... DE FILHO!

– Vini, não!

Lá estava ele de novo alterado, tal como foi no dia que eu lhe contei a verdade. A respiração acelerada, a raiva dominando-o e nada poderia o parar. Também entrei em estado alerta, mas era necessário, como era necessário que tudo fosse dito de uma só vez. Como dizê-lo isso? Mais que o puxei de volta ao sofá, empurrei-o para que se sentasse e seu Júlio também o amparava. Sentou-se do lado do neto, onde estava me ajudando a segurá-lo.

– Acalme-se Vini, deixe que ele termine.

– Lena, esse... esse...

– Shiii... deixe que ele termine... Por favor?

Ele bufa, mas assente. A bola da vez ainda está com Filipe e ele não demora a continuar seu sombrio lado da história.

– Entendam, eu não estava numa boa situação para assumir um filho. E Lígia perturbando não seria saudável para ninguém. Viviane me fez acreditar que iria tirar o bebê... então passei muito tempo sem vê-la. Nesse meio período, Lígia engravidou. Sendo casados, mesmo de conveniência, eu tinha que assumir... Uns meses depois, eu reencontrei Viviane. Pela clara protuberância de sua barriga, eu vi que ela não tinha desistido de nosso filho... e, com raiva por ter me desobedecido, por ter nos colocando num perigo maior, eu...e-eu a destratei.

– FILHO DA MÃE!

Vinícius só gritou. A esse tempo todos já estávamos chorando. E eram tantas as razões para se chorar que ficava difícil apontar um motivo só. Eu também tinha raiva, e tinha que controlá-la. Senão, não haveria como segurar meu namorado. Uma vez ele já batera no pai, uma segunda vez ele poderia muito bem fazer. Tinha medo que apelasse para a violência de novo. Quando conseguimos o estabilizar, Filipe prossegue, em leves fungadas, passando a mão pelo rosto:

– Tivemos uma discussão feia. Uns dias depois, brigamos de novo. Foi então... que falei... que eu era casado. E, esbaforida, ela saiu do meu escritório. Eu tentei ir atrás... não consegui alcançá-la. Sem saber como proceder, eu viajei de novo. Quando foi uns dois dias depois, sem ter alguma notícia, meu irmão Gustavo me ligou para avisar... avisar que ela havia feito um parto de emergência... e por causa dele, e-ela nã-ã-ão... não resistiu.

Não haveria calor humano em mim para segurar a revolta de Vinícius, chorando alto, negando firmemente o que era descrito sobre seu passado, misturado ao choro de todos ali presentes. “Não, não, não”, ele gritava. Eu mesma não conseguia controlar meus espasmos, eu sentia a dor de cada um ali. Era demais, era demais para todos. Com meus braços envolta de Vinícius, sentia-o tremer. Eu não sabia o que fazer... só sei que estava reunindo forças para me deter, porque a vontade que eu tinha era de bater naquele homem desprezível até as forças acabarem... Nem assim ele calava a boca, porque ele ainda estava falando. E cada palavra que chegava aos meus ouvidos traziam mais revolta.

– Eu entrei em depressão e quase me matei... Porra, eu tinha perdido quem mais eu tinha amado nessa vida por uma droga de vida de conveniência. Me afastei de Lígia e de todos. Eu sabia que Gustavo tinha assumido meu filho... e eu só queria sumir. Não demorou muito e Iara nasceu. Só ela, ainda tão pequenina, me trouxe a sanidade de volta. Ela me fez ficar responsável, tentando compensar os erros do meu passado. Gustavo tentava me conectar com meu filho, mas a vergonha era tão grande que eu o deixei acreditar que eu não queria meu filho comigo... o que não era verdade. Só achei que ele estava fazendo um papel melhor que o meu. E foi então que eu recebi mais um soco dessa merda de vida. Descobri pouco antes de um acidente que sofri com Lígia, onde deste ela morreu, que Iara não era minha filha biológica.

MEU DEUS, ISSO NÃO ACABA!

NEM EU QUERIA MAIS OUVIR!

Nem Djane estava se aguentando. Seu Júlio que a amparava, enquanto eu... eu... eu não sabia mais que paralelo maluco era esse que eu tinha parado. Cadê o fim disso? Que finde esse tormento todo! Se ele não logo calar a boca, sou eu que vou avançar e calar por ele. O que me segurava mesmo era o fato de que eu tinha me proposto de ouvir até o fim, afinal, eu tinha pedido pelo mesmo a Vinícius.

– O pai dela decidiu reaver a filha, e conseguiu tirá-la de mim. Era uma criança ainda. E toda minha gana por prosperidade não estava mais valendo de nada... foi aí que me isolei mesmo. Vivia do meu trabalho só por viver, porque nada mais tinha sentido pra mim. E os anos foram passando, Gustavo sempre fazendo uma ponte entre mim e Vinícius, enviando-me fotos, contando o que ele estava fazendo, como estava crescendo, o que estava aprendendo... Eu só acompanhava de longe. Quando ele adoeceu, eu pensei em voltar, mas o medo me prendeu novamente. Nem deu chance de eu me despedir do meu irmão... a última vez que falei com ele, foi quando ele quis assegurar nossa felicidade. Ele quis que eu voltasse e cuidasse do nosso garoto. E foi o que fiz, voltei. Transformei minha raiva em determinação. Mas Djane... Djane se fez de grande obstáculo para mim.

– Seu cretino!

É, ela largou um tapa merecido na face do homem. Tapa que eu gostaria de dar também. Ela levantou tão rápido que pra mim só pareceu um borrão e todos ouviram o paff que repercutiu no rosto dele. Seu Júlio conseguiu puxar Djane de volta, Iara tratou de entrar na frente para defender seu pai-que-não-era-pai e Vinícius tentou fugir. Estava armada a bagunça perfeita.

– Eu já ouvi o bastante.

Disse Vini determinado a ir embora. Me puxou junto a ele e praticamente levada por ele ainda chegamos à porta da sala. E Filipe foi atrás de nós.

– Foi golpe baixo sim, não nego, me aproveitar da má relação que surgiu entre você e Djane, mas que chances eu tinha? Tudo estava correndo bem para meu lado. Eu já tinha todos os planos de assumi-lo, e então você sofreu aquele maldito acidente. Tudo desandou de novo... Mas tudo, tudo que fiz, foi por amor, eu tinha que reconquistar o que era meu por direito!

Meu Deus, será que para ele tudo se resumia a posses? Ele mesmo viu que gana por dinheiro não estava garantindo sua vida... e ainda assim ele me ofereceu dinheiro quando teve chance. Ele, de fato, não bate bem das ideias... e se continuar insistindo vai levar umas porradas para ver se pega no tranco. Eu estaria disposta, também tinha minhas revoltas. Passando pela varanda a passos duros, Vini busca no bolso da calça as chaves do carro e eu me desespero por ele querer dirigir. ESTAVA ACONTECENDO TUDO DE NOVO! Por mais cansada que estivesse de toda essa loucura, eu não iria deixá-lo fazer besteira novamente. Só que Filipe não estava facilitando, ele ainda estava levando a diante a história...

– Fui atrás de Iara também... muito tempo depois descobri que o pai dela tinha morrido e ela trabalhava numa das filiais da minha empresa. Eu consegui resgatar o amor dela, só me faltava, falta, o seu, meu filho... Perdoe-me, meu garoto, eu sempre te amei. Não me importa o que tenho que fazer, eu o faço... eu só quero que possa ver que eu me arrependo, e como me arrependo. Já perdi muito nessa vida, e agora só você me resta praticamente. Eu não tenho mais vida, nem amor. Me traga de volta, Vinícius, eu te amo, meu filho...

– Me DEIXA em paz!

Eu ia explodir também! Quer dizer, eu explodi de fato. Porque eu consegui arrancar as chaves dele, joguei-as com força na piscina e gritei. Eu não aguentava ver aquela cena toda calada.

– PAREM! AGORA!

– LENA, O QUE VOCÊ FEZ? AS CHAVES...

– SÓ PAREM, PELO AMOR DE DEUS!

Saí empurrando de leve Filipe, para que se afastasse, mas ele fazia força para se manter no mesmo lugar. Eu não ia deixar ninguém ia sair no estado que estava, mas também não ia permitir que o circo pegasse fogo, mais do que já estava queimado. O melhor a se fazer era dispersar... E quem disse que deu certo? Vinícius empurrou o pai pelo longo da grama, batendo de frente e, PUTA MERDA, vamos começar tudo de novo e de novo e de novo?

– VIU O QUE VOCÊ FEZ, SEU DESGRAÇADO?

– NÃAAAO!

Agora sim tudo se embaralhou, Vinícius partiu pra cima do pai bufando em descontrole e seu Júlio se meteu. Da casa vinha Djane, que me segurou, e Iara também estava em desespero, gritando para que parassem. Eu tinha que fazer alguma coisa. O quê, Senhor? O quê?

Bom, eu poderia ter fingido, só que acabou acontecendo de verdade. Não comigo, com seu Júlio. Acho que o coração dele não aguentou tanta emoção. Quando todos foram perceber, ele tinha soltado os dois engalfinhados, cambaleou para o lado e caiu inerte na grama.


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Notas finais do capítulo

Eita.

Trechinho do próximo?

— (...) Eu só faço burrada, maninho. Po-ode me xingar.
— Milena, você é minha irmã. Claro que você vai fazer burradas nesse mundo, sendo minha parente, é determinante.

Inté!



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