Com o sangue fervendo da bebida quente resolvi treinar um pouco para tentar espairecer e espantar aquele sentimento sufocante de morte iminente que me dominava. Onde é que eu estava com a cabeça quando concordei em entrar naquele covil de humanos. Balancei a cabeça tentando espantar mais uma vez os pensamentos sobre ele e entrei no centro de treinamento. Estava vazio como era o esperado daquela hora. O dia mal havia começado e o meu mal humor já dominava a sala inteira.

Depois de me alongar e correr algumas voltas comecei a descontar toda a minha frustração no saco de pancadas. Escutei a porta abrir, mas nem ao menos me importei, quem quer que fosse eu não estava interessada em conversinhas.

— Alguém caiu da cama hoje hein... – Olhei rapidamente e vi aquele garoto dos olhos amarelos. O que tinha me visto chorar. Meu sangue começou a subir pra cabeça e eu batia cada vez com mais força. Tinha que ser ele? Lhe mandei um olhar mortal enquanto ele se alongava despreocupadamente.

— É por isso que sua cara ficou assim? – Falei venenosamente. Ele riu alto enquanto começava a se alongar

— Ouch! Que tpm braba hein – Eu não sabia que eu era capaz de sentir tanto ódio por uma pessoa como a raiva assassina que me dominava naquele momento. Talvez eu estivesse descontando tudo nesse cara aleatório? Muito provavelmente, mas sinceramente eu não estava nem ai. Eu estava cansada, frustrada, apavorada, emocionalmente instável e tentando ignorar que meu professor favorito ia ser morto pela mina escola. É por isso que não choro em público. Isso te faz parecer fraca e idiotas como ele acham que podem fazer piadinhas sobre você.

— Ah claro, todos os problemas femininos se resumem a isso. – Revirei os olhos e fui obrigada a parar pra respirar. Ele me olhava com uma cara presunçosa e um sorriso torto enquanto começava a correr ao redor do tatame. Ele murmurou baixinho "Elfas" e fui levada ao limite do meu autocontrole.

— Ah Entendi, é por causa da sua paixão pelo Hans, não é mesmo? – Seus olhos se estreitaram de deleite enquanto ele caçoava de mim. Eu não sei o que deu em mim, mas é como se eu tivesse possuída de raiva ou algo assim. Corri em sua direção e quase dava pra ver a fumaça saindo pelo meu nariz. Meu punho direito agiu por conta própria quando eu estava chegando perto.

Pra minha infelicidade meu punho não acertou sua cara presunçosa e começamos a lutar. Ou melhor eu comecei a ataca-lo violentamente enquanto ele defendia meus golpes com a maior facilidade o que claro só me deixava ainda mais fula da vida. Eu estava praticamente rosnando em um estado animal. Realmente aquele cara despertava o pior de mim. Em um golpe de sorte acertei sua cara em cheio e soltei uma risada triunfante.

Devo dizer que foi naquele momento que ele aproveitou pra me derrubar no chão e me imobilizar. Era como se meu soco não tivesse feito nenhum efeito debilitante.

— Me larga seu idiota! – Rosnei me debatendo inutilmente.

— Não, você está descontrolada. – Falou ele calmamente. Mas dava pra ver que ele estava irritado. Pelo menos pra isso meu soco serviu! Não conseguia me soltar dos seu braços não importava o quanto me debatesse, então não tive escolha a não ser apelar. Mordi seu braço com força. – Aai você ficou louca? – Ele não fazia ideia do quanto. Aproveitei sua distração pra ficar por cima, dessa vez o prendendo no chão por alguns segundos. Me preparei pra levantar e acabar com aquilo. Agora ele estava realmente com ódio, não pude evitar de sorrir

— Você não me deu escolha. – Tentei me afastar, mas ele rapidamente se recuperou e me derrubou novamente, me prendendo ainda mais forte. Bufei de raiva. -  O que diabos você esta fazendo?

— Você não me deu escolha – Respondeu ele repetindo minhas palavras. Então senti seus dentes se cravando no meu pescoço. Sua respiração fez cocegas. Senti o ar sumindo dos meus pulmões. Aquele menino era um louco! Então ele se levantou como se nada tivesse acontecido enquanto eu permaneci no chão em puro choque. – Já está bom por hoje não acha? – Respirei pesadamente enquanto tentava me recompor. Ele já havia virado as costas e chegando na bancada pegou uma gaze pra cobrir a mordida aparente em seu braço. Então sua mão brilhou levemente sobre o machucado. Então ele era um mago, isso explica seu ar de superioridade. Eu mal havia me levantado quando as pessoas começaram a chegar para a aula. Olhei de relance para o espelho e vi que a mordida estava bem aparente. Maravilha, isso vai ser bem fácil de explicar praquela fofoqueira da Ava.

As ninfas imediatamente começaram a cochichar e soltar risadinhas. Tentei ficar o mais afastada possível. Me perguntei quem seria o substituto do Hans. Senti meu humor pesar novamente. Não importa quem seja, ninguém seria tão bom quanto ele. Eu já detestava o cara e ainda nem sabia quem era. Ava veio correndo na minha direção. Eu deveria estar com ódio dela, mas é claro que eu não conseguia. Ainda mais com tantas outras coisas me tirando do sério, mas eu estava tentando meu melhor. E o pior é que eu mesma tinha causado o maior estrago. Um estrago bem maior do que ela me levando naquele covil. Eu tinha dormido com um humano pelo amor dos Deuses antigos. Tá bom que foi no sentido literal, mas ainda assim uma loucura completa.

— Onde você se meteu a noite toda? – Sua expressão era uma mistura de curiosidade, preocupação e felicidade. Então seus olhos recaíram imediatamente na mordida, sem chance de eu escapar disso. A morte por favor... – Isso é uma mordida?!

— Dá pra falar mais baixo? – Sibilei com raiva. O mago arrogante nos olhou de relance e continuou lendo um papel segurando uma risada. Ele não foi o único.

— O que você aprontou ontem a noite? – Agora ela estava genuinamente confusa. Na verdade ela parecia não decidir que emoção estava sentindo. Ou talvez eu estivesse cansada demais pra isso. Meus pensamentos estavam uma bagunça. A noite havia sido longa. Acho que é melhor eu não contar nada sobre Yuri. Pelo menos não ali.

— Precisei espairecer. – Falei desviando o olhar do seu.

— E tava dando uns pegas em alguém? – Falou ela com uma risadinha mal disfarçada. Certo, ela estava rindo abertamente da minha cara.

— Não é nada disso Ava – Falei irritada. – Só me meti numa briga com um idiota

— Sei, queria uma briga dessas hein. Ei mas falando nisso, você já viu como o substituto é um gato?

— Claro que não, ele ainda não chegou. – Olhei ao redor investigativamente

— Do que você está falando? Ele está bem ali – Ela apontou para o mago arrogante e por um segundo eu senti que ia colocar tudo pra fora. Ai não. – Nossa mas essas ninfas sem vergonha não perdem tempo mesmo né? Olha ai, já estão lá babando ele.

Minha cara estava verde de enjoo. Eu acabei de morder... O meu professor? Eu dei um soco nele.. Eu. Tô. Ferrada. Ava estava certa as ninfas o cercavam  com risinhos enquanto ele sorria sem jeito, mas dava pra perceber que ele estava adorando toda a atenção, algumas chegavam ate mesmo a toca-lo e elogiar seus músculos, que clichê.

— Não pode ser, você deve estar enganada. Olha pra ele, é muito novo, deve ser um aluno novo.

— Aloo, magos ficam jovens um tempão esqueceu? Além do mais eu o vi com meus próprios olhos conversando com o diretor lembra? Nossa, mas o cara é muito gato mesmo hein, não canso de olhar pra ele.

— Não é tudo isso. – Minha cabeça estava girando enquanto eu torcia pra que um buraco se abrisse no chão e me engolisse. Quando será que eu ia parar de me ferrar? Queria chorar de frustração, mas jamais o faria no meio de todas aquelas pessoas.

— Você ta louca mulher? Ele é de tirar o folego e além de um rosto bonito ele parece ter um corpão. Aposto que por baixo daquela camisa tem um tanquinho super definido. – Fechei os olhos e coloquei as mãos no rosto tentando não lembrar de seus músculos contra a minha pele. – Além disso eu ouvi dizer que ele é um dos magos mais fortes de todos os reinos. Me pergunto o que ele está fazendo aqui em uma escola. Mas parece ter sido um favor para o diretor, eles se conhecem de longa data pelo que eu escutei. E você sabe como os magos são conhecidos pelos poderes e pela preguiça né? Mas não ele, ouvi dizer que ele é um mestre das artes marciais e domina todas as armas. Dizem que ele sempre anda com um arsenal infinito de armas invisíveis que conjura quando precisa. – Quanto mais ela tagarelava mais enjoada eu ficava. -  Você tá bem? Parece que vai vomitar

— Eu tô muito ferrada – Olhei pra cima me perguntando o que eu havia feito pra merecer tanto azar assim.

— Do que você ta falando? – Ela perguntou com aquela cara que fazia sempre que queria descobrir uma fofoca. E sempre conseguia mesmo, ela era implacável. Comecei a rir de puro desespero.

— Eu meio que soquei o nosso novo professor, maravilha. – Depois que comecei a rir eu não conseguia parar. Eu tinha perdido completamente o juízo. Acho que estava completamente louca mesmo. Se esse é o efeito que os humanos causam eu consigo agora compreender completamente o porquê isso é passível de morte. Que força destrutível terrível para seres tão frágeis.

— O que?! – Seu rosto agora era de choque completo. Dessa vez várias pessoas viraram para nós com curiosidade.

— Fala baixo! – Ralhei novamente. O mago levantou uma sobrancelha como se quisesse perguntar o que eu estava fazendo. Então ele colocou as mãos que seguravam o papel para trás do corpo e se preparou para começar a falar. – Depois eu te conto sobre isso em um lugar mais privado. – Falei entredentes.

— Bem vindos turma! Eu me chamo Will e serei seu novo professor de combate. Sei que vocês gostavam muito do professor Hans, - Ele me encarou com a expressão neutra, mas eu sabia que por dentro ele estava caçoando de mim. – Eu não tenho dúvidas de que ele era muito querido e um excelente professor. Infelizmente ele precisou ir embora devido à problemas familiares. E eu vim para ter certeza de que a educação de vocês não fosse prejudicada. Prometo dar o meu melhor para suprir suas necessidades. Estarei disponível fora do horário das aulas toda quarta para tirar qualquer dúvida que vocês tenham.

O silêncio na sala era ensurdecedor. Algumas certas pessoas, como aquelas ninfas descaradas, o encaravam embasbacadas de admiração e pareciam já ter esquecido tudo sobre o Hans. Bufei inconscientemente. Falsas. Outras pessoas estavam meio tristes e de cara fechada como eu. Will bateu as mãos quebrando todos do estupor que suas palavras causaram.

— Ok, vamos começar com o alongamento.

Dava pra perceber pela cara da Ava que ela estava se coçando para me perguntar mais. Por isso mesmo depois do alongamento mais silencioso de todos os tempos eu corri e fui fazer dupla com um elfo negro que estava ao nosso lado. Ela estreitou os olhos e me encarou com raiva, mas não disse nada. Ela sabia que ia conseguir arrancar toda a informação que queria de mim cedo ou tarde. Eu estava com tanta coisa na minha cabeça que só conseguia focar em derrubar o pobre do Gil. Ele estava se esforçando devo confessar. Já era bem a 15° vez que ele caia no tatame e estava ficando frustrado.

— Vou beber uma agua. – Disse ele irritado. Assenti sem falar nada enquanto recuperava o fôlego. Will aproveitou aquele momento para se aproximar com um sorriso presunçoso.

— Luna, certo? – Cerrei os dentes, ótimo ele já tinha até decorado meu nome. Com certeza eu estava muito ferrada. Balancei a cabeça sem me atrever a abrir a boca. Sabem os Deuses o que poderia sair, melhor não confiar. – Sabe, se aprender um pouco mais de controle emocional, você tem muito potencial. – Tive que usar toda a minha força pra ficar calada. Minha cara deve ter feito umas trinta caretas – Depois da aula vamos ter uma conversinha sim? – Apenas o encarei com ódio enquanto ele se afastava sorrindo tranquilamente. Não foi um bom momento pro Gildar voltar. Agora o coitado iria sofrer.

Will, o professor babaca

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