Lágrimas Do Tridente escrita por Icaro Pratti


Capítulo 5
Capítulo 5 - Oponentes


Notas iniciais do capítulo

Desculpem o pequeno descanso :c Aqui está o novo capítulo para vocês e espero que gostem!



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Vê-la dormir como um anjo, encontrando seus braços e ao mesmo tempo o meu conforto. Dormimos juntos, meus braços sobre os seus e seus cabelos próximos ao meu rosto. Talvez, a melhor noite da minha vida. Estar ao seu lado vale mais que qualquer coisa para mim.

Um barulho de porta abrindo me desperta e logo lanço meu braço para o lado e não encontro qualquer parte do corpo de Annie, levanto assustado. Annie estava no banheiro, penteando seu cabelo molhado próximo a pia e se olhando no espelho. Ela acaricia cada parte de seu cabelo e depois os balança pelas costas, fazendo-os dançarem e meus olhos caminham com seus movimentos. Ela está com um vestido diferente, é bonito, mas segue o típico estilo do distrito 4. Esse deve ter sido feito pela sua mãe pela enorme quantidade de bordados delicados nas partes do vestido. Ela está linda como sempre. Meus pensamentos são interrompidos quando ela para de pentear seus cabelos e nossos olhares se encontram pelo espelho, não consigo evitar um sorriso.

– Desculpe se te acordei Finnick – diz tímida. – Acho que está na hora de se arrumar.

Ainda continuo olhando para suas costas... Levanto, vou até ela e seu cheiro, inconfundível, me leva para outra porção de Panem, viaja em minha mente para todos os nossos momentos. Passo a mão em seu cabelo e jogo-os para um de seus ombros. Levo meus lábios até seu ombro e dou um leve toque.

– Estou indo, senhorita Odair – digo sorrindo encontrando seus olhos pelo espelho.

Começo a me afastar e caminhar até a porta quando ela me puxa pelo braço. Uma dor e um arrepio percorrem todo o meu corpo, mas não posso deixar de atrapalhar o momento. Ela gruda as suas mãos em meu pescoço e toca os seus lábios nos meus, sinto uma lágrima escorrer do seu rosto e tocar a minha bochecha. Automaticamente afasto meu rosto e mantenho nossos olhares fixos. Não quero dizer nada, apenas abraçá-la.

Novamente estamos em braços de compreensão e trocando o único sentimento que podemos criar com esses dias que estão para vir. Um deve estar unido ao outro a qualquer custo. Meus olhos enchem-se de lágrimas e não posso me conter, segurá-las está sendo impossível. Ela encosta-se em meu peito, passo as minhas mãos por trás de sua cabeça e acaricio seus cabelos. Somos interrompidos por um barulho.

– Estamos atrasados – Maggs sussurra batendo na porta.

Que horas são eu não sei, mas se Maggs fala que estamos atrasados, estamos. Toco meus lábios aos de Annie, corro pela porta e vou direto para o meu quarto. Olho para o relógio e consigo perceber que em poucos minutos começará a reprise das colheitas. Precisamos conhecer os oponentes de Annie; neste caso, meus oponentes.

Tiro toda a roupa e fico no chuveiro alguns minutos. A água que cai desses chuveiros é muito diferente de qualquer água do distrito 4. A água com uma pequena quantidade de sal, um leve choque em contato com algumas coisas metálicas e algumas coisas corroídas, essas são algumas marcas que o mar deixa por lá. Essa é uma água totalmente transparente, doce. Termino meu banho com um pouco de dificuldade, tenho que evitar molhar um dos braços que está machucado, mas certas vezes a água acaba por escorrer até o ferimento. Depois de alguns minutos de agonia, me seco na toalha e bagunço o cabelo com as mãos. Maggs já tratara de escolher a roupa perfeita para mim e está levemente dobrada em cima da minha cama. As mangas escondem os ferimentos do meu braço que logo poderão receber os tratos da capital.

Passar pelo corredor e caminhar até a sala que os outros estão seria uma atividade comum se o caminho não tivesse um cheiro inconfundível que me consome, o único capaz de dominar todos os meus pensamentos.

Todos estão sentados no sofá e Maggs fora esperta o suficiente para separar o rapaz do lado de Annie. Mesmo assim, tal atitude não me conforta. Para tirá-lo do lado de Annie, teve que colocá-lo ao seu lado e percebo em seu rosto uma expressão de fúria, a expressão que ele está habituado a colocar em seus lábios e sobrancelhas.

– Vamos Finn, já começou – diz Maggs.

Sento-me ao lado de Annie e passo o braço por trás de seu pescoço e o pouso em cima de seus ombros. Caesar está em seu palco falando coisas dos antigos Jogos Vorazes e sobre algumas novidades que são aguardadas para esta edição. Na poltrona ao seu lado está o idealizador dos jogos, sua expressão é imparcial, como sempre. Apenas diz a mesma frase que todos os outros idealizadores já disseram: “Temos muito à esperar desse ano”. Caesar volta ao telão, começa a introdução do Distrito 1 e logo as imagens de uma infinidade de pessoas aparece em frente ao hall da justiça. Nomes nem precisam ser ditos, duas mãos erguem-se da plateia e podemos ver dois meninos brigando para subir até o palco. Um mais forte sobe até o palco com um nariz sangrando e ergue os braços num grito. A menina não tem nenhum concorrente e se manifesta como tributo. Eis a honra de manifestar o seu distrito e mostrar que são capazes de vencer os distritos mais pobres.

A imagem volta para Caesar, que começa a discutir o físico e aparência dos candidatos e volto meus olhos para Annie enquanto a imagem não volta para apresentar o Distrito 2. Ela levara suas unhas até a boca e começara a roê-las desde que o menino subira no palco e demonstrara sua cara de desprezo em relação aos outros, apenas mais uma cobaia da capital. Levo minhas mãos até a dela, abaixo seus dedos e seguro entre os meus.
Caesar volta a imagem para o Distrito 2 e já podemos ver dois tributos subindo ao palco sem necessidade de terem seus nomes anunciados. Estão formados os grupos de carreiristas deste ano. Annie, a menina delicada, concorrendo contra cinco pessoas que se denominam superiores. Não importa quem são eles, o que importa é que ela sairá de lá viva.

Volto minha atenção para a tela que já começa a exibir a colheita do distrito 4. O nome de Annie sendo anunciado e ela sem qualquer reação, apenas perdida. Os olhos de Declan brilhando e o poder subindo à sua cabeça quando ele é chamado e se coloca ao lado de Maggs.

Não consigo prestar atenção em mais nenhum nome anunciado, cada nome tem significado uma faca que atravessa, é mais um que tentarei de matar a qualquer custo para tirá-la de lá. Esse pensamento me causa enjoo e minha cabeça dói, apesar de querer muito que Annie saia de lá viva, fazer com que essas crianças e suas famílias sofram me tira o chão. Do mesmo jeito que tenho a chance de perdê-la, todos eles têm essa mesma chance.

Annie aperta meus dedos com suas unhas e volto meus olhos para o que está sendo transmitido. A primeira coisa que observo é uma menina muito pequena ruiva e com lágrimas escorrendo pelo seu rosto subir ao palco em frente ao edifício da justiça. Logo depois outro nome é anunciado e um menino, também ruivo, sobe os degraus e dá as mãos para o homem que anunciara seus nomes. “Meus filhos não”, uma voz feminina grita e logo a imagem volta para Caesar. Meus olhos começam a lacrimejar e sinto uma dor excruciante em meu peito ao ver aquelas duas crianças subirem ao palco.

Annie significa mais que um familiar para mim, meu porto seguro, a pessoa que me mantém com os pés juntos aqui, a pessoa na qual mais lutei para sair daquela arena anos atrás. Os olhos lacrimejantes da menina ruiva dominam meus pensamentos de forma que não há como se lembrar de nada, não consigo imaginar qualquer um matando aquelas crianças, não há doentia maior que essa: tirar as únicas pessoas que temos e entregar por diversão.

Me levanto antes de acabar com as apresentações e sento na beirada da poltrona que estive na noite anterior. Coloco a mão no queixo e fico com os pensamentos vagos, vendo os enormes campos que passam além dos distritos. Posso ver algumas construções, algumas pontes começam a surgir e enormes prédios são possíveis de ver pelo vidro mais distante.

Olho para trás e vejo que as apresentações terminaram e que Maggs está com Annie e o rapaz próximos à maior janela. Declan está de boca aberta e só falta a baba escorrer de sua boca pra passar maior vergonha, já Annie está assustada, seus olhos expressam uma situação de pânico ou medo, ela não está gostando do que está vendo. Qualquer opção de natureza ou vida é praticamente esquecida na Capital. Podem-se encontrar prédios, rios que correm sobre o cimento. Alguns ainda prezam pela natureza e mantém algumas vegetações nos topos dos prédios. Não tem mar, não tem nosso único ambiente fixo, a areia salina.

Me junto ao lado de Annie e entrelaço meus dedos aos seus e posso sentir o anel que lhe dei encostando-se ao meu dedo. Ela está fria, minhas mãos quentes e suadas geram um contraste entre nossas temperaturas. Cada vez mais próximos estamos dos grandes edifícios da Capital e algumas pessoas acenam para o trem enquanto passamos. Declan entendeu algumas regras, como a de que os tributos têm que se impor, de forma que retribui os acenos e manda beijos para algumas meninas. Annie está imóvel, uma de suas mãos segura a minha e a outra ainda aperta a mão de Maggs.

– Estamos chegando à estação. Sorriam, finjam estar feliz com tudo isso – Maggs anuncia acenando para algumas pessoas paradas na calçada.

– Fingir que está feliz? Isso é o máximo – Declan vangloria-se.

Olho de soslaio para ele e logo seu sorriso se esvai. Ele pôde sentir que não gostei da brincadeira e logo corresponde aos meus pedidos. É bom me impor sobre ele, principalmente depois das palavras que saíram de sua boca. Tiro meu olhar dele quando o trem começa a frear sem qualquer dificuldade e a porta começa a abrir silenciosamente. A enorme estação está à vista com milhares de pessoas amontoando o que chamariam de local de embarque.

A porta termina de abrir e duas filas de pacificadores estão, uniformemente, formadas para criar um corredor ao qual nos guiará até os carros. Não é possível ouvir mais nada, cartazes e gritos começam assim que Maggs coloca o primeiro pé para fora do trem, Declan desce logo atrás. Desço ainda com o as mãos dadas para Annie e os gritos aumentam. O que pensava que era um barulho ensurdecedor, triplica de altura e alguns pacificadores começam a ser forçados a desfazer a formação, sendo empurrados e a multidão grita “Fin-nick, Fin-nick”. Os movimentos são rápidos e Annie solta meus dedos e caminha rápido para frente ficando ao lado de Declan.

Tento correr quando sou impedido por um obstáculo: uma mão acabara de segurar os meus pés. Caio com tudo no chão, usando como apoio o braço que já estava machucado. Olho para o braço e uma pontada de dor, seguida de um arrepio passa por todo o meu corpo. O sangue começa a aparecer em meu braço, a blusa agora está manchada com um sangue escuro.

Uma mulher começa a chorar desesperadamente na multidão e só então todos percebem o que aconteceu e se calam. Maggs olha para trás e logo corre em minha direção. Um pacificador aponta sua arma para a mulher que começara a chorar e gritava algo como “Desculpe, desculpe”. Não irão matá-la, ela é da Capital. Um pacificador me ajuda a levantar e me coloca ao lado de Maggs que começa a apoiar o meu braço. O pacificador leva as mãos até o cabelo da mulher e a segura com força e uma expressão maligna. Todos sabem o caos que pode gerar um dos mentores ter sofrido uma espécie de ataque vindo de algum rival.

– Solte-a – consigo dizer.

A expressão do pacificador se desfaz com minhas palavras e vejo a mulher, que na verdade é apenas uma garotinha, correr para longe dali ao encontro de sua família. Levanto com Maggs em direção ao carro que já está com Declan e Annie no banco traseiro. Sento no banco da frente e logo que olho para trás. Declan está entre as duas, o que faz com que um universo de fúria invada meus pensamentos.

Levo meus olhos até o ferimento dos meus braços e consigo ter noção de como a ferida piorara pelo tanto de sangue que, agora, pinga pela camiseta, e pela dor que tomou conta de todo o meu braço. O primeiro caminho que sempre temos que ir é a preparação inicial dos tributos. Neste caso, até o Centro de Preparações da Capital, que não fica muito distante dos edifícios onde ficaremos hospedados.

Maggs é a primeira a saltar, acompanhada de Declan e por último, Annie. Nossos olhares se encontram e logo passo o braço que não está machucado sob seu ombro e ela leva seus dedos sob a ferida que está marcando todo o meu braço. Ela toca de leve seus lábios nos meus dedos e caminhamos para dentro do edifício. As portas se abrem assim que estamos chegando perto, uma coisa que achei engraçada na primeira vez que vim até aqui e que agora transforma Declan em uma criança. Afinal, sua real personalidade.
Seguimos pelo saguão e várias pessoas param o que estão olhando para focar em nossa presença, que traz uma nova movimentação ao local. O corredor enumerado por quatro está aceso e logo encontramos duas portas, uma com o nome de cada um.

– Vamos lá? – diz Alfred abrindo uma das portas e segurando os braços de Declan. – Finnick! – exclama, me apertando contra o seu corpo.

Logo cumprimento todos os preparadores que encontramos todos os anos, com suas roupas extravagantes, cada vez mais irreconhecíveis e malucas. O que assusta Annie inicialmente é o cabelo, logo depois as enormes marcas no corpo. Um tridente está desenhado no braço de Alfred, o que faz os olhos de Annie pousarem na marca e depois voltar seus olhos para mim.

Olhar para o desenho do tridente me fez relembrar de cada vez que segurei em seu cabo metálico, sentindo o frio de sua extensão, correndo com ele pela arena, quase morto, correndo dos carreiristas que queriam ver o garoto eliminado. A maior dádiva já recebida veio a salvar a minha vida. O tridente que se ajeitava de forma confortante entre meus dedos, que eu conseguia lançar nos meus inimigos e fazer o barulho do canhão estourar.

– Vamos resolver isto agora? – Maggs susurra, segurando meu braço machucado.

Caminhamos até a ala hospitalar do local e logo a mulher dá um grito ao tirar a camiseta e os panos que estavam envolvendo a ferida. Ela chama desesperadamente um ajudante e logo colocam um líquido viscoso sobre a ferida, fazendo com que ela lateje. Passam água sobre ela e com aquela sujeira e sangue seco sendo retirados, eles começam um trabalho infinitamente demorado para retirar pequenos cacos de vidro que se alojaram na pele e saem com dificuldade. A dor passou, isso se deve a uma espécie de remédio que eles colocaram sobre a ferida, que provavelmente possui a capacidade de adormecer, pois tornou meu braço imóvel. A dor se transformou em leves beliscos.

O tempo parou de contar para mim, sei que apenas está passando devagar e que não aguento mais ficar à espera da melhora desse machucado. Quando acho que estão terminando, começam a aplicar uma série de remédios e a envolvê-lo com uma espécie de curativo. Olho para o meu braço e fico perplexo com o trabalho realizado. O braço está intacto, envolto por uma espécie de curativo da cor da minha pele, que mescla tornando-se praticamente imperceptível, a única diferença se dá pela largura, que está um pouco maior.

– Obrigado – consigo agradecer.

Maggs estava lendo alguma espécie de revistas da capital, em sua capa já estavam as fotos dos vinte e quatro tributos, todos com seus nomes em baixo. Ela larga a revista sobre o pequeno sofá e caminha ao meu lado.

– Maggs, como vamos fazer? Temos cinco carreiristas esse ano para competir com ela – lamento em sussurro.

– Se não percebeu, temos seis – ela ri enquanto fala.

Só então me dou conta. Annie pode se preencher ao grupo dos carreiristas. Não, absolutamente não a quero se envolvendo com eles, sempre são traiçoeiros e buscam a vingança com seus aliados. Nunca se apóiam a ninguém, não passam de idiotas que se vangloriam de sua vitória. Olho para Maggs e ela para de frente para mim, seus olhos se encontram com os meus e ela se impõe com uma expressão séria que vi somente quando estava entrando na arena. “Confio em você”, disse antes de eu entrar no cubo de vidro e subir até a arena.

– Vamos dar nosso máximo para salvá-la, não sei o porquê de estar preocupado com os carreiristas quando nosso primeiro obstáculo está aqui – diz, apontando para os lados.
Logo penso em Declan, um inimigo tão próximo que poderia enganar facilmente. Mas ele absolutamente está fora de qualquer aliança que Annie possa criar, isso está certificado antes mesmo que qualquer treinamento comece. Volto meu olhar para Maggs.

– Não é tão obvio? – conclui.

Volto meus pensamentos para Annie, sua reação com o modo de vestir, as pessoas gritando meu nome, as atitudes das pessoas por simples tributos que são encaminhados para a morte. A busca por sobrevivência onde apenas um será campeão e poderá abraçar novamente sua família enquanto pessoas pagam para vê-los com seus brinquedinhos. Entendo o que Maggs quer dizer, o primeiro fator que devemos nos preocupar está diante dos meus olhos e nem me dei conta disso. Ela tem que enfrentar isso para tornar-se uma vitoriosa e a Capital é o seu primeiro oponente.


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Notas finais do capítulo

Como sempre a Capital tá na parada, espero que tenham entendido minhas ideias principais.. a Annie tem que vencer o próprio medo dentro de si! Beijos e espero vocês no próximo capítulo.