Dilema Platônico escrita por Metal_Will


Capítulo 38
Capítulo 38 - Sinceridade




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/35573/chapter/38



    O resto da aula passa rapidamente. Todos até que se viram bem nos últimos exercícios, embora não tenham muita experiência com improvisos. No final, o professor reúne todos e mais uma vez comunica sobre a peça que eles farão;
    - Então é isso pessoal - diz Platão com um tom extremamente animado - Semana que vem faremos mais exercícios e eu já trago as primeiras falas da nossa peça prontas. Parece muito tempo, mas o semestre acaba daqui a uns dois meses.
    "Dois meses", pensa Miguel, "Eu só tenho dois meses para ensaiar essa coisa"
    - Nossa, tá bem em cima mesmo - concorda Sandra - Será que vai dar tempo?
    - É por isso que peguei uma coisa bem simples. Eu juro que trago boa parte do roteiro pronta na semana que vem para vocês darem uma olhada. Ah, sim..é provável que alguns de vocês façam alguns papeis diferentes durante a peça, mas serão falas rápidas..não se preocupem.
    - Sei...papel de figuração? - pergunta Leandro
    - Ue? O que mais você quer? Nessa história os únicos personagens com alguma relevância são o próprio príncipe e a princesa. Miguel e Danieli com certeza não mudarão o papel
    - Olha só. Vocês não tão pra brincadeira, não, heim? - diz Camila, toda sorridente.
    Miguel olha para a janela, vermelho. Dani apenas dá risada também.Esses dois, protagonistas, como príncipe e princesa. Essa podia ser uma ótima oportunidade para Miguel, mas também poderia ser bastante arriscado. "Se eu for um fracasso de ator...ela vai me odiar pra sempre!", pensa o pobre e ansioso rapaz, "Não, não, não...eu sei que ela nunca iria ficar comigo, mas também não quero que ela me odeie. Preciso me dar bem nesse personagem, nem que eu tenha que me virar do avesso!"
    - É só isso, gente. Até a aula de Filosofia semana que vem
    - É verdade. Sempre esqueço que ele também é professor lá na escola - lembra Toni
    - Você tá sempre dormindo na aula, né? Assim você sempre esquece disso mesmo - comenta Camila
    - É que...sei lá, acho que fico muito cansado de tanto fazer exercícios. Daí acabo deixando um pouco de lado a escola - o forte rapaz desabafa.
    - Sério? Mas não pode! Você tem que se esforçar nos estudos também! - comenta a loirinha, enquanto saía junto com o grupo pela porta.
    - Hmm...estudar é muito chato...acho que...
    - Acha o que?
    - Acho que só cheguei até o segundo colegial colando - diz Toni em uma voz quase inaudível para evitar uma bronca do professor
    - Olha só...mas não pode - diz a loirinha (a única que escutou o que ele disse) - O que você pretende fazer depois que se formar?
    - Não sei ainda...acho que faria Educação Física em alguma faculdade por aí...tem que ser algo a ver com mexer o corpo. Ficar parado não é comigo!
    - Você gosta mesmo de malhar, né? Mas mesmo para Educação Física tem que estudar bastante.
    - Eu sei. Vou tentar me esforçar mais. Apesar de ser difícil estudar sozinho
    Essa Miguel ouve. "É verdade, esqueci daquele Toni...jogando uma dessas pra ela! Ai, tomara que ela não caia. Não cai, não cai, não cai", pensa o tímido garoto.
    - Ah, por que não falou logo? Se quiser eu estudo com você. Eu sou nova na escola e tenho várias coisas pra ver também. A gente podia estudar junto.    - Mesmo? Se você pudesse...nossa, eu ia agradecer muito!
    - Claro. Você tem algum dia dessa semana livre?
    - Tenho quinta à tarde...nesse dia eu só venho pra academia à noite
    - Beleza. Se quiser passar lá em casa na quinta, a gente pode estudar junto
    - Sério mesmo? Valeu, Camila
    - De nada
    Miguel ouvia isso com o máximo de esforço. Nunca imaginou que Toni iria para sua casa algum dia. "Se ele ver o meu quarto...", pensa Miguel. Tudo bem, ele parecia estar bem mais maduro agora, há estava se dirigindo a Miguel (e à maioria das pessoas também) com bastante respeito. Mesmo assim era muito estranho. Estranho porque Miguel tinha certeza de que ele iria dizer o que sentia para Camila naquele dia. Afinal, ao contrário de Miguel, Toni estava certo do que queria. O pobre e tímido Miguel não podia suportar a ideia de sua prima ficar com Toni ali, na sua própria casa. Mas é claro: Camila não estava a fim de nenhum relacionamento! Mas, se fosse assim, por que ela convidaria Toni para estudar em casa? Isso era muito contraditório...não demorou para Miguel começar a suspeitar que Camila só falou aquilo para enrolá-lo. Hora de entrar no modo "todos estão contra mim"!
     Quando a galera saia, Toni se despede dizendo que ainda tem mais exercícios naquele horário e segue para o vestiário. Poucos segundos depois de Toni sair, Miguel pensa em uma coisa meio louca.
    - Gente...preciso ir ao banheiro. Eu já volto - diz ele, meio sem-jeito.
    - Agora? Tá, vai lá. A gente espera - diz Camila
    Miguel sai correndo e entra no vestiário. Toni estava ali. Graças ao céus, ainda não havia começado a se trocar e Miguel evitou uma visão desagradável.
    - Toni
    - Opa, fala Miguel.   
    - Então...você vai mesmo lá em casa essa semana?
    - Ah, você tava ouvindo, safado? Hehe. Vou, vou sim. Essa é a minha chance, cara
    - Sua...chance - repete Miguel
    - É. Se eu não falar o que eu sinto pela sua prima agora não falo mais
    Miguel não fala nada.   
    - E até que essas aulas de teatro são legais - diz o fortão em voz baixa - Eu esperava muito mais frufruzices, mas até que tá da hora
    - Né? Eu também estou me esforçando   
    - Eu vi. Vai até ser o principal da peça lá. E ainda vai fazer par com a ruiva gatinha. Se deu bem, maluco.Hahaha!
    - Não é garantia...se eu não der conta, troco com outra pessoa - diz Miguel, já bem ruborizado.
    - Dá conta, sim. Você é um cara bem esperto
    Miguel gosta de ouvir o elogio
    - É nerd, mas é esperto. Isso é o que conta
    O rapaz procura interpretar isso como um elogio também
    - Mas, valeu mesmo - diz Toni, enquanto se troca. Miguel queria sair dali o quanto antes, mas ainda precisava saber umas coisas.
    - Valeu por que?
    - Pela sua ideia de fazer essas aulas...eu não teria combinado isso com a Camila se não estivesse aqui
    - Nada...vocês poderiam conversar na escola
    - Talvez. Mas você acelerou as coisas. Naquela escola..sabe como é..tem muita gente fofoqueira
    - É...acho que sim. Ah, Toni...só posso perguntar mais uma coisa?
    - Claro. Manda aí - ele responde, enquanto guardava algumas coisas no armário.
    - Se...a Camila não corresponder  o que você tá sentindo...como você vai reagir?
    - Que é isso, véio? Já tá pensando no pior?
    - Não é isso, mas...pode acontecer...não pode?
    - Eu prefiro não pensar nisso
    - Como assim?
    - Eu sempre me dei bem com mulher, não sei se já te contei...
    Precisava contar
    - Mas..- continua Toni - Nunca soube o que é ser rejeitado. Todas as minas que eu pedi pra ficar, sempre ficaram comigo...
    "Como ele pode falar isso de um jeito tão natural? Que raiva!", pensa Miguel, obviamente, contendo suas emoções por dentro.
    - Só que ficar é uma coisa e namorar é outra. Nunca pedia uma menina em namoro. Se ela também for do tipo que só quer curtição...aí, nem rola
    Miguel fica surpreso com essa última frase. "Nem rola? Como assim?"
    - Nem rola? Tá querendo dizer...que se não for pra namorar, nem ficar com ela você vai ficar?
    - Não - diz Toni fechando o armário - Ficar só por ficar posso fazer com qualquer uma...mas com a Camila. Com a Camila, não. Não vou conseguir ficar com ela sabendo que é só por um momento...eu queria mais, bem mais
    - Caramba...isso é
    - Eu sei - Toni interrompe - É estranho ouvir isso de mim, né? No fundo acho que eu sempre soube disso. Beijar, ficar, dar uns amassos...a mina pode ser a mais gata do mundo, mas, de que adianta se for só por uma noite? Uma noite e puff..já era..só lembrança. Mas quando você tem alguém do lado, você pode compartilhar tudo e fazer tudo isso, ficar, beijar, abraçar...quando quiser. É isso, cara. É isso o que, na verdade, eu sempre quis. Por mais mina que eu beijasse, nunca tava satisfeito. Eu sempre queria mais, mais e mais. Mas a resposta tava bem na cara: eu queria uma mina só, pra sempre, mas que fosse uma mina que eu realmente gostasse! E, sinceramente, a Camila é essa mina, cara. Eu tenho certeza
    Miguel ouve tudo o que Toni lhe diz sem falar nada. O que ele poderia dizer?
    - Agora, o que você perguntou... - continua o fortão - ...não, eu prefiro não pensar nisso. O que tiver que ser, será. O importante é fazer aquilo que você acredita que é certo sem se arrepender
    Aquilo soou muito forte para Miguel. "Fazer o que é certo sem se arrepender", pensa ele, "Mas, na minha situação, eu nem sei o que é certo..."
    - Olha, cara - diz Toni já trocado com sua roupa de ginástica - Eu tenho que ir pra aula agora. A gente se fala. Abração
    - Falou
    Miguel sai do vestiário extremamente confuso. Aquele cara que ele acabou de conversar era o mesmo imbecil que tirava todas da cara dele no passado? O amor consegue amadurecer tanto assim as pessoas? O garoto sentia vergonha de ter sentido tanta raiva de alguém que, na verdade, tinha um coração enorme. Tudo aquilo que ele fazia era só molecagem e babaquices mesmo. Como podia ser verdade? Miguel só sabia de uma coisa. Cada palavra, cada confissão que Toni havia feito ali, naquele momento, foram sinceros. Alguém que teve mulher aos montes, mas trocaria tudo por uma única que amasse de verdade. Eram tão diferentes. Toni tinha um visão otimista, ele simplesmente faria o que achava certo sem se importar com resultados, seguindo o coração. Já Miguel racionalizava tudo e sempre chegava a conclusões pessimistas. Como ela pode gostar de mim? O que eu tenho de bom? Melhor só ficar à distância. Por mais que se esforçasse, Miguel não conseguia romper essas barreiras. Ele acreditava que Toni estava certo. Ele sabia que contar a Dani o que sentia era a melhor escolha. Mas ele simplesmente não tinha coragem de falar..porque sempre que olhava para si mesmo, já sabia da resposta. Por que ele tinha que ser tão racional? Por que? Eram tantas perguntas e pensamentos juntos que Miguel sequer reparou que já havia chegado aonde os amigos estavam.   
    - Ô, Miguel? - chama Camila - Ia embora sem a gente, é?
    - Nossa, viajando legal, heim? - diz Leandro, que estava no banco de espera abraçado com Sandra
    - Hã? Ah, vocês...
    - Já foi ao banheiro? - pergunta Camila
    - Banheiro? Ah, sim, sim. Podemos ir embora.   
    - A Dani teve que ir embora, mas ela desejou boa sorte para o papel que vocês vão fazer.   
    - É, maluco. Se deu bem! - brinca Leandro - Agora é só aproveitar e ensaiar bem o beijo técnico! Hahaha!
    - Para, Leandro - bronqueia Sandra - Olha, beijo não acho que vá ter, não. É uma peça pra criança e o professor parece mais focar na parte social no que no romance
    - Nem me fale. Ele quer futuros marxistas, é isso? - diz Camila.
    - Marxismo para criança...é cada uma que aparece - fala Sandra.
    - Seja como for...eu não sei se vou dar conta desse papel. Eu aceitei, mas..
    - Ai, Miguel. Quer parar com isso? Já tá enchendo! - bronqueia Camila - Você sempre tem essa mania de já considerar que uma coisa tá perdida sem nem tentar! Ensaia primeiro, depois você fala!
    Miguel fica quieto com a bronca, mas Camila continua:
    - É uma peça curta, rápida e você ainda tem dois meses pra ensaiar. Além disso, você tem a Dani, que já tem experiência em teatro pra te ajudar, não tem?
    No fundo isso era verdade
    - Você devia é usar isso a seu favor e se aproximar mais dela. Isso sim
    O problema era esse. Por alguma razão, se aproximar de Dani era tão doce quanto assustador.
    - Vai ter que se esforçar mesmo - comenta Sandra - A Dani é inocente demais...você vai ter que dar muita indireta pra ela
    - Tudo bem, tudo bem...eu vou tentar ser o principal da peça. Mas não esperem grande coisa
    - É claro. Você tá fazendo um curso de teatro há duas semanas e já quer ser ator profissional? Pelo amor, né? - ironiza Camila - Relaxa. Apenas ensaie e se divirta
    - Me divertir...vai ser difícil...   
    - Ai, vambora, Miguel. Já cansei dessa conversa!
    - Tudo bem, vamos
    - Aí. Miguel - chama Sandra, enquanto o grupo saía
    - O que é?
    - Se quiser eu posso jogar umas indiretas sobre você pra Dani. O que acha?
    - Não, não. Nem brinca. Eu...vou resolver isso sozinho..
    "Sozinho, é?", pensa Camila, "Quero só ver..."
    Quando o grupo se separa e o casal Leandro e Sandra dividem o caminho, Miguel invoca a velha conversa de sempre.
    - E a senhorita?
    - O que tem eu? Ah, nem precisa falar...tá falando do Toni, né?
    - Pois é. Você não disse que não quer nada com ninguém, que não quer nenhum tipo de relacionamento e blá, blá, blá? Que história é essa de chamar ele pra ir lá em casa?
    - O que é que tem? Ele tá precisando de nota e eu também tô precisando estudar. Aliás, você bem que podia dar uma força pra gente, né?
    - Acho que não adiantaria muito
    - Por que?
    - O Toni não iria aceitar...você é esperta. Já deve saber bem o que ele quer
    Camila fica séria
    - Sei. Sei sim.
    - Hmm?
    - E é outro motivo por ter oferecido estudar lá em casa. Com certeza ele vai usar a oportunidade pra falar o que sente...então, eu quero acabar logo com isso e falar pra ele que não quero nada antes que seja tarde
    - Caramba...você...realmente não quer nada com ele?
    - Eu não quero nada com ninguém! - diz ela, num tom mais forte e sério - Agora...será que a gente pode mudar de assunto?
    Miguel havia comentado aquilo mais para saber o que Camila estava querendo. Na verdade, depois daquela conversa, Miguel estava era muito curioso para saber como Toni reagiria a uma decepção. "O que você vai fazer, Toni?", pensa Miguel, "Você que nunca recebeu um não de uma menina...como você vai se sentir?"


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Dilema Platônico" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.