Piper’s POV

Já passavam das dez da noite e eu e Jason ainda estávamos fazendo a mesma coisa do que duas horas atrás, ou seja, sentados nos bancos da bancada da cozinha fazendo o trabalho, ou melhor, castigo, de química. Nós tínhamos escolhido como tema fazer a estrutura de uma célula, que já estava no final, agora só faltava a segunda mão de tinta e voilá, trabalho, enfim, feito.

Eu mal podia acreditar que eu e Jason estávamos fazendo um trabalho normalmente como se nada tivesse acontecido, a situação era tão sarcástica que chegava a ser cômica. Mas se bem que, depois do acidente e tudo mais, parece que as coisas começaram a se resolver, por exemplo, eu não imaginei me tornar amiga da Reyna, ou estar fazendo um trabalho de química com meu ex...

Jason já havia me pedido para reatar, mas eu não sabia por que, mas tinha medo, medo de me machucar novamente. Meus sentimentos por Jason nunca mudaram, e, por mais que eu negasse, ainda sentia algo por ele, algo mais que querer ser apenas uma amiga, como nos velhos tempos. Mas sabia que se eu cedesse a ele, julgaria a mim mesma como uma masoquista.

– Piper, passa a tinta vermelha? – disse Jason, me trazendo de volta ao mundo real.

– Ah ta. – disse eu, piscado três vezes e balançando a cabeça, como se estivesse saindo de um transe.

Peguei a tinta vermelha, tentando a abrir, sem sucesso. Torci a tampa novamente, mas ela estava tão dura que era quase impossível e ser abeta.

– Jason, abre isso pra mim? – falei o entregando a tinta.

– Claro. – ele respondeu, pegando o frasco da minha mão, e tentando o abrir, também sem sucesso.

Ri pelo nariz com a cara de indignado que ele fez, afinal, era o Jason, o sub-capitão da equipe de basquete, que tinha mais que o dobro de tamanho e força que eu e que não estava conseguindo abrir uma latinha de tinta.

– Não ria de mim, você também não conseguiu. – ele protestou.

– Não estou rindo. – falei, reprimindo um riso.

– Claro. – ele falou irônico, torcendo a tampa da latinha de tinta e enfim conseguindo a abrir, mas o lado negativo foi que ao abrir a latinha, a toda a tinta que estava nela espirrou logo em mim, tingindo meus cabelos da raiz às pontas de vermelho.

– Seu... – comecei a falar de boca aberta com a situação deplorável do meu cabelo. Mas fiz melhor que isso, sorrindo travessa e pegando um pote de tinta azul já aberto e o jogando em Jason, que no começo ficou surpreso, mas depois sorriu malicioso, começando uma guerra de tinta entre nós dois.

(...)

Peguei um pincel e o molhei na tinta azul, pincelando a cara de Jason, que pegou um canudo e o encheu de tinta, depois a espirrou em gotículas bem no meu rosto.

Eu, muito esperta, fui tentar desfiar desviar de mais um jato de tinta vermelha, mas acabei tropeçando num tapete e cai no chão, rindo de mim mesma. Jason foi tentar me ajudar a levantar, estendendo sua mão, mas bem no momento em que eu a peguei, ele pisou numa poça de tinta, caindo logo em cima de mim.

Ao cair, os olhos de Jason se encontraram nos meus, e por alguns segundos não havia mais nada a não ser lembranças; nosso primeiro beijo, encima do telhado da escola, assistindo a chuva de meteoros; a vez que nos colocamos as calcas do Treinador Hedge no fogo; nós dois cantando You Belong With Me, no shopping e quando nós começamos a namorar, no mesmo dia; nossos beijos no celeiro; ele cantando Little Things para mim. Tudo aquilo parecia um passado tão distante agora, como se fossem memórias falsas, mas eles não eram falsas. Elas são muito reais.

Até demais.

Eu e Jason estávamos realmente estávamos realmente próximos, dez, cinco, dois centímetros, talvez milímetros de distância, bastava apenas isso para mais nada. Mas infelizmente ou não, minhas lembranças não pararam por ai, naqueles milésimos de segundo para que os milésimos de distância não existissem mais e nós finalmente nos beijássemos, me veio em mente nosso último beijo o dia em que ele aconteceu, e por fim o dia seguinte... Eu não poderia simplesmente esquecer, não poderia me deixar levar pelo momento e também não poderia negar que aquelas memórias, daquele dia, eram mais forte s do que eu.

E mesmo que eu esquecesse tudo aquilo, me deixasse levar pelo momento, e superasse aquelas memórias, daquele dia, eu ainda sim, seria uma masoquista.

Maldita consciência sempre certa.

Talvez por defesa própria, impulso, covardia, medo, ou qualquer uma dessas hipóteses, eu dei um passo para trás.

– Desculpa. – disse Jason, ao perceber que eu recuei.

Balancei a cabeça, como sem dissesse “não foi nada” em resposta.

– Vêm, vamos arrumar essa bagunça. – falei me levantando e o estendendo minha mão.

Dessa vez sem tropeços, pois querendo eu não, já estava decidido que aquele dia, naquela tarde, teria ocorrido nosso último beijo.