O Feiticeiro Parte III - O Medalhão de Mu escrita por André Tornado
O barulho do vento, no seu assobiar típico de senhor das alturas, era a única companhia de Toynara no Palácio Celestial. O jovem sacerdote meditava no mais profundo dos silêncios, sentado nas lajes brancas e polidas dos domínios do Todo-Poderoso.
Não se movia. Entregara-se àquele exercício que anulava qualquer necessidade física desde que o kami-sama e Mr. Popo tinham misteriosamente desaparecido. Era indispensável, uma prova a superar, outro teste à sua vontade, haveria de se reanimar no dia do seu regresso, acreditando, então, que regressariam. Tinham passado quase nove dias, contara.
O vento soou novamente, mas carregava consigo outro som. Um zumbido que fez estremecer o mundo. De olhos fechados, viu claramente a imagem de uma serpente grossa e negra que rodopiava furiosamente enquanto penetrava o espaço proibido, carregando no seu ventre uma multidão de espíritos.
Levantou-se, equilibrou-se nas pernas fracas. Ignorou a tontura provocada pela fome e pela sede. Três pessoas materializaram-se do nada, três espíritos vomitados pela serpente. Reconheceu dois deles, o kami-sama e Mr. Popo. O outro era da mesma raça do kami-sama mas, pelo aspeto imponente, seria um guerreiro.
A serpente prosseguiu pelo mundo a vomitar outros espíritos, animada por uma magia que ele não conhecia, cruzando uma porta escancarada que se fechava à medida que a serpente ficava de ventre vazio. O encantamento era poderoso e sentiu curiosidade, mas não conseguiu acompanhá-lo. A serpente deslizava escorregadia, esquivando-se ao seu alcance.
O kami-sama estava confuso.
- Voltámos à Dimensão Z – divagou. – Aconteceu o que não queríamos que acontecesse. Houve um de nós que interagiu com um deles.
Mr. Popo cumprimentou-o com uma vénia.
- Toynara-san.
Devolveu o cumprimento a Mr. Popo, dobrando-se igualmente numa vénia. O guerreiro disse:
- Então, ele é o sacerdote do Templo da Lua?
Ficou tenso, detestava ter as atenções concentradas nele. Sentia-se inibido. Um grande senhor da magia devia passar despercebido, como uma sombra, presente mas invisível.
- Hai, Piccolo-san – respondeu o kami-sama.
Não lhe dispensou um segundo olhar. O guerreiro afastou-se, dirigiu-se aos limites do recinto, onde ficou a observar o mundo, como o kami-sama costumava fazer.
A curiosidade tornou-se insuportável. Se fosse noutra ocasião, Toynara teria suprimido esse desejo, penitenciando-se violentamente a seguir com um castigo autoinfligido. Mas necessitava urgentemente de uma resposta, assim como de comida e de bebida. Precisava de saber que magia era aquela que comandava a serpente. Mr. Popo, que insistia em querer ler o que lhe ia na alma, já se tinha apercebido da sua curiosidade e mais valia expô-la, para poder ainda salvar alguma coisa da sua dignidade. Inclinou primeiro a cabeça, afastou uma segunda tontura e perguntou:
- Kami-sama… Gostaria muito de saber o que vos aconteceu. Estiveram desaparecidos durante nove dias. Não sentia as vossas auras, era como se tivessem sido transportados para outro universo. Hoje, de repente, regressam e percebo que é a magia que vos transporta.
- Pensas corretamente, Toynara-san. Não estivemos neste universo. Melhor dizendo, estivemos noutra dimensão. Foi Zephir que se encarregou de nos enviar para esse lugar longínquo e inalcançável.
O nome do feiticeiro causou-lhe uma terceira tontura.
- Foram para outra dimensão? Posso perguntar… para que dimensão?
- Para a Dimensão Real.
Empalideceu, mais uma tontura. Piccolo voltou-se para eles, abandonando a observação do mundo. A majestosa capa branca que usava nos ombros ondulou com o movimento que fez e com uma rajada de vento que varreu o Palácio Celestial. Toynara gaguejou incrédulo:
- A… a Dimensão Real?!
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Próximo capítulo:
Raptada.