Prólogo.

Sorhe pensou muito sobre o que iria fazer. Tinha passado praticamente duas semanas no laboratório, meditando e fazendo cálculos para a viagem, o que era loucura, pois, mesmo ele sendo considerado um gênio, não podia ter certeza se o resultado da pesquisa era certo, uma vez que não havia dados experimentais para o que o homem estava prestes a fazer.

“É o único meio.” Sorhe pensou depois de debater com o conselho de anciãos. Tinha explicado e argumentado de várias formas e até chegou ao ponto de implorar para que eles o escutassem, para que não fizessem aquilo, mas os dezoito homens de centenas de anos de idade mantiveram-se irredutíveis quanto à monstruosa ação. Não havia como parar...

Sozinho em sua casa, o cientista deitou-se na cama olhando para o teto branco na esperança que a parede superior pudesse lhe dar uma resposta, qualquer reposta lhe serviria, pois o sono há muito o havia abandonado em virtude de sua consciência ficar gritando “Isso está errado, se há um sentido no que não está certo é o que vão fazer! Precisa impedir, tem de dar um jeito!” Mas Sorhe não conseguia encontrar um meio de parar. Pôs toda a inteligência para achar uma saída e ainda assim tinha certeza que não havia como deter a difusão dos selos.

Isto lhe causou mais insônia, já que a sua consciência ainda exigia de sua mente uma solução. “Tem de haver alguma, sempre há... é só questão de estar disposto a achá-la.” E por fim achou. Não era uma solução certa, na verdade quase não havia nada de certo no que iria fazer, mas como seu mentor sempre dizia... “ se não sabe por que caminho ir, então qualquer um servirá.”

Era um caminho, Sorhe não tinha a menor dúvida, a questão era se o caminho o levaria a salvação daquele mundo. A salvação, ou apenas um meio para que eles possam se defender.

Teria de funcionar, iria funcionar! Era tudo no que o cientista se apegava, na ideia e na fé de que se não pudesse resolver o problema, ao menos teria a certeza de que fez tudo o que pode, apesar do alto preço que lhe custaria.

O horário de expediente já havia terminado há horas, a maioria do pessoal de pesquisa já retornava para casa deixando todo o complexo estudantil vazio e era esse o momento que o cientista esperava e temia. Sorhe caminhou lentamente pela passarela de mármore branco que ligava a área de pesquisa com o departamento de ciências humanas, olhando atentamente por todos os lados, esperando não ver ninguém que suspeitasse de sua permanência até aquele horário, mas também encarava todo o espaço a sua volta com uma sensação de nostalgia e tristeza. Sorhe adorava este lugar, foi praticamente onde cresceu intelectualmente com a ajuda do seu mentor... Sim, ele sentiria muitas saudades do velho Haskir com suas histórias e ensinamentos. O cientista tinha esperanças que seu professor pudesse perdoá-lo pelo que ele iria fazer. Sim, se tem alguém que entenderá é Haskir...

Sorhe adentrou em um corredor aberto, bem iluminado por lâmpadas fluorescente e parou na terceira porta do lado direito, digitou o código de segurança, agradecido pelo complexo inteiro usar um único sistema de senhas ao qual um cientista de sua categoria teria acesso.

Em todo o imenso laboratório de ciências biológicas só havia um aparelho que Sorhe estava interessado, era um EnergyDrought*, basicamente uma haste de metal ligada a uma bateria de energia reversa que ao invés de dar uma descarga elétrica puxa a eletricidade de qualquer aparelho que funcione com esta base de força.

“Qualquer aparelho... Sim... Será um fim rápido.” O cientista retirou o jaleco e a camisa, deixando o peito nu, regulou a intensidade da máquina e pegou a haste com a mão direita observando que ela tremia freneticamente, por que ele não estava pronto. Haviam muitas dúvidas sobre o que faria, dúvidas importante que só eram aquietadas pela fé de que poderá ajudar aquele planeta, ajudar as bilhões de vidas que nele habitam.

O cientista respirou fundo sentindo o tremor aumentar, o que deixava evidente por suas mãos, mas ele tinha que fazer, estava planejando aquilo por semanas, não poderia voltar atrás agora... E assim Sorhe levou a ponta da haste ao tórax e seu corpo imediatamente vibrou arrepiando a pele à medida que a máquina parava as batidas de seu coração, levando embora sua vida. 

*EnergyDrought = do inglês, significa energia seca.