Natsu caminhava lentamente para o quarto em que Lucy estava. Em suas mãos, havia uma bandeja prateada, repleta de alimentos, desde frutas até sucos e iogurtes naturais, o que realmente era uma questão de equilíbrio para o rosado, mas o Dragneel andava lentamente também por outro motivo.

O DragonSlayer estava imerso em seus pensamentos, todos focados na loira que estava no quarto ao fim do corredor.

Tudo porque, após a dura discussão entre eles, o garoto não sabia como a Heartfilia reagiria ao vê-lo, pois mesmo com pesar, ele não podia negar que aquela garota não era a mesma Lucy que ele conhecera outrora.

Mas mesmo assim, no fundo de seu coração, Natsu não queria acreditar que aquele era o fim tão cruel.

O rosado se negava a aceitar como definitivo, o fato de que sua amiga, sua amada amiga, se tornara aquele ser arrogante e assustador para sempre.

Talvez fosse uma espécie de auto-proteção, dor, desespero, medo, pavor e desconfiança... E mesmo que parecesse impossível transpassar aquela aura de isolamento e raiva, o Dragneel estava determinado a fazê-lo e recuperar a loira para si.

O problema era por onde começar... Enquanto divagava por entre seus pensamentos, o DragonSlayer não notou que Makarov estava no batente do quarto da Heartfilia, a observando dormir solenemente.

O mais velho nem sabia quanto tempo estava ali, observando a garota dormir. O arrependimento pulsava em suas veias, e a culpa dilacerava sua sanidade.

Ele sentia vontade de tocar o rosto da garota, como um pai, como um pai ausente e negligente que fora, queria acordá-la, e dizer tanta coisa... Mas sentia que não sabia como falar tudo o que estava engasgado em sua garganta, e tinha medo de só piorar as coisas.

Uma lágrima solitária e dolorida escorreu por sua face, e Makarov não fez questão de enxugá-la, mas ele não sabia que Natsu o estava observando.

—Mestre?—Perguntou o rosado, sua voz preocupada ecoando no corredor e na mente do grisalho que sentiu um arrepio percorrer sua espinha brutalmente.

Como uma criança que é pega fazendo o que não devia, o mais velho disfarçou e engoliu o choro com maestria e determinação, enxugando a lágrima tão rapidamente que quem o visse agora, jamais acharia que Makarov estava chorando há poucos segundos.

—O Senhor estava...

—Não!—Retrucou Makarov, subitamente interrompendo a fala do Dragneel.

O DragonSlayer não insistiu no assunto, pois conhecia seu Mestre tempo suficiente para saber que o velhote nunca mostraria suas fraquezas daquele modo, mesmo que fosse em uma situação justificável e extrema como aquela.

O garoto ficou ao lado do mais velho, apoiado no outro batente da porta, observando-a.

—Assim ela parece ser tão tranqüila...—Murmurou ele.

—Ainda não tive a oportunidade de vê-la acordada...—Respondeu Makarov e Natsu lhe dirigiu um sorriso irônico e seco, com múltiplos significados.

—Não sei dizer se é felizmente ou infelizmente...—Respondeu Natsu, com sinceridade.

—O que quer dizer moleque?—Indagou o grisalho, olhando para o rosado.

—Bem, acho que o Senhor deve descobrir isso por si mesmo...—Disse o Dragneel e antes que o mais velho pudesse interpretar o que o DragonSlayer havia dito, o garoto lhe estendeu a bandeja e saiu andando a passos largos, logo sumindo da vista de seu mestre. Por mais que ele quisesse ver Lucy novamente, Natsu sabia que Makarov também tinha esse direito, ainda mais porque, tecnicamente, foi o grisalho quem começou tudo isso, não que o rosado o culpasse, na verdade, o Dragneel nunca o culpou, nunca culpou ninguém da guilda.

Todos já se martirizavam demais, e um julgamento cheio de amargor, ressentimento e raiva não ajudaria em nada.

E agora, quando a loira finalmente estava próxima deles novamente, o grisalho tinha que consertar as coisas, e foi esse privilégio que o rosado o deixou fazer.

Agora, estando sozinho no mesmo ambiente que a loira, o Mestre da guilda parecia patético, não sabendo como deveria agir.

Primeiramente, ele colocou a bandeja no criado mudo, ao lado da cama, mas o metal da bandeja acabou fazendo um barulho agudo que se propagou no ar, de forma suave, mas que foi o suficiente para acordar o a Heartfilia de seu aparente profundo sono.

O mais velho levou um susto ao ver aquelas orbes caramelo se virarem para si, ainda vermelhos denunciando o sono que ainda sentia e a irritação, também pelo mesmo motivo.

Seu cabelo estava desarrumado, estava até um pouco engraçado, mas não naquela hora... Poucos segundos de silencio se sucederam, mas que se arrastaram pelo que pareciam ser horas e mais horas de agonia para Makarov.

—Makarov...—Sussurrou a garota, lentamente, como se estivesse tentando se lembrar como falava aquele nome.

O grisalho não se conteve e lágrimas irromperam de seus olhos, causando surpresa nela, mesmo que Lucy soubesse muito bem como camuflar aquilo diante das pessoas.

—O que veio fazer aqui?—Perguntou a loira, que ficou feliz ao ver que sua voz não mostrava hesitação ou fraqueza.

—Pedir perdão.—Respondeu o Mestre, e aquela frase singela, dita com sufoco, atingiu a Heartfilia como um soco, um tsunami, um raio, enfim, use alegoria que você desejar, mas o que importa é que a garota não esperava ouvir aquilo, e toda aquela barreira que ela havia construído com ardor para se proteger das pessoas, havia sido destroçada por aquela simples sentença.

E o mais velho, vendo que Lucy estava surpresa ao ouvir aquilo, continuou a sua fala, com mais determinação do que antes:

—Você não sabe como está sendo torturante para todos nós... Nos sentíamos como monstros, mas não pense que eu estou nos colocando como vítimas da história. Na verdade, até que foi bom, para nós aprendermos o seu valor... Nada de Atherion ou família Heartfiilia, somente você, Lucy. Sei que é pedir demais, mas, volte para casa, minha filha. Todos nós erramos, mas o que importa é o que nós fazemos com as conseqüências desses erros... E, eu digo em meu nome e no nome da Fairy Tail, que queremos você de volta para nossa família.

A loira não mudou de expressão, continuando com os olhos arregalados e a boca escancarada de perplexidade.

Makarov até chegou a pensar que a Heartfilia iria desmaiar, mas foi então que a garota fez algo que o surpreendeu ainda mais.

Lágrimas escorriam pelo rosto infantil e perfeito dela e o grisalho não sabia decidir se aquilo era bom ou ruim.

—Eu perdôo vocês...—Disse por fim, tentando conter os soluços, sorrindo de leve, da melhor forma que podia sorrir no momento, ao contrário do Mestre, que sorriu de orelha a orelha, se assemelhando a um duende.

—Venha, nós precisamos contar para todo mundo!—Exclamou o mais velho, segurando nas mãos de Lucy com carinho, com o objetivo de arrastá-la para fora do quarto.—Vamos dar uma festa que durará três dias e...

A fala do mais velho foi definhando aos poucos, vendo que a loira não compartilhava da mesma alegria e animação do que ele, e pior, ainda continuava a chorar incessantemente, e não era um choro de felicidade.